terça-feira, 31 de julho de 2018

Faça-se a luz: A importância das imagens na evangelização

Interessante texto sobre a importância da imagem na evangelização publicado hoje no site Vatican News, fazendo referência inclusive à Liturgia. O texto, porém, possui algumas imprecisões históricas, indicadas nas notas ao final. Segue o artigo na íntegra:

Vivemos em um tempo da busca de uma boa imagem. Fotografias que consigam traduzir emoções, escolhas, perfis, etc. Para refletirmos sobre a importância da imagem, o Vatican News contou com um artigo do Gestor de Design Fernando Nunes (Londrina):

Fotografia, dentre tantos significados etimológicos, um em especial nos chama a atenção: “escrita da luz”. Sabemos que muitos termos utilizados na tecnologia são próximos ou até idênticos aos teológicos, e na fotografia, existe uma vasta riqueza destes termos, aos quais precisamos nos aprofundar, para que toda a sacralidade que captamos com os olhos possa se tornar arte e evangelização.
Há em nossas paróquias muitos fotógrafos que precisam ser verdadeiros “escritores da luz”. Não se escreve um bom texto sem antes conhecer a matéria de estudo, e não se escreve sobre alguém, sem conhecê-lo, e por último não se escreve bem sem regras gramaticais. 
Ao criar uma fotografia, estamos gerando uma imagem. Porém, se esta fotografia for pensada, imbuída de sentido e finalidade, faremos um código visual, uma mensagem evangelizadora. Não será somente um fragmento do tempo, uma eternização, mas uma mensagem a ser decifrada, tornando-se uma experiência de fé. 
Vamos comparar agora o processo da fotografia com os vitrais. Primeiro é necessária a composição visual, execução, a luz passa por dentro da lente, registra a imagem, depois a imagem é exposta em alguma mídia de comunicação, onde ela revela sua finalidade. 
A luz é citada várias vezes nas Sagradas Escrituras; Jesus se identifica como luz: “Eu sou a luz do mundo.” (Jo 8,12). Quando falamos de vitrais, nos recordamos da luz e de seu papel na evangelização por meio da imagem. Um vitral sem a luz não tem como expressar sua beleza, mas antes disso é importante que conheçamos um pouco do contexto em que os vitrais se tornaram fonte de evangelização. 
No período medieval, não existiam estruturas nem instituições de ensino catequético [1]. A fé era transmitida no seio familiar, e através do convívio com os ritos e lugares sagrados. Como naquele período, toda a Liturgia e as Sagradas Escrituras não eram traduzidas na linguagem vernácula [2], a paróquia era uma grande catequese. Além de toda a Liturgia, a arte servia de grande amparo catequético, e os vitrais estavam inseridos neste contexto, pois traziam múltiplas histórias bíblicas, do Gênesis ao Apocalipse, e também a vida dos santos como um testemunho. 
A beleza translúcida dos vitrais assim como sua composição visual bem elaborada, as cores, encantam todos aqueles que os visualizam. Sem o suporte da arte, a mensagem poderia até ser boa, mas não chamaria a atenção, e não permitiria ver pelos olhos do autor a sua experiência íntima com o sagrado. A mensagem do Evangelho servia de inspiração para o desenvolvimento dos vitrais, através da experiência pessoal e da busca por novas técnicas de evangelização, surgiu um grande tesouro e uma das mais belas formas visuais de se ilustrar a vida de Cristo. 
Pensem na lógica dos vitrais. Primeiro existe a composição visual, ou seja, o projeto de como irá ficar o vitral depois de pronto, em seguida, execução, depois ele é colocado no alto das igrejas. A luz passa pelo vitral, e revela sua finalidade, trazendo cor e luz para todos os que frequentam aquele espaço sagrado, servindo para ilustrar e educá-los na fé, além de testemunhar a vida de nossos santos. 
Percebe que ambos têm um processo parecido? Ambos precisam de luz para existir. O vitral é colocado no alto das igrejas, que era o meio de evangelização onde se expressava a arte. Da mesma forma, a fotografia é colocada nas mais diversas mídias de comunicação, ela está presente em quase todas, e muitas vezes não percebemos a eficácia desta poderosa ferramenta de evangelização. 
Entretanto, temos de pontuar algo muito importante: a finalidade. A exemplo dos vitrais, nossas fotografias precisam ter a finalidade de evangelizar.
A fotografia como código visual precisa despertar em seu espectador experiências de fé. Para isto, precisa ser pensada e composta com essa finalidade, não pode ser somente um clique, deve ser um anúncio. Ao ver uma fotografia gerada com a intenção e finalidade de evangelizar, o espectador deve ser afetado e motivado a ir ao encontro dos códigos visuais ali presentes. 
A fotografia está inserida na maioria das mídias de comunicação, seja nas tradicionais, no caso das mídias impressas, até nas mais inovadoras. Os meios de comunicação seculares investem cada vez mais em imagens potentes, capazes de criar novas culturas: somos constantemente bombardeados por informações imagéticas, nem sempre com boas finalidades. 
As fotografias, da mesma forma que os vitrais, devem ser “iluminadas”, cheias de vida, e tão belas ao ponto de serem apreciadas, e não somente vistas como uma recordação de uma festividade, ou evento paroquial. É necessário transcender. 
A evangelização por meio da fotografia exige preparo, sensibilidade, espiritualidade, pois são as imagens palpáveis que construirão a imagem do invisível e sem a experiência pessoal, elas se tornarão vazias de significado.
Somos chamados hoje a retomar a evangelização por meio da imagem, para que tenhamos conteúdos católicos de qualidade com imagens de qualidade e geradas para evangelizar. Sabemos que uma imagem muitas vezes nos fala mais do que os textos, ou sem ela nem ao menos chegamos até eles. 
A fotografia religiosa é um novo convite a evangelizar por meio da imagem e auxiliar a Igreja na produção de conteúdos imagéticos, dando suporte ao trabalho das redes sociais, sites, revistas e as mais vastas mídias de comunicação católica. No Brasil já existem bancos de imagens católicas colaborativos onde os agentes da Pastoral da Comunicação produzem e disponibilizam imagens de boa qualidade para o serviço de comunicação da Igreja. 
Somos chamados a ter as câmeras nas mãos e o coração na missão!

Notas do autor deste blog:
[1] É falso afirmar que não haviam instituições de ensino ou catequéticas na Idade Média, uma vez que justamente neste período se desenvolveram as escolas e as universidades junto aos mosteiros e catedrais, apesar das limitações da época (os livros eram muito caros, pois eram copiados à mão).
[2] O latim era praticamente a única língua usada para a escrita neste período, uma vez que as línguas nacionais ainda estavam se formando e não possuíam uma gramática estruturada.

Rosácea norte da Catedral de Chartes (França)

segunda-feira, 30 de julho de 2018

Liturgia e Espiritualidade: Encontro de Pastoral Litúrgica 2018

Entre os dias 23 e 27 de julho de 2018 aconteceu no Santuário de Fátima o 44º Encontro Nacional de Pastoral Litúrgica, promovido pelo Secretariado Nacional de Liturgia de Portugal. Este ano o tema do Encontro foi “Liturgia e Espiritualidade”.

O Encontro, que reuniu mais de 900 participantes, contou com 8 conferências, proferidas por diversos especialistas em Liturgia. Ao clicar no título, é possível ouvir o áudio completo da respectiva Conferência (com duração média de 1 hora):

Dia 23/07:
1ª Conferência: A espiritualidade cristã - Pe. José Frazão, SJ.

Dia 24/07:
2ª Conferência: Vivência espiritual da Eucaristia - Côn. Luís Manuel Pereira da Silva, Patriarcado de Lisboa.

3ª Conferência: A Adoração Eucarística - Interpelação das Jornadas Mundiais da Juventude - Dom José Cordeiro, Bispo de Bragança-Miranda.

Dia 25/07:
4ª Conferência: Liturgia das Horas - Pe. Pedro Lourenço Ferreira, OCD.

5ª Conferência: Liturgia e lectio divina - Pe. José Luís de Almeida Monteiro, OP.

Dia 26/07:
6ª Conferência: A beleza da Liturgia - Dom Bernardino Ferreira da Costa, OSB, Abade de Singeverga.

7ª Conferência: Música litúrgica em conversão contínua - Côn. António Ferreira dos Santos, Diocese do Porto.

8ª Conferência: Liturgia e espiritualidade familiar - Pe. Paulo Jorge Barbosa da Rocha, Diocese do Porto.


Fonte: Secretariado Nacional de Liturgia - Portugal

sábado, 28 de julho de 2018

Homilia: XVII Domingo do Tempo Comum - Ano B

Santo Efrém
Diatessaron
Até o tempo em que daria o seu Corpo e o seu Sangue

Nosso Senhor multiplicou o pão no deserto, em Caná ele transformou a água em vinho. Assim os habituava ao seu pão e ao seu vinho, até o momento em que daria o seu Corpo e o seu Sangue. Ele fez que provassem um vinho e um pão passageiros para ocasionar neles o desejo do seu Corpo e Sangue vivificantes. Ele deu-lhes com liberalidade estas pequenas coisas, para que soubessem que o seu dom supremo seria dado de forma gratuita. Deu-lhes gratuitamente, embora pudessem comprá-los com o que tinham, para que eles compreendessem que não lhes exigiria pagamento por uma dádiva que não tem preço; de fato, se pudessem pagar o preço do pão e do vinho, certamente não poderiam pagar o preço do seu Corpo e do seu Sangue.

Não só os cumulou gratuitamente com os seus dons, mas ainda os mimou afetuosamente. Na verdade, ele deu-nos estas coisas gratuitamente para atrair-nos, a fim de que buscássemos e recebêssemos gratuitamente esse dom imenso que é a Eucaristia. Aquelas porções do pão e do vinho que nos deu são agradáveis ao paladar, mas a dádiva de seu Corpo e seu Sangue é proveitoso para o espírito. Ele nos atraiu através destes dons agradáveis, para atrair-nos ao que dá vida à alma. Ocultou a doçura no vinho que fez, para revelar aos convidados que tesouro admirável está oculto em seu Sangue vivificante.

Como primeiro sinal, ele fez um vinho que alegra aos convidados para mostrar-lhes que o seu Sangue daria alegria a todos os povos. O vinho é uma parte em todas as alegrias que se possa imaginar e também toda libertação está diretamente relacionada com o mistério do seu Sangue. Concedeu aos hóspedes um maravilhoso vinho que modificou suas mentes para que compreendessem que o ensinamento que revelaria transformaria os seus corações. O que inicialmente era água foi transformado em vinho nas talhas; era o símbolo do primeiro mandamento levado à perfeição; a água tinha se transformado na lei perfeita. Os convidados bebiam água, mas sem o gosto da água. Da mesma forma, quando escutamos os antigos preceitos, os desfrutamos com o seu novo sabor. O preceito: olho por olho foi substituído e elevado à perfeição: Se alguém te atingir a face direita, oferece-lhe também a esquerda.

A obra do Senhor tudo alcança; em um cesto, ele multiplicou um pouco de pão. Aquilo que os homens fazem durante dez meses de trabalho, seus dez dedos fizeram instantaneamente. Suas mãos eram como terra sob o pão, e a sua Palavra como um trovão em cima dele; o sussurro dos seus lábios difunde-se sobre eles como o rocio e sua boca era como o sol; em um breve espaço de tempo ele cumpriu o que normalmente levaria muito tempo. Daquela pequena quantidade de pão brotaram vários tipos de pães; como na época da bênção primeva: Sede fecundos e multiplicai-vos. Os pedaços de pão, antes infecundos e insignificantes, com a bênção de Jesus - como seio fecundo de mulher - deram frutos dos quais sobraram muitos fragmentos.

O Senhor revelou a eficácia penetrante da sua Palavra para quem o escutava, e mostrou a rapidez com a qual distribuía as suas dádivas para aqueles que ele favorecia. Não multiplicou o pão tanto quanto podia, mas o suficiente para os convidados. O milagre não alcançou a medida do seu poder, mas foi de acordo com a fome dos famintos. Realmente, se o milagre fosse medido por seu poder, seria impossível avaliar-se o fruto. Mesmo com a fome de milhares de pessoas, o milagre excedeu-lhes em doze cestos. Em todos os artesãos, o poder é abaixo da demanda dos compradores: eles não podem fazer tudo o que o cliente pede. As coisas que Deus realiza, porém, transcendem os desejos. E: recolham os pedaços que sobraram, para que nada se perca, e não se pense que o Senhor agiu apenas em alegoria. Mas, quando os restos forem guardados um dia ou dois, acreditarão que o Senhor realmente o fez e que não se trata de uma ilusão infundada.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 435-436. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Para ler uma homilia de Santo Hilário de Poitiers para este domingo, clique aqui.

sexta-feira, 27 de julho de 2018

A reforma litúrgica antes do Concílio Vaticano II

Na coluna “Memória Histórica - 50 anos do Concílio Vaticano II”, o site Vatican News, depois da série sobre “Dez aspectos da reforma litúrgica”, publicou quatro textos sobre a história do movimento litúrgico que antecedeu o Concílio Vaticano II:


No nosso espaço Memória Histórica – 50 anos do Concílio Vaticano II, vamos falar sobre “as origens da reforma litúrgica antes do Concílio [1]”.
No programa passado introduzimos as palavras do Papa Francisco dirigidas aos participantes da 68ª Semana Litúrgica Nacional italiana, em 24 de agosto de 2017, em que repassava as reformas introduzidas na liturgia a partir de São Pio X. Estas reformas que são irreversíveis – reiterou o Papa - amadureceram mais tarde, como bom fruto da árvore da Igreja, com a Constituição Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada Liturgia.
Mas antes de aprofundarmos as palavras do Santo Padre naquela ocasião, vamos conhecer um pouco as origens da reforma litúrgica antes do Concílio Vaticano II.
Um dos pioneiros no campo da purificação e renovação litúrgica – 200 anos antes da SC - foi sem dúvida o monge Dom Guéranger, já em 1805, fundador e abade de Solesmes, que pretendeu fazer compreensiva a Liturgia, no período que favorecia o abandono dos ritos regionais e a adoção do Rito Romano. Da mesma maneira que Newman, Moehler e Pusey, seus contemporâneos, Guéranger descobriu o valor transcendente do pensamento patrístico e sua extraordinária fecundidade para os cristãos de todas as gerações. Associou a este objetivo a restauração da música e a propagação do canto gregoriano. Dom Pothier (que viveu de 1835-1923), de Solesmes, trabalhou na reconstrução integral do oficio gregoriano. Publicou suas Melodias Gregorianas (1880) e o Liber Gradualis (1883).
As abadias de Beuron (1863) na Alemania, de Mont-César (1899) e de Maredsous (1872) na Bélgica, abriam – na época - novas perspectivas nas revistas e publicações, que influenciaram decisivamente para a restauração litúrgica eclesial, num movimento de renovação litúrgica pré-conciliar.
Em 1903, Pio X apresentou o gregoriano como “o modelo supremo da música sagrada”, e deu instruções precisas que ele próprio qualificou como “código jurídico da música sagrada”, mas não impediu que fosse usada na Liturgia a música polifônica de acordo com as normas.  O Papa Francisco, há pouco, ainda recordava essa memória de renovação num encontro litúrgico da Itália.
Já nesse pontificado de Pio X se realizou importante impulso de renovação litúrgica com a reforma do Breviário e do Missal Romano. Uma ideia resumia o pensamento de Pio X: “Não tem que rezar nem cantar durante a missa, mas tem que cantar e rezar a missa”. No século XX, o Papa reformava a Liturgia e, de maneira especial, a música sagrada, que havia caído em matéria profana; reformou também o Breviário romano, reduziu o número de festas de preceito e, em 1911, reformando o calendário litúrgico e ordenando as regras sobre as controvertidas indulgências [2].
Em 1914 se publicou em Lovaina a obra “A piedade da Igreja”, de Lambert Beauduin, um beneditino de Mont-César (Lovaina), que conseguiu que todas estas disposições e inovações litúrgicas fosse assumidas e postas em prática na vida paroquial e diocesana. Este movimento foi completado por meio da Abadia de Maria Laach e pelos escritos de Pius Parsch (1884-1954) e do teólogo e liturgista Romano Guardini, contemporâneo do Concílio Vaticano II.
Com Jungmann, da Universidade de Innsbruck, a história da liturgia renovou seus métodos e facilitou com o estudo das fontes a renovação litúrgica que brilhará no Concilio Vaticano II.
Um outro fato histórico da reforma litúrgica se atribui a celebração, em 1918, na Abadia de María Laach (Alemanha) a primeira “missa comunitária” como missa dialogada. Tudo isso foi gérmen para que se culmina nos debates do Concilio Ecumênico Vaticano II, para se compilar a Cconstituição Sacrosanctum Concilium, o mais importante e decisivo documento litúrgico publicado até hoje, promulgado por Paulo VI.

[1] Juan María Laboa. Historia de la Iglesia IV: Época Contemporánea. Biblioteca de Autores Cristianos, Madrid, 2002, pp. 261-263.
[2] Ibidem, p. 279.


No nosso espaço “Memória Histórica – 50 anos do Concílio Vaticano II”, vamos continuar a falar sobre o surgimento do Movimento Litúrgico que culminou com a promulgação da Constituição Sacrosanctum Concilium.
A renovação litúrgica tem suas raízes bem anteriores ao Concílio Vaticano II. Como vimos no programa passado, o Movimento Litúrgico surgiu há mais de 200 anos, sobretudo em Abadias da Alemanha, Bélgica e Itália. Também os Papas Pio X e Pio XII, introduziram algumas reformas. No pontificado de Pio X, por exemplo, realizou-se um importante impulso de renovação litúrgica com a reforma do Breviário e do Missal Romano. Dando continuidade a este tema, o padre Gerson Schmidt nos traz hoje a reflexão “O Movimento Litúrgico e a reforma litúrgica de Pio XII [1]”:
Como temos visto aqui, o Movimento Litúrgico para a renovação na Liturgia não surgiu no Concílio Vaticano II, mas já 200 anos antes, sobretudo nas Abadias da Alemanha, Bélgica, Itália, como apontamos já aqui anteriormente.
Houve tentativas de reformas por meio dos Papas Pio X e Pio XII.  Em 1947, Pio XII publica a Encíclica Mediator Dei, onde aponta a reforma da Semana Santa, que foi o antecedente mais importante para a decisiva reforma litúrgica do Vaticano II, resultando assim a riqueza da Constituição Sacrosanctum Concilium, o mais importante e decisivo documento litúrgico publicado até hoje.
No século XX, o desenvolvimento do espírito litúrgico está relacionado com as abadias de Mont-César, Levaina e São André, de Bruges, com nomes como Romano Guardini, Pius Parsch, Odo Casel ou Jungmann, com a coleção “Lex Orandi”, também com revistas como La Maison-Dieu ou centros nacionais de apostolado litúrgico. O movimento da Reforma Litúrgico tem sido fomentado na Bélgica, depois se estendeu à França, Alemanha, Itália.
Em 1909 – quase 60 anos antes do Concílio Vaticano II – em Malinas (Bélgica) houve um Congresso regional – Congrés National des Oeuvres Catholiques – onde os participantes já se propunham em tornar viva e eficaz a celebração dos mistérios cristãos, de modo que os ritos “falassem” aos homens de hoje. Na ocasião um expoente para essa renovação foi Odo Casel, com a categoria na Liturgia do “mistério”.
Em 1956, aconteceu um fato interessante, o primeiro Congresso Internacional de Pastoral Litúrgica, celebrado em Assis, que foi um verdadeiro encontro de especialistas e troca de experiências. Tudo isso vai ter sua culminância, em forma de compêndio, na reforma litúrgica do Vaticano II.
Para esse Congresso de 1956, Papa Pio XII fez um precioso discurso, excelente complemento da anterior Encíclica sobre a música sagrada, colocando a excelência e elevada significação da liturgia católica, como símbolo da graça e da pessoa de Cristo [2].
Na mensagem enviada por Pio XII aos participantes, o Papa disse muitas coisas interessantes, para a sua época, falando assim, ainda antes do Concilio: “Se se compara a situação atual do Movimento Litúrgico com o que já foi há trinta anos, constata-se que alcançou um progresso inegável, tanto na extensão quanto na profundidade.
O interesse pela Liturgia, as realizações práticas e a participação ativa dos fiéis conquistaram um desenvolvimento que seria difícil de prever naquele momento”. Veja, que já em 1956, Pio XII falava da participação ativa dos fiéis, tônica endossada pela Sacrosanctum Concilium.

[1] Juan María Laboa. Historia de la Iglesia IV: Época Contemporánea. Biblioteca de Autores Cristianos, Madrid, 2002, pp. 261-263.
[2] Francisco J. Montalban e VV.AA. História de la Iglesia Catolica IV: Edad Moderna, Biblioteca de Autores Cristianos, Madrid, 1958, p. 843.


Ângelus: XVI Domingo do Tempo Comum - Ano B

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 22 de julho de 2018

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
O Evangelho de hoje (Mc 6,30-34) narra-nos que os apóstolos, depois da sua primeira missão, voltaram para junto de Jesus e lhe contaram «tudo o que haviam feito e ensinado» (v. 30). Após a experiência da missão, certamente entusiasmante mas também cansativa, eles sentem a exigência de repousar. E Jesus, cheio de compreensão, preocupa-se em garantir-lhes um pouco de alívio e diz: «Vinde, retiremo-nos a um lugar deserto, e descansai um pouco» (v. 31). Mas desta vez a intenção de Jesus não se pode realizar, porque a multidão, intuindo o lugar solitário para onde se teria dirigido de barco, juntamente com os seus discípulos, apressou-se para estar lá antes da sua chegada.

O mesmo pode verificar-se também hoje. Por vezes não conseguimos realizar os nossos projetos, porque acontece um imprevisto urgente que altera os nossos programas e requer flexibilidade e disponibilidade em relação às necessidades dos outros.

Nestas circunstâncias, somos chamados a imitar o que Jesus fez: «Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão e compadeceu-se dela, porque eram como ovelhas sem pastor. E começou a ensinar-lhes muitas coisas» (v. 34). Nesta breve frase, o evangelista apresenta-nos um flash de singular intensidade, fotografando os olhos do Mestre divino e o seu ensinamento. Observemos os três verbos deste fotograma: ver, compadecer-se, ensinar. Podemos chamá-los os verbos do Pastor. O olhar de Jesus não é neutro nem, pior ainda, frio e distante, porque Ele vê sempre com os olhos do coração. E o seu coração é tão terno e cheio de compaixão, que sabe sentir as necessidades inclusive as mais escondidas das pessoas. Além disso, a sua compaixão não indica simplesmente uma reação emotiva perante uma situação de dificuldade das pessoas, mas é muito mais: é a atitude e a predisposição de Deus para com o homem e a sua história. Jesus manifesta-se como a realização da solicitude e da bondade de Deus pelo seu povo.

Dado que Jesus se comoveu ao ver toda aquela gente necessitada de guia e de ajuda, esperaríamos que ele se preparasse para fazer algum milagre. Ao contrário, começou a ensinar-lhes muitas coisas. Eis o primeiro pão que o Messias oferece à multidão faminta e desorientada: o pão da Palavra. Todos nós precisamos da palavra da verdade, que guie e ilumine o caminho. Sem a verdade, que é o próprio Cristo, não é possível encontrar a orientação certa da vida. Quando nos afastamos de Jesus e do seu amor, ficamos desorientados e a existência transforma-se em desilusão e insatisfação. Com Jesus ao nosso lado é possível proceder com segurança, é possível superar as provações, progredir no amor a Deus e ao próximo. Jesus fez-se dom para os outros, tornando-se assim modelo de amor e de serviço para cada um de nós.

Maria Santíssima nos ajude a assumir os problemas, os sofrimentos e as dificuldades do nosso próximo, mediante uma atitude de partilha e de serviço.


Fonte: Santa Sé.

terça-feira, 24 de julho de 2018

Papa Francisco preside Consistório para Causas de Canonização

Na manhã do último dia 19 de julho o Papa Francisco presidiu na Sala do Consistório no Palácio Apostólico a oração da Hora Terça da Liturgia das Horas (9h) e um Consistório para Causas de Canonização.

O Santo Padre foi assistido pelos Monsenhores Guido Marini e Pier Enrico Stefanetti.

Foi definido neste Consistório que o Beato Nunzio Sulprizio, jovem leigo, será canonizado no próximo dia 14 de outubro, juntamente com outros seis Beatos, no contexto do Sínodo dos Jovens.

Versículo introdutório
Leitura
Cardeal Amato lê a biografia do Beato

Papa saúda o Cardeal Amato, Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos

Festa de São Sérgio de Radonezh em Moscou

No último dia 18 de julho o Patriarca Kirill da Igreja Ortodoxa Russa celebrou a Divina Liturgia da Festa de São Sérgio de Radonezh na igreja da Assunção dentro do Mosteiro da Trindade, fundado por São Sérgio próximo a Moscou.

Na tradição bizantina os santos monges são celebrados em verde, a mesma cor usada nas celebrações do Espírito Santo.

Chegada do Patriarca
Patriarca venera as relíquias de São Sérgio
Procissão de entrada
Patriarca abençoa os fiéis

Patriarca Kirill celebra em Ekaterimburgo

Na madrugada do último 17 de julho, o Patriarca Kirill da Igreja Ortodoxa Russa celebrou a Divina Liturgia na praça diante da igreja de Todos os Santos Russos em Ekaterimburgo, por ocasião do Centenário da morte da família real russa.

O czar Nicolau II, sua esposa e filhos são venerados como mártires pela Igreja Ortodoxa Russa. A igreja de Ekaterimburgo, também conhecida como "Memorial do Sangue", foi construída no local onde ocorreu seu assassinato em 1918.

Após a Divina Liturgia, ainda durante a madrugada, cerca de 100 mil fiéis acompanharam o Patriarca Kirill pelas ruas de Ekaterimburgo até uma pequena igreja construída no local onde os corpos da família real foram escondidos.

Divina Liturgia:



Pequena Entrada
Incensação


sábado, 21 de julho de 2018

Homilia: XVI Domingo do Tempo Comum - Ano B

São Gregório de Nissa
Comentário sobre o Cântico dos Cânticos
Oração do Bom Pastor

Onde pastoreias, ó bom pastor, tu que carregas sobre teus ombros a toda a grei? Toda a humanidade, que carregaste sobre os teus ombros, é, de fato, como uma só ovelha. Mostra-me o lugar de repouso, guia-me até o pasto nutritivo, chama-me por meu nome para que eu, tua ovelha, escute a tua voz, e tua voz me conceda a vida eterna: Avisa-me, amor de minha alma, onde pastoreias.

Chamo-te deste modo, porque teu nome supera qualquer outro nome e qualquer entendimento, de tal forma que nenhum ser racional é capaz de pronunciá-lo ou de compreendê-lo. Este nome, expressão de tua bondade, expressa o amor de minha alma por ti. Como posso deixar de te amar, a ti que me amaste tanto, apesar de minha escuridão, que entregaste a tua vida pelas ovelhas de teu rebanho? Não se pode imaginar um amor superior a este, o de dar a tua vida por minha salvação.

Ensina-me, portanto - diz o texto sagrado -, onde pastoreias, para que possa encontrar os pastos saudáveis e saciar-me do alimento celestial que é necessário comer para entrar na vida eterna; para que possa ainda acorrer à fonte que proporcionas aos sedentos com a água que brota de teu lado, manancial de água aberto pela lança, que se torna para todos os que dele bebem uma fonte de água que jorra para a vida eterna.

Se me pastoreias desta forma, me farás recostar ao meio-dia, sestearei em paz e descansarei sob a luz sem mistura de sombra. Durante o meio-dia não existe sombra alguma, já que o sol está a cimo; sob esta luz meridiana fazes recostar aos que pastoreaste, ao pores teus ajudantes contigo em teu quarto. Ninguém é considerado digno deste repouso meridiano se não é filho da luz e filho do dia. Mas aquele que se afasta das trevas, tanto das vespertinas como das matutinas, que simbolizam o começo e o fim do mal, é colocado pelo sol de justiça na luz do meio-dia, para que repouse debaixo dela.

Ensina-me, pois, como devo recostar-me e pastar, e qual seja o caminho do repouso meridiano, não aconteça que por ignorância me afaste de tua direção e me junte a um rebanho estranho ao teu.

Isto diz a esposa do Cântico, solícita pela beleza que lhe vem de Deus e com o desejo de saber como alcançar a felicidade eterna.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 433-434. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Para ler uma homilia de São Basílio de Selêucia para este domingo, clique aqui.

Festa do Redentor em Veneza

No terceiro domingo de julho, em Veneza, celebra-se a Festa do Redentor. Esta celebração remonta ao ano de 1577, e recorda a ação de graças a Deus pelo fim de uma peste que assolou a população.

No último dia 15 de julho o Patriarca de Veneza, Dom Francesco Moraglia, celebrou a Santa Missa na igreja do Redentor e concedeu a Bênção Eucarística na porta da igreja em direção à cidade.

Chegada do Patriarca à igreja*
Procissão de entrada

Evangelho
Oração Eucarística

Solenidade da Dedicação da Basílica do Santo Sepulcro

No último dia 15 de julho o Vigário da Custódia da Terra Santa, Padre Dobromir Jazstal, celebrou a Santa Missa na Basílica do Santo Sepulcro por ocasião da Solenidade do aniversário da Dedicação desta igreja.

A Basílica do Santo Sepulcro, inicialmente foi dedicada em 14 de setembro de 335. Porém, após ser atacada pelos muçulmanos durante as Cruzadas, foi restaurada e novamente dedicada em 15 de julho de 1149.

Ritos iniciais
Liturgia da Palavra
 
 
Apresentação das oferendas

Ângelus: XV Domingo do Tempo Comum - Ano B

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 15 de julho de 2018

Amados irmãos e irmãs, bom dia!
O Evangelho de hoje (Mc 6,7-13) narra o momento no qual Jesus envia os Doze em missão. Depois de os ter chamado pelo nome um por um, «para andarem com Ele» (Mc 3,14) ouvindo as suas palavras e observando os seus gestos de cura, convocava-os agora para os «enviar dois a dois» (Mc 6,7) às aldeias que Ele se preparava para visitar. É uma espécie de “aprendizagem” daquilo que serão chamados a fazer depois da Ressurreição do Senhor com o poder do Espírito Santo.

O trecho evangélico analisa o estilo do missionário, que podemos resumir em dois pontos: a missão tem um centro; a missão tem um rosto.

O discípulo missionário tem antes de mais um seu centro de referência, que é a pessoa de Jesus. A narração indica isto usando uma série de verbos que têm a Ele como sujeito - «chamou», «enviou-os», «dava-lhes poder», «ordenou», «dizia-lhes» (vv. 7.8.10) - de modo que o ir e o agir dos Doze aparecem como o irradiar-se de um centro, o repropor-se da presença e da obra de Jesus na sua ação missionária. Isto manifesta que os Apóstolos nada têm de seu para anunciar, nem capacidades próprias para demonstrar, mas falam e agem porque foram «enviados», enquanto mensageiros de Jesus.

Este episódio evangélico refere-se também a nós, e não só aos sacerdotes, mas a todos os batizados, chamados a testemunhar, nos vários ambientes de vida, o Evangelho de Cristo. E também para nós esta missão é autêntica apenas a partir do seu centro imutável que é Jesus. Não é uma iniciativa dos fiéis individualmente nem dos grupos, nem sequer das grandes agregações, mas é a missão da Igreja inseparavelmente unida ao seu Senhor. Cristão algum anuncia o Evangelho «por conta própria», mas unicamente enviado pela Igreja que recebeu o mandato do próprio Cristo. É precisamente o Batismo que nos torna missionários. Um batizado que não sentir a necessidade de anunciar o Evangelho, de anunciar Jesus, não é um bom cristão.

A segunda característica do estilo do missionário é, por assim dizer, um rosto, que consiste na pobreza dos meios. O seu equipamento responde a um critério de sobriedade. Com efeito, os Doze receberam a ordem de «que nada levassem para o caminho a não ser um cajado: nem pão, nem alforje, nem dinheiro no cinto» (v. 8). O Mestre quis que eles fossem livres e ligeiros, sem apoios nem favores, com a única certeza do amor d’Aquele que os envia, fortalecidos unicamente pela sua palavra que vão anunciar. O cajado e as sandálias são o equipamento dos peregrinos, porque eles são mensageiros do reino de Deus, não empresários onipotentes, não funcionários rigorosos nem estrelas em tournée. Pensemos, por exemplo, nesta Diocese da qual eu sou o Bispo. Pensemos em alguns Santos desta Diocese de Roma: São Filipe Neri, São Bento José Labre, Santo Aleixo, Beata Ludovica Albertoni, Santa Francisca Romana, São Gaspar de Bufalo e muitos outros. Não eram funcionários nem empresários, mas trabalhadores humildes do Reino. Tinham este rosto. E a este “rosto” pertence também a maneira como a mensagem é acolhida: com efeito, pode que acontecer não sejamos acolhidos nem ouvidos (v. 11). Também isto é pobreza: a experiência da falência. A vicissitude de Jesus, que foi rejeitado e crucificado, antecipa o destino do seu mensageiro. E só se estivermos unidos a Ele, morto e ressuscitado, conseguiremos encontrar a coragem da evangelização.

A Virgem Maria, primeira discípula e missionária da Palavra de Deus, nos ajude a levar ao mundo a mensagem do Evangelho numa exultação humilde e radiante, além de qualquer rejeição, incompreensão ou tribulação.


Fonte: Santa Sé.

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Exéquias do Cardeal Jean-Louis Tauran

No último dia 12 de julho foram celebradas no altar da Cátedra da Basílica Vaticana as Exéquias do Cardeal Jean-Louis Tauran, falecido no dia 05 de julho.

A Santa Missa foi presidida pelo Decano do Colégio Cardinalício, Cardeal Angelo Sodano. O Papa Francisco assistiu à Missa e, no final, presidiu os ritos da Última Encomendação e Despedida.

O Santo Padre foi assistido pelo Mons. Diego Giovanni Ravelli, uma vez que Mons. Guido Marini está na Irlanda preparando a viagem do Papa ao país em agosto.

Papa Francisco aguarda o início da Missa

Homilia do Cardeal Sodano
Aspersão do féretro
 

Ângelus: XIV Domingo do Tempo Comum - Ano B

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 08 de julho de 2018

Amados irmãos e irmãs, bom dia!
A hodierna página evangélica (Mc 6,1-6) apresenta Jesus que regressa a Nazaré e, no dia de sábado, começa a ensinar na sinagoga. Desde que se tinha ido embora para começar a pregar nos povoados e aldeias circunvizinhas, nunca voltara à sua pátria. Voltou. Portanto, toda a cidade terá ido ouvir este filho do povo, cuja fama de mestre sábio e de poderoso curador já se alastrava pela Galileia e além. Mas aquilo que se poderia apresentar como um sucesso, transformou-se numa clamorosa recusa, a ponto que Jesus não pôde realizar ali prodígio algum, mas apenas poucas curas (v. 5). A dinâmica daquele dia foi reconstruída detalhadamente pelo evangelista Marcos; o povo de Nazaré inicialmente ouve, e fica admirado; depois questiona-se perplexo: «de onde lhe vêm estas coisas», esta sabedoria?; e no final escandaliza-se, ao reconhecer n’Ele o carpinteiro, o filho de Maria, que eles viram nascer (vv. 2-3). Por isso Jesus conclui com a expressão que se tornou proverbial: «um profeta só é desprezado na sua pátria» (v. 4).

Perguntemo-nos: por que passam os concidadãos de Jesus da admiração à incredulidade? Eles fazem um confronto entre a origem humilde de Jesus e as suas capacidades atuais: é um carpinteiro, não estudou, contudo prega melhor que os escribas e faz milagres. Mas em vez de se abrirem à realidade, escandalizam-se. Segundo os habitantes de Nazaré, Deus é demasiado grande para se abaixar e falar através de um homem tão simples! É o escândalo da encarnação: o evento desconcertante de um Deus que se fez carne, que pensa com mente de homem, trabalha e age com mãos de homem, ama com coração de homem, um Deus que trabalha, come e dorme como um de nós. O Filho de Deus inverte qualquer esquema humano: não foram os discípulos que lavaram os pés ao Senhor, mas foi o Senhor que lavou os pés aos discípulos (cf. Jo 13,1-20). É este o motivo de escândalo e de incredulidade não só naquela época, em todas as épocas, mas também hoje.

A inversão realizada por Jesus engaja os seus discípulos de ontem e de hoje numa verificação pessoal e comunitária. Com efeito, também nos nossos dias pode acontecer que se alimentem preconceitos que impedem que se compreenda a realidade. Mas o Senhor convida-nos a assumir uma atitude de escuta humilde e de expectativa dócil, porque a graça de Deus se apresenta, com frequência, de maneiras surpreendentes, que não correspondem às nossas expectativas. Pensemos juntos na Madre Teresa de Calcutá, por exemplo. Uma religiosa pequenina - ninguém dava dez tostões por ela - que ia pelas ruas recuperar os moribundos para que tivessem uma morte digna. Esta pequenina religiosa fez maravilhas com as orações e com as suas obras! A pequenez de uma mulher revolucionou as obras de caridade na Igreja. É um exemplo dos nossos dias. Deus não se conforma com os preconceitos. Devemos esforçar-nos por abrir o coração e a mente, para acolher a realidade divina que vem ao nosso encontro. Trata-se de ter fé: a falta de fé é um obstáculo à graça de Deus. Muitos batizados vivem como se Cristo não existisse: repetem-se gestos e os sinais da fé, mas a eles não corresponde uma adesão real à pessoa de Jesus nem ao seu Evangelho. Cada cristão - todos nós, cada um de nós - é chamado a aprofundar esta pertença fundamental, procurando testemunhá-la com uma conduta de vida coerente, cujo fio condutor será sempre a caridade.

Peçamos ao Senhor, por intercessão da Virgem Maria, que desfaça a dureza dos corações e a limitação das mentes, para que sejamos abertos à sua graça, à sua verdade e à sua missão de bondade e misericórdia, que se destina a todos, sem excluir ninguém.


Fonte: Santa Sé.

sábado, 14 de julho de 2018

Homilia: XV Domingo do Tempo Comum - Ano B

Santo Ambrósio
Carta 26
Pregamos a Cristo

Quão formosos os pés do mensageiro que anuncia a paz, que traz a Boa Notícia! Quem são os que trazem a Boa Notícia senão Pedro, Paulo e todos os Apóstolos? E qual é a Boa Notícia que nos trazem, senão ao Senhor Jesus? Ele é a nossa paz, ele é aquele soberano bem, porque é bom e procede do bom: de uma árvore boa se colhe frutos bons. Bom é, finalmente, o espírito que dele recebe e que conduz aos servos de Deus pelo caminho reto.

E quem, tendo o Espírito de Deus em si, negará ao bom, quando ele mesmo diz: Ou tu vais ter inveja porque eu sou bom? Venha este bem à nossa alma, ao mais íntimo de nosso espírito; este bem que Deus concede generosamente àqueles que o pedem. Este é o nosso tesouro, este é o nosso caminho, esta é a nossa sabedoria, nossa justiça, nosso pastor, e pastor bom: ele é nossa vida. Já observas quantos bens em um só bom! Pois todos estes bens nos pregaram os evangelistas.

O Senhor Jesus é o sumo bem em pessoa, anunciado pelos profetas, pregado pelos anjos, prometido pelo Pai, evangelizado pelos apóstolos. Ele veio a nós qual fruto maduro: e não só qual fruto maduro, mas também como fruto que amadurece nos montes. E para que não tivesse nada duro nem imaturo em nossos projetos, nada violento nem áspero em nossas ações e em nossos costumes, ele foi o primeiro que se apresentou anunciando-nos a Boa Notícia.

Por isso ele disse: Eu que era o que falava, aqui estou. Isto é, eu que falava nos profetas, estou presente no corpo que assumi da Virgem; eu estou aqui, eu que sou a imagem do Deus invisível e figura de sua substância, e estou aqui também como homem. Mas quem me conhece? Viram ao homem e o creram super-homem por suas obras.

Portanto, apressemo-nos ao seu encontro, em quem está o soberano bem: porque ele é a bondade; ele é a paciência de Israel, que te chama à penitência, a fim de que não sejas convocado a juízo, mas possas receber a remissão dos pecados. Ele diz: Fazei penitência. Ele é o soberano bem que de ninguém necessita e superabunda em tudo. E é tal a sua substância, que de sua plenitude todos temos recebido e nele fomos cumulados, como diz o evangelista.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 428-429. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Para ler uma homilia de São Gregório Magno para este domingo, clique aqui.

quinta-feira, 12 de julho de 2018

Fotos da Celebração Ecumênica com o Papa em Bari

No último dia 07 de julho o Papa Francisco participou de uma Peregrinação Ecumênica à cidade italiana de Bari, para rezar pela paz no Oriente Médio.

O encontro iniciou-se na Basílica de São Nicolau, com uma oração do Papa e dos Patriarcas diante das relíquias do santo:

O Papa saúda os Patriarcas na porta da Basílica

Oração diante das relíquias de São Nicolau


Palavras do Papa na Celebração Ecumênica em Bari

Visita do Papa Francisco a Bari
Encontro de Oração e Reflexão sobre o Oriente Médio

Monição Introdutória do Santo Padre à Oração Ecumênica pela Paz
Rotunda no Lungomare
Sábado, 7 de julho de 2018

Amados irmãos!
Chegamos como peregrinos a Bari, janela aberta para o Oriente vizinho, trazendo no coração as nossas Igrejas, os povos e as inúmeras pessoas que vivem em situações de grande sofrimento. Dizemos-lhes: «Estamos convosco». Amados Irmãos, muito obrigado por terdes vindo, generosa e prontamente, aqui. E sinto-me muito grato a todos vós que nos acolheis nesta cidade, cidade do encontro, cidade da hospitalidade.
Sustenta-nos, no nosso caminho comum, a Santa Mãe de Deus, aqui venerada como Hodigitria, Aquela que mostra o caminho. Aqui repousam as relíquias de São Nicolau, bispo do Oriente, cuja veneração sulca os mares e cruza as fronteiras entre as Igrejas. O Santo taumaturgo interceda pela cura das feridas que muitos trazem dentro de si. Aqui contemplamos o horizonte e o mar, e sentimo-nos impelidos a viver esta jornada com a mente e o coração voltados para o Médio Oriente, encruzilhada de civilizações e berço das grandes religiões monoteístas.
Lá nos veio visitar o Senhor, «como sol nascente» (Lc 1,78). A partir de lá, propagou-se pelo mundo inteiro a luz da fé. Lá brotaram, frescas, as fontes da espiritualidade e do monaquismo. Lá se conservam ritos antigos únicos e riquezas inestimáveis da arte sacra e da teologia, lá habita a herança dos nossos grandes Pais na fé. Esta tradição é um tesouro que deve ser guardado com todas as nossas forças, porque no Médio Oriente estão as raízes das nossas próprias almas.
Mas sobre esta região esplêndida adensou-se, especialmente nos últimos anos, uma espessa cortina de trevas: guerra, violência e destruição, ocupações e formas de fundamentalismo, migrações forçadas e abandono… Tudo no silêncio de tantos e com a cumplicidade de muitos. O Médio Oriente tornou-se terra de gente que deixa a própria terra. E há o risco de ser cancelada a presença de nossos irmãos e irmãs na fé, deturpando a própria fisionomia da região, porque um Médio Oriente sem cristãos não seria Médio Oriente.
Esta jornada começa pela oração, para que a luz divina rarefaça as trevas do mundo. Já acendemos diante de São Nicolau a «lâmpada uni-chama», símbolo da Igreja unida. Juntos, desejamos acender hoje uma chama de esperança. As lâmpadas que deporemos sejam sinal duma luz que ainda brilha na noite. De facto, os cristãos são luz do mundo (cf. Mt 5,14), não apenas quando tudo em redor é radioso, mas também quando, nos momentos escuros da história, não se resignam com a escuridão, que tudo envolve, e alimentam o pavio da esperança com o azeite da oração e do amor. Porque, quando se estendem as mãos para o céu em oração e quando se estende a mão para o irmão sem buscar o próprio interesse, arde e resplandece o fogo do Espírito, Espírito de unidade, Espírito de paz.
Rezamos unidos, para implorar do Senhor do Céu aquela paz que os poderosos da terra ainda não conseguiram encontrar. Do curso do Nilo ao Vale do Jordão e mais além, passando pelo rio Orontes até ao Tigre e ao Eufrates, ressoe o grito do Salmo: «Para ti, haja paz!» (122,8). Para os irmãos que sofrem e para os amigos de cada povo e credo, repetimos: Para ti, haja paz! Com o Salmista, imploramo-lo de modo particular para Jerusalém, cidade santa amada por Deus e ferida pelos homens, sobre a qual ainda chora o Senhor: Para ti, haja paz!
Haja paz: é o grito de tantos Abeis, de hoje, que sobe ao trono de Deus. Pensando neles, já não podemos, tanto no Médio Oriente como em qualquer parte do mundo, permitir-nos dizer: «Sou, porventura, guarda do meu irmão?» (Gn 4,9). A indiferença mata, e nós queremos ser voz que contrasta o homicídio da indiferença. Queremos dar voz a quem não tem voz, a quem pode apenas engolir lágrimas, porque o Médio Oriente hoje chora, hoje sofre e emudece, enquanto outros o espezinham à procura de poder e riquezas. Para os pequenos, os simples, os feridos…, para eles que têm Deus da sua parte, nós imploramos: haja paz! O «Deus de toda a consolação» (2Cor 1,3), que cura os corações atribulados e faixa as feridas (cf. Sl 147,3), escute hoje a nossa oração.

Palavras do Santo Padre na conclusão do Encontro
Adro da Basílica de São Nicolau
Sábado, 7 de julho de 2018

Amados irmãos e irmãs!
Sinto-me muito grato pela partilha que tivemos a graça de viver. Ajudamo-nos a redescobrir a nossa presença de cristãos no Médio Oriente, como irmãos. Esta presença será tanto mais profética quanto mais testemunhar Jesus, Príncipe da paz (cf. Is 9,5). Ele não empunha a espada; antes, pede aos seus que a reponham na bainha (cf. Jo 18,11). Também o nosso ser Igreja é tentado pelas lógicas do mundo, lógicas de poder e lucro, lógicas resolutivas e de conveniência. E temos o nosso pecado, a incoerência entre a fé e a vida, que obscurece o testemunho. Mais uma vez sentimos que temos de nos converter ao Evangelho, garantia de liberdade autêntica, e de o fazer urgentemente agora, na noite do Médio Oriente em agonia. Como na noite angustiante do Getsêmani, não serão a fuga (cf. Mt 26,56) nem a espada (cf. Mt 26,52) que antecipam a aurora radiosa de Páscoa, mas o dom de si mesmo à imitação do Senhor.
A boa nova de Jesus, crucificado e ressuscitado por amor, chegada das terras do Médio Oriente, conquistou o coração do homem ao longo dos séculos, porque está ligada, não aos poderes do mundo, mas à força inerme da cruz. O Evangelho compromete-nos numa conversão diária aos planos de Deus, a encontrar segurança e conforto apenas n’Ele, a anunciá-Lo a todos e apesar de tudo. A fé dos simples, tão enraizada no Médio Oriente, é fonte donde tirar água para saciar a sede e nos purificar, como acontece quando voltamos às origens, indo peregrinos a Jerusalém, à Terra Santa ou aos santuários do Egito, Jordânia, Líbano, Síria, Turquia e dos outros lugares sagrados daquelas regiões.
Encorajados uns pelos outros, dialogamos fraternalmente. Foi um sinal de que se deve buscar sempre o encontro e a unidade, sem medo das diferenças. E o mesmo se diga da paz: deve ser cultivada mesmo nos terrenos áridos das contraposições, porque hoje, apesar de tudo, não há alternativa possível à paz. Não são as tréguas garantidas por muros e provas de força que trarão a paz, mas a vontade real de escuta e diálogo. Comprometemo-nos a caminhar, rezar e trabalhar, e imploramos que a arte do encontro prevaleça sobre as estratégias do conflito, que a ostentação de ameaçadores sinais de poder seja substituída pelo poder de sinais esperançosos: homens de boa vontade e de credos diferentes que não têm medo de se falar, acolher as razões alheias e cuidar uns dos outros. Só assim, tendo cuidado para que a ninguém falte o pão e o trabalho, a dignidade e a esperança, os gritos de guerra se transformarão em cânticos de paz.
Para se conseguir isto, é essencial que os detentores do poder se ponham, final e decididamente, ao serviço autêntico da paz e não dos interesses próprios. Basta com os lucros de poucos à custa da pele de muitos! Basta com as ocupações de terras que dilaceram os povos! Basta com fazer prevalecer verdades de parte sobre as esperanças da gente! Basta com usar o Médio Oriente para lucros alheios ao Médio Oriente.
A guerra é o flagelo que acomete tragicamente esta amada região. E as suas vítimas são sobretudo a gente humilde. Pensemos na martirizada Síria, em particular na província de Deraa. Lá recomeçaram duros combates que provocaram um número enorme de deslocados, expostos a tribulações terríveis. A guerra é filha do poder e da pobreza. Vence-se renunciando às lógicas de supremacia e erradicando a miséria. Muitos conflitos foram fomentados também por formas de fundamentalismo e fanatismo que, disfarçados sob pretextos religiosos, na realidade blasfemaram do nome de Deus, que é paz, e perseguiram o irmão que vive desde sempre ao seu lado. Mas a violência é sempre alimentada pelas armas. Não se pode levantar a voz para falar de paz, enquanto, às escondidas, se perseguem desenfreadas corridas ao rearmamento. É uma gravíssima responsabilidade, que pesa sobre a consciência das nações, em particular das mais poderosas. Não se esqueça o século passado, não se esqueçam as lições de Hiroshima e Nagasaki, não se transformem as terras do Oriente, onde nasceu o Verbo da paz, em escuras vastidões de silêncio. Basta com contraposições obstinadas; basta com a sede de lucro que passa por cima de todos para se apoderar de jazidas de gás e combustíveis, sem respeito pela casa comum nem escrúpulos pelo facto de ser o mercado da energia a ditar a lei da convivência entre os povos!
Para abrir sendas de paz, volte-se o olhar para o lado contrário, ou seja, para quem suplica poder conviver fraternalmente com os outros. Tutelem-se todas as presenças, e não apenas as maioritárias. Abra-se também no Médio Oriente a estrada para o direito à cidadania comum, estrada para um futuro renovado. Os próprios cristãos sejam, e são, cidadãos a todos os títulos, com direitos iguais.
Fortemente angustiados, mas nunca sem esperança, voltamos o olhar para Jerusalém, cidade para todos os povos, cidade única e sagrada para cristãos, judeus e muçulmanos de todo o mundo, cuja identidade e vocação devem ser preservadas, independentemente das várias disputas e tensões, e cujo status quo exige ser respeitado como foi deliberado pela Comunidade Internacional e repetidamente solicitado pelas comunidades cristãs da Terra Santa. Só uma solução negociada entre israelitas e palestinenses, firmemente desejada e favorecida pela Comunidade das Nações, poderá levar a uma paz estável e duradoura e garantir a coexistência de dois Estados para dois povos.
A esperança tem o rosto das crianças. Há anos que, no Médio Oriente, um número terrível de pequeninos chora mortes violentas em família e vê ameaçada a sua terra natal, restando-lhes muitas vezes como única perspectiva ter de fugir. Esta é a morte da esperança. Os olhos de demasiadas crianças passaram a maior parte da vida a ver escombros em vez de escolas, ouvir o estrondo surdo de bombas em vez da alegre algazarra dos jogos. Que a humanidade escute – peço-vos – o clamor das crianças, cuja boca proclama a glória de Deus (cf. Sl 8,3). É enxugando as suas lágrimas que o mundo reencontrará a dignidade.
Pensando nas crianças – não esqueçamos as crianças –, daqui a pouco faremos voar no ar, junto com algumas pombas, o nosso desejo de paz. O anseio de paz suba mais alto que todas as nuvens escuras. Os nossos corações permaneçam unidos e voltados para o Céu, à espera que torne, como nos tempos do dilúvio, o tenro ramo da esperança (cf. Gn 8, 11). E o Médio Oriente seja, já não um arco de guerra estendido entre os continentes, mas uma arca de paz acolhedora dos povos e dos credos. Querido Médio Oriente, desapareçam de ti as trevas da guerra, do poder, da violência, dos fanatismos, dos ganhos iníquos, da exploração, da pobreza, da desigualdade e do não-reconhecimento dos direitos. «Para ti, haja paz» (Sl 122,8) – juntos: «Para ti, haja paz» [repetem] –, em ti habite a justiça, sobre ti repouse a bênção de Deus. Amém.


Fonte: Santa Sé