quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Ângelus: Cristo Rei - Ano B

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 25 de novembro de 2018

Bom dia, estimados irmãos e irmãs!
A Solenidade de Jesus Cristo Rei do universo, que celebramos hoje, é colocada no fim do Ano Litúrgico e recorda que a vida da criação não progride por acaso, mas procede rumo a uma meta final: a manifestação definitiva de Cristo, Senhor da história e de toda a criação. A conclusão da história será o seu reino eterno. O hodierno trecho evangélico (cf. Jo 18,33b-37) fala-nos deste reino, o reino de Cristo, o reino de Jesus, narrando a situação humilhante na qual se encontrou Jesus depois de ter sido preso no Getsêmani: amarrado, insultado, acusado e levado diante das autoridades de Jerusalém. Depois, foi apresentado ao procurador romano, como alguém que atenta ao poder público, para se tornar o rei dos judeus. Então Pilatos faz a sua investigação e num interrogatório dramático pergunta-lhe por duas vezes se Ele fosse um rei (cf. vv. 33b-37).

E Jesus desde o início responde que o seu reino «não é deste mundo» (v. 36). Em seguida afirma: «Tu dizes que eu sou rei» (v. 37). Observando toda a sua vida é evidente que Jesus não tem ambições políticas. Recordemos que depois da multiplicação dos pães, o povo entusiasmado pelo milagre, o teria proclamado rei, para derrubar o poder romano e restabelecer o reino de Israel. Mas para Jesus o reino é outra coisa, e não se realiza certamente com a revolta, a violência e a força das armas. Por isso retirou-se sozinho sobre o monte para rezar (cf. Jo 6,5-15). Depois, respondendo a Pilatos, evidencia que os seus discípulos não combateram para o defender. Diz: «Se o meu Reino fosse deste mundo, os meus súditos certamente teriam pelejado para que eu não fosse entregue aos judeus» (v. 36).

Jesus quer fazer compreender que acima do poder político há outro muito maior, que não se obtém com meios humanos. Ele veio à terra para exercer este poder, que é o amor, dando testemunho da verdade (v. 37). Trata-se da verdade divina que enfim é a mensagem essencial do Evangelho: «Deus é amor» (1Jo 4,8) e deseja estabelecer no mundo o seu reino de amor, justiça e paz. Este é o reino do qual Jesus é o rei e que se estende até ao fim dos tempos. A história ensina-nos que os reinos fundados no poder das armas e na prevaricação são frágeis e mais cedo ou mais tarde desabam. Mas o reino de Deus é fundado no seu amor e enraizado nos corações - o reino de Deus enraíza-se nos corações - conferindo a quem o acolhe paz, liberdade e plenitude de vida. Todos nós queremos paz, todos nós queremos liberdade e plenitude. E como se faz? Deixa que o amor de Deus, o reino de Deus, o amor de Jesus se enraíze no teu coração e terás paz, terás liberdade e plenitude.

Jesus hoje pede-nos para deixarmos que Ele se torne o nosso rei. Um rei que com a sua palavra, o seu exemplo e a sua vida imolada na cruz nos salvou da morte, e indica - este rei - o caminho ao homem perdido, dá luz nova à nossa existência marcada pela dúvida, pelo medo e pelas provações de todos os dias. Mas não devemos esquecer que o reino de Jesus não é deste mundo. Ele só poderá dar um sentido novo à nossa vida, às vezes posta a dura prova inclusive pelos nossos erros e pecados, se não seguirmos as lógicas do mundo e dos seus “reis”.

A Virgem Maria nos ajude a acolher Jesus como rei da nossa vida e a difundir o seu reino, dando testemunho da verdade que é o amor.


Fonte: Santa Sé.

XVI Catequese do Papa sobre os Mandamentos: Não cobiçarás

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 21 de novembro de 2018
Os Mandamentos (16): Não cobiçarás

Bom dia, prezados irmãos e irmãs!
Os nossos encontros sobre o Decálogo levam-nos hoje ao último mandamento. Ouvimo-lo na introdução. Estas não são as últimas palavras do texto, mas muito mais: são o cumprimento da viagem através do Decálogo, tocando o coração de tudo aquilo que nele nos é transmitido. Com efeito, vendo bem, não acrescentam um conteúdo novo: as indicações «não cobiçarás a mulher [...], nem coisa alguma que pertença ao teu próximo» estão pelo menos latentes nos mandamentos sobre o adultério e sobre o furto; então, qual é a função destas palavras? É um resumo? É algo mais?
Recordemos que todos os mandamentos têm a tarefa de indicar o confim da vida, o limite para além do qual o homem se destrói a si mesmo e ao próximo, danificando a sua relação com Deus. Se fores mais além, destruir-te-ás a ti mesmo, destruirás também a relação com Deus e o relacionamento com os outros. Os mandamentos indicam isto. Através desta última palavra põe-se em evidência o facto de que todas as transgressões nascem de uma comum raiz interior: os desejos maléficos. Todos os pecados nascem de um desejo maligno. Todos! É ali que o coração começa a mover-se; assim a pessoa entra naquela onda e acaba numa transgressão. Mas não numa transgressão formal, legal: numa transgressão que fere a si mesmo e ao próximo.
No Evangelho, o Senhor Jesus diz explicitamente: «É do interior do coração dos homens que procedem os maus pensamentos: devassidões, roubos, assassinatos, adultérios, cobiças, perversidades, fraudes, desonestidade, inveja, difamação, orgulho e insensatez. Todos estes vícios procedem de dentro e tornam impuro o homem» (Mc 7,21-23).
Portanto, compreendemos que todo o percurso feito pelo Decálogo não teria utilidade alguma, se não chegasse a alcançar este nível, o coração do homem. De onde nascem todas estas perversidades? O Decálogo mostra-se lúcido e profundo a tal propósito: o seu ponto de chegada - o último mandamento - é o coração; e se ele, se o coração não for libertado, o resto de nada serve. Eis o desafio: libertar o coração de todas estas perversidades. Os preceitos de Deus podem reduzir-se unicamente à bonita fachada de uma vida que, contudo, permanece uma existência de escravos, não de filhos. Frequentemente, por detrás da máscara farisaica da retidão asfixiante esconde-se algo de perverso e não resolvido.
Pelo contrário, devemos deixar-nos desmascarar por estes mandamentos sobre a cobiça, porque nos mostram a nossa pobreza, para nos levar a uma santa humilhação. Cada um de nós pode interrogar-se: mas quais desejos malvados tenho com frequência? A inveja, a cobiça, as tagarelices? Todos estes vícios que procedem de dentro. Cada um pode questionar-se, e isto far-lhe-á bem. O homem precisa desta bendita humilhação, aquela pela qual descobre que não se pode libertar sozinho, aquela pela qual clama a Deus para ser salvo. São Paulo explica-o de modo insuperável, referindo-se exatamente ao mandamento não cobiçarás (cf. Rm 7,7-24).
É inútil pensarmos que nos podemos corrigir a nós mesmos, sem o dom do Espírito Santo. É inútil pensarmos em purificar o nosso coração unicamente com o esforço titânico da nossa vontade: isto não é possível. É necessário abrir-se à relação com Deus, na verdade e na liberdade: só assim as nossas fadigas podem dar fruto, porque é o Espírito Santo que nos leva em frente.
A tarefa da Lei bíblica não consiste em iludir o homem que uma obediência literal o leva a uma salvação artificial e, de resto, inatingível. A tarefa da Lei consiste em conduzir o homem à sua verdade, ou seja, à sua pobreza, que se torna abertura autêntica, abertura pessoal à misericórdia de Deus, que nos transforma e nos renova. Deus é o único capaz de renovar o nosso coração, contanto que lhe abramos o coração: eis a única condição; Ele faz tudo, mas devemos abrir-lhe o coração.
As últimas palavras do Decálogo educam todos a reconhecer-se mendigos; ajudam a colocar-nos diante da desordem do nosso coração, para deixarmos de viver de modo egoísta e para nos tornarmos pobres de espírito, autênticos na presença do Pai, deixando-nos redimir pelo Filho e instruir pelo Espírito Santo. O Espírito Santo é o Mestre que nos guia: deixemo-nos ajudar. Sejamos mendigos, peçamos esta graça!
«Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos Céus!» (Mt 5,3). Sim, felizes aqueles que deixam de se iludir, julgando que se podem salvar da própria debilidade sem a misericórdia de Deus, a única que pode curar. Somente a misericórdia de Deus cura o coração. Ditosos aqueles que reconhecem os seus desejos malvados e, com um coração arrependido e humilhado, não se apresentam a Deus e aos outros homens como pessoas justas, mas como pecadores. É bonito o que Pedro disse ao Senhor: “Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um pecador”. Como é bonito este pedido: “Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um pecador”.
Estas pessoas sabem ter compaixão, misericórdia pelos outros, porque a experimentam em si mesmos.


Fonte: Santa Sé

sábado, 24 de novembro de 2018

Homilia: Solenidade de Cristo Rei - Ano B

Santo Agostinho
Do Tratado sobre o Evangelho de João
O Reino de Cristo até o fim do mundo

Meu reino não é deste mundo. Seu reino se estabelece aqui, mas somente até o fim do mundo. De fato, a ceifa é o fim do mundo, momento em que os ceifadores virão, a saber, os anjos, e arrancarão de seu reino todos os corruptores e perversos, o que não seria realizável se seu reino não estivesse aqui. Porém, não é daqui, porque está no mundo como peregrino. Por isso diz ao seu reino: Não sois do mundo, mas eu vos escolhi tirando-vos do mundo.

Portanto, eram do mundo, quando não eram seu reino, mas pertenciam ao príncipe do mundo. É, portanto, do mundo tudo aquilo que no homem é criado, sim, pelo Deus verdadeiro, mas foi gerado da viciada e condenada estirpe de Adão; e se converteu em reino, já não deste mundo, tudo o que a partir daquele momento foi regenerado em Cristo. Desta forma, Deus nos tirou do domínio das trevas, e nos transladou ao reino de seu querido Filho. Deste reino diz: Meu reino não é deste mundo, ou meu reino não é daqui.

Pilatos lhe disse: Então, tu és rei? Jesus respondeu: Tu o dizes: Eu sou rei. E na continuação acrescentou: Para isto nasci e para isto vim ao mundo, para dar testemunho da verdade. De onde se deduz claramente que aqui se refere ao seu nascimento no tempo quando, encarnado, veio ao mundo, não àquele outro sem princípio pelo qual era Deus, e por meio do qual o Pai criou o mundo. Para isto disse ter nascido, ou seja, esta é a razão de seu nascimento, e para isto veio ao mundo – nascendo certamente de uma virgem –, para ser testemunha da verdade. Mas como a fé não é de todos, acrescentou e disse: Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz.

 Escuta a minha voz, porém, com os ouvidos interiores, ou seja, obedece a minha voz, o que equivale a dizer: Crê em mim. Sendo Cristo, portanto, testemunha da verdade, realmente dá testemunho de si mesmo. Esta afirmação é realmente sua: Eu sou a verdade. E em outro lugar diz também: Eu dou testemunho de mim mesmo. E quanto ao que acrescenta: Todo aquele que é da verdade, escuta a minha voz, refere-se à graça com que chama aos predestinados.

Pilatos lhe disse: E o que é a verdade? E não esperou para escutar a resposta, mas, dito isto, saiu outra vez aonde os judeus se encontravam e lhes disse: Eu não encontro nele culpa alguma. Suponho que, quando Pilatos perguntou: O que é a verdade?, imediatamente lhe veio à memória o costume dos judeus de que pela Páscoa colocassem um preso em liberdade, e, por isso não deu tempo a Jesus para que respondesse o que é a verdade, a fim de não perder tempo ao recordar o costume que podia ser um álibi para pô-lo em liberdade em razão da Páscoa. Pois não existe dúvida de que o desejava ardentemente, mas não conseguiu afastar de seu pensamento a ideia de que Jesus era o rei dos judeus, como se ali - como ele o fez no título da cruz - a própria Verdade o tivesse cravado, essa verdade da qual ele havia perguntado o que era.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 511-512. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Para ler uma homilia de São Cirilo de Alexandria para esta Solenidade, clique aqui.

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Catequese do Papa João Paulo II sobre a Temperança

Concluímos com esta postagem a série das primeiras Catequeses do Papa João Paulo II, refletindo sobre as virtudes fundamentais. Hoje recordamos os 40 anos da catequese sobre a temperança:

Papa João Paulo II
Audiência Geral
Quarta-feira, 22 de novembro de 1978
A virtude da temperança

1. Na sucessão das audiências do meu ministério pontifício, procurei executar o "testamento" do meu estimado Predecessor João Paulo I. Como é sabido, ele não deixou testamento escrito, porque a morte o arrebatou inesperada e improvisamente, mas deixou alguns apontamentos de que se conclui ter-se proposto, nos primeiros encontros das quartas-feiras, falar dos princípios fundamentais da vida cristã, ou seja, das três virtudes teologais - e isto teve tempo de o realizar - e depois das quatro virtudes cardeais - isto o está fazendo o seu indigno sucessor. Hoje é a vez de falar da quarta virtude cardeal, a "temperança", acabando de cumprir assim, dalgum modo, o programa de João Paulo I, programa em que pode ver-se como que um testamento do Pontífice falecido.
2. Quando falamos das virtudes - não só das cardeais, mas de todas e cada uma das virtudes - devemos conservar sempre diante dos olhos o homem real, o homem concreto. A virtude não é alguma coisa de abstrato, separado da vida, mas, pelo contrário, tem profundas "raízes" na vida mesma, dela brota, é ela que forma. A virtude incide na vida do homem, nas suas ações e no seu comportamento. Disto resulta que, em todas estas nossas reflexões, não falamos tanto da virtude quanto do homem que vive e procede "virtuosamente"; falamos do homem prudente, justo, corajoso e, por fim, hoje exatamente, falamos do homem "temperante" (ou "sóbrio").
Acrescentemos imediatamente que todos estes atributos, ou melhor atitudes do homem, provenientes de cada uma das virtudes cardeais, estão entre si conexas. Não se pode, por conseguinte, ser homem verdadeiramente prudente, nem autenticamente justo, nem realmente forte, se não se tem ainda a virtude da temperança. Pode-se dizer que esta virtude condiciona indiretamente todas as outras virtudes; mas deve-se dizer também que todas as outras virtudes são indispensáveis para que o homem possa ser "temperante" (ou "sóbrio").
3. O próprio vocábulo "temperança" parece em certo modo referir-se ao que está "fora do homem". Dizemos, de facto, que temperante é aquele que não abusa de alimentos, de bebidas e de prazeres, que não toma imoderadamente bebidas alcoólicas, não se priva da consciência pelo uso de estupefacientes, etc. Esta referência a elementos externos ao homem tem contudo a sua base dentro do homem. É como se em cada um de nós existisse um "eu superior" e um "eu inferior". No nosso "eu inferior" exprime-se o nosso "corpo" e tudo o que lhe pertence: as suas carências, os seus desejos, as suas paixões de natureza prevalentemente sensual. A virtude da temperança garante a cada homem o domínio do "eu superior" sobre o "eu inferior". Temos aqui humilhação do nosso corpo? ou diminuição? Pelo contrário, este domínio valoriza o corpo. A virtude da temperança leva o corpo e os nossos sentidos a encontrarem o justo lugar que lhes pertence no nosso ser humano.
O homem temperante é aquele que é senhor de si mesmo. Aquele em que as paixões não tornam a supremacia sobre a razão, sobre a vontade e também sobre o "coração". O homem que sabe dominar-se a si mesmo! Se assim é, facilmente nos damos conta do valor fundamental e radical que tem a virtude da temperança. É absolutamente indispensável, para que o homem "seja" plenamente homem. Basta reparar em alguém que, arrastado pelas suas paixões, delas se torna "vítima", renunciando ele próprio ao uso da razão (como, por exemplo, um alcoolizado, um drogado). Verificamos então com evidência que "ser homem" significa respeitar a própria dignidade e, por isso, em particular deixar-se guiar pela virtude da temperança.
4. Esta virtude é chamada também "sobriedade". E é bem justo chamá-la assim! De facto, para podermos dominar as paixões - a concupiscência da carne, as explosões da sensualidade (por exemplo nas relações com o outro sexo) etc., devemos não ultrapassar o justo limite que se põe a nós próprios e ao nosso "eu inferior". Se não respeitamos este justo limite, não seremos capazes de dominar-nos. Não quer isto dizer que o homem virtuoso, sóbrio, não possa ser "espontâneo", não possa gozar, não possa chorar, não possa manifestar os próprios sentimentos, isto é, não significa que deva tornar-se insensível, "indiferente", como se fosse de gelo ou de pedra. Não, de nenhum modo! Basta olharmos para Jesus e convencer-nos-emos. A moral cristã nunca se identificou com a estoica. Pelo contrário, considerando toda a riqueza dos afetos e das emotividades de que é dotado cada homem - cada um aliás de modo diverso: dum modo o homem, doutro a mulher por causa da sensibilidade de cada um - é necessário reconhecer que o homem não pode chegar a esta espontaneidade madura, senão através de um trabalho intenso sobre si mesmo e uma especial "vigilância" sobre todo o seu comportamento. Nisto está de facto a virtude da "temperança", da "sobriedade".
5. Julgo que esta virtude exige de cada um de nós uma especial humildade quanto aos dons que Deus colocou na nossa natureza humana. Diria, "a humildade do corpo" e a "do coração". Esta humildade é condição necessária para a "harmonia" interior do homem: para a beleza "interior" do homem. Cada um reflita bem neste ponto, em especial reflitam os jovens, e mais ainda as jovens, na idade em que tanto se tem a peito ser belo ou bela, para agradar aos outros! Recordemo-nos que o homem deve ser belo sobretudo interiormente. Sem esta beleza, todos os esforços que tenham em vista só o corpo não farão - nem dele nem dela - uma pessoa verdadeiramente bela.
E não é, por sinal, precisamente o corpo que sofre prejuízos sensíveis e muitas vezes até notáveis quanto à saúde, se falta ao homem a virtude da temperança, da sobriedade? A este propósito, muito poderiam dizer as estatísticas e as fichas clínicas de todos os hospitais do mundo. Disso possuem também grande experiência os médicos ocupados nos consultórios, a quem muitas vezes se dirigem noivos e jovens em geral. É verdade que não podemos julgar a virtude baseando-nos exclusivamente no critério da saúde psicofísica, abundam todavia as provas de a falta da virtude da temperança, da sobriedade, vir a prejudicar a saúde.
6. É preciso que eu termine aqui, embora esteja convencido de este assunto ficar mais interrompido do que esgotado. Talvez um dia se apresente a ocasião de a ele voltar.
Por agora, basta isto.
Deste modo procurei, como pude, executar o testamento de João Paulo I.
Rogo-lhe que peça por mim, quando tiver de passar a outros assuntos durante as audiências da quarta-feira.



Fonte: Santa Sé

Os Papas pré-conciliares e a reforma litúrgica

A contribuição dos Papas pré-conciliares na reforma litúrgica
05 de novembro de 2018

Temos dedicado diversos programas deste nosso espaço ao tema da reforma litúrgica trazida pelo Concílio Vaticano II, que como disse em agosto de 2017 o Papa Francisco aos participantes da Semana Litúrgica Nacional italiana, “é irreversível”. Já ressaltamos aqui, que a reforma litúrgica não se deu de um dia para outro, como se tivesse acontecido um Pentecostes tão somente no Concílio Vaticano II, mas houve um tempo de longa preparação, motivados pelos movimentos de renovação litúrgica, pelos teólogos, liturgistas e também pelas reformas dos Papas anteriores ao Concílio, como Pio X, Pio XI e Pio XII.  E justamente a contribuição destes Pontífices, é o tema de nosso programa de hoje. Padre Gerson Schmidt:
Importante recordar o mérito do Papa Pio X, que na reforma da música sacra, no Motu Proprio tra le Sollectudini (1903), já defende o conceito de participação ativa dos fiéis. Lembramos que Pio X também introduziu as reformas do Breviário, promoveu a comunhão cotidiana e também antecipou a Primeira Eucaristia para as crianças. Se hoje as crianças de 9 anos em diante fazem a Primeira Comunhão, se deve a esse Papa Pio X o mérito de antecipar a Eucaristia, através dos decretos Sacra Tridentina Synodus(1905) e Quam Singulari(1910).
Já o Papa Pio XI, na Constituição Apostólica Divinus Cultus sanctitatem (1928), pediu com mais vigor a participação ativa dos fiéis nos mistérios cristãos.  Nessa Constituição Apostólica se diz assim no número IX: “A fim de que os fiéis tomem parte mais ativa no culto divino, restitua-se para o povo o uso do canto gregoriano, no que ao povo tocar. É necessário, na verdade, que os fiéis, não como estranhos ou mudos espectadores, mas verdadeiramente compreendedores e compenetrados da beleza da Liturgia, assistam às sagradas funções de tal modo que alternem a sua voz - segundo as devidas normas e instruções, mesmo em procissões e outros momentos solenes -, com a voz do sacerdote e a do coro. Porque, se isto felizmente suceder, não haverá já mais que lamentar esse triste espetáculo em que o povo nada responde, ou apenas responde com um murmúrio fraco e confuso às orações mais comuns expressas na língua litúrgica e até em língua vulgar”.
É verdadeiramente fantástica essa preocupação papal da compreensão e participação dos fiéis na Liturgia. Nesse documento Pio XI fazia menção do movimento de renovação litúrgica e de Pio X, recordando o esforço feito até então para uma maior “participação ativa dos fiéis nos sacrossantos mistérios e na oração solene da Igreja”. 
Pio XI ainda falou assim nesse documento: “nas disposições de Pio X se logrou a restauração das mais diletas formas de arte e o consolador reflorescimento do espírito religioso, já que o povo cristão, compenetrado por um mais profundo sentimento litúrgico, começou a tomar parte mais ativa no rito eucarístico, na oração pública e na salmodia”. Aqui o Papa Pio XI já reconhece uma maior participação do povo cristão na Liturgia: “(o povo) começou a tomar parte mais ativa no rito eucarístico, na oração pública e na salmodia”.
O movimento litúrgico, como toda a renovação na Igreja, tinha seus oponentes. Até hoje eles existem. A Magna Charta que dá força ao Movimento Litúrgico é a encíclica Mediator Dei, de Pio XII (1939-1958), que vai dar ao movimento litúrgico um caráter eclesial, a partir do magistério ordinário. O Sumo Pontífice institui, em 1948, 15 anos antes do Concilio, uma comissão para a Reforma Litúrgica.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Divina Liturgia Ucraniana em Nápoles

No último dia 18 de novembro o Arcebispo-Maior da Igreja Greco-Católica Ucraniana, Dom Sviatoslav Shevchuk, celebrou uma Divina Liturgia na Catedral de Nápoles com a comunidade católica ucraniana na Itália em memória dos 85 anos do Holodomor.

Procissão de entrada

Acolhida do Arcebispo de Nápoles, Cardeal Sepe
Arcebispo abençoa os fiéis

Ângelus: XXXIII Domingo do Tempo Comum - Ano B

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 18 de novembro de 2018

Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
No trecho do Evangelho deste domingo (Mc 13,24-32), o Senhor quer instruir os seus discípulos sobre os acontecimentos futuros. Em primeiro lugar, não é um discurso sobre o fim do mundo mas, ao contrário, o convite a viver bem o presente, a estarmos vigilantes e sempre prontos para quando formos chamados a prestar contas da nossa vida. Jesus diz: «Naqueles dias, depois dessa tribulação, o sol ficará escuro, a lua não refletirá o seu esplendor; cairão os astros do céu» (vv. 24-25). Estas palavras fazem-nos pensar na primeira página do Livro do Gênesis, a narração da criação: o sol, a lua, os astros, que desde os primórdios do tempo brilham na sua ordem e transmitem luz, sinal de vida, aqui são descritos na sua decadência, enquanto precipitam na escuridão e no caos, sinal do fim. Pelo contrário, a luz que há de resplandecer naquele último dia será única e nova: será a do Senhor Jesus, que virá na glória com todos os santos. Naquele encontro veremos finalmente o seu Rosto na plena luz da Trindade; um Rosto resplandecente de amor, diante do qual também cada ser humano aparecerá na verdade total.

A história da humanidade, assim como a de cada um de nós, não pode ser entendida como uma simples sucessão de palavras e de acontecimentos sem sentido. Também não pode ser interpretada à luz de uma visão fatalista, como se tudo já estivesse preestabelecido, segundo um destino que subtrai todo o espaço de liberdade, impedindo que se façam escolhas que sejam fruto de uma verdadeira decisão. Pelo contrário, no Evangelho de hoje, Jesus diz que a história dos povos e dos indivíduos tem um fim e uma meta a alcançar: o encontro definitivo com o Senhor. Não conhecemos o tempo nem as modalidades como isto acontecerá; o Senhor reiterou que «ninguém o sabe, nem os anjos do céu, nem sequer o Filho» (v. 32); tudo está conservado no segredo do mistério do Pai. Todavia, conhecemos um princípio fundamental, com o qual nos devemos confrontar: «O céu e a terra passarão - diz Jesus - mas as minhas palavras não passarão» (v. 31). Eis o verdadeiro ponto crucial. Naquele dia, cada um de nós deverá compreender se a Palavra do Filho de Deus iluminou a própria existência pessoal, ou se lhe virou as costas, preferindo confiar nas próprias palavras. Será mais do que nunca o momento no qual abandonar-nos definitivamente ao amor do Pai e confiar-nos à sua misericórdia.

Ninguém pode evitar este momento, nenhum de nós! Já não servirá a astúcia, que muitas vezes inserimos nos nossos comportamentos, para acreditar a imagem que queremos oferecer; do mesmo modo, já não poderá ser usado o poder do dinheiro e dos meios económicos, com os quais pretendemos, com presunção, comprar tudo e todos. Só disporemos daquilo que realizamos nesta vida, acreditando na sua Palavra: o tudo e o nado daquilo que vivemos ou que deixamos de fazer. Só levaremos conosco o que doarmos.

Invoquemos a intercessão da Virgem Maria, para que a constatação da nossa provisoriedade na terra e do nosso limite não nos faça afundar na angústia, mas nos chame à responsabilidade em relação a nós mesmos, ao próximo e a todo o mundo.


Fonte: Santa Sé.

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Fotos da Festa da Dedicação da Basílica de São Pedro

No último dia 18 de novembro o Papa Francisco celebrou a Santa Missa na Basílica de São Pedro por ocasião da Solenidade do aniversário de sua dedicação. Na mesma ocasião se celebrou o chamado "Dia Mundial dos Pobres".

O Santo Padre foi assistido pelos Monsenhores Guido Marini e Massimiliano Matteo Boiardi. O livreto da celebração pode ser visto aqui.

Para ler a homilia do Papa, clique aqui.

Procissão de entrada
Ósculo do altar
Incensação

Ritos iniciais

Homilia do Papa: Dedicação da Basílica de São Pedro

Santa Missa na Solenidade da Dedicação da Basílica de São Pedro
Homilia do Papa Francisco
Basílica Vaticana
Domingo, 18 de novembro de 2018

Debrucemo-nos sobre três ações que Jesus realiza no Evangelho (Mt 14,22-33).

A primeira. Em pleno dia, deixa... deixa a multidão na hora do sucesso, quando era aclamado por ter multiplicado os pães. E os discípulos queriam gozar do triunfo, mas Jesus obrigou-os imediatamente a partir, enquanto Ele despede a multidão (vv. 22-23). Procurado pelo povo, retira-Se sozinho; quando tudo se apresentava «em descida», Ele sobe ao monte para rezar. Depois, no coração da noite, desce do monte e vai ter com os Seus, caminhando sobre as águas agitadas pelo vento. Em tudo isto, Jesus vai contracorrente: primeiro deixa o sucesso, depois a tranquilidade. Ensina-nos a coragem de deixar: deixar o sucesso que ensoberbece o coração, e a tranquilidade que adormece a alma.

Para ir... aonde? A Deus, rezando, e a quem tem necessidade, amando. São os verdadeiros tesouros da vida: Deus e o próximo. Subir até Deus e descer até aos irmãos: eis a rota indicada por Jesus. Subtrai-nos, assim, à tendência de nos apascentarmos calmamente nas cómodas planícies da vida, de deixar correr ociosamente a vida por entre as pequenas satisfações do dia-a-dia. Os discípulos de Jesus não estão feitos para a previsível tranquilidade duma vida normal. Como o Senhor Jesus, vivem o seu caminho, leves, prontos a deixar as glórias do momento, atentos a não se apegar aos bens que passam. O cristão sabe que a sua pátria não é aqui, sabe - como recorda o Apóstolo Paulo na 2ª Leitura - que já é «concidadão dos santos e membro da casa de Deus» (Ef 2,19). É um ágil viandante da existência. Não vivemos para acumular: a nossa glória está em deixar o que passa, para guardarmos aquilo que permanece. Peçamos a Deus a graça de nos assemelharmos à Igreja descrita na primeira Leitura: sempre em movimento, especialista no deixar e fiel no servir (At 28,11-14). Despertai-nos, Senhor, da calmaria ociosa, da bonança tranquila dos nossos portos seguros. Desligai-nos das amarras da autorreferencialidade que atulham a vida, libertai-nos da busca dos nossos sucessos. Ensinai-nos, Senhor, a saber deixar, para orientar a rota da vida pela tua: rumo a Deus e ao próximo.

A segunda ação: em plena noite, Jesus encoraja. Vai ter com os Seus, submersos na escuridão, caminhando «sobre o mar» (Mt 14,25). Na realidade, tratava-se de um lago; mas naquele tempo o mar, com a profundidade dos seus abismos tenebrosos, evocava as forças do mal. Por outras palavras, Jesus vai ao encontro dos Seus, calcando os inimigos malignos do homem. Tal é o significado deste sinal: não uma manifestação celebrativa de força, mas a revelação, que nos é feita, da certeza tranquilizadora de que Jesus, só Ele, Jesus, vence os nossos grandes inimigos: o diabo, o pecado, a morte, o medo, o mundanismo. Hoje, Ele diz também a nós: «Tranquilizai-vos! Sou Eu! Não temais!» (v. 27).

A barca da nossa vida vê-se, frequentemente, balanceada pelas ondas e sacudida pelos ventos; e, se as águas por vezes estão calmas, não tardam a agitar-se. Então irritamo-nos com as tempestades do momento, como se fossem os nossos únicos problemas. Mas o problema não é a tempestade presente, mas o modo como navegar na vida. O segredo de bem navegar é convidar Jesus a subir para bordo. O leme da vida deve ser dado a Ele, para que seja Jesus a traçar a rota. Com efeito, só Ele dá vida na morte, e esperança na dor; só Ele cura o coração com o perdão, e liberta do medo com a confiança. Convidemos, hoje, Jesus a subir para a barca da vida. Como os discípulos, experimentaremos que, com Ele a bordo, amainam os ventos (v. 32) e nunca sofremos naufrágio. Com Ele a bordo, nunca sofremos naufrágio. E só com Jesus é que nos tornamos capazes também de encorajar. Há uma grande necessidade de pessoas que saibam consolar, não com palavras vazias, mas com palavras de vida, com gestos de vida. No nome de Jesus, encontramos e oferecemos verdadeira consolação: não são os encorajamentos formais e previstos que restauram, mas a presença de Jesus. Encorajai-nos, Senhor! Consolados por Vós, seremos verdadeiros consoladores para os outros.

E a terceira ação de Jesus: no meio da tempestade, estende a mão (v. 31). Agarra Pedro que, assustado, duvidara e, afundando, gritou: «Salva-me, Senhor!» (v. 30). Podemos colocar-nos no lugar de Pedro: somos pessoas de pouca fé e estamos aqui a mendigar a salvação. Somos pobres de vida verdadeira, e serve-nos a mão estendida do Senhor que nos tire fora do mal. Isto é o início da fé: esvaziar-se da orgulhosa convicção de nos julgarmos em ordem, capazes, autónomos, para nos reconhecermos necessitados de salvação. A fé cresce neste clima, um clima ao qual nos adaptamos convivendo com quantos não se colocam no pedestal, mas precisam e pedem ajuda. Por isso é importante, para todos nós, viver a fé em contato com os necessitados. Não é uma opção sociológica, não é a moda dum pontificado, mas exigência teológica. É reconhecer-se mendigos de salvação, irmãos e irmãs de todos, mas especialmente dos pobres, prediletos do Senhor. Assim bebemos do espírito do Evangelho: «o espírito de pobreza e de caridade - diz o Concílio - são a glória e o testemunho da Igreja de Cristo» (Constituição Pastoral Gaudium et spes, n. 88).

Jesus ouviu o grito de Pedro. Peçamos a graça de ouvir o grito de quem vive em águas borrascosas. O grito dos pobres: é o grito estrangulado de bebês que não podem vir à luz, de crianças que padecem a fome, de adolescentes habituados ao fragor das bombas em vez de o ser à algazarra alegre dos jogos. É o grito de idosos descartados e deixados sozinhos. É o grito de quem se encontra a enfrentar as tempestades da vida sem uma presença amiga. É o grito daqueles que têm de fugir, deixando a casa e a terra sem a certeza dum refúgio. É o grito de populações inteiras, privadas inclusive dos enormes recursos naturais de que dispõem. É o grito dos inúmeros Lázaros que choram, enquanto poucos epulões se banqueteiam com aquilo que, por justiça, é para todos. A injustiça é a raiz perversa da pobreza. O grito dos pobres torna-se mais forte de dia para dia, mas de dia para dia é menos ouvido. De dia para dia é mais forte aquele grito, mas de dia para dia é menos ouvido, porque abafado pelo barulho de poucos ricos, que são sempre menos e sempre mais ricos.

Perante a dignidade humana espezinhada, muitas vezes fica-se de braços cruzados ou então abanam-se os braços, impotentes diante da força obscura do mal. Mas o cristão não pode ficar de braços cruzados, indiferente, nem de braços a abanar, fatalista! Não... O crente estende a mão, como Jesus faz com ele. Junto de Deus, o grito dos pobres encontra guarida. Pergunto: E em nós? Temos olhos para ver, ouvidos para escutar, mãos estendidas para ajudar, ou vamos repetindo «volta amanhã»? «Nos pobres, o próprio Cristo como que apela em alta voz para a caridade dos seus discípulos» (ibid.). Pede-nos para O reconhecermos em quem tem fome e sede, é forasteiro e está privado de dignidade, doente e encarcerado (Mt 25,35-36).

O Senhor estende a mão: é um gesto gratuito, não devido. É assim que se faz. Não somos chamados a fazer bem só a quem nos ama. Retribuir é normal, mas Jesus pede para ir mais longe (Mt 5,46): dar a quem não tem para restituir, isto é, amar gratuitamente (Lc 6,32-36). Consideremos os nossos dias: entre as muitas coisas que fazemos, alguma é de graça? Fazemos algo por quem não tem com que retribuir? Tal há de ser a nossa mão estendida, a nossa verdadeira riqueza no céu.

Estendei-nos a mão, Senhor, e agarrai-nos. Ajudai-nos a amar como Vós amais. Ensinai-nos a deixar o que passa, a encorajar quem vive ao nosso lado, a dar gratuitamente a quem está necessitado. Amém.


Fonte: Santa Sé.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

XV Catequese do Papa sobre os Mandamentos: Não levantar falso testemunho

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 14 de novembro de 2018
Os Mandamentos (15): Não levantar falso testemunho

Bom dia, queridos irmãos e irmãs!
Na catequese de hoje abordaremos a oitava Palavra do Decálogo: «Não levantarás falso testemunho contra o teu próximo».
Este mandamento - reza o Catecismo - «proíbe falsificar a verdade nas relações com outrem» (n. 2.464). Viver de comunicações não autênticas é grave, porque impede os relacionamentos e, por conseguinte, também o amor. Onde há mentira não há amor, não pode haver amor. E quando falamos de comunicação entre as pessoas, entendemos não apenas as palavras, mas inclusive os gestos, as atitudes, até os silêncios e as ausências. Uma pessoa fala com tudo aquilo que é e que faz. Todos nós estamos em comunicação, sempre. Todos nós vivemos comunicando e estamos continuamente em equilíbrio entre a verdade e a mentira.
Mas o que significa dizer a verdade? Significa ser sincero? Ou exato? Na realidade, isto não é suficiente, porque podemos estar sinceramente em erro, ou podemos ser exatos no detalhe, mas não entender o sentido do conjunto. Às vezes justificamo-nos dizendo: “Mas eu disse o que sentia!”. Sim, mas absolutizaste o teu ponto de vista. Ou então: “Eu simplesmente disse a verdade!”. Talvez, mas revelaste dados pessoais ou reservados. Quantas bisbilhotices destroem a comunhão por inoportunidade ou falta de delicadeza! Aliás, os mexericos matam, e quem o disse foi o Apóstolo Tiago na sua Carta. Os tagarelas, as tagarelas são pessoas que matam: matam o próximo, porque a língua mata como uma facada. Estai atentos! Um bisbilhoteiro ou uma bisbilhoteira é um terrorista, pois com a sua língua lança a bomba e vai embora tranquilo, mas aquilo que diz aquela bomba lançada destrói a reputação de outrem. Não vos esqueçais: mexericar significa matar.
Mas então: o que é a verdade? Eis a pergunta formulada por Pilatos, precisamente quando Jesus, diante dele, realizava o oitavo mandamento (cf. Jo 18,38). Com efeito, as palavras «Não levantarás falso testemunho contra o teu próximo» pertencem à linguagem forense. Os Evangelhos culminam na narração da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus; e esta é a narração de um processo, da execução da sentença e de uma consequência inaudita.
Interrogado por Pilatos, Jesus diz: «Foi para dar testemunho da verdade que nasci e vim ao mundo: para dar testemunho da verdade» (Jo 18,37). E Jesus dá este «testemunho» mediante a sua Paixão e Morte. O Evangelista Marcos narra que «o centurião que estava diante de Jesus, ao ver que Ele tinha expirado assim, disse: “Este homem era realmente o Filho de Deus!”» (15,39). Sim, porque era coerente, foi coerente: com esse seu modo de morrer, Jesus manifesta o Pai, o seu amor misericordioso e fiel.
A verdade encontra a sua plena realização na própria pessoa de Jesus (cf. Jo 14,6), no seu modo de viver e de morrer, fruto da sua relação com o Pai. Ele, Ressuscitado, oferece também a nós esta existência de filhos de Deus, enviando o Espírito Santo, que é Espírito de verdade, o qual confirma ao nosso coração que Deus é nosso Pai (cf. Rm 8,16).
Em cada um dos seus gestos, o homem, as pessoas afirmam ou negam esta verdade. Desde as pequenas situações diárias até às escolhas mais exigentes. Mas é a mesma lógica, sempre: aquele que os pais e os avós nos ensinam, quando nos dizem para não mentir.
Questionemo-nos: quais obras, palavras e escolhas de nós cristãos comprovam a verdade? Cada um pode perguntar-se: sou uma testemunha da verdade, ou sou mais ou menos um mentiroso disfarçado de verdadeiro? Cada qual se interrogue. Nós cristãos não somos homens e mulheres extraordinários. No entanto, somos filhos do Pai celestial, que é bom e não nos desilude, instilando no nosso coração o amor pelos irmãos. Esta verdade não se diz tanto com discursos, é um modo de existir, uma maneira de viver, que se vê em cada gesto (cf. Tg 2,18). Este homem é verdadeiro, aquela mulher é verdadeira: vê-se! Mas como, se não abre a boca? Contudo, comporta-se como verdadeiro, como verdadeira. Diz a verdade, age de modo verdadeiro. Um bom modo de vivermos!
A verdade é a maravilhosa revelação de Deus, da sua Face de Pai, é o seu amor ilimitado. Esta verdade corresponde à razão humana mas supera-a infinitamente, porque constitui um dom que desceu sobre a terra e se encarnou em Cristo Crucificado e Ressuscitado; ela é revelada por quem lhe pertence e tem as suas mesmas atitudes.
Não levantarás falso testemunho significa viver como filho de Deus, que nunca, nunca se desmente, jamais diz mentiras; viver como filhos de Deus, deixando sobressair em cada gesto esta grande verdade: que Deus é Pai e que podemos confiar n’Ele. Eu confio em Deus: esta é a grande verdade. Da nossa confiança em Deus, que é Pai e me ama, nos ama, nasce a minha verdade, o ser verdadeiro e não mentiroso.


Fonte: Santa Sé

Os teólogos da reforma litúrgica


Continuando os textos do site Vatican News sobre a reforma litúrgica do Concílio Vaticano II, publicamos hoje duas reflexões sobre os teólogos da reforma litúrgica:

19 de setembro de 2018

Damos continuidade neste nosso espaço memória histórica ao tema da reforma litúrgica, que encontrou sua expressão máxima com a Constituição Sacrosanctum Concilum do Concílio Vaticano II. O objetivo desta reforma era de que o texto e as cerimônias deveriam ser ordenadas de tal modo, que exprimissem mais claramente as coisas santas que eles significam e que o povo cristão pudesse compreendê-las facilmente, participando, à medida do possível, plena e ativamente da celebração comunitária.
No programa desta quarta-feira, padre Gerson Schmidt, incardinado na arquidiocese de Porto Alegre - que tem nos acompanhado neste percurso dos documentos conciliares – nos fala sobre os teólogos que fomentaram a reforma litúrgica: 
A reforma litúrgica não se deu de um dia para outro, como se tivesse acontecido um Pentecostes tão somente no Concilio Vaticano II. Houve um tempo de longa preparação, motivados pelos movimentos de renovação litúrgica, pelos teólogos, liturgistas e também pelas reformas dos papas anteriores ao concilio: Pio X, Pio XI e Pio XII.
A Constituição Sacrosantum Concilium, portanto, não caiu do céu, mas é fruto de todo um clamor que vinha dos novos tempos, da nova compreensão da liturgia, motivada pelos centros teológicos, que fomentaram os princípios contidos na SC.  Anselm Schott, por exemplo, tinha publicado em 1884 um Missal popular, das formas de participação do povo, que teve grande difusão nos anos sucessivos.
Em 1909, em Malines, por ocasião do Katholikentag (palavra alemã, que se traduz por “dia do Católico”), o bispo Lambert Beauduin (+1960) defendeu o fortalecimento da Liturgia celebrada com a participação do povo. Esse encontro de Malines assinalou o início do movimento litúrgico no século XX, encontrando eco na Holanda, Bélgica, Itália e França [1].  O movimento litúrgico foi particularmente ativo nos países de língua alemã.
Os grandes teólogos desse movimento litúrgico foram Odo Casel, OSB (+1948) e Romano Guardini (+1968). Guardini já havia escrito, durante a I Guerra Mundial (1914-1918) a sua obra magistral intitulada “O Espírito da Liturgia”, que terá uma influência enorme nessa reforma. Bento XVI foi aluno e admirador confesso de Romano Guardini.
O destino realmente singular de Romano Guardini é o fato de ter sido uma espécie de ‘mestre’ para nada menos do que três papas. Paulo VI promoveu pessoalmente as suas primeiras traduções a partir do pequeno livro La coscienza, que aconselhava aos seus estudantes da Federação das Universidades Católicas Italianas. Bento XVI se percebe até mesmo como uma espécie de discípulo espiritual e intelectual do grande pensador. Finalmente, o Papa Francisco passou alguns meses na Alemanha para ler e estudar Guardini....
O primeiro teólogo da Liturgia que se ocupou da celebração enquanto tal foi Odo Casel (1948), pioneiro também por oferecer uma reflexão do culto cristão sobre bases direta e primariamente teológicas. Para ele a celebração é uma epifania, uma manifestação do divino na ação ritual (...), o elemento principal do ato celebrativo é a presença-atualização da salvação na ação sagrada e ritual, na qual intervém a prece da Igreja (...). A ação sagrada é imitação simbólica do agir divino (mimésis), mas ao contrário do que ocorre na celebração das religiões naturalistas, apoia-se numa palavra pronunciada como anúncio da intervenção divina (Palavra de Deus) e na súplica que se seguiu como resposta à proclamação [2].
Odo Casel preparou terreno para a Teologia do Mistério Pascal e Romano Guardini, entre os tesouros, a ideia fundamental da Igreja como Corpo Místico, ambos conceitos contemplados e valorizados nos documentos do Concílio Vaticano II”.

sábado, 17 de novembro de 2018

Homilia: XXXIII Domingo do Tempo Comum - Ano B

Santo Efrém
Canto fúnebre 41
És, Senhor, a esperança de todos e a vida dos que morem

Lutador valente! O dia do juízo será o fim dos teus trabalhos; entraste no combate e saíste vitorioso, consumaste a carreira e guardaste firme a fé; o Filho de Deus recompensará os teus esforços: aquele dia será para ti dia de prêmio. Quando elevar-se o Oriente desde o alto do céu para redimir-nos das trevas do sepulcro, pede-lhe que as orações lhe sejam hóstias e oblações gratíssimas; confia que ao vir o Senhor também ouvirás sua voz e ressuscitarás.

Filhos, recebei a doutrina de vosso pai, o testamento de sua herança: ambas procedem do Senhor e permanecerão para sempre. Com exceção de sua doutrina, tudo passa, tudo é efêmero: o mundo passa, passam as ilusões e os sofrimentos; somente perdura a vida naqueles que viveram bem e a assumiram como tempo de ganhar méritos. Esses, ao final dos séculos, buscarão o Rei, que virá majestoso. As coisas boas que nos ensinaram, estas não passam; dai-me, caríssimos, este consolo de que todos, todos, caminheis na verdade e na sã doutrina, pois assim, quando o Esposo se tornar visível, eu também me alegrarei da felicidade de meus filhos.

Ai! Vejo-me obrigado a deixar todos os bens que juntei, até a veste, e nu e pobre partir deste mundo. Todas as riquezas em que abundava e a própria vida me abandonam: as honras, os tesouros ficam na padieira de meu mausoléu; não podem passar adiante, aonde colocam o seu dono. Meus parentes também partirão, me desprezarão. Somente o olhar-me lhes ofenderá; e minha mulher e meus filhos, ao ver-me despojado de minha primeira honra, no mesmo instante sairão, aterrados pelo vazio da noite que rodeará meu cadáver.

Ricos e poderosos, venham aqui e considerai qual é a transformação que se opera em tudo que é nosso, e qual seu paradeiro final... És, Senhor, a esperança de todos e a vida dos que morrem, ainda que para ti não estejam perdidos os que morrem, mas adormecidos... Pois, segundo isto, meu Deus, que me purifiques com a tua graça das máculas com que me sujou minha depravada natureza, não vão fechar-me a entrada de glória prometida à virtude.

O nascimento de nosso Rei invicto comoveu o orbe inteiro, e, admirado, correu atrás dele. Ressuscitou aos mortos, deu vista aos cegos, limpou os leprosos, venceu a morte e o demônio e assegurou a liberdade de nossa estirpe. Ele mesmo, morto e sepultado, saiu do sepulcro cheio de glória e claridade para voltar ao céu, à destra de seu Pai. Quando chegue a hora, descerá segunda vez ao mundo com grande majestade, rodeado das hostes dos espíritos celestiais. Então cumprirá a promessa feita no Evangelho e realizará a sua ascensão triunfante aos céus e dará para sempre a herança íntegra da bem-aventurança eterna.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 508-509. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Para ler uma homilia de São Jerônimo para este domingo, clique aqui.

A novidade da Sacrosanctum Concilium

O site Vatican News continua a publicar esporadicamente textos sobre a reforma litúrgica do Concílio Vaticano II. Hoje recordamos aqui três textos que refletem sobre a novidade da Constituição Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada Liturgia:

29 de agosto de 2018

A Constituição Sacrosanctum Concilium  e o espírito de “aggiornamento” do Concílio é o tema do nosso Espaço Memória Histórica, 50 anos do Concílio Vaticano II desta quarta-feira.
No nosso Espaço Memória Histórica, iniciado em 2013, já dedicamos mais de 200 programas ao tema Concílio Vaticano II. Começamos pela contextualização e pelos eventos que levaram à convocação do Concílio, época em que contamos com a preciosa colaboração do Padre João Batista Libânio, falecido em janeiro de 2014. Passamos pela abertura, a participação do episcopado brasileiro no evento e agora repassamos os documentos, tendo concentrado os últimos programas à Constituição Sacrosancutum Concilium.
O Concílio Vaticano II não surgiu de uma hora para outra. Estava sendo gestado pelos movimentos de renovação. Um novo concílio era inevitável, iria acontecer, cedo ou tarde. Pio XII, Papa anterior a João XXIII, que convocou o Concílio, já tinha pensado num Concílio Ecumênico.
Embora tenha um caráter especificamente pastoral, o Concílio Vaticano II não deixou de fazer uma belíssima síntese teológica, sobretudo nas duas grandes Constituições Dogmáticas Dei Verbum (1965) e Lumen Gentium (1964) e também através da Sacrosanctum Concilium (1963).  Deixamos claro aqui, em outro momento se deixou na dúvida, que a Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium não é dogmática, justamente porque prevê adaptações na Liturgia, salvaguardando o essencial e divino. As Constituições Dogmáticas são unicamente Dei Verbum e Lumen Gentium. Mas lembramos que essas três Constituições falam dos aspectos constitutivos da Igreja.
O Concílio não causou uma ruptura na tradição da fé da Igreja. Não podemos separar o Concilio Vaticano II dos outros Concílios precedentes e torná-lo como um “superconcílio”, como afirma Helmut Hoping, padre professor de Teologia da Universidade de Friburgo.  Por isso, na fronteira de uma nova época, que hoje é chamada de “mudança epocal” ou “mudança de época”, o Papa João XXIII convoca toda a Igreja para um verdadeiro “aggiornamento”.
Aggiornamento é um termo italiano, que significa “atualização”, renovação. Esta palavra foi a orientação chave dada como objetivo para o Concílio Vaticano II, convocado pelo Papa João XXIII. “O aggiornamento para adequar a Igreja aos tempos atuais não deveria significar a mera adaptação a relações mutáveis, mas sim abertura ao mundo moderno. O aggiornamento da Igreja, que era o objetivo do Concilio, não se verificou através da ruptura com a tradição, nem com a adaptação a um ambiente transformado; deu-se sobretudo de um aggiornamento que entrelaçou as tradições mais antigas, em parte esquecidas, com o tempo presente” [1].
No século XIX a Igreja entrou num isolamento do mundo moderno. O Concílio Vaticano II deveria superar esse isolamento, dialogando com os novos tempos e a nova realidade. Isso não significa uma hermenêutica de ruptura com os princípios, com os valores da tradição até então guardados no depositum fides (tradição da fé).
Os padres conciliares não queriam criar uma nova Igreja, mas uma Igreja renovada. A Igreja não pode ser reinventada negligenciando-se a doutrina, a tradição, os dogmas e os costumes. A Revelação de Deus não se inventa, mas se atualiza de acordo com os novos desafios. Não se pode criar outro credo, mas renovar os princípios da fé verdadeiramente conforme às novas necessidades e emergências atuais.
A Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium resume o espírito do aggiornamento da seguinte maneira: “fomentar a vida cristã entre os fiéis, adaptar melhor às necessidades do nosso tempo as instituições susceptíveis de mudança, promover tudo o que pode ajudar à união de todos os crentes em Cristo, e fortalecer o que pode contribuir para chamar a todos ao seio da Igreja” (SC, 01).

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Centenário da Independência da Polônia em Cracóvia

O centenário da independência da Polônia, comemorado no último dia 11 de novembro, foi celebrado em Cracóvia com a Santa Missa na Catedral de Wawel, presidida pelo Arcebispo, Dom Marek Jędraszewski.

Na ocasião o Arcebispo abençoou um ostensório de 1,3 metro, batizado de Lumen Gentium (Luz das nações), que será doado ao Santuário de São João Paulo II.

O ostensório tem a forma de uma cruz, com uma fita branca e vermelha que flui do coração do ostensório até a águia branca, símbolo da Polônia. No peito da águia está a imagem de Nossa Senhora de Częstochowa. Na base estão gravados o lema da Polônia - "Polonia sempre fidelis" (Polônia sempre fiel) - e as imagens dos três Arcanjos, Miguel, Gabriel e Rafael.

Procissão de entrada


Ritos iniciais

Centenário da Independência da Polônia em Varsóvia

No último dia 11 de novembro a Polônia comemorou os 100 anos de sua independência. Na capital, Varsóvia, uma Missa foi celebrada no Templo da Divina Providência, presidida pelo Núncio Apostólico, Dom Salvatore Pennacchio. A homilia ficou a cargo de Dom Stanisław Gądecki, Arcebispo de Poznań e Presidente da Conferência Episcopal Polonesa.

Estiveram presentes também várias autoridades civis, como o Presidente Andrezj Duda com sua esposa Agata e o Primeiro-Ministro Mateusz Morawiecki.

Procissão de entrada
Ritos iniciais
Homilia

Incensação