quarta-feira, 23 de julho de 2025

Homilia do Papa: XVI Domingo do Tempo Comum - Ano C (2025)

Missa do XVI Domingo do Tempo Comum (Ano C)
Homilia do Papa Leão XIV
Catedral de São Pancrácio, Albano
Domingo, 20 de julho de 2025

Queridos irmãos e irmãs,
Estou muito feliz por me encontrar hoje aqui, celebrando a Eucaristia dominical nesta linda Catedral. Como sabeis, a minha chegada estava prevista para o dia 12 de maio, porém o Espírito Santo fez de modo diverso [1]. Mas estou verdadeiramente feliz e, com esta fraternidade e alegria cristã, saúdo todos os presentes, Sua Eminência [Cardeal Michael Czerny], o Bispo da Diocese [Dom Vincenzo Viva], as autoridades presentes e todos vós.

Na Liturgia hodierna a 1ª leitura e o Evangelho falam-nos de hospitalidade, de serviço e de escuta (Gn 18,1-10a; Lc 10,38-42).

No primeiro caso, Deus visita Abraão na pessoa de «três homens» que se dirigem à sua tenda «no maior calor do dia» (Gn 18,1-2). Podemos imaginar a cena: o sol escaldante, a calma do deserto, o calor intenso e os três desconhecidos que procuram abrigo. Abraão, «sentado à entrada da sua tenda», está no lugar de anfitrião, e é muito bonito ver como exerce a sua função: reconhecendo nos visitantes a presença de Deus, levanta-se, corre ao seu encontro, prostra-se por terra, pede-lhes que se detenham. E assim, toda a cena ganha vida. A tranquilidade da tarde é preenchida com gestos de amor que envolvem não só o Patriarca, mas também Sara, sua mulher, e os servos. Abraão já não está sentado, mas «de pé, junto deles, debaixo da árvore» (v. 8), e aí Deus lhe dá a notícia mais bonita que poderia esperar: «Sara, tua mulher, terá um filho» (v. 10).


A dinâmica deste encontro pode nos fazer refletir: Deus escolhe o caminho da hospitalidade para encontrar Sara e Abraão e para lhes anunciar o dom da sua fecundidade, que eles tanto desejavam e já nem sequer esperavam. Depois de tantos momentos de graça em que anteriormente os tinha visitado, volta a bater à sua porta, pedindo acolhida e confiança. E aqueles dois idosos respondem positivamente, sem saber ainda o que está para acontecer. Reconhecem nos misteriosos visitantes a bênção divina, a sua própria presença. Oferecem-lhe o que têm - comida, companhia, serviço e a sombra de uma árvore -, e recebem a promessa de uma vida nova e de uma descendência.

Embora em circunstâncias diferentes, o Evangelho fala do mesmo modo de agir de Deus. Aqui Jesus se apresenta como hóspede em casa de Marta e Maria. Não é um desconhecido: está na casa de amigos e o ambiente é de festa. Uma das irmãs acolhe-o com mil atenções, enquanto a outra o escuta sentada a seus pés, com a atitude típica do discípulo perante o mestre. Como sabemos, às queixas da primeira, que gostaria de receber alguma ajuda em questões práticas, Jesus responde convidando-a a apreciar o valor da escuta (cf. Lc 10,41-42).

No entanto, seria errado ver estas duas atitudes como contrapostas entre si, bem como fazer comparações em termos de méritos entre as duas mulheres. Com efeito, o serviço e a escuta são duas dimensões “gêmeas” da acolhida.

Em primeiro lugar, na nossa relação com Deus. Na verdade, se é importante que vivamos a nossa fé com ações concretas e com a fidelidade aos nossos deveres, segundo o estado e a vocação de cada um, é também fundamental que o façamos a partir da meditação da Palavra de Deus e da atenção ao que o Espírito Santo sugere ao nosso coração, reservando, para isso, momentos de silêncio, momentos de oração, tempos em que, silenciando ruídos e distrações, nos reunimos diante d’Ele e construímos a unidade em nós mesmos. Esta é uma dimensão da vida cristã que hoje temos particular necessidade de recuperar, seja como valor pessoal e comunitário seja como sinal profético para o nosso tempo: dar lugar ao silêncio, à escuta do Pai que fala e «vê o que está oculto» (Mt 6,6). Neste sentido, os dias de verão podem ser um tempo providencial para experimentar como é bela e importante a intimidade com Deus, e como ela pode também nos ajudar a ser mais abertos e acolhedores uns com os outros.

São dias em que dispomos de mais tempo livre, tanto para nos recolhermos e meditarmos, como para nos encontrarmos, deslocando-nos e visitando-nos. Saindo do turbilhão dos compromissos e das preocupações, aproveitemos para saborear alguns momentos de sossego e recolhimento, bem como para, indo a algum lado, partilhar a alegria de nos vermos - como acontece comigo, hoje e aqui. Façamos disso uma oportunidade para cuidarmos uns dos outros, para trocarmos experiências, ideias, para nos compreendermos mutuamente e darmos bons conselhos: isto nos faz sentir amados, e todos precisamos disso. Façamo-lo com coragem. Assim, na solidariedade, na partilha da fé e da vida, promoveremos uma cultura de paz, ajudando também aqueles que nos rodeiam a superar divisões e hostilidades e a construir a comunhão entre pessoas, povos e religiões.

O Papa Francisco disse que «se quisermos saborear a vida com alegria, devemos associar estas duas atitudes: por um lado, “estar aos pés” de Jesus, para ouvi-lo enquanto Ele nos revela o segredo de tudo; por outro lado, estar atentos e prontos na hospitalidade, quando Ele passa e bate à nossa porta, com o rosto do amigo que tem necessidade de um momento de conforto e fraternidade» (Ângelus, 21 de julho de 2019). Ele disse estas palavras, ademais, poucos meses antes que a pandemia começasse. E, nesse sentido, quanto nos ensinou aquela longa e dura experiência, que ainda hoje recordamos.

Naturalmente tudo isso implica fadiga. O serviço e a escuta nem sempre são fáceis: exigem empenho, capacidade de renúncia. Por exemplo, na escuta e no serviço, a fidelidade e o amor com que um pai e uma mãe orientam a sua família implicam fadiga, o mesmo acontece com o empenho dos filhos, em casa e na escola, para corresponder aos seus esforços; é exigente o compreendermo-nos uns aos outros quando temos opiniões diferentes, o perdoarmo-nos quando se erra, o assistirmo-nos quando se está doente, o apoiarmo-nos quando se está triste. Mas só assim, com estes esforços, se constrói algo de bom na vida; só assim nascem e crescem relações autênticas e fortes entre as pessoas, e a partir de baixo, da quotidianidade, o Reino de Deus cresce, se difunde e se experimenta já presente (cf. Lc 7,18-22).

Santo Agostinho, ao refletir sobre o episódio de Marta e Maria, comentou em um dos seus discursos: «Nestas duas mulheres estão simbolizadas duas vidas: a presente e a futura; uma vivida na fadiga e a outra no repouso; uma atribulada, a outra bem-aventurada; uma temporária, a outra eterna» (Sermão 104,4). E pensando no trabalho de Marta, Agostinho disse: «Quem na terra está isento deste serviço de cuidar dos outros? Quem na terra consegue descansar destas tarefas? Procuremos desempenhá-las de forma irrepreensível e com caridade... O cansaço passará e o repouso chegará; mas o repouso só chegará por meio do cansaço. A barca passará e a pátria chegará; mas não se chegará à pátria senão por meio da barca» (ibid., 6-7).

Abraão, Marta e Maria recordam-nos hoje precisamente isto: que a escuta e o serviço são duas atitudes complementares para, na vida, nos abrirmos à presença abençoadora do Senhor. O seu exemplo convida-nos a conciliar com sabedoria e equilíbrio, ao longo de cada dia, contemplação e ação, repouso e fadiga, silêncio e trabalho, tendo sempre como medida a caridade de Jesus, como luz a sua Palavra e como manancial de força a sua graça, que nos sustenta para além das nossas próprias capacidades (cf. Fl 4,13).


Fonte: Santa Sé.

[1] O então Cardeal Robert Francis Prevost foi nomeado Cardeal Bispo de Albano no dia 06 de fevereiro de 2025. Sua posse estava prevista para o dia 12 de maio; porém, no dia 08 de maio foi eleito Bispo de Roma.

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