terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Homilia: Quarta-feira de Cinzas

São João Crisóstomo
Discurso 3 contra os judeus
Jejuamos por nossos pecados, pois vamos aproximar-nos dos sagrados mistérios

Por que jejuamos durante estes quarenta dias? No passado, muitos se aproximavam dos sagrados mistérios temerariamente e sem nenhuma preparação, especialmente nestes dias em que Cristo entregou-se a si próprio. Por esse motivo, os Padres, conscientes do prejuízo que podia se derivar dessa aproximação irresponsável aos mistérios, julgara oportuno prescrever quarenta dias de jejum, de orações, de escuta da Palavra de Deus e de assembleias, para que todos, diligentemente purificados pela oração, a esmola, o jejum, as vigílias, as lágrimas, a confissão e demais obras, possamos aproximar-nos dos sagrados mistérios com a consciência limpa, conforme nossa capacidade receptiva. A experiência nos diz que, com esta decisão unânime, asseguraram, inclusive para os tempos vindouros, algo grandioso e maravilhoso, conseguindo fazer-nos chegar à habitual observância do jejum.
De fato, ainda que durante o ano todo nós não nos cansamos de pregar e proclamar o jejum, ninguém presta atenção às nossas palavras. Por outro lado, apenas anunciando a Quaresma, ainda que ninguém incentive, ainda que ninguém exorte, até o mais negligente se reanima e acolhe as exortações e os estímulos que nos faz este mesmo tempo quaresmal.
Portanto, se alguém te pergunta por que jejuas, não digas que é pela Páscoa, nem sequer que é pela cruz. De fato, não jejuamos nem pela Páscoa nem pela cruz, mas por causa de nossos pecados, pois vamos aproximar-nos dos sagrados mistérios. Ademais, a Páscoa não é motivo de jejum ou de luto, mas de alegria e júbilo.
Finalmente, a cruz tomou sobre si o pecado, foi expiação pelo mundo inteiro e reconciliação de um ódio entranhado, abriu as portas do céu, devolveu a amizade aos que antes eram inimigos, nos fez subir ao céu, colocou a nossa natureza à direita do trono, e nos concedeu outros bens inumeráveis. Por isso não devemos chorar e afligir-nos por todas estas coisas, mas sim rejubilar-nos e alegrar-nos. O próprio São Paulo disse: Deus me livre de gloriar-me a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo. E novamente: A prova de que Deus nos ama é que Cristo morreu por nós quando ainda éramos pecadores.
Neste mesmo sentido se expressa claramente São João: Deus tanto amou o mundo. Como o amou? Recusando-se perder todas as outras coisas, ergueu uma cruz. Depois de ter dito: Deus tanto amou o mundo, acrescentou: que entregou a seu Filho único para que o crucificassem, para que não pereça nenhum dos que creem nele, mas tenham a vida eterna. Portanto, se a cruz é motivo de amor e de glorificação, não digamos que nos afligimos por ela. Nunca, jamais choremos pela cruz, mas por nossos pecados. Por isso é que jejuamos.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 53-54. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Confira também uma homilia de São Basílio Magno para esta celebração clicando aqui.

Mensagem do Papa para a Quaresma 2017

Mensagem do Papa Francisco para a Quaresma de 2017
A Palavra é um dom. O outro é um dom

Amados irmãos e irmãs!
A Quaresma é um novo começo, uma estrada que leva a um destino seguro: a Páscoa de Ressurreição, a vitória de Cristo sobre a morte. E este tempo não cessa de nos dirigir um forte convite à conversão: o cristão é chamado a voltar para Deus «de todo o coração» (Jl 2, 12), não se contentando com uma vida medíocre, mas crescendo na amizade do Senhor. Jesus é o amigo fiel que nunca nos abandona, pois, mesmo quando pecamos, espera pacientemente pelo nosso regresso a Ele e, com esta espera, manifesta a sua vontade de perdão (cf. Homilia na Santa Missa, 8 de janeiro de 2016).
A Quaresma é o momento favorável para intensificarmos a vida espiritual através dos meios santos que a Igreja nos propõe: o jejum, a oração e a esmola. Na base de tudo isto, porém, está a Palavra de Deus, que somos convidados a ouvir e meditar com maior assiduidade neste tempo. Aqui queria deter-me, em particular, na parábola do homem rico e do pobre Lázaro (cf. Lc 16, 19-31). Deixemo-nos inspirar por esta página tão significativa, que nos dá a chave para compreender como temos de agir para alcançarmos a verdadeira felicidade e a vida eterna, incitando-nos a uma sincera conversão.

1. O outro é um dom
A parábola inicia com a apresentação dos dois personagens principais, mas quem aparece descrito de forma mais detalhada é o pobre: encontra-se numa condição desesperada e sem forças para se solevar, jaz à porta do rico na esperança de comer as migalhas que caem da mesa dele, tem o corpo coberto de chagas, que os cães vêm lamber (cf. vv. 20-21). Enfim, o quadro é sombrio, com o homem degradado e humilhado.
A cena revela-se ainda mais dramática, quando se considera que o pobre se chama Lázaro, um nome muito promissor pois significa, literalmente, «Deus ajuda». Não se trata duma pessoa anónima; antes, tem traços muito concretos e aparece como um indivíduo a quem podemos atribuir uma história pessoal. Enquanto Lázaro é como que invisível para o rico, a nossos olhos aparece como um ser conhecido e quase de família, torna-se um rosto; e, como tal, é um dom, uma riqueza inestimável, um ser querido, amado, recordado por Deus, apesar da sua condição concreta ser a duma escória humana (cf. Homilia na Santa Missa, 8 de janeiro de 2016).
Lázaro ensina-nos que o outro é um dom. A justa relação com as pessoas consiste em reconhecer, com gratidão, o seu valor. O próprio pobre à porta do rico não é um empecilho fastidioso, mas um apelo a converter-se e mudar de vida. O primeiro convite que nos faz esta parábola é o de abrir a porta do nosso coração ao outro, porque cada pessoa é um dom, seja ela o nosso vizinho ou o pobre desconhecido. A Quaresma é um tempo propício para abrir a porta a cada necessitado e nele reconhecer o rosto de Cristo. Cada um de nós encontra-o no próprio caminho. Cada vida que se cruza connosco é um dom e merece aceitação, respeito, amor. A Palavra de Deus ajuda-nos a abrir os olhos para acolher a vida e amá-la, sobretudo quando é frágil. Mas, para se poder fazer isto, é necessário tomar a sério também aquilo que o Evangelho nos revela a propósito do homem rico.

2. O pecado cega-nos
A parábola põe em evidência, sem piedade, as contradições em que vive o rico (cf. v. 19). Este personagem, ao contrário do pobre Lázaro, não tem um nome, é qualificado apenas como «rico». A sua opulência manifesta-se nas roupas, de um luxo exagerado, que usa. De facto, a púrpura era muito apreciada, mais do que a prata e o ouro, e por isso se reservava para os deuses (cf. Jr 10, 9) e os reis (cf. Jz 8, 26). O linho fino era um linho especial que ajudava a conferir à posição da pessoa um caráter quase sagrado. Assim, a riqueza deste homem é excessiva, inclusive porque exibida habitualmente: «Fazia todos os dias esplêndidos banquetes» (v. 19). Entrevê-se nele, dramaticamente, a corrupção do pecado, que se realiza em três momentos sucessivos: o amor ao dinheiro, a vaidade e a soberba (cf. Homilia na Santa Missa, 20 de setembro de 2013).
O apóstolo Paulo diz que «a raiz de todos os males é a ganância do dinheiro» (1 Tm 6, 10). Esta é o motivo principal da corrupção e uma fonte de invejas, contendas e suspeitas. O dinheiro pode chegar a dominar-nos até ao ponto de se tornar um ídolo tirânico (cf. Exort. ap. Evangelii gaudium, 55). Em vez de instrumento ao nosso dispor para fazer o bem e exercer a solidariedade com os outros, o dinheiro pode-nos subjugar, a nós e ao mundo inteiro, numa lógica egoísta que não deixa espaço ao amor e dificulta a paz.
Depois, a parábola mostra-nos que a ganância do rico fá-lo vaidoso. A sua personalidade vive de aparências, fazendo ver aos outros aquilo que se pode permitir. Mas a aparência serve de máscara para o seu vazio interior. A sua vida está prisioneira da exterioridade, da dimensão mais superficial e efémera da existência (cf. ibid., 62).
O degrau mais baixo desta deterioração moral é a soberba. O homem veste-se como se fosse um rei, simula a posição dum deus, esquecendo-se que é um simples mortal. Para o homem corrompido pelo amor das riquezas, nada mais existe além do próprio eu e, por isso, as pessoas que o rodeiam não caiem sob a alçada do seu olhar. Assim o fruto do apego ao dinheiro é uma espécie de cegueira: o rico não vê o pobre esfomeado, chagado e prostrado na sua humilhação.
Olhando para esta figura, compreende-se por que motivo o Evangelho é tão claro ao condenar o amor ao dinheiro: «Ninguém pode servir a dois senhores: ou não gostará de um deles e estimará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro» (Mt 6, 24).

3. A Palavra é um dom
O Evangelho do homem rico e do pobre Lázaro ajuda a prepararmo-nos bem para a Páscoa que se aproxima. A liturgia de Quarta-Feira de Cinzas convida-nos a viver uma experiência semelhante à que faz de forma tão dramática o rico. Quando impõe as cinzas sobre a cabeça, o sacerdote repete estas palavras: «Lembra-te, homem, que és pó da terra e à terra hás de voltar». De facto, tanto o rico como o pobre morrem, e a parte principal da parábola desenrola-se no Além. Dum momento para o outro, os dois personagens descobrem que nós «nada trouxemos ao mundo e nada podemos levar dele» (1 Tm 6, 7).
Também o nosso olhar se abre para o Além, onde o rico tece um longo diálogo com Abraão, a quem trata por «pai» (Lc 16, 24.27), dando mostras de fazer parte do povo de Deus. Este detalhe torna ainda mais contraditória a sua vida, porque até agora nada se disse da sua relação com Deus. Com efeito, na sua vida, não havia lugar para Deus, sendo ele mesmo o seu único deus.
Só no meio dos tormentos do Além é que o rico reconhece Lázaro e queria que o pobre aliviasse os seus sofrimentos com um pouco de água. Os gestos solicitados a Lázaro são semelhantes aos que o rico poderia ter feito, mas nunca fez. Abraão, porém, explica-lhe: «Recebeste os teus bens na vida, enquanto Lázaro recebeu somente males. Agora, ele é consolado, enquanto tu és atormentado» (v. 25). No Além, restabelece-se uma certa equidade, e os males da vida são contrabalançados pelo bem.
Mas a parábola continua, apresentando uma mensagem para todos os cristãos. De facto o rico, que ainda tem irmãos vivos, pede a Abraão que mande Lázaro avisá-los; mas Abraão respondeu: «Têm Moisés e os Profetas; que os oiçam» (v. 29). E, à sucessiva objeção do rico, acrescenta: «Se não dão ouvidos a Moisés e aos Profetas, tão-pouco se deixarão convencer, se alguém ressuscitar dentre os mortos» (v. 31).
Deste modo se patenteia o verdadeiro problema do rico: a raiz dos seus males é não dar ouvidos à Palavra de Deus; isto levou-o a deixar de amar a Deus e, consequentemente, a desprezar o próximo. A Palavra de Deus é uma força viva, capaz de suscitar a conversão no coração dos homens e orientar de novo a pessoa para Deus. Fechar o coração ao dom de Deus que fala, tem como consequência fechar o coração ao dom do irmão.
Amados irmãos e irmãs, a Quaresma é o tempo favorável para nos renovarmos, encontrando Cristo vivo na sua Palavra, nos Sacramentos e no próximo. O Senhor – que, nos quarenta dias passados no deserto, venceu as ciladas do Tentador – indica-nos o caminho a seguir. Que o Espírito Santo nos guie na realização dum verdadeiro caminho de conversão, para redescobrirmos o dom da Palavra de Deus, sermos purificados do pecado que nos cega e servirmos Cristo presente nos irmãos necessitados. Encorajo todos os fiéis a expressar esta renovação espiritual, inclusive participando nas Campanhas de Quaresma que muitos organismos eclesiais, em várias partes do mundo, promovem para fazer crescer a cultura do encontro na única família humana. Rezemos uns pelos outros para que, participando na vitória de Cristo, saibamos abrir as nossas portas ao frágil e ao pobre. Então poderemos viver e testemunhar em plenitude a alegria da Páscoa.

Vaticano, 18 de outubro – Festa do Evangelista São Lucas – de 2016.

FRANCISCO



Fonte: Santa Sé

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

A despedida do Aleluia

"Nós temos costume de cantar solenemente o Aleluia em determinado tempo, segundo a antiga tradição da Igreja, e não o cantamos em certos dias sem sacramento. Se é certo que só cantamos o Aleluia em certos dias, não é menos certo que pensamos nele todos os dias” (Santo Agostinho, Comentário ao Salmo 106).


O Aleluia (do hebraico Halleluya, “louvai a Yaweh”) é, desde o início da Igreja, a expressão máxima de louvor a Deus. Portanto, desde o início do século V, como indica o texto de Agostinho que citamos acima, era costume omitir esta aclamação em determinados dias penitenciais, ou seja, durante a Quaresma.

A omissão do Aleluia na Quaresma tem um duplo sentido. Primeiramente, para reforçar o caráter penitencial deste tempo. E, além disso, para enfatizar a novidade do Aleluia pascal, proclamado solenemente antes do Evangelho da Ressurreição, na Vigília Pascal.

No final do século VI, com a introdução das três semanas pré-quaresmais (Tempo da Septuagésima), a omissão do Aleluia passa a iniciar-se no Domingo da Septuagésima. Por intervenção de São Gregório Magno, a liturgia deste domingo se tornou uma grande glorificação do Aleluia, inclusive com o duplo Aleluia na despedida das Vésperas, gesto atualmente reservado às solenidades da Páscoa (com sua oitava) e Pentecostes.

São Gregório Magno
Durante o pontificado de Gregório VII (1070-1085) os Aleluias do Domingo da Septuagésima são suprimidos, e o Aleluia passa a ser omitido a partir da hora nona (15h) do sábado que antecede a Septuagésima.

Surgem neste período algumas curiosas cerimônias de “despedida” do Aleluia no sábado que antecede a Septuagésima. Na diocese de Toul (França), por exemplo, havia o rito da Depositio Alleluiae, literalmente a “sepultura do Aleluia”.

Às 15h reuniam-se os pueri chantores (meninos membros do coro) na sacristia, de onde partiam em procissão através da igreja com incenso, cruz processional, velas e uma caixa vazia, representando o “caixão” do Aleluia. Este era depositado em um local adequado (um altar lateral, por exemplo) e solenemente incensado.

"Caixão" do Aleluia
As orações do domingo da Septuagésima na Liturgia Hispano-Mozárabe, própria da Arquidiocese de Toledo (Espanha), apresentavam o Aleluia como um personagem e desejavam-lhe uma “boa viagem” durante sua ausência na Quaresma. Veja-se, por exemplo, um responsório das Laudes deste domingo:

V. Te vas, Aleluya. Que tengas buen viaje, Aleluya.
R. Y vuelvas contento a visitarnos, Aleluya.
V. Que los ángeles te lleven en sus brazos para que tu pie no tropiece en piedra alguna. R. Y vuelvas contento a visitarnos, Aleluya.
V. Gloria y honor al Padre y al Hijo y al Espíritu Santo, por los siglos de los siglos. Amén.
R. Y vuelvas contento a visitarnos. Aleluya.

V. Você vai, Aleluia. Que tenha uma boa viagem, Aleluia.
R. E voltes feliz a visitar-nos, Aleluia.
V. Que os anjos te levem em seus braços para que teu pé não tropece em alguma pedra.
R. E voltes feliz a visitar-nos, Aleluia.
V. Glória e louvor ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.
R. E voltes feliz a visitar-nos, Aleluia.

A Liturgia Romana não prescreve nada para a despedida do Aleluia, que passa a ser omitido a partir da Quarta-feira de Cinzas, sendo entoado até a terça-feira de Carnaval inclusive. Sugerimos aos fiéis neste dia, no âmbito da piedade popular, realizar um jantar festivo em família ou entre amigos e entoar pela última vez o Aleluia (como refrão de um salmo, por exemplo), antes de entoá-lo mais uma vez na solene Vigília Pascal.

Até lá, ¡que tengas buen viaje, Aleluya!


Referências:

AGOSTINHO. Comentário aos Salmos (Ennarationes in Psalmos) - in: CORDEIRO, José de Leão (Org.). Antologia Litúrgica: Textos Litúrgicos, Patrísticos e Canónicos do Primeiro Milénio. Secretariado Nacional de Liturgia: Fatima, 2003, p. 771.

RIGHETTI, Mario. Historia de la Liturgia. Biblioteca de Autores Cristianos: Madrid, 1945, v. I, pp. 733-735.

Instituição de Leitores e Acólitos em Cracóvia

No último dia 25 de fevereiro o Arcebispo de Cracóvia, Dom Marek Jędraszewski, celebrou a Santa Missa no Santuário de São João Paulo II, durante a qual instituiu nos ministérios de Leitores e Acólitos alguns dos seminaristas maiores da Arquidiocese.

Procissão de entrada

Incensação do altar
Liturgia da Palavra
Evangelho

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Homilia: VIII Domingo do Tempo Comum - Ano A

São Cirilo de Alexandria
Sermão 62 sobre o Evangelho de São Lucas
Sobretudo buscai o Reino de Deus e a sua justiça

Ao ouvir estas palavras, que conclusões os discípulos tomarão e que decisões práticas adotarão? Certamente estas: abandonarão nas mãos de Deus a preocupação pelo alimento, e lembrar o que disse aquele santo varão: entrega a Deus teu cuidado, que Ele te sustentará. Sim, Ele dá abundantemente aos santos o necessário para a vida e certamente não mente ao dizer: Não estejais preocupados pela vida pensando o que vais comer, nem pelo corpo pensando com o que vais vestir... vosso Pai já sabe que tendes necessidade de tudo isto. Sobretudo buscai o Reino de Deus e sua justiça; e tudo o mais vos será dado por acréscimo.
Era extremamente útil e inclusive necessário que aqueles que são investidos da dignidade apostólica tivessem uma alma livre da ambição de riquezas e nada desprezassem tanto como a acumulação de ofertas, contentando-se mais com o que Deus lhe proporciona, pois, como está escrito: a cobiça é a raiz de todos os males. Convinha, portanto, que a todo custo se mantivessem à margem e plenamente libertados daquele vício que é a raiz e mãe de todos os males, esgotando, por assim dizer, todo o seu empenho em ocupações realmente necessárias: em não cair sob o jugo de Satanás. Desta forma, caminhando à margem das preocupações mundanas, subestimarão os apetites carnais e desejarão unicamente o que Deus quer.
E assim como os mais valentes soldados, saindo ao combate, não levam consigo mais que as armas necessárias para a guerra, assim também aqueles a quem Cristo enviava em ajuda da terra e a assumir a luta, a favor dos que estavam em perigo, contra os poderes que dominam este mundo de trevas; ainda mais, a lutar contra o próprio Satanás em pessoa, convinha que estivessem libertados das fadigas deste mundo e de toda preocupação mundana de maneira que, bem cingidos, e com as armas espirituais nas mãos, pudessem lutar intrepidamente contra os que obstruem a glória de Cristo e semearam de ruínas a terra inteira; é um fato que induziram aos seus habitantes a adorar a criatura em vez do Criador e a oferecer culto aos elementos do mundo.
Tenham embraçado o escudo da fé, estejais revestidos da couraça da justiça e da espada do Espírito Santo, isto é, toda a Palavra de Deus. Com estes instrumentos, era inevitável que fossem intoleráveis para seus inimigos, sem levar entre seus apetrechos nada merecedor de mancha ou de culpa, ou seja, o afã de possuir, ajuntar lucros ilícitos e andar preocupados em guardá-los, todas estas coisas que afastam a alma humana de uma vida grata a Deus nem a permitem elevar-se a Ele, mas antes lhe cortam as asas e a afundam em aspirações materiais e terrenas.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 144-145. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

XII Catequese do Papa sobre a esperança

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017
A esperança (12): Rm 8,19-27

Bom dia, estimados irmãos e irmãs!
Muitas vezes somos tentados a pensar que a criação é uma nossa propriedade, uma posse a ser desfrutada a nosso bel-prazer e da qual não devemos prestar contas a ninguém. No trecho da Carta aos Romanos (8,19-27) da qual há pouco ouvimos uma parte, o Apóstolo Paulo recorda-nos ao contrário que a criação é um dom maravilhoso que Deus colocou nas nossas mãos, para podermos entrar em relação com Ele e nela reconhecer o vestígio do seu desígnio de amor, para cuja realização todos nós somos chamados a colaborar, dia após dia.
No entanto, quando se deixa levar pelo egoísmo, o ser humano acaba por estragar até as coisas mais bonitas que lhe foram confiadas. E assim aconteceu inclusive no caso da criação. Pensemos na água. A água é um bem belíssimo e deveras importante; a água dá-nos vida, ajudando-nos em tudo, mas para explorar os minerais contamina-se a água, deturpa-se e destrói-se a criação. Este é apenas um exemplo. Há muitos outros. Com a trágica experiência do pecado, rompendo a comunhão com Deus, transgredimos a comunhão originária com tudo aquilo que nos circunda e acabamos por corromper a criação, tornando-a deste modo escrava, submetida à nossa caducidade. E infelizmente a consequência de tudo isto salta de maneira dramática aos nossos olhos, todos os dias. Quando rompe a comunhão com Deus, o homem perde a sua beleza originária e acaba por desfigurar tudo ao seu redor; e onde antes tudo remetia ao Pai Criador e ao seu amor infinito, agora tem o sinal triste e desolado do orgulho e da voracidade do homem. Explorando a criação, o orgulho humano destrói.
Contudo, o Senhor não nos deixa sozinhos e até nesta situação desoladora nos oferece uma nova perspectiva de libertação, de salvação universal. É aquilo que Paulo põe em evidência com alegria, convidando-nos a dar ouvidos aos gemidos de toda a criação. Com efeito, se prestarmos atenção, ao nosso redor tudo geme: a própria criação geme, nós seres humanos gememos, e até o Espírito geme dentro de nós, no nosso coração. Pois bem, estes gemidos não são uma lamentação estéril, desconsolada, mas - como esclarece o Apóstolo - são os gemidos de uma mulher em trabalho de parto; trata-se dos gemidos de quem sofre, mas sabe que está prestes a nascer uma nova vida. E no nosso caso é realmente assim. Nós ainda estamos a braços com as consequências do nosso pecado e, ao nosso redor, tudo ainda tem o sinal dos nossos esforços, das nossas faltas, dos nossos fechamentos. Mas ao mesmo tempo, sabemos que fomos salvos pelo Senhor e já nos é dado contemplar e prelibar, em nós e no que nos circunda, os sinais da Ressurreição, da Páscoa que atua uma nova criação.
Este é o conteúdo da nossa esperança. O cristão não vive fora do mundo, sabe reconhecer na sua vida e naquilo que o circunda os sinais do mal, do egoísmo e do pecado. É solidário com quantos sofrem, com quem chora, com os marginalizados, com aqueles que se sentem desesperados... Mas ao mesmo tempo, o cristão aprendeu a ler tudo isto com os olhos da Páscoa, com os olhos de Cristo Ressuscitado. E então, sabe que vivemos o tempo da espera, o tempo de um anseio que vai além do presente, o tempo do cumprimento. Na esperança, nós sabemos que o Senhor quer purificar definitivamente com a sua misericórdia os corações feridos e humilhados, bem como tudo o que o homem deturpou na sua impiedade, e que deste modo Ele regenera um mundo novo e uma humanidade nova, finalmente reconciliados no seu amor.
Quantas vezes nós, cristãos, somos tentados pela desilusão, pelo pessimismo... Às vezes abandonamo-nos à lamentação inútil, ou então permanecemos sem palavras e nem sequer sabemos o que pedir, o que esperar... Mas vem de novo em nossa ajuda o Espírito Santo, suspiro da nossa esperança, que mantém vivos o gemido e a expetativa do nosso coração. O Espírito vê por nós além das aparências negativas do presente, revelando-nos desde já os novos céus, a nova terra que o Senhor continua a preparar para a humanidade.


Fonte: Santa Sé

Domingo do Juízo Final em Moscou

No último dia 19 de fevereiro o Patriarca Kirill da Igreja Ortodoxa Russa celebrou na Catedral Patriarcal do Cristo Salvador em Moscou a Divina Liturgia do Domingo do Juízo Final, o terceiro da chamada Pré-Quaresma.

Entrada do Patriarca

O Bispo abençoa os fieis

Evangelho

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Fotos da Missa do Papa no VII Domingo do Tempo Comum

No último dia 19 de fevereiro o Papa Francisco celebrou a Santa Missa do VII Domingo do Tempo Comum na Paróquia Santa Maria Josefa do Coração de Jesus, no bairro de Castelverde, em Roma.

O Santo Padre foi assistido pelo Monsenhor Guido Marini.

Incensação do altar
Evangelho
Homilia


Homilia do Papa: VII Domingo do Tempo Comum - Ano A

Visita à Paróquia Romana de Santa Maria Josefa do Coração de Jesus a Castelverde
Homilia do Papa Francisco
Domingo, 19 de fevereiro de 2017

Hoje, nas leituras, há uma mensagem que definiria única. Na primeira há a Palavra do Senhor que diz: «Sede santos, porque eu, o Senhor vosso Deus, sou santo» (Lv 19,2). Deus Pai diz-nos isto. E o Evangelho termina com aquela Palavra de Jesus: «Sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai que está nos céus» (Mt 5,48). A mesma coisa. Este é o programa de vida. Sede santos, porque Ele é santo; sede perfeitos, porque Ele é perfeito. E vós podeis perguntar-me: “Mas, Padre, como é o caminho rumo à santidade, qual é o percurso para nos tornarmos santos?”. Jesus explica bem isto no Evangelho: explica-o com coisas concretas.

Antes de tudo: «Foi dito: “olho por olho, dente por dente”. Mas eu digo-vos para não vos opordes ao malvado» (Mt 5,38-39), ou seja, nenhuma vingança. Se no coração tenho rancor por alguma coisa que alguém me fez e me quero vingar, isto afasta-me do caminho rumo à santidade. Nenhuma vingança. “Fizeste isto, vais pagar!”. Um comportamento assim é cristão? Não. “Vais pagar” não faz parte da linguagem de um cristão. Nenhuma vingança. Nenhum rancor. “Mas aquele torna a minha vida impossível!”. “Aquela vizinha fala mal de mim todos os dias! Também eu falarei mal dela...”. Não. O que diz o Senhor? “Reza por ela” - “Mas devo rezar por ela?” - “Sim, reza por ela”. É o caminho do perdão, do esquecimento das ofensas. Dão-te uma bofetada na face direita? Apresenta-lhe a outra. O mal vence-se com o bem, o pecado é vencido com esta generosidade, com esta força. O rancor é mau. Todos sabemos que não é uma coisa pequena. As grandes guerras - vemos nos telejornais, nos jornais, este massacre de pessoas, de crianças... quanto ódio, mas é o mesmo ódio - é o mesmo! - que tu tens no teu coração por alguém, por este ou por aquele teu parente ou pela tua sogra ou por outra pessoa, o mesmo. Ele é aumentado, mas é o mesmo. O rancor, a vontade de me vingar: “Vais pagar!”, isto não é cristão.

“Sede santos como Deus é santo”; sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai”, «o qual faz que o sol se levante sobre maus e bons, e a chuva desça sobre justos e injustos» (Mt 5,45). É bom. Deus concede os seus bens a todos. “Mas se alguém fala mal de mim, se me fez uma grande ofensa, se aquele me...”. Perdoar. No meu coração. Eis o caminho da santidade; e isto afasta as guerras. Se todos os homens e mulheres do mundo aprendessem isto, não haveria guerras, elas não existiriam. A guerra começa assim, na amargura, no rancor, na vontade de vingança. Mas isto destrói famílias, destrói amizades, destrói bairros, destrói tanto, tanto... “E, Padre, que devo fazer quando sinto isto?”. É Jesus quem o diz e não eu: «Amai os vossos inimigos» (Mt 5,44). “Eu tenho que amar aquele?” - Sim - “Não posso” - Reza para que possas. «Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem» (ibid.). “Rezar por aquele que é malvado comigo?” - Sim, para que mude de vida, para que o Senhor o perdoe. Esta é a magnanimidade de Deus, o Deus magnânimo, o Deus de coração grande, que tudo perdoa, que é misericordioso. “É verdade, Padre, Deus é misericordioso”. E tu? És misericordioso, és misericordiosa, com as pessoas que foram malvadas contigo? Ou que não gostam de ti? Se Ele é misericordioso, se Ele é santo, se Ele é perfeito, nós devemos ser misericordiosos, santos e perfeitos como Ele.

Esta é a santidade. Um homem e uma mulher que fazem isto, merecem ser canonizados: tornam-se santos. É tão simples a vida cristã. Eu sugiro-vos que comeceis com pouco. Todos temos inimigos; todos sabemos que aquele ou aquela fala mal de mim, todos o sabemos. E todos sabemos que este ou aquele me odeia. Todos sabemos. E comecemos do pouco. “Eu sei que este me caluniou, disse coisas más de mim”. Sugiro-vos: refleti um minuto, dirigi-vos a Deus Pai: “Aquele ou aquela é teu filho, tua filha: muda o seu coração. Abençoa-o, abençoa-a”. A isto se chama rezar por aqueles que não nos amam, pelos inimigos. Pode ser feito com simplicidade. Talvez permaneça o rancor; talvez o rancor permaneça em nós, mas nós estamos a fazer o esforço para seguir o caminho deste Deus que é tão bom, misericordioso, santo e perfeito, que faz surgir o sol sobre maus e bons: é para todos, é bom com todos. Devemos ser bons com todos. E rezar por aqueles que não são bons, por todos.

Rezamos por quantos matam as crianças na guerra? É difícil, é muito distante, mas temos que aprender a fazê-lo. Para que se convertam. Rezamos por aquelas pessoas que estão mais próximas de nós e que nos odeiam ou nos fazem mal? “Eh, Padre, é difícil! Gostaria de lhes apertar o pescoço!” - Reza. Reza para que o Senhor mude a sua vida. A oração é um antídoto contra o ódio, contra as guerras, estas guerras que começam em casa, que começam no bairro, que começam nas famílias... Pensai apenas nas guerras familiares devido à herança: quantas famílias se destroem, se odeiam devido à herança. Rezai para que haja paz. E se sei que alguém me deseja mal, que não gosta de mim, devo rezar por essa pessoa de maneira especial. A oração é poderosa, a oração vence o mal, a oração traz a paz.

O Evangelho, a Palavra de Deus hoje é simples. Dou-vos este conselho: «Sede santos, porque eu, o Senhor vosso Deus, sou santo». E depois: «Sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai que está nos céus». E para isto, pedi a graça de não guardar rancor, a graça de rezar pelos inimigos, pelas pessoas que não gostam de nós, a graça da paz.

Peço-vos, por favor, que façais esta experiência: todos os dias uma oração: “Ah, este não gosta de mim, mas, Senhor, peço-te...”. Um por dia. Assim se vence, deste modo iremos por este caminho da santidade e da perfeição. Assim seja.


Fonte: Santa Sé.

Ângelus do Papa: VII Domingo do Tempo Comum - Ano A

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 19 de fevereiro de 2017

Amados irmãos e irmãs, bom dia!
No evangelho deste Domingo (Mt 5,38-48) - uma daquelas páginas que melhor exprimem a «revolução cristã» - Jesus mostra o caminho da verdadeira justiça mediante a lei do amor que supera a do talião, ou seja, «olho por olho, dente por dente». Esta antiga regra impunha que se infligisse aos transgressores penas equivalentes aos danos causados: a morte a quem tinha matado, a amputação a quem tinha ferido alguém, e assim por diante. Jesus não pede aos seus discípulos que suportem o mal, aliás, pede que reajam, e não com outro mal, mas com o bem. Só assim se interrompe a corrente do mal: um mal leva a outro mal, outro mal leva a mais outro... Interrompe-se esta corrente de mal, e as coisas mudam deveras. Com efeito o mal é um “vazio”, um vazio de bem, e um vazio não se pode encher com outro vazio, mas só com um “cheio”, ou seja, com o bem. A represália nunca leva à resolução dos conflitos. “Tu tramaste contra mim, vais pagar”: isto nunca resolve um conflito, nem sequer é cristão.

Para Jesus, a rejeição da violência pode exigir também a renúncia a um direito legítimo; e dá alguns exemplos: apresentar a outra face, ceder a própria veste ou o próprio dinheiro, aceitar outros sacrifícios (vv. 39-42). Mas esta renúncia não significa dizer que as exigências da justiça são ignoradas ou contraditas; não, ao contrário, o amor cristão, que se manifesta de modo especial na misericórdia, representa uma realização superior da justiça. Aquilo que Jesus nos quer ensinar é a clara distinção que devemos fazer entre a justiça e a vingança. Distinguir entre justiça e vingança. A vingança nunca é justa. É-nos consentido pedir justiça; é nosso dever praticar a justiça. Ao contrário, nos é proibido vingar-nos ou fomentar de qualquer forma a vingança, enquanto expressão do ódio e da violência.

Jesus não pretende propor um novo ordenamento civil, mas antes o mandamento do amor ao próximo, que inclui também o amor aos inimigos: «Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem» (v. 44). E isto não é fácil. Esta palavra não deve ser interpretada como aprovação do mal praticado pelo inimigo, mas como convite a uma perspectiva superior, a uma perspectiva magnânima, semelhante à do Pai celeste, o qual - diz Jesus - «faz que o seu sol se levante sobre maus e bons, e a chuva desça sobre justos e injustos» (v. 45). Com efeito, também o inimigo é uma pessoa humana, criada como tal à imagem de Deus, mesmo se atualmente esta imagem é ofuscada por uma conduta indigna.

Quando falamos de “inimigos” não devemos pensar em sabe-se lá quais pessoas diversas e distantes de nós; falamos também de nós mesmos, que podemos entrar em conflito com o nosso próximo, por vezes com os nossos familiares. Quantas inimizades nas famílias, quantas! Pensemos nisto. Inimigos são também aqueles que falam mal de nós, que nos caluniam e são injustos conosco. E não é fácil digerir isto. A todas estas pessoas estamos chamados a responder com o bem, que também ele tem as suas estratégias, inspiradas pelo amor.

A Virgem Maria nos ajude a seguir Jesus por este caminho exigente, que exalta deveras a dignidade humana e nos faz viver como filhos do nosso Pai que está nos céus. Nos ajude a praticar a paciência, o diálogo, o perdão, e a sermos artífices de comunhão e artífices de fraternidade na nossa vida diária, sobretudo na nossa família.


Fonte: Santa Sé.

Cardeal Nichols consagra a Inglaterra ao Coração de Maria

No último dia 18 de fevereiro o Cardeal Vicent Gerard Nichols, Arcebispo de Westminster, celebrou a Santa Missa na Catedral do Preciosíssimo Sangue em Londres, durante a qual consagrou a Inglaterra e o País de Gales ao Imaculado Coração de Maria.

A Missa foi precedida de uma procissão com a imagem de Nossa Senhora de Fátima e as relíquias dos Beatos Jacinta e Francisco. No início da celebração a imagem foi solenemente coroada pelo Cardeal Nichols.

Procissão (crianças portam as relíquias e a coroa)

Coroação da imagem no início da Missa


sábado, 18 de fevereiro de 2017

Homilia: VII Domingo do Tempo Comum - Ano A

 São João Crisóstomo
Sermão 18 sobre o Evangelho de São Mateus
Subir os degraus até atingir o cume da virtude

Ouvistes o que foi dito: amarás a teu próximo e odiarás o teu inimigo. Porém, eu vos digo: amai aos vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem, para que sejais filhos de vosso Pai que está nos céus, que faz se levantar o sol sobre bons e maus e faz chover sobre os justos e injustos.
Observa como colocou a conclusão de todos os bens. Por isso ensinou a ter paciência com aqueles que nos esbofeteiam e até mesmo a apresentar-lhes a outra face; e não apenas juntar o manto à túnica, mas a caminhar por duas milhas mais com quem nos requisitou para uma, para que em seguida aceitasse com maior facilidade o que era superior a estes preceitos; ou seja, que quem cumprir tudo isso não tenha inimigos. Pois bem: existe algo ainda mais perfeito, porque Ele não diz “não odeies”, mas “ama”. Não disse “não prejudiques”, mas sim “favoreça”. Se alguém examina cuidadosamente, encontrará um acréscimo muito maior que este. Porque agora não só manda amá-los, mas a também rogar por eles.
Observas a que degraus subiu e como nos elevou até o próprio cume da virtude? Quero que o medites, enumerando-os desde o princípio: o primeiro degrau é não injuriar; o segundo, quando injuriados, não nos vingarmos; o terceiro, não aplicar sobre o autor o mesmo castigo com o qual nos fere, mas sim ter mansidão; o quarto, oferecer-se voluntariamente a sofrer injúrias; o quinto, oferecer ao injuriador muito mais do que ele nos exige; o sexto, não odiar a quem nos faz semelhante injustiça; o sétimo, inclusive amá-lo; o oitavo, ainda favorecê-lo. Finalmente, o nono: rogar a Deus por ele.
Vês o auge da virtude? Por isto seu reino é magnífico! O preceito era difícil e necessitava um espírito generoso e muito aplicado, pelo qual assinalou um prêmio tão grande como não o tinha feito antes com os preceitos anteriores. Aqui Ele não traz à memória a terra, como ao tratar dos mansos, nem a consolação e a misericórdia, como ao tratar dos que choram e se compadecem, nem o Reino dos Céus, mas diz - o que é um supremo grau admirável - que serão semelhantes a Deus. Porque diz: para que sejais semelhantes ao vosso Pai que está nos céus.
Deves observar como nem aqui nem no anterior chama “seu” ao Pai. Quando tratou dos juramentos falou de Deus e do grande reino; porém aqui fala do Pai dos ouvintes. Pois bem: Ele o faz atendendo a oportunidade dos tempos e aguardando para ela tais formas de falar. Logo avança, declara e explica a semelhança que tinha apenas deixado indicada, dizendo: o qual faz nascer o sol sobre bons e maus e chover sobre justos e pecadores. De maneira que não odeia, mas até faz benefícios àqueles que o injuriam. Ainda que, para dizer a verdade, não existe nisso igualdade alguma, não só a respeito da grandeza dos benefícios, mas também na altíssima dignidade.
Tu és desprezado por um conservo; Ele por um servo a quem cumulou de infinitos benefícios. Tu, quando oras pelo conservo oferece palavras; mas ele concede coisas muito maiores e admiráveis; é evidente, a luz do sol e as chuvas anuais. Mas mesmo assim, parece dizer: concedo-te que sejas igual a Deus, tanto quanto o homem pode sê-lo.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 141-142. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Confira também uma homilia de São Cipriano de Cartago para este domingo clicando aqui.

XI Catequese do Papa sobre a esperança

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017
A esperança (11): Rm 5,1-5

Bom dia, prezados irmãos e irmãs!
Desde a infância nos ensinam que não é bom orgulhar-se. Na minha terra, aqueles que se vangloriam são chamados «pavões». E é correto, porque orgulhar-nos daquilo que somos ou do que possuímos, além de uma certa soberba, revela também uma falta de respeito pelos outros, especialmente por quantos são mais desafortunados do que nós. Mas neste trecho da Carta aos Romanos, o Apóstolo Paulo surpreende-nos porque por duas vezes nos exorta a orgulhar-nos. Então, do que é correto orgulhar-se? Pois se ele exorta a orgulhar-se, é correto orgulhar-se de algo. E como é possível fazer isto, sem ofender o próximo, sem excluir ninguém?
No primeiro caso, somos convidados a orgulhar-nos da abundância da graça que nos permeia em Jesus Cristo, por meio da fé. Paulo deseja levar-nos a compreender que, se aprendermos a ver tudo na luz do Espírito Santo, compreenderemos que tudo é graça! Tudo é dom! Com efeito, se prestarmos atenção, quem age - tanto na história como na nossa vida - não somos nós, mas antes de tudo Deus. Ele é o protagonista absoluto, que cria tudo como dádiva de amor, que tece a trama do seu desígnio de salvação e que o leva a cumprimento por nós, mediante o seu Filho Jesus. A nós pede-se que reconheçamos tudo isto, que o recebamos com gratidão e que o levemos a tornar-se motivo de louvor, de bênção e de grande alegria. Se fizermos isto, estaremos em paz com Deus e faremos experiência da liberdade. E depois esta paz propaga-se a todos os âmbitos e a todos os relacionamentos da nossa vida: estamos em paz connosco mesmos, estamos em paz em família, na nossa comunidade, no trabalho e com as pessoas que encontramos todos os dias ao longo do nosso caminho.
Mas Paulo exorta a orgulhar-se também nas tribulações. Isto não é fácil de entender. Para nós isso é mais difícil e pode parecer que nada tem a ver com a condição de paz há pouco descrita. Ao contrário, constitui o seu pressuposto mais autêntico e mais verdadeiro. Com efeito, a paz que o Senhor nos oferece e nos garante não deve ser entendida como ausência de preocupações, de desilusões, de faltas, de motivos de sofrimento. Se fosse assim, caso conseguíssemos estar em paz, esse momento acabaria depressa e inevitavelmente cairíamos no desânimo. Ao contrário, a paz que brota da fé é um dom: é a graça de experimentar que Deus nos ama e que está sempre ao nosso lado, não nos deixa sós nem sequer um instante da nossa vida. E isto, como afirma o Apóstolo, gera paciência porque sabemos que, até nos momentos mais difíceis e desconcertantes, a misericórdia e a bondade do Senhor são maiores do que tudo e nada nos tirará das suas mãos e da comunhão com Ele.
Eis, então, por que a esperança cristã é sólida, eis por que não desilude. Nunca desilude. A esperança não desengana! Não está fundada no que nós podemos fazer ou ser, e nem sequer naquilo em que podemos acreditar. O seu fundamento, ou seja, o fundamento da esperança cristã, é o que de mais fiel e seguro pode existir, isto é, o amor que o próprio Deus alimenta por cada um de nós. É fácil dizer: Deus ama-nos. Todos o dizemos. Mas pensai um pouco: cada um de nós é capaz de dizer: estou convicto de que Deus me ama? Não é tão fácil dizê-lo. Mas é verdade. É um bom exercício, dizer a si mesmo: Deus ama-me. Esta é a raiz da nossa segurança, a raiz da esperança. E o Senhor infundiu abundantemente nos nossos corações o Espírito - que é o amor de Deus - como artífice, como garante, exatamente para que possa nutrir a fé dentro de nós e manter viva esta esperança. E esta segurança: Deus ama-me. «Mas neste momento difícil» - Deus ama-me. «E eu, que cometi esta ação feia e má?» - Deus ama-me. Ninguém nos priva desta segurança. E devemos repeti-lo como prece: Deus ama-me. Estou convicto de que Deus me ama. Estou convencida de que Deus me ama.
Agora compreendemos por que razão o Apóstolo nos exorta a orgulhar-nos sempre de tudo isto. Orgulho-me do amor de Deus, porque Ele me ama. A esperança que nos é oferecida não nos separa dos outros, e muito menos nos leva a desacreditá-los ou a marginalizá-los. Ao contrário, trata-se de uma dádiva extraordinária da qual somos chamados a tornar-nos «canais» para todos, com humildade e simplicidade. E então o nosso maior orgulho consistirá em ter como Pai um Deus que não tem preferências, que não exclui ninguém, mas que abre a sua casa a todos os seres humanos, a começar pelos últimos e pelos distantes a fim de que, como seus filhos, aprendamos a consolar-nos e a ajudar-nos uns aos outros. E não vos esqueçais: a esperança não desilude!


Fonte: Santa Sé

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Ordenação Diaconal no Rito Bizantino em Curitiba

No último dia 12 de fevereiro, Domingo do Filho Pródigo no Rito Bizantino, o Bispo da Metropolia São João Batista para os Católicos Ucranianos em Curitiba, Dom Volodemer Koubetch, O.S.B.M., celebrou a Divina Liturgia de São João Crisóstomo na Catedral Metropolitana para a Ordenação Diaconal do Seminarista Juliano Rumoviski.

Ritos iniciais
Homilia
O candidato lava as mãos do Bispo antes da Grande Entrada
Início do Rito de Ordenação
O candidato beija os quatro cantos do altar

Ângelus do Papa: VI Domingo do Tempo Comum - Ano A

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 12 de fevereiro de 2017

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
A Liturgia de hoje apresenta-nos outra página do Sermão da Montanha, que encontramos no Evangelho de Mateus (Mt 5,17-37). Neste trecho, Jesus quer ajudar os seus ouvintes a fazer uma releitura da lei mosaica. O que foi dito na antiga aliança era verdadeiro, mas não era tudo: Jesus veio para dar cumprimento e para promulgar de forma definitiva a lei de Deus, até ao último jota (v. 18). Ele manifesta as suas finalidades originárias e cumpre os seus aspectos autênticos, e faz tudo isto mediante a sua pregação e mais ainda com o dom de si mesmo na cruz. Assim Jesus ensina como fazer plenamente a vontade de Deus e usa esta palavra: com uma “justiça superior” em relação à dos escribas e dos fariseus (v. 20). Uma justiça animada pelo amor, pela caridade, pela misericórdia, e portanto capaz de realizar a substância dos mandamentos, evitando o risco do formalismo. O formalismo: isto posso, isto não posso; até aqui posso, até aqui não posso... Não: mais, mais.

Em particular, no Evangelho de hoje Jesus examina três aspetos, três mandamentos: o homicídio, o adultério e o juramento.

Relativamente ao mandamento “não matar”, Ele afirma que foi violado não só pelo homicídio efetivo, mas também por aqueles comportamentos que ofendem a dignidade da pessoa humana, inclusive as palavras injuriosas (v. 22). Certamente, estas palavras injuriosas não têm a mesma gravidade e culpabilidade do assassínio, mas estão na mesma linha, porque são premissas destes e revelam a mesma malevolência. Jesus convida-nos a não estabelecer uma classificação das ofensas, mas a considerá-las todas prejudiciais, pois são movidas pelo intento de fazer mal ao próximo. E Jesus dá o exemplo. Insultar: estamos acostumados a insultar, é como dizer “bom dia”. E isto está na mesma linha do homicídio. Quem insulta o irmão, mata no próprio coração o irmão. Por favor, não insulteis! Não ganhamos nada...

Outro cumprimento é relativo à lei matrimonial. O adultério era considerado uma violação do direito de propriedade do homem sobre a mulher. Ao contrário, Jesus vai à raiz do mal. Assim como se chega ao homicídio por meio de injúrias, ofensas e insultos, também se chega ao adultério mediante as intenções de posse em relação a uma mulher que não é a própria esposa. O adultério, como o furto, a corrupção e todos os outros pecados, são concebidos primeiro no nosso íntimo e, depois de o coração ter feito a escolha errada, ganham forma no comportamento concreto. E Jesus diz: quem olha para uma mulher que não é a própria com sentimentos de posse é um adúltero no seu coração, começou o caminho rumo ao adultério. Pensemos um pouco sobre isto: sobre os maus pensamentos que vêm nesta linha.

Depois, Jesus diz aos seus discípulos para não jurar, pois o juramento é sinal da insegurança e da duplicidade mediante a qual se desenrolam as relações humanas. Instrumentaliza-se a autoridade de Deus para dar garantia às nossas vicissitudes humanas. Pelo contrário, fomos chamados para instaurar entre nós, nas nossas famílias e nas nossas comunidades um clima de clareza e de confiança recíproca, para que possamos ser considerados sinceros sem recorrer a intervenções superiores a fim de sermos credíveis. A desconfiança e a suspeita recíproca sempre ameaçam a serenidade!

Que a Virgem Maria, mulher da dócil escuta e da obediência jubilosa, nos ajude a aproximar-nos cada vez mais do Evangelho, para sermos cristãos não “de fachada”, mas de substância! E isto é possível com a graça do Espírito Santo, que nos permite fazer tudo com amor, e assim realizar plenamente a vontade de Deus.


Fonte: Santa Sé.