sexta-feira, 27 de junho de 2025

Homilia do Papa João Paulo II: Sagrado Coração (Ano C)

No dia 02 de junho de 1989 o Papa João Paulo II (†2005) celebrou a Missa da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus no Centro Esportivo «Idrettsbygget» da Universidade Técnica de Trondheim (Noruega) durante sua Viagem Apostólica ao país.

Durante a celebração, que reuniu os fiéis da Noruega Central, um grupo de crianças recebeu a primeira Comunhão, como o Papa destaca em sua homilia, meditando as leituras da Solenidade para o Ano C (Ez 34,11-16; Sl 22; Rm 5,5b-11; Lc 15,3-7).

Viagem Apostólica a Noruega, Islândia, Finlândia, Dinamarca e Suécia
Celebração Eucarística
Homilia do Papa João Paulo II
Centro Esportivo «Idrettsbygget», Universidade Técnica de Trondheim (Noruega)
Sexta-feira, 02 de junho de 1989

Caros irmãos e irmãs da Noruega Central!
1. Estou verdadeiramente contente de celebrar a Solenidade do Sagrado Coração convosco, aqui em Trondheim. Viestes das comunidades de Alesund, Molde, Kristiansund, Levanger e Trondheim.
Muitos de vós contribuíram com muito trabalho para que esse dia fosse um sucesso. Estou feliz com isso e agradeço a todos!

Viestes, como os peregrinos de outrora, a esta venerável cidade de Nidaros (agora Trondheim, às relíquias de Santo Olaf, que anunciou uma nova era de Cristianismo e de unificação nesta terra, embora não tenha vivido o suficiente para poder ver os frutos do seu trabalho. Seu filho - Magnus, o Bom - construiu a primeira igreja de madeira neste lugar, que rapidamente se tornou uma meta de peregrinação. Já em 1060 se celebrava uma Liturgia em honra de Santo Olaf até mesmo em Northumberland, na Grã-Bretanha. Também na Igreja Ortodoxa a memória de Santo Olaf é muito venerada: à sua intercessão foi atribuída a sobrevivência da Guarda Imperial de Constantinopla em um momento de perigo, quando, sob o Imperador Aleixo, enfrentou os búlgaros em batalha.

Imagem do Bom Pastor com o Coração em destaque
(Basílica de São Lourenço fora dos muros, Roma)

A Eucaristia foi um ponto central para as inumeráveis pessoais que vieram aqui ao longo dos séculos. Na Eucaristia recebemos Cristo, que instituiu este sacramento para poder permanecer conosco e viver em nós. Poderia haver dom maior? Cristo redimiu o mundo com o sacrifício do seu Corpo e do seu Sangue. Fazendo isso, Ele nos deu o alimento e a bebida para a vida eterna. Este alimento sacramental, sob as espécies do pão e do vinho, realmente “restaura as nossas almas”. Com efeito, Ele nos guia pelo caminho da fé, da esperança e da caridade todos os dias da nossa vida, para que possamos “viver na casa do Senhor”.

“O Senhor é o meu pastor, não me falta coisa alguma” (Sl 22,1).
A Liturgia de hoje coloca essas palavras do salmista nos lábios das crianças que receberão a primeira Comunhão nesta Missa. É particularmente apropriado que elas rezem hoje com essas maravilhosas palavras, quando nosso Senhor e Salvador prepara uma mesa eucarística para elas pela primeira vez. As palavras “o Senhor é o meu pastor” expressam uma esperança iluminada que elas podem repetir todas as vezes que receberem Jesus, o pão da vida.

2. As leituras da Escritura da Missa de hoje nos propõem a figura do Bom Pastor. Os profetas do Antigo Testamento usam esta imagem para poder falar de Deus que libertou o povo eleito, Israel, da escravidão do Egito e lhe demonstrou particular amor. Deus é o pastor que cuida das suas ovelhas, vigiando-as para que não se percam. Ele nutre o seu rebanho, buscando “prados verdejantes” para que possam pastar bem. Ele até mesmo encontra lugares tranquilos para que possa repousar. Com solicitude amorosa Ele cuida de todo o rebanho, não apenas de todas as ovelhas, mas também de cada uma individualmente. Ele se preocupa com o bem-estar de cada cordeiro e de cada ovelha que lhe foram confiados. Esta é a imagem do Bom Pastor assim como o profeta Ezequiel a apresenta na 1ª leitura (Ez 34,11-16).

Na plenitude dos tempos, Jesus confirmou e aperfeiçoou a visão profética do Bom Pastor, sacrificando a própria vida pelas ovelhas (cf. Jo 10,11). Isto se refere ao seu sacrifício na Cruz, através do qual Ele deu a sua vida pela vida do mundo (cf. Jo 6,51) - por todos e por cada um individualmente. São Paulo escreve a respeito: “Cristo morreu por nós quando éramos ainda pecadores” (Rm 5,8). Com a sua morte, Cristo ofereceu-se a si mesmo em sacrifício ao Pai e, através desse sacrifício redentor, revelou o amor do Pai por nós. São Paulo ensina que fomos “justificados pelo sangue de Cristo... fomos reconciliados com Deus pela morte do seu Filho; agora, estando já reconciliados, seremos salvos por sua vida” (vv. 9-10). Este é o mistério do amor de Deus pelas suas ovelhas, o seu infinito e imutável amor, que o leva a ir em busca da ovelha perdida (cf. Lc 15,3-7).

Este mistério nos foi ulteriormente revelado na véspera da morte de Cristo na Cruz, quando Ele instituiu o sacramento do seu Corpo e o seu Sangue. A Eucaristia é o sacrifício do Calvário realizado sacramentalmente sobre os nossos altares, razão pela qual o Filho de Deus Crucificado e Ressuscitado está sempre vivo no meio de nós. E é precisamente a sua vida ressuscitada que Ele deseja nos comunicar. Como verdadeiro Deus e verdadeiro homem, Ele partilha esta nova vida conosco na Eucaristia, quando o recebemos sob as aparências do pão e do vinho.

3. Disseram-me que as ovelhas podem ser vistas pastar em toda a Noruega desde o início da primavera até o final do outono. Sem dúvida elas muitas vezes podem vagar por lugares perigosos, e se vão muito longe correm o risco de se perder ou caírem presas de outros perigos. Na nossa viagem através da vida também nós corremos o risco de perder-nos. Ouvimos tantas vozes contraditórias que nos chamam de um lado e de outro. Assim, hoje convém que cada um de nós se interrogue: onde estou realmente? Sou uma ovelha perdida que precisa ser reconduzida ao redil sobre os ombros do Bom Pastor? Ele busca-nos continuamente, chamando-nos de volta das estradas falsas e enganosas nas quais podemos nos perder. Ele continuamente chama-nos ao arrependimento: chama-nos a restabelecer a comunhão com Deus e com os outros quando pecamos, e a uma santidade cada vez maior enquanto membros da sua Igreja.

Imagem do Bom Pastor com o Coração em destaque
(Catedral Armênia de Lviv, Ucrânia)

Através da conversão devemos também crescer no amor e no respeito por todo o rebanho de Cristo. Comparada com outros lugares, a Noruega é um país rico. O próprio nome “Trondheim” nos recorda isso: significa “riqueza da terra”. Muitas pessoas veem com admiração vossa democrática sociedade. As tendências sociais no vosso país atraem a atenção do mundo. Nesse contexto, portanto, sois chamados a não esquecer as crianças, os enfermos, as pessoas com deficiência e os idosos. Todos merecem e têm necessidade de ser amados assim como Deus ama cada um de nós: isso constitui um tesouro do qual todos nos beneficiamos. O melhor dom que podeis dar aos vossos filhos é um coração que seja plenamente humano, um coração que seja sensível ao bem e ao mal. O melhor dom que podeis dar aos enfermos, às pessoas com deficiência e aos idosos é o respeito devido a eles enquanto filhos e filhas do mesmo Pai celestial. Eles merecem o vosso tempo, a atenção e o amor de cada um de vós. O seu exemplo e a sua plenitude enriquecerão as vossas vidas e as vidas de todos aqueles que se aproximarem deles com solicitude compassiva.

4. Meus irmãos e irmãs, sei que muitos de vós, que viestes aqui hoje para celebrar a vossa unidade na fé com o Sucessor de São Pedro, pertencem a pequenas comunidades. Muitos de vós provavelmente vivem longe de uma igreja. Vós experimentastes o que significa pertencer a uma minoria religiosa, especialmente considerando que muitos católicos da Noruega Central provêm do exterior. Aqueles entre vós que vieram de outros países podem sentir falta da língua, da cultura e do modo de viver da sua pátria, e também da familiar Igreja Católica com as suas orações, os seus hinos e as suas cerimônias. Porém, quero dizer a cada um de vós que o Papa, o Pastor universal da Igreja, vos ama. Ele vem em nome de Cristo, o Bom Pastor, e vós possuís um lugar especial no seu coração. Ele admira a vossa fidelidade e a vossa perseverança. E hoje ele está aqui para vos encorajar a colocar toda a vossa confiança no amor de Deus!
Colocai toda a vossa confiança no amor de Deus!

Àqueles de vós que sois noruegueses por nascimento e há gerações compreendeis que os imigrantes também contribuem para a riqueza da nação: segundo as melhores tradições deste país, destes aos vossos cidadãos a possibilidade de começar de novo em liberdade, com todas as oportunidades que a sociedade oferece. Deste modo, representais um nobre exemplo que os outros devem seguir. As diferenças humanas enriquecem cada nível da sociedade, e por isso encorajo toda a comunidade a continuar garantindo àqueles que se estabeleceram no meio de vós um lugar real na sociedade, concedendo-lhes o respeito e os direitos que vós mesmos possuís.

5. A Solenidade do Sagrado Coração de Jesus que hoje celebramos nos convida a ver e a amar Cristo em todas as pessoas e a refletir o seu amor por elas na nossa vida. Por gerações a Igreja rezou assim: “Jesus, manso e humilde de coração, fazei o nosso coração semelhante ao vosso”. Hoje desejo recordar esta oração familiar e recitá-la em vosso nome: Jesus, fazei o nosso coração semelhante ao vosso. E, fazendo isso, agradeço a Deus particularmente pelo exemplo dos Padres de Picpus, missionários do Sagrado Coração, que por mais de cinquenta anos ofereceram sacerdotes para esta região, frequentemente em condições muito difíceis. Caros irmãos: hoje, na vossa grande festa, vos exorto a continuar vosso ministério sacerdotal e vos ofereço a gratidão de toda a Igreja pela vossa generosidade e pelo vosso zelo.

Agradeço também as Irmãs das Congregações religiosas que de maneira louvável demonstraram a todos o amor de Cristo, especialmente às crianças, aos enfermos e aos idosos. O serviço que prestais é uma oração vivente que pode ser compreendida por todos. Que o Bom Pastor continue a zelar por vós e vos abençoe no vosso empenho.

6. Minhas palavras finais são dirigidas às crianças:
Queridas crianças que recebereis a primeira Comunhão, hoje é um dia muito importante para vós. Recebereis pela primeira vez a sagrada Comunhão. Estou surpreso ao ver de quantos lugares provindes. Muitos de vós falam não só o norueguês, mas também o vietnamita, o polonês, o espanhol, o inglês ou outras línguas. Vossos pais e os sacerdotes que vos instruíram me disseram que vos preparastes muito bem. Este é um ótimo exemplo para os adultos de todo o mundo. Vós demonstrais que todos pertencem à comunidade da Igreja.

Estamos aqui porque Jesus nos chamou. Vistes no exemplo do publicano Zaqueu. Jesus quer celebrar uma festa conosco e quer dar-nos o melhor de si: o seu Corpo e o seu Sangue.

A preparação para a primeira Comunhão vos fez muito felizes. Permanecei unidos e continuai assim. Os vossos sacerdotes, os vossos pais e os vossos companheiros mais velhos ficarão felizes de vos ajudar.

Desejo concluir com uma palavra aos vossos pais. Muitos de vós ajudastes vossos filhos na sua preparação e vos agradeço do fundo do coração. Agora vos peço que façais todo o possível para que vossos filhos se encontram em casa na comunidade da Igreja.

O Papa dá a Comunhão a uma criança

Tradução nossa a partir do texto italiano. Fonte: Santa Sé.

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