Há cerca de 20 anos, para a Via
Sacra presidida pelo Papa João Paulo II na Sexta-feira Santa de 2001 junto ao
Coliseu, foram utilizadas as meditações escritas pelo Cardeal John Henry Newman
(1801-1890), por ocasião dos 200 anos do
seu nascimento.
O Cardeal Newman seria beatificado pelo Papa Bento XVI em
2010 e canonizado pelo Papa Francisco em 2019.
Seguem abaixo suas meditações
para a Via Sacra, que ilustramos com as 14 estações esculpidas por Arthur Eric
Rowton Gill para a Catedral do Preciosíssimo Sangue do Senhor em Londres, a Catedral de Westminster:
Departamento para as Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice
Via-Sacra no Coliseu presidida pelo Santo Padre João Paulo II
Sexta-feira Santa, 13 de abril de 2001
Oração inicial
Santo Padre: Em
nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo.
R. Amém.
Primeira Sexta-feira Santa do Terceiro Milênio. Caiu a
noite. Alta no céu brilha a lua. Os fiéis de Roma e inúmeros peregrinos se
reuniram para percorrer com Jesus o caminho da Cruz: o Coliseu, insigne
monumento do Império Romano, é agora Statio
Urbis et Orbis [1].
Via Crucis, caminho de solidariedade. Jesus, o Filho de Deus,
nascido de uma Mulher, é solidário com os seus irmãos, humanidade sofredora e
perdida: nos seus passos, o passo do exilado e do deportado, do homem
desiludido que vagueia incerto, o passo vacilante da criança, do enfermo, do
ancião, do condenado que se aproxima do patíbulo. Mas Jesus, caminhando para o
“lugar da Caveira”, conduz a humanidade para o esplendor da Glória.
Via Crucis, caminho discipular. Jesus, o único Mestre, disse: “Se
alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e me siga” (Mt 16,24). Siga-me sempre. Siga-me ao
Calvário. Junto à Cruz, de fato, estão a Mãe, a primeira discípula, e o
Discípulo amado. Subindo o Calvário, Jesus sabe que se dirige para a cátedra
suprema, para confirmar com o dom de Si o seu ensinamento: “Ninguém tem amor
maior do que aquele que dá sua vida pelos amigos” (Jo 15,13).
Via Crucis, caminho real
e sacerdotal. Jesus, consagrado pelo Espírito, é Rei e Sacerdote. No caminho do
Calvário, porém, não porta nenhuma insígnia real, nem endossa nenhuma veste
sacerdotal. Mesmo assim, sabe que inicia o seu Reino, da única forma possível
para ele: Ele reina com a força do amor. Agora inicia o seu Sacerdócio: o
Cordeiro manso e inocente oferece a Si mesmo, vítima de expiação pelos pecados
do mundo.
Via Crucis, caminho de esperança. No pôr-do-sol já está
presente a certeza da aurora. No entardecer da vida, Jesus está seguro do amor
do Pai, espera contra as evidências da “derrota”; está seguro que do ventre
escuro da terra ressurgirá qual “brilhante estrela da manhã” (Ap 22,16). Jesus sabe que, caminhando
para a morte, apressa o passo rumo à ressurreição.
Via Crucis, caminho de plenitude: de dor e de amor sem limites,
de total rebaixamento e de suprema exaltação; plenitude do Espírito, que flui
do lado aberto do Salvador, como torrente de vida e de graça; plenitude de
perdão e de misericórdia, de reconciliação e de paz. Hora do “forte grito” (Mc 15,37) e do silêncio do cosmo, que
chora a morte do seu Criador. Hora do amor obediente: “Pai, tudo está consumado”
(cf. Jo 19,30). Hora da cabeça
inclinada e do operante repouso. E, no coração da Mãe, hora de imensa piedade e
de ansiosa expectativa.
Deus todo-poderoso, fortifica-me com a tua força, consola-me
com a tua paz, ilumina-me com a beleza do teu Rosto, ilumina-me com a luz que
brota do teu incriado esplendor, purifica-me com o perfume da tua inefável
santidade, mergulha-me em ti para que eu beba da água viva que flui de ti, Pai
Santo, e do teu Filho e do teu co-eterno Amor.
Ó meu Senhor, tu és tudo para mim, só tu me bastas.
Ó meu Senhor Jesus, o teu Sangue basta para o mundo inteiro.
Tu bastas para mim e para toda a linhagem de Adão.
Ó meu Senhor Jesus, faz com que a tua Cruz baste para toda a
humanidade.
Faz com que seja eficaz. Faz que seja eficaz para mim mais
do que tudo, para evitar que eu tenha tudo em abundância sem levar nenhum fruto
à perfeição. Amém [2].
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Cruz da Catedral do Preciosíssimo Sangue - Londres |
I Estação: Jesus é condenado à morte
Do Evangelho segundo Mateus (Mt 27,22-23.26)
Pilatos perguntou: “Que farei com Jesus, que chamam de
Cristo?” Todos gritaram: “Seja crucificado!”. Pilatos falou: “Mas, que mal ele
fez?” Eles, porém, gritaram com mais força: “Seja crucificado!”. (...) Então
Pilatos soltou Barrabás, mandou flagelar Jesus, e entregou-o para ser
crucificado.
O Santo, Justo e Verdadeiro é julgado pelos pecadores e
condenado à morte. No entanto, enquanto o julgavam, eram compelidos a
absolvê-lo. Judas, que o traiu, disse: “Pequei, entregando sangue inocente” (Mt 27,4). Pilatos, que emitiu a
sentença, proclama: “Eu sou inocente do sangue deste justo” (Mt 27,24). O centurião, que o viu
crucificado, exclama: “Verdadeiramente este homem era justo!” (Lc 23,47).
Senhor, és sempre justo quando falas e vences quando és
julgado. Ainda mais no último dia, quando os homens “olharão para aqueles que
transpassaram” (cf. Zc 12,10; Jo 19,37). E Tu, condenado na fraqueza,
julgarás o mundo com poder, e mesmo aqueles que serão condenados reconhecerão
que foram julgados com justiça.
A ti, Jesus, justo Juiz, a honra e a glória pelos séculos
sem fim. Amém.
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I Estação: Jesus é condenado à morte (Catedral de Westminster) |