Viagem Apostólica do Papa
Francisco ao Chile e Peru
Hora Média com as Religiosas Contemplativas
Homilia do Santo Padre
Lima - Santuário do Senhor dos Milagres
Domingo, 21 de janeiro de 2018
Queridas
irmãs dos vários mosteiros de vida contemplativa!
Que bom
é encontrarmo-nos aqui, neste Santuário do Senhor dos Milagres, muito visitado
pelos peruanos para Lhe pedir a sua graça e mostrar-nos a sua proximidade e a
sua misericórdia! Ele é «farol que guia, que nos ilumina com o seu amor
divino». Ao ver-vos aqui, assaltou-me um mau pensamento: que tenhais
aproveitado para sair um pouco do convento e dar um pequeno passeio! Obrigado à
Madre Soledad pelas suas palavras de boas-vindas, e a todas vós que, «no
silêncio do claustro, caminhais sempre ao meu lado». E, porque mo pede o
coração, deixai-me enviar daqui uma saudação aos meus quatro Carmelos de Buenos
Aires. Quero colocá-los também a eles diante do Senhor dos Milagres, porque me
acompanharam no meu ministério naquela diocese, e desejo que estejam aqui para
que o Senhor as abençoe. Não sentis ciúmes, pois não? [respondem: Não!]
Ouvimos
as palavras de São Paulo, lembrando-nos que recebemos o espírito filial, que nos
torna filhos de Deus (cf. Rm 8,15-16). Nestas poucas palavras,
se condensa a riqueza de cada vocação cristã: a alegria de nos sabermos filhos.
Esta é a experiência que sustenta a nossa vida; esta quer ser sempre uma
resposta agradecida a tão grande amor divino. Como é importante renovar, dia a
dia, esta alegria! Sobretudo nos momentos em que a alegria parece ter
desaparecido, a alma está enevoada ou há coisas que não se compreendem,
peçamo-la novamente repetindo: «Sou filha, sou filha de Deus».
Um caminho
privilegiado que tendes para renovar esta certeza é a vida de oração, oração
comunitária e pessoal. A oração é o núcleo da vossa vida consagrada, da vossa
vida contemplativa e é o modo de cultivar a experiência de amor que sustenta a
nossa fé. E, como justamente dizia a Madre Soledad, é uma oração sempre
missionária. Não é uma oração que embate no muro do convento e volta para trás,
não! É uma oração que sai e parte…
A
oração missionária é uma oração que consegue unir-se aos irmãos nas mais
variadas circunstâncias em que se encontrem, pedindo que não lhes falte o amor
e a esperança. Assim o dizia Santa Teresinha do Menino Jesus: «Compreendi que
só o amor fazia atuar os membros da Igreja e que, se o amor viesse a
extinguir-se, nem os apóstolos continuariam a anunciar o Evangelho nem os
mártires a derramar o seu sangue; compreendi que o amor encerra em si todas as
vocações, que o amor é tudo e que abrange todos os tempos e lugares, numa
palavra, que o amor é eterno (…): no coração da Igreja, minha Mãe, eu serei o amor» [1].
Que cada uma de vós possa dizer isto! Se alguma se sente um pouco «fraca» e se
apagou nela o fogo do amor, peça-o, peça-o! Poder amar é um presente de Deus.
Ser o
amor! É saber assistir o sofrimento de tantos irmãos, dizendo com o Salmista:
«Na minha angústia, clamei ao Senhor. O Senhor escutou-me e pôs-me a salvo» (Sl 118/117,5).
Assim, a vossa vida na clausura consegue ter um alcance missionário e universal
e «um papel fundamental na vida da Igreja. Rezai e intercedei por tantos irmãos
e irmãs presos, migrantes, refugiados e perseguidos, por tantas famílias
feridas, pelas pessoas sem trabalho, pelos pobres, os doentes, as vítimas das
várias dependências… limitando-me a citar algumas situações que se tornam, de
dia para dia, mais urgentes. Sois como aqueles amigos que trouxeram o
paralítico à presença do Senhor, para que o curasse (cf. Mc 2,1-12).
[Não tinham vergonha; eram “desavergonhados”, mas no bom sentido. Não
tiveram vergonha de abrir um buraco no teto e fazer descer o paralítico. Sede
“desavergonhadas”, não vos envergonheis de fazer, através da oração, com que a
miséria dos homens se aproxime do poder de Deus. Esta é a vossa oração].
Através da oração, dia e noite, aproximais do Senhor a vida de tantos irmãos e
irmãs que, por variadas situações, não O podem alcançar para experimentar a sua
misericórdia sanadora, enquanto Ele os espera para lhes conceder a graça. Com a
vossa oração, podeis curar as chagas de tantos irmãos» [2].
Por isso
mesmo podemos afirmar que a vida de clausura não algema nem restringe o
coração; antes, alarga-o. Ai da religiosa que tem o coração restringido! Por
favor, procurai um remédio. Não se pode ser uma religiosa contemplativa com o
coração restringido. Que volte a respirar, que volte a ser um coração grande!
Além disso, as religiosas com este coração restringido são religiosas que
perderam a fecundidade e não são mães; lamentam-se de tudo, vivem amarguradas,
sempre à procura de qualquer bagatela para se lamentar. A Santa Madre [Teresa
de Jesus] dizia: «Ai da monja que diz: “Fizeram-me uma injustiça sem motivo!”».
No convento, não há lugar para as «colecionadoras de injustiças»; mas apenas
para aquelas que abrem o coração e sabem carregar a cruz, a cruz fecunda, a
cruz do amor, a cruz que dá vida.
O amor
alarga o coração e, por isso, com a ajuda do Senhor, vamos para diante, porque
Ele nos torna capazes de sentir, de forma nova, a dor, o sofrimento, a
frustração, o infortúnio de tantos irmãos que são vítimas desta «cultura do
descarte» do nosso tempo. Que a intercessão pelos necessitados seja a
caraterística da vossa oração. Com os braços levantados para o Alto como
Moisés, com o coração assim inclinado, suplicando… E, quando for possível,
ajudai-os não só com a oração mas também com o serviço concreto. Quantos dos
vossos conventos, sem faltar à clausura, respeitando o silêncio, podem fazer um
bem imenso nalguns momentos de parlatório!
A
oração de súplica que se faz nos vossos mosteiros, sintoniza-vos com o Coração
de Jesus que pede ao Pai que todos sejamos um só; assim o mundo acreditará
(cf. Jo 17,21). Quanto precisamos da unidade na Igreja! Que
todos sejamos um só. Precisamos tanto que os batizados sejam um só, que os
consagrados sejam um só, que os sacerdotes sejam um só, que os bispos sejam um
só! Hoje e sempre. Unidos na fé. Unidos pela esperança. Unidos pela caridade.
Nesta unidade que deriva da comunhão com Cristo, que nos une ao Pai no Espírito
e, na Eucaristia, nos une uns com os outros neste grande mistério que é a
Igreja. Peço-vos, por favor, que rezeis muito pela unidade desta amada Igreja
peruana, que é tentada de desunião. A vós confio a unidade, a unidade da
Igreja, a unidade dos agentes pastorais, dos consagrados, do clero e dos
bispos. O diabo é mentiroso, e também bisbilhoteiro: gosta de levar e trazer,
procura dividir, deseja que, nas comunidades, falem mal umas das outras. Já
disse isto muitas vezes, repetindo-me: Sabeis o que é uma religiosa
bisbilhoteira? É uma «terrorista». Pior que aqueles terroristas de Ayacucho,
alguns anos atrás. Pior, porque o mexerico é como uma bomba: ela vai e «bss...
bss... bss...», como o diabo, atira a bomba, destrói e parte tranquila. Nada de
irmãs «terroristas», sem bisbilhotices. Já sabeis que o melhor remédio para não
bisbilhotar é morder-se a língua. A enfermeira terá um pouco que fazer, porque
a vossa língua se inflamará, mas pelo menos não atirastes a bomba. Por
conseguinte, que não haja bisbilhotices no convento, porque isto é inspirado
pelo diabo. Ele, por natureza, é bisbilhoteiro e mentiroso. E recordai-vos dos
terroristas de Ayacucho, quando vos vier vontade de bisbilhotar.
Empenhai-vos
na vida fraterna, tornando cada mosteiro um farol que possa iluminar no meio da
desunião e da divisão. Ajudai a profetizar que isto é possível. Que todas as
pessoas, ao aproximar-se de vós, possam pregustar a bem-aventurança da caridade
fraterna, tão caraterística da vida consagrada e tão necessária no mundo de
hoje e nas nossas comunidades.
Quando
a vocação é vivida na fidelidade, a vida torna-se anúncio do amor de Deus.
Peço-vos que não cesseis de dar este testemunho. Nesta igreja das Nazarenas
Carmelitas Descalças, deixai-me recordar as palavras da Mestra de vida
espiritual, Santa Teresa de Jesus: «Se perdeis o guia, que é o bom Jesus, não
acertareis com o caminho. (…) Porque o próprio Senhor diz que é caminho; também
diz o Senhor que é luz e que ninguém pode ir ao Pai senão
por Ele» [3].
Permanecei sempre atrás d’Ele. «Sim, padre, mas às vezes Jesus acaba no
Calvário». E então? Vai tu também, porque, também lá, Ele te espera, porque te
ama.
Queridas
irmãs, sabei uma coisa: Não é que vos tolera a Igreja, ela precisa de vós! A
Igreja precisa de vós. Com a vossa vida fiel, sede faróis e mostrai Aquele que
é caminho, verdade e vida, o único Senhor que oferece plenitude à nossa
existência e dá a vida em abundância [4].
Rezai
pela Igreja, rezai pelos pastores, pelos consagrados, pelas famílias, pelos que
sofrem, pelos que praticam o mal e destroem tantas vidas, pelos que exploram
seus irmãos. E por favor, continuando com a lista dos pecadores, não vos
esqueçais de rezar por mim. Obrigado!
[1] «Carta à Irmã Maria do Sagrado Coração» (8/IX/1896): Manuscritos
autobiográficos, Ms. B, [3v.].
[2] Francisco, Const. Ap.
Vultum Dei quaerere, sobre a vida
contemplativa feminina (29/VI/2016), 16.
[3] Livro das Moradas, VI, cap. 7, n. 6.
[4] Cf. Francisco, Const. Ap.
Vultum Dei quaerere, sobre a vida
contemplativa feminina (29/VI/2016), 6.