quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Indicações Pastorais para o Ano da Fé

Congregação para a Doutrina da Fé
Nota com indicações pastorais para o Ano da Fé

Introdução
Com a Carta Apostólica Porta fidei de 11 de outubro de 2011, o Santo Padre Bento XVI convocou um Ano da Fé. Ele começará no dia 11 de outubro 2012, por ocasião do quinquagésimo aniversário da abertura do Concílio Ecumênico Vaticano II, e terminará aos 24 de novembro de 2013, Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo.
Este ano será uma ocasião propícia a fim de que todos os fiéis compreendam mais profundamente que o fundamento da fé cristã é “o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo”. [1] Fundamentada no encontro com Jesus Cristo ressuscitado, a fé poderá ser redescoberta na sua integridade e em todo o seu esplendor. “Também nos nossos dias a fé é um dom que se deve redescobrir, cultivar e testemunhar” para que o Senhor “conceda a cada um de nós viver a beleza e a alegria de sermos cristãos” [2].
O início do Ano da Fé coincide com a grata recordação de dois grandes eventos que marcaram a face da Igreja nos nossos dias: o quinquagésimo aniversário da abertura do Concílio Vaticano II, desejado pelo beato João XXIII (11 de outubro de 1962), e o vigésimo aniversário da promulgação do Catecismo da Igreja Católica, oferecido à Igreja pelo beato João Paulo II (11 de outubro de 1992).
O Concílio, segundo o Papa João XXIII, quis “transmitir pura e íntegra a doutrina, sem atenuações nem subterfúgios”, empenhando-se para que “esta doutrina certa e imutável, que deve ser fielmente respeitada, seja aprofundada e exposta de forma a responder às exigências do nosso tempo” [3]. A este propósito, continua sendo de importância decisiva o início da Constituição dogmática Lumen gentium: “A luz dos povos é Cristo: por isso, este sagrado Concílio, reunido no Espírito Santo, deseja ardentemente iluminar com a Sua luz, que resplandece no rosto da Igreja, todos os homens, anunciando o Evangelho a toda a criatura (cf. Mc 16,15)” [4]. A partir da luz de Cristo, que purifica, ilumina e santifica na celebração da sagrada liturgia (cf. Constituição Sacrosanctum Concilium) e com a sua palavra divina (cf. Constituição Dogmática Dei Verbum), o Concílio quis aprofundar a natureza íntima da Igreja (cf. Constituição Dogmática Lumen gentium) e a sua relação com o mundo contemporâneo (cf. Constituição Pastoral Gaudium et spes). Ao redor das suas quatro Constituições, verdadeiras pilastras do Concílio, se agrupam as Declarações e os Decretos, que enfrentam alguns dos maiores desafios do tempo.
Depois do Concílio, a Igreja se empenhou na assimilação (receptio) e na aplicação do seu rico ensinamento, em continuidade com toda a Tradição, sob a guia segura do Magistério. A fim de favorecer a correta assimilação do Concílio, os Sumos Pontífices convocaram amiúde o Sínodo dos Bispos [5], instituído pelo Servo de Deus Paulo VI em 1965, propondo à Igreja orientações claras por meio das diversas Exortações apostólicas pós-sinodais. A próxima Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, no mês de outubro de 2012, terá como tema: A nova evangelização para a transmissão da fé cristã.
Desde o começo do seu pontificado, o Papa Bento XVI se empenhou de maneira decisiva por uma correta compreensão do Concílio, rechaçando como errônea a assim chamada “hermenêutica da descontinuidade e da ruptura” e promovendo aquele que ele mesmo chamou de “hermenêutica da reforma”, da renovação na continuidade do único sujeito-Igreja, que o Senhor nos concedeu; é um sujeito que cresce no tempo e se desenvolve, permanecendo porém sempre o mesmo, único sujeito do Povo de Deus a caminho” [6].
Catecismo da Igreja Católica, pondo-se nesta linha, é, de um lado, “verdadeiro fruto do Concílio Vaticano II” [7], e de outro pretende favorecer a sua assimilação. O Sínodo Extraordinário dos Bispos de 1985, convocado por ocasião do vigésimo aniversário da conclusão do Concílio Vaticano II e para efetuar um balanço da sua assimilação, sugeriu que fosse preparado este Catecismo a fim de oferecer ao Povo de Deus um compêndio de toda a doutrina católica e um texto de referência segura para os catecismos locais. O Papa João Paulo II acolheu a proposta como desejo “de responder plenamente a uma necessidade verdadeira da Igreja Universal e das Igrejas particulares” [8]. Redigido em colaboração com todo o Episcopado da Igreja Católica, este Catecismo “exprime verdadeiramente aquela a que se pode chamar a ‘sinfonia da fé’” [9].
Catecismo compreende “coisas novas e velhas (cf. Mt 13,52), porque a fé é sempre a mesma e simultaneamente é fonte de luzes sempre novas. Para responder a esta dupla exigência, o ‘Catecismo da Igreja Católica’ por um lado retoma a ‘antiga’ ordem, a tradicional, já seguida pelo Catecismo de São Pio V, articulando o conteúdo em quatro partes: o Credo; a sagrada Liturgia, com os sacramentos em primeiro plano; o agir cristão, exposto a partir dos mandamentos; e por fim a oração cristã. Mas, ao mesmo tempo, o conteúdo é com freqüência expresso de um modo ‘novo’, para responder às interrogações da nossa época” [10]. Este Catecismo é “um instrumento válido e legítimo a serviço da comunhão eclesial e como uma norma segura para o ensino da fé” [11]. Nele os conteúdos da fé encontram “a sua síntese sistemática e orgânica. Nele, de facto, sobressai a riqueza de doutrina que a Igreja acolheu, guardou e ofereceu durante os seus dois mil anos de história. Desde a Sagrada Escritura aos Padres da Igreja, desde os Mestres de teologia aos Santos que atravessaram os séculos, o Catecismo oferece uma memória permanente dos inúmeros modos em que a Igreja meditou sobre a fé e progrediu na doutrina para dar certeza aos crentes na sua vida de fé” [12].
Ano da Fé quer contribuir para uma conversão renovada ao Senhor Jesus e à redescoberta da fé, para que todos os membros da Igreja sejam testemunhas credíveis e alegres do Senhor ressuscitado no mundo de hoje, capazes de indicar a “porta da fé” a tantas pessoas que estão em busca. Esta “porta” escancara o olhar do homem para Jesus Cristo, presente no nosso meio “todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28,20). Ele nos mostra como “a arte de viver” se aprende “numa relação profunda com Ele” [13]. “Com o seu amor, Jesus Cristo atrai a Si os homens de cada geração: em todo o tempo, Ele convoca a Igreja confiando-lhe o anúncio do Evangelho, com um mandato que é sempre novo. Por isso, também hoje é necessário um empenho eclesial mais convicto a favor duma nova evangelização, para descobrir de novo a alegria de crer e reencontrar o entusiasmo de comunicar a fé” [14].
Por ordem do Papa Bento XVI [15], a Congregação para a Doutrina da Fé redigiu a presente Nota, em acordo com os Dicastérios competentes da Santa Sé e com a contribuição do Comitê para a preparação do Ano da Fé [16], com algumas indicações para viver este tempo de graça, sem excluir outras propostas que o Espírito Santo quiser suscitar entre os Pastores e os fiéis nas diversas partes do mundo.

Carta Apostólica Porta Fidei sobre o Ano da Fé

Bento XVI
Carta Apostólica sob forma de Motu Proprio “Porta Fidei”
Com a qual se proclama o Ano Da Fé

1. A porta da fé (cf. At 14,27), que introduz na vida de comunhão com Deus e permite a entrada na sua Igreja, está sempre aberta para nós. É possível cruzar este limiar, quando a Palavra de Deus é anunciada e o coração se deixa plasmar pela graça que transforma. Atravessar esta porta implica embrenhar-se num caminho que dura a vida inteira. Este caminho tem início no Batismo (cf. Rm 6,4), pelo qual podemos dirigir-nos a Deus com o nome de Pai, e está concluído com a passagem através da morte para a vida eterna, fruto da ressurreição do Senhor Jesus, que, com o dom do Espírito Santo, quis fazer participantes da sua própria glória quantos creem n’Ele (cf. Jo 17,22). Professar a fé na Trindade – Pai, Filho e Espírito Santo – equivale a crer num só Deus que é Amor (cf. 1Jo 4,8): o Pai, que na plenitude dos tempos enviou seu Filho para a nossa salvação; Jesus Cristo, que redimiu o mundo no mistério da sua morte e ressurreição; o Espírito Santo, que guia a Igreja através dos séculos enquanto aguarda o regresso glorioso do Senhor.
2. Desde o princípio do meu ministério como Sucessor de Pedro, lembrei a necessidade de redescobrir o caminho da fé para fazer brilhar, com evidência sempre maior, a alegria e o renovado entusiasmo do encontro com Cristo. Durante a homilia da Santa Missa no início do pontificado, disse: «A Igreja no seu conjunto, e os Pastores nela, como Cristo devem pôr-se a caminho para conduzir os homens fora do deserto, para lugares da vida, da amizade com o Filho de Deus, para Aquele que dá a vida, a vida em plenitude» [1]. Sucede não poucas vezes que os cristãos sintam maior preocupação com as consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé, considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária. Ora um tal pressuposto não só deixou de existir, mas frequentemente acaba até negado. [2] Enquanto, no passado, era possível reconhecer um tecido cultural unitário, amplamente compartilhado no seu apelo aos conteúdos da fé e aos valores por ela inspirados, hoje parece que já não é assim em grandes sectores da sociedade devido a uma profunda crise de fé que atingiu muitas pessoas.
3. Não podemos aceitar que o sal se torne insípido e a luz fique escondida (cf. Mt 5,13-16). Também o homem contemporâneo pode sentir de novo a necessidade de ir como a samaritana ao poço, para ouvir Jesus que convida a crer n’Ele e a beber na sua fonte, donde jorra água viva (cf. Jo 4,14). Devemos readquirir o gosto de nos alimentarmos da Palavra de Deus, transmitida fielmente pela Igreja, e do Pão da vida, oferecidos como sustento de quantos são seus discípulos (cf. Jo 6,51). De facto, em nossos dias ressoa ainda, com a mesma força, este ensinamento de Jesus: «Trabalhai, não pelo alimento que desaparece, mas pelo alimento que perdura e dá a vida eterna» (Jo 6,27). E a questão, então posta por aqueles que O escutavam, é a mesma que colocamos nós também hoje: «Que havemos nós de fazer para realizar as obras de Deus?» (Jo 6,28). Conhecemos a resposta de Jesus: «A obra de Deus é esta: crer n’Aquele que Ele enviou» (Jo 6,29). Por isso, crer em Jesus Cristo é o caminho para se poder chegar definitivamente à salvação.
4. À luz de tudo isto, decidi proclamar um Ano da Fé. Este terá início a 11 de Outubro de 2012, no cinquentenário da abertura do Concílio Vaticano II, e terminará na Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo, a 24 de Novembro de 2013. Na referida data de 11 de Outubro de 2012, completar-se-ão também vinte anos da publicação do Catecismo da Igreja Católica, texto promulgado pelo meu Predecessor, o Beato Papa João Paulo II, [3] com o objetivo de ilustrar a todos os fiéis a força e a beleza da fé. Esta obra, verdadeiro fruto do Concílio Vaticano II, foi desejada pelo Sínodo Extraordinário dos Bispos de 1985 como instrumento ao serviço da catequese [4] e foi realizado com a colaboração de todo o episcopado da Igreja Católica. E uma Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos foi convocada por mim, precisamente para o mês de Outubro de 2012, tendo por tema A nova evangelização para a transmissão da fé cristã. Será uma ocasião propícia para introduzir o complexo eclesial inteiro num tempo de particular reflexão e redescoberta da fé. Não é a primeira vez que a Igreja é chamada a celebrar um Ano da Fé. O meu venerado Predecessor, o Servo de Deus Paulo VI, proclamou um ano semelhante, em 1967, para comemorar o martírio dos apóstolos Pedro e Paulo no décimo nono centenário do seu supremo testemunho. Idealizou-o como um momento solene, para que houvesse, em toda a Igreja, «uma autêntica e sincera profissão da mesma fé»; quis ainda que esta fosse confirmada de maneira «individual e coletiva, livre e consciente, interior e exterior, humilde e franca». [5] Pensava que a Igreja poderia assim retomar «exata consciência da sua fé para a reavivar, purificar, confirmar, confessar». [6] As grandes convulsões, que se verificaram naquele Ano, tornaram ainda mais evidente a necessidade duma tal celebração. Esta terminou com a Profissão de Fé do Povo de Deus, [7] para atestar como os conteúdos essenciais, que há séculos constituem o patrimônio de todos os crentes, necessitam de ser confirmados, compreendidos e aprofundados de maneira sempre nova para se dar testemunho coerente deles em condições históricas diversas das do passado.
5. Sob alguns aspectos, o meu venerado Predecessor viu este Ano como uma «consequência e exigência pós-conciliar» [8], bem ciente das graves dificuldades daquele tempo sobretudo no que se referia à profissão da verdadeira fé e da sua reta interpretação. Pareceu-me que fazer coincidir o início do Ano da Fé com o cinquentenário da abertura do Concílio Vaticano II poderia ser uma ocasião propícia para compreender que os textos deixados em herança pelos Padres Conciliares, segundo as palavras do Beato João Paulo II, «não perdem o seu valor nem a sua beleza. É necessário fazê-los ler de forma tal que possam ser conhecidos e assimilados como textos qualificados e normativos do Magistério, no âmbito da Tradição da Igreja. Sinto hoje ainda mais intensamente o dever de indicar o Concílio como a grande graça de que beneficiou a Igreja no século XX: nele se encontra uma bússola segura para nos orientar no caminho do século que começa». [9] Quero aqui repetir com veemência as palavras que disse a propósito do Concílio poucos meses depois da minha eleição para Sucessor de Pedro: «Se o lermos e recebermos guiados por uma justa hermenêutica, o Concílio pode ser e tornar-se cada vez mais uma grande força para a renovação sempre necessária da Igreja». [10]

Fotos da Missa do Papa no Líbano

No dia 16 de setembro o Papa Bento XVI celebrou a Missa na cidade de Beirute por ocasião de sua Viagem Apostólica ao Líbano. Na ocasião, o Papa entregou a Exortação Apostólica Pós-Sinodal "Ecclesia in Medio Oriente" a alguns representantes da Igreja no Oriente Médio.

O Santo Padre foi assistido pelos Monsenhores Guido Marini e Marco Agostini. O livreto da celebração pode ser visto aqui (pp. 45-87).

Procissão de entrada

Incensação

Patriarca Maronita saúda o Papa 

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Homilia do Papa na Missa no Líbano

Viagem Apostólica ao Líbano
Santa Missa e Entrega da Exortação Apostólica Pós-Sinodal para o Médio Oriente
Homilia do Papa Bento XVI
Beirut City Center Waterfront
Domingo, 16 de Setembro de 2012

Amados irmãos e irmãs!
«Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo» (Ef 1,3). Bendito seja Ele neste dia em que tenho a alegria de me encontrar convosco aqui, no Líbano, para entregar aos Bispos da região a Exortação Apostólica Pós-sinodal Ecclesia in Medio Oriente. Agradeço cordialmente a Sua Beatitude Béchara Boutros Raï as amáveis palavras de boas-vindas. Saúdo os outros Patriarcas e os Bispos das Igrejas orientais, os Bispos latinos das regiões vizinhas bem como os Cardeais e os Bispos vindos doutros países. Com grande afeto, saúdo a todos vós, queridos irmãos e irmãs do Líbano e também dos países de toda esta amada região do Médio Oriente, que viestes celebrar, com o sucessor de Pedro, Jesus Cristo crucificado, morto e ressuscitado. Dirijo também a minha deferente saudação ao Presidente da República e às autoridades libanesas, aos Responsáveis e aos membros das outras tradições religiosas que quiseram estar aqui nesta manhã.
Neste domingo em que o Evangelho nos interpela sobre a verdadeira identidade de Jesus, sentimo-nos a caminhar com os discípulos na estrada que leva às aldeias da região de Cesareia de Filipe. «E quem dizeis vós que Eu sou?» (Mc 8,29): pergunta-lhes Jesus. O momento escolhido para lhes colocar esta questão não é sem significado. Jesus encontra-se num ponto de viragem decisiva da sua vida. Sobe para Jerusalém, para o lugar onde será realizado, através da cruz e ressurreição, o acontecimento central da nossa salvação. É também em Jerusalém que, depois de todos estes acontecimentos, vai nascer a Igreja. E, neste momento decisivo, Jesus começa por perguntar aos seus discípulos: «Quem dizem os homens que Eu sou?» (Mc 8,27), recebendo deles respostas muito variadas: João Batista, Elias, um profeta… Ainda hoje, como ao longo dos séculos, aqueles que, de diversas maneiras, se cruzaram com Jesus no seu caminho têm a sua resposta a dar. São abordagens que podem ajudar a encontrar o caminho da verdade. Mas as mesmas, embora não sejam necessariamente falsas, são insuficientes, porque não atingem o cerne da identidade de Jesus. Só alguém que aceite seguir pelo seu caminho, viver em comunhão com Ele na comunidade dos discípulos, é que pode ter um verdadeiro conhecimento. Tal é o caso de Pedro, que, desde há algum tempo, vive com Jesus e que agora responde: «Tu és o Messias» (Mc 8,29). Resposta certa, sem dúvida alguma; mas ainda insuficiente, dado que Jesus sente a necessidade de a especificar. Ele entrevê que as pessoas poderiam servir-se desta resposta para desígnios que não são os seus, para suscitar falsas esperanças temporais sobre Ele. Não se deixa bloquear nos simples atributos do libertador humano que muitos esperam.
Anunciando aos seus discípulos que terá de sofrer, ser condenado à morte e depois ressuscitar, Jesus quer fazer-lhes compreender quem Ele é verdadeiramente. Um Messias sofredor, um Messias servo, e não um libertador político omnipotente. Ele é o Servo obediente à vontade de seu Pai até ao ponto de perder a sua vida. É o que anunciava já o profeta Isaías na primeira leitura. Assim Jesus vai contra o que muitos esperavam d’Ele. A sua afirmação choca e desconcerta. E ouve-se o protesto de Pedro, que O censura, recusando para o seu Mestre o sofrimento e a morte. Jesus mostra-se severo com ele, e faz-lhe compreender que aquele que quiser ser seu discípulo deve aceitar ser servo, como Ele Se fez Servo.
Seguir Jesus significa tomar a própria cruz para O acompanhar pelo seu caminho, um caminho incómodo que não é o do poder nem da glória terrena, mas o que leva necessariamente a renunciar a si mesmo, a perder a sua vida por Cristo e pelo Evangelho, a fim de a salvar. É que nos foi dada a certeza de que este caminho leva à ressurreição, à vida verdadeira e definitiva com Deus. Decidir acompanhar Jesus Cristo que Se fez o Servo de todos exige uma intimidade cada vez maior com Ele, colocando-se atentamente à escuta da sua Palavra, a fim de tirar dela a inspiração para o nosso agir. Ao promulgar o Ano da Fé, que começará em 11 de Outubro próximo, quis que cada fiel pudesse comprometer-se de maneira renovada neste caminho da conversão do coração. Por isso, ao longo deste ano, encorajo-vos vivamente a aprofundar a vossa reflexão sobre a fé para a tornar mais consciente e fortalecer a vossa adesão a Jesus Cristo e ao seu Evangelho.
Irmãos e irmãs, o caminho por onde Jesus nos quer conduzir é um caminho de esperança para todos. A glória de Jesus revela-se no momento em que, na sua humanidade, Ele Se mostra mais frágil, especialmente na encarnação e na cruz. É assim que Deus manifesta o seu amor, fazendo-Se servo, dando-Se a nós. Porventura não é este um mistério extraordinário, por vezes difícil de admitir? O próprio apóstolo Pedro só o compreenderá mais tarde.
Na segunda leitura, São Tiago lembrou-nos como este seguimento de Jesus, para ser autêntico, exija actos concretos: «Pelas obras, te mostrarei a minha fé» (Tg 2,18). Servir é uma exigência imperativa para a Igreja, de modo que os cristãos são verdadeiros servos à imagem de Jesus. O serviço é um elemento constitutivo da identidade dos discípulos de Cristo (cf. Jo 13,15-17). A vocação da Igreja e do cristão é servir; e fazê-lo, como o próprio Senhor, gratuitamente e a todos sem distinção. Assim, servir a justiça e a paz, num mundo onde a violência não cessa de alongar o seu rasto de morte e destruição, é uma urgência de modo a comprometer-se em prol duma sociedade fraterna, para edificar a comunhão. Amados irmãos e irmãs, peço ao Senhor de modo particular que conceda a esta região do Médio Oriente servidores da paz e da reconciliação, para que todos possam viver pacífica e dignamente. É um testemunho essencial que os cristãos devem prestar aqui, em colaboração com todas as pessoas de boa vontade. Eu vos convido a todos a trabalhar pela paz; cada qual ao seu nível e no lugar onde se encontra.
Além disso o serviço deve estar no centro da vida da própria comunidade cristã. Todo o ministério, toda a função na Igreja é primariamente um serviço a Deus e aos irmãos. É este espírito que deve animar todos os batizados, uns em relação aos outros, especialmente através dum compromisso efetivo a favor dos mais pobres, dos marginalizados, daqueles que sofrem, para que seja preservada a dignidade inalienável de toda a pessoa.
Queridos irmãos e irmãs que sofreis no corpo ou no coração, o vosso sofrimento não é inútil. Cristo Servo está perto de todos aqueles que sofrem. Está presente junto de vós. Oxalá encontreis no vosso caminho irmãos e irmãs que manifestem concretamente a presença amorosa de Cristo, que não vos pode abandonar. Permanecei cheios de esperança por causa de Cristo!
E vós todos, irmãos e irmãs, que viestes participar nesta celebração, procurai tornar-vos cada vez mais conformes ao Senhor Jesus, Ele que Se fez Servo de todos pela vida do mundo. Deus abençoe o Líbano, abençoe todos os povos desta amada região do Médio Oriente e lhes conceda o dom da sua paz. Amém.


Fonte: Santa Sé

domingo, 23 de setembro de 2012

São Pio de Pietrelcina e a Santa Missa

Entrevista de São Pio de Pietrelcina, publicada em 1974, na qual o santo fala a respeito da Missa:

Padre, o Sr. ama o Sacrifício da Missa?
Sim, porque Ela regenera o mundo.

Que glória dá a Deus a Missa?
Uma glória infinita

Que devemos fazer durante a Missa?
Compadecer-nos e amar.

Padre, como devemos assistir à Santa Missa?
Como assistiram a Santíssima Virgem e as piedosas mulheres. Como assistiu S. João Evangelista ao Sacrifício Eucarístico e ao Sacrifício cruento da Cruz.

Padre, que benefícios recebemos ao assistir à Santa Missa?
Não se podem contar. Vê-lo-ás no céu. Quando assistires à Santa Missa, renova a tua fé e medita na Vítima que se imola por ti à Divina Justiça. Não te afastes do altar sem derramar lágrimas de dor e de amor à Jesus, Crucificado por tua salvação. A Virgem Dolorosa te acompanhará e será tua doce inspiração.

Padre, que é sua Missa? 
Uma união sagrada com a Paixão de Jesus. Minha responsabilidade é única no mundo. (Dizia chorando)

Que devo descobrir na sua Santa Missa?
Todo o Calvário.

Padre, diga-me tudo o que o senhor sofre durante a Santa Missa.
Sofro tudo o que Jesus sofreu na sua Paixão, embora sem proporção, só enquanto pode fazê-lo uma criatura humana. E isto, apesar de cada uma de minhas faltas e só por sua bondade.

Padre, durante o Sacrifício divino, o senhor carrega os nossos pecados?
Não posso deixar de fazê-lo, já que é uma parte do Santo Sacrifício.

O senhor considera a si mesmo como um pecador?
Não o sei, porém temo que assim seja.

Eu já vi o senhor tremer ao subir aos degraus do altar. Por quê? Pelo que tens de sofrer? 
Não pelo que tenho de sofrer, mas pelo que tenho de oferecer.

Em que momento da Missa o senhor sofre mais?
Na Consagração e na Comunhão.

Padre, esta manhã na Missa, ao ler a história de Esaú, que vendeu os direitos de sua primogenitura, seus olhos se encheram de lágrimas.
Parece-te pouco desprezar o dom de Deus!?

Por que, ao ler o Evangelho, o senhor chorou quando leu estas palavras: "Quem come minha carne e bebe o meu sangue..."
Chora comigo de ternura!

Padre, por que o senhor chora quase sempre que lê o Evangelho na Missa?
A nós nos parece que não tem importância que um Deus fale às suas criaturas e elas O contradigam e continuamente O ofendam com sua ingratidão e incredulidade.

Sua Missa, Padre, é um sacrifício cruento?
Herege!

Perdão, Padre, quis dizer que na Missa o Sacrifício de Jesus não é cruento, mas a sua participação em toda a Paixão o é. Engano-me?
Não, nisso não te enganas. Creio que tens toda a razão.

Quem lhe limpa o sangue durante a Missa?
Ninguém.

Padre, por que o senhor chora no Ofertório?
Queres saber o segredo? Pois bem: porque é o momento em que a alma se separa das coisas profanas.

Durante sua Missa, Padre, o povo faz um pouco de barulho...
Se estivesses no Calvário, não escutarias gritos, blasfêmias, ruídos, e ameaças? Havia um alvoroço enorme.

Não o distraem os ruídos?
Em nada.

Padre, por quê sofre tanto na Consagração?
Não sejas maldoso... (Não quero que me perguntes isso...)

Padre, diga-me: por quê sofre tanto na Consagração?
Porque nesse momento se produz realmente uma nova e admirável destruição e criação.

Padre, por que chora no altar e que significam as palavras que pronuncia na Elevação? Pergunto por curiosidade, mas também porque quero repeti-las com o senhor.

Os segredos do Rei Supremo não podem revelar-se nem profaná-los. Perguntas-me por que choro, mas eu não queria derramar essas pobres lagrimazinhas, mas torrentes de lágrimas. Não meditas neste grandioso mistério?

Padre, o senhor sofre, durante a Missa, a amargura do fel?
Sim, muito freqüentemente...

Padre, como pode estar-se de pé no Altar?
Como estava Jesus na Cruz.

No altar, o senhor está cravado na Cruz, como Jesus no Calvário?
E ainda me perguntas?

Como se acha o senhor?
Como Jesus no Calvário.

Padre, os carrascos deitaram a Cruz no chão para pregarem os cravos em Jesus?
Evidentemente.

Ao senhor também lhos pregam?
E de que maneira!

Também deitam a Cruz para o senhor?
Sim, mas não devemos ter medo.

Padre, durante a Missa, o senhor pronuncia as Sete Palavras que Jesus disse na Cruz?
Sim, indignamente, mas também as pronuncio.

E a quem diz: "Mulher, eis aí teu filho"?
Digo para Ela: "Eis aqui os filhos de Teu Filho".

O senhor sofre a sede e o abandono de Jesus?
Sim.

Em que momento?
Depois da Consagração.

Até que momento?
Costuma ser até a Comunhão.

O senhor diz que tem vergonha de dizer: "Procurei quem me consolasse e não achei". Por quê?
Porque nossos sofrimentos de verdadeiros culpados, não são nada em comparação com os de Jesus.

Diante de quem sente vergonha?
Diante de Deus e da minha consciência.

Os Anjos do Senhor o reconfortam no Altar em que o senhor se imola?
Pois... não o sinto.

Se não lhe vem o consolo até a alma durante o Santo Sacrifício, e o senhor sofre, como Jesus, o abandono total, nossa presença não serve para nada.
A utilidade é para vós. Por acaso foi inútil a presença da Virgem Dolorosa, de São João e das piedosas mulheres aos pés de Jesus agonizante?

Que é a Sagrada Comunhão?
É toda uma misericórdia interior e exterior, todo um abraço. Pede a Jesus que se deixe sentir sensivelmente.

Quando Jesus vem, visita somente a alma?
O ser inteiro.

Que faz Jesus na Comunhão? 
Deleita-se na sua criatura.

Quando se une a Jesus na Santa Comunhão, que quer peçamos a Deus pelo senhor?
Que eu seja outro Jesus, todo Jesus e sempre Jesus.

O senhor sofre também na Comunhão?
É o ponto culminante.

Depois da Comunhão, continuam seus sofrimentos?
Sim, mas são sofrimentos de amor.

A quem se dirigiu o último olhar de Jesus agonizante?
À sua Mãe.

E o senhor, para quem olha?
Para meus irmãos de exílio.

O senhor morre na Santa Missa?
Misticamente, na Sagrada Comunhão.

É por excesso de amor ou de dor?
Por ambas as coisas, porém mais por amor.

Se o senhor morre na Comunhão, continua a ficar no Altar? Por quê?
Jesus morto permanecia pendente da Cruz no Calvário.

Padre, o senhor disse que a vítima morre na Comunhão. Colocam o senhor nos braços de Nossa Senhora?
Nos de São Francisco.

Padre, Jesus desprega os braços da Cruz para descansar no Senhor?
Sou eu quem descansa nEle!

Quanto ama a Jesus?
Meu desejo é infinito, mas a verdade é que, infelizmente, tenho que dizer nada e me causa pena.

Padre, por que o senhor chora ao pronunciar a última palavra do Evangelho de São João: "E vimos sua glória como do Unigênito Pai, cheio de graça e de verdade"?
Parece-te pouco? Se os Apóstolos, com seus olhos de carne, viram essa glória, como será a que veremos no Filho de Deus, em Jesus, quando se manifestar no céu?

Que união teremos então com Jesus?
A Eucaristia nos dá uma idéia.

A Santíssima Virgem assiste à sua Missa?
Julgas que a Mamãe não se interessa por seu Filho?

E os Anjos?
Em multidões.

Padre, quem está mais perto do Altar?
Todo o Paraíso.

O senhor gostaria de celebrar mais de uma Missa por dia?
Se eu pudesse não queria descer do Altar.

Disseram-me que o senhor traz consigo o seu próprio Altar...
Sim, porque se realizam estas palavras do Apóstolo: "Eu trago no meu corpo os estigmas de Jesus." "Estou cravado com Cristo na Cruz." "Castigo o meu corpo, e o reduzo à escravidão..."

Nesse caso, não me engano quando digo que estou vendo Jesus Crucificado! 
(Nenhuma resposta)
Padre, o senhor se lembra de mim na Santa Missa?
Durante toda a Missa, desde o princípio até o fim, lembro-me de ti.

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A Missa do Padre Pio, em seus primeiros anos, durava mais de duas horas. Sempre foi um êxtase de amor e de dor. Se rosto estava inteiramente concentrado em Deus e cheio de lágrimas. Um dia, ao confessar-me, perguntei-lhe sobre este grande mistério:

Padre, quero fazer-lhe uma pergunta.
Dize-me filho.

Padre, queria perguntar-lhe que é a Missa?
Por quê me perguntas isto?

Para ouvi-la melhor, Padre.
Filho, posso dizer-te que é Minha Missa.

Pois, é isso que quero saber, Padre.
Meu filho, estamos na Cruz e a Missa é uma contínua agonia.


terça-feira, 18 de setembro de 2012

Divina Liturgia na Festa da Exaltação da Santa Cruz

No último dia 14 de setembro o Arquimandrita João Carlos Teodoro celebrou a Divina Liturgia de São João Crisóstomo na Paróquia Greco-Melquita São Jorge em Juiz de Fora (MG) por ocasião da Festa da Exaltação da Santa e Vivificante Cruz.

Seguem algumas fotos, publicadas no blog Luz do Oriente:

Cruz exposta à veneração dos fieis
Procissão com a Santa Cuz no final da Divina Liturgia
Oração diante da Cruz

Bênção com a Cruz em direção aos quatro pontos cardeais
Fieis venerando a cruz

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Divina Liturgia no Sínodo da Igreja Ucraniana

No último dia 09 de setembro, Sua Beatitude Sviatoslav Shevchuk, Arcebispo Maior da Igreja Greco-Católica Ucraniana presidiu a Divina Liturgia de São João Crisóstomo na Catedral de São Volodemer e Santa Olga em Winnipeg (Canadá) por ocasião da abertura do Sínodo da Igreja Greco-Católica Ucraniana. O Sínodo comemora também os 100 anos da chegada do primeiro bispo católico ucraniano no Canadá, o Beato Nykyta Budka. 

Seguem algumas fotos da celebração de abertura do Sínodo (dia 08) e da Divina Liturgia (dia 09):

Entrada de Dom Sviatoslav
Oração ao Espírito Santo
Palavras de Dom Sviatoslav
Procissão de saída
 Divina Liturgia:

Bênção

sábado, 15 de setembro de 2012

Divina Liturgia na pós-festa da Exaltação da Santa Cruz

No dia 15 de setembro de 2011, portanto há exatamente um ano, Dom Volodemer Koubetch, OSBM, Bispo da Eparquia de São João Batista em Curitiba para os Ucranianos celebrou a Divina Liturgia de São João Crisóstomo na pós-festa da Exaltação da Santa e Vivificante Cruz. Esta celebração encerrou uma semana de estudos sobre a Teologia Oriental, promovida pelo Studium Theologicum (Curitiba).

Seguem algumas fotos, que nos mostram a beleza da liturgia bizantina:

Cruz exposta à veneração
Dom Volodemer Koubetch, OSBM
Bispo abençoando em direção aos quatro pontos cardeais
Litania da Paz
Pequena Entrada

Homilia: Memória de Nossa Senhora das Dores

Dos Sermões de São Bernardo, abade
(Sermo in Dom. infra oct. Assumptionis)
Estava sua mãe junto à cruz

O martírio da Virgem é mencionado tanto na profecia de Simeão quanto no relato da paixão do Senhor. Este foi posto, diz o santo ancião sobre o menino, como um sinal de contradição, e a Maria: e uma espada traspassará tua alma (cf. Lc 2,34-35).
Verdadeiramente, ó santa Mãe, uma espada traspassou tua alma. Aliás, somente traspassando-a, penetraria na carne do Filho. De fato, visto que o teu Jesus – de todos certamente, mas especialmente teu – a lança cruel, abrindo-lhe o lado sem poupar um morto, não atingiu a alma dele, mas ela traspassou a tua alma. A alma dele já ali não estava, a tua, porém, não podia ser arrancada dali. Por isto a violência da dor penetrou em tua alma e nós te proclamamos, com justiça, mais do que mártir, porque a compaixão ultrapassou a dor da paixão corporal.
E pior que a espada, traspassando a alma, não foi aquela palavra que atingiu até a divisão entre a alma e o espírito: Mulher, eis aí teu filho? (Jo 19,26). Oh! que troca incrível! João, Mãe, te é entregue em vez de Jesus, o servo em lugar do Senhor, o discípulo pelo Mestre, o filho de Zebedeu pelo Filho de Deus, o puro homem, em vez do Deus verdadeiro. Como ouvir isto deixaria de traspassar tua alma tão afetuosa, se até a sua lembrança nos corta os corações, tão de pedra, tão de ferro?
Não vos admireis, irmãos, que se diga ter Maria sido mártir na alma. Poderia espantar- se quem não se recordasse do que Paulo afirmou que entre os maiores crimes dos gentios estava o de serem sem afeição. Muito longe do coração de Maria tudo isto; esteja também longe de seus servos.
Talvez haja quem pergunte: “Mas não sabia ela de antemão que iria ele morrer?” Sem dúvida alguma. “E não esperava que logo ressuscitaria?” Com toda a confiança. “E mesmo assim sofreu com o Crucificado?” Com toda a veemência. Aliás, tu quem és ou donde tua sabedoria, para te admirares mais de Maria que compadecia, do que do Filho de Maria a padecer? Ele pôde morrer no corpo; não podia ela morrer juntamente no coração? É obra da caridade: ninguém a teve maior! Obra de caridade também isto: depois dela nunca houve igual.

Responsório

R. Após chegar ao lugar que é chamado Calvário, crucificaram Jesus.
* Junto à Cruz de Jesus estava, em pé, sua Mãe.
V. Uma espada de dor, então, transpassou o seu coração.
* Junto à Cruz de Jesus estava, em pé, sua Mãe.


Fonte: Liturgia das Horas, v. IV, p. 1281-1282.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Homilia: Festa da Exaltação da Santa Cruz

Santo André de Creta, Bispo
Oratio X in Exaltatione Sanctae Crucis
A glória e a exaltação de Cristo é a cruz

Celebramos a festa da cruz; por ela as trevas são repelidas e volta a luz. Celebramos a festa da cruz e junto com o Crucificado somos levados para o alto para que, abandonando a terra com o pecado, obtenhamos os céus. A posse da cruz é tão grande e de tão imenso valor que seu possuidor possui um tesouro. Chamo com razão tesouro aquilo que há de mais belo entre todos os bens pelo conteúdo e pela fama. Nele, por ele e para ele reside toda a nossa salvação, e é restituída ao seu estado original.

Se não houvesse a cruz, Cristo não seria crucificado. Se não houvesse a cruz, a vida não seria pregada ao lenho com cravos. Se a vida não tivesse sido cravada, não brotariam do lado as fontes da imortalidade, o sangue e a água, que lavam o mundo. Não teria sido rasgado o documento do pecado, não teríamos sido declarados livres, não teríamos provado da árvore da vida, não se teria aberto o paraíso. Se não houvesse a cruz, a morte não teria sido vencida e não teria sido derrotado o inferno.  

É, portanto, grande e preciosa a cruz. Grande sim, porque por ela grandes bens se tornaram realidade; e tanto maiores quanto, pelos milagres e sofrimentos de Cristo, mais excelentes quinhões serão distribuídos. Preciosa também porque a cruz é paixão e vitória de Deus: paixão, pela morte voluntária nesta mesma paixão; e vitória porque o diabo é ferido e com ele a morte é vencida. Assim, arrebentadas as prisões dos infernos, a cruz também se tornou a comum salvação de todo o mundo.

É chamada ainda de glória de Cristo, e dita a exaltação de Cristo. Vemo-la como o cálice desejável e o termo dos sofrimentos que Cristo suportou por nós. Que a cruz seja a glória de Cristo, escuta-o a dizer: Agora, o Filho do homem é glorificado e nele Deus é glorificado e logo o glorificará (Jo 13,31-32). E de novo: Glorifica-me tu, Pai, com a glória que tinha junto de ti antes que o mundo existisse (Jo 17,5). E repete: Pai, glorifica teu nome. Desceu então do céu uma voz: Glorifiquei-o e tornarei a glorificar (Jo 12,28), indicando aquela glória que então alcançou na cruz.

Que ainda a cruz seja a exaltação de Cristo, escuta o que ele próprio diz: Quando eu for exaltado, atrairei então todos a mim (cf. Jo 12,32). Bem vês que a cruz é a glória e a exaltação de Cristo.

Santo André de Creta, Bispo

Responsório:

Ó Cruz gloriosa! De teus braços pendeu o tesouro precioso e a redenção dos cativos.
R. Por ti foi o mundo remido no sangue de seu Redentor.

Salve, ó Cruz, consagrada pelo corpo de Cristo, por seus membros ornada, quais pedras preciosas.
R. Por ti foi o mundo remido no sangue de seu Redentor.

Oração

Ó Deus, que para salvar a todos dispusestes que o vosso Filho morresse na cruz, a nós, que conhecemos na terra este mistério, dai-nos colher no céu os frutos da redenção. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém.

Fonte: Liturgia das Horas, vol. IV, pp. 1269-1271.