Quase concluindo a publicação das Catequeses do Papa Francisco sobre os vícios e as virtudes que estamos realizando durante a Quaresma deste Ano Jubilar de 2025, confira suas meditações sobre as duas primeiras virtudes teologais: a fé e a esperança.
Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 01 de maio de 2024
Os vícios e as virtudes (17): A fé
Prezados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje gostaria de falar sobre a virtude da fé.
Com a caridade e a esperança, esta virtude é chamada “teologal”. São
três as virtudes teologais: fé, esperança e caridade. Por que são teologais?
Porque só podem ser vividas graças ao dom de Deus. As três virtudes teologais
são os grandes dons que Deus concede à nossa capacidade moral. Sem elas,
poderíamos ser prudentes, justos, fortes e temperantes, mas não teríamos olhos
que veem até no escuro, não teríamos um coração que ama até quando não é amado,
não teríamos uma esperança que ousa contra toda a esperança.
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As três virtudes teologais (Heinrich Maria von Hess) |
O que é a fé? O Catecismo da Igreja Católica explica-nos
que a fé é o ato com o qual o ser humano se abandona livremente a Deus (n.
1814). Nesta fé, Abraão foi o grande pai. Quando aceitou deixar a terra dos
seus antepassados para se dirigir rumo à terra que Deus lhe indicaria,
provavelmente foi considerado louco: por que deixar o conhecido pelo
desconhecido, o certo pelo incerto? Por que fazer isto? É louco? Mas Abraão
põe-se a caminho, como se visse o invisível. É o que a Bíblia diz de Abraão:
“Partiu, como se visse o invisível”. Isto é lindo! E será ainda este invisível
que o fará subir à montanha com o seu filho Isaac, o único filho da promessa,
que só no último momento será poupado do sacrifício. Nesta fé, Abraão torna-se
o pai de uma longa linhagem de filhos. A fé tornou-o fecundo.
Homem de fé será Moisés que, aceitando a voz de Deus
até quando mais do que uma dúvida o podia abalar, continuou a manter-se firme e
a confiar no Senhor, e até a defender o povo a quem, pelo contrário, muitas
vezes faltava a fé.
Mulher de fé será a Virgem Maria que, recebendo o
anúncio do Anjo, que muitos teriam rejeitado como demasiado exigente e
arriscado, responde: «Eis a serva do Senhor: faça-se em mim segundo a tua
palavra» (Lc 1,38). E com o coração cheio de fé, com o coração
repleto de confiança em Deus, Maria põe-se a caminho por uma estrada da qual
não conhece nem o trajeto nem os perigos.
A fé é a virtude que faz o cristão. Pois ser cristão
não consiste antes de tudo em aceitar uma cultura, com os valores que a
acompanham, mas ser cristão significa acolher e preservar um vínculo, um
vínculo com Deus: eu e Deus; a minha pessoa e o rosto amável de Jesus. É este
vínculo que nos torna cristãos.
A respeito de fé, vem-me à mente um episódio do
Evangelho. Os discípulos de Jesus atravessam o lago e são surpreendidos por uma
tempestade. Pensam que conseguirão salvar-se com a força dos seus braços, com
os recursos da experiência, mas o barco começa a encher de água e entram em
pânico (cf. Mc 4,35-41). Não se dão conta de que têm a
solução diante dos olhos: Jesus está ali com eles no barco, no meio da
tempestade, e Jesus dorme, diz o Evangelho. Quando finalmente o acordam,
assustados e até zangados porque Ele os deixa morrer, Jesus repreende-os: «Por
que tendes medo? Ainda não tendes fé?» (Mc 4,40).
Eis, portanto, o grande inimigo da fé: não é a
inteligência, não é a razão, como, infelizmente, alguns continuam a repetir
obsessivamente, mas o grande inimigo da fé é o medo. Por isso a fé é o primeiro
dom a receber na vida cristã: um dom que deve ser acolhido e pedido
diariamente, para que se renove em nós. Aparentemente, é um dom pequeno, mas é
essencial. Quando fomos levados à pia batismal, os nossos pais, depois de terem
anunciado o nome que tinham escolhido para nós, foram interrogados pelo sacerdote
- foi isto que aconteceu no nosso Batismo -: «O que pedis à Igreja de Deus?». E
os pais responderam: «A fé, o Batismo!».
Para um pai cristão, consciente da graça que lhe foi
concedida, é este o dom a pedir também para o seu filho: a fé. Com ela o pai
sabe que, até no meio das provações da vida, o seu filho não se afogará no
medo. Eis, o inimigo é o medo. Sabe também que, quando deixar de ter um pai
nesta terra, continuará a ter um Deus Pai no céu, que nunca o abandonará. O
nosso amor é tão frágil, e só o amor de Deus vence a morte!
Certamente, como diz o Apóstolo, a fé não é de todos (cf. 2Ts 3,2),
e até nós, que cremos, muitas vezes sentimos que a temos em pouca quantidade.
Muitas vezes Jesus pode repreender-nos, como fez com os seus discípulos, por
sermos “homens de pouca fé”. No entanto, é o dom mais feliz, a única virtude
que nos é permitido invejar. Pois quem tem fé é habitado por uma força que não
é apenas humana; com efeito, a fé “desencadeia” em nós a graça e abre a mente
ao mistério de Deus. Como certa vez Jesus disse: «Se tivésseis fé como um grão
de mostarda, poderíeis dizer a esta amoreira: “Arranca-te e planta-te no mar”,
e ela vos obedeceria» (Lc 17,6). Por isso, também nós, como os
discípulos, lhe repetimos: “Senhor, aumenta a nossa fé!” (cf. Lc 17,5)
É uma linda oração! Digamo-la todos juntos: “Senhor, aumenta a nossa fé”.
Digamo-la juntos: “Senhor, aumenta a nossa fé”. Um pouco mais alto: “Senhor,
aumenta a nossa fé!”.
Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 08 de maio de 2024
Os vícios e as virtudes (18): A esperança
Estimados irmãos e irmãs!
Na última Catequese demos início à reflexão sobre as
virtudes teologais. São três: fé, esperança e caridade. Da última vez
refletimos sobre a fé, hoje é a vez da esperança. «A esperança é a
virtude teologal pela qual desejamos o Reino dos céus e a vida eterna como
nossa felicidade, pondo toda a nossa confiança nas promessas de Cristo e
apoiando-nos não nas nossas forças, mas no socorro da graça do Espírito Santo»
(Catecismo da Igreja Católica, n. 1817). Estas palavras
confirmam-nos que a esperança é a resposta oferecida ao nosso coração, quando
brota em nós a pergunta absoluta: “Que será de mim? Qual é a meta da viagem?
Qual é o destino do mundo?”.
Todos compreendemos que uma resposta negativa a estas
perguntas produz tristeza. Se o caminho da vida não tem sentido, se não há nada
no princípio e no fim, então nos perguntamos por que deveríamos caminhar: daqui
nasce o desespero do homem, a sensação da inutilidade de tudo. E muitos
poderiam revoltar-se: esforcei-me por ser virtuoso, prudente, justo, forte,
temperante. Fui também um homem ou uma mulher de fé... De que serviu o meu
combate, se tudo acaba aqui? Se faltar a esperança, todas as outras virtudes
correm o risco de desmoronar e de acabar em cinzas. Se não existisse um amanhã
fiável, um horizonte resplandecente, não restaria senão concluir que a virtude
é um esforço inútil. «Somente quando o futuro é certo como realidade positiva é
possível viver também o presente», dizia Bento XVI (Encíclica Spe salvi,
n. 2).
O cristão tem esperança não por mérito próprio. Se
acredita no futuro, é porque Cristo morreu, ressuscitou e nos concedeu o seu
Espírito. «A redenção nos é oferecida no sentido que nos foi dada a esperança,
uma esperança fidedigna, graças à qual podemos enfrentar o nosso tempo
presente» (ibid., n. 1). Neste sentido, dizemos mais uma vez que a
esperança é uma virtude teologal: não deriva de nós, não é uma obstinação da qual
queremos nos convencer, mas sim um dom que vem diretamente de Deus.
A muitos cristãos céticos, que não tinham renascido
completamente para a esperança, o Apóstolo Paulo apresenta a nova lógica da
experiência cristã: «Se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, e ainda viveis
nos vossos pecados. Por isso, até os que morreram em Cristo pereceram. Se tão
somente nesta vida esperarmos em Cristo, somos os mais miseráveis de todos os
homens» (1Cor 15,17-19). É como se dissesse: se acreditas na Ressurreição
de Cristo, então sabes com certeza que nenhuma derrota, nenhuma morte é para
sempre. Mas se não acreditas na Ressurreição de Cristo, então tudo se torna
vazio, até a pregação dos Apóstolos.
A esperança é uma virtude contra a qual pecamos
frequentemente: nas nossas saudades negativas, nas nossas melancolias, quando
pensamos que as felicidades do passado estão enterradas para sempre. Pecamos
contra a esperança quando desanimamos diante dos nossos pecados, esquecendo que
Deus é misericordioso e é maior do que o nosso coração. Não esqueçamos isto,
irmãos e irmãs: Deus perdoa tudo, Deus perdoa sempre. Somos nós que nos
cansamos de pedir perdão. Mas não esqueçamos esta verdade: Deus perdoa tudo,
Deus perdoa sempre! Pecamos contra a esperança quando desanimamos perante os
nossos pecados; pecamos contra a esperança quando o outono anula em nós a
primavera, quando o amor de Deus deixa de ser um fogo eterno e não temos a
coragem de tomar decisões que nos comprometem para toda a vida.
O mundo de hoje tem muita necessidade desta virtude
cristã! O mundo precisa da esperança, assim como tem tanta necessidade da
paciência, uma virtude que caminha de mãos dadas com a esperança. Os homens
pacientes são tecelões de bem. Desejam obstinadamente a paz, e embora alguns
tenham pressa e queiram tudo e já, a paciência tem a capacidade da espera. Até
quando muitos à sua volta cederam à desilusão, quem é animado pela esperança e
é paciente torna-se capaz de atravessar as noites mais escuras. Esperança e
paciência caminham de mãos dadas!
A esperança é a virtude de quem é jovem de coração; e
nisto a idade não conta. Porque existem até idosos com os olhos cheios de luz,
que vivem em tensão permanente para o futuro. Pensemos naqueles dois grandes
anciãos do Evangelho, Simeão e Ana: nunca se cansaram de esperar e viram o
último trecho do seu caminho abençoado pelo encontro com o Messias, que reconheceram
em Jesus, levado ao Templo pelos seus pais. Que felicidade se fosse assim para
todos nós! Se, depois de uma longa peregrinação, pousando alforje e cajado, o
nosso coração se enchesse de uma alegria nunca antes sentida e também nós
pudéssemos exclamar: «Agora, Senhor, conforme a tua promessa, podes deixar teu
servo partir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste
diante de todos os povos: luz iluminar as nações e glória do teu povo, Israel»
(Lc 2,29-32).
Irmãos e irmãs, vamos em frente e peçamos a graça de
ter esperança, esperança com paciência. Olhar sempre para o encontro
definitivo; pensar sempre que o Senhor está perto de nós, que a morte nunca,
nunca será vencedora! Vamos em frente e peçamos ao Senhor que nos conceda esta
grande virtude da esperança, acompanhada pela paciência.
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Fé e esperança (Piero del Pollaiolo) |
Fonte: Santa Sé (01 de maio / 08 de maio).
Confira também as Catequeses do Bem-aventurado Papa João Paulo I sobre a virtude da fé e sobre a virtude da esperança.
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