terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

Homilia: Quarta-feira de Cinzas

São Basílio Magno
Sermão sobre o jejum
Corre com alegria ao dom do jejum

Perfuma a cabeça e lava o rosto. Estas palavras da santa Escritura chamam tua atenção a um sentido misterioso. Aquele que foi ungido, ungiu; e o que foi lavado, lavou. Translada este preceito ao teu interior. Lava tua alma das repugnantes manchas do pecado; unge tua cabeça com o perfume da santidade para que acompanhes a Cristo, e com esta disposição inicie o jejum. Não mudes o tom de teu rosto como fazem os hipócritas; e fique sabendo que a cor de teu rosto se muda quando o afeito interior cobre-se por um hábito exterior simulado, e se cobre com a mentira como com um véu espesso.
O hipócrita vem a ser como um cômico que representa outras pessoas: algumas vezes representa ser um senhor, quando não é mais que um vil criado; outras de ser um rei poderoso, não passando de um desprezível servo. De tal forma que na vida presente, como em uma farsa, muitos passam por uma representação aparente de teatro, porque ocultam uma coisa em seu coração e manifestam outra em seu semblante. Por isso, não mudes o teu rosto; apresenta-te como és na realidade, e não te desfigure em um exterior triste e melancólico, colocando toda a tua glória em que te considerem um homem sóbrio e comedido.
A verdade é que aquela prática não deixa nada de útil, porque se revelou como trombeta; nem se tira fruto algum daquele jejum, porque se faz apenas para pública ostentação. Aquelas obras que geram reputação entre os homens de nada servem para o século vindouro, porque terminam com a recomendação e louvor dos outros homens. Portanto, corre com alegria ao dom do jejum. O jejum é um dom, que, apesar de ser muito antigo, nem se deteriora, nem envelhece, mas sempre rejuvenesce com um vigor perpétuo e contínuo.
Pensas que eu conto a antiguidade do jejum desde que a lei começou? Pois saiba que o jejum é ainda mais antigo que ela. Pensas um pouco, e verás que é verdade o que te digo... O jejum não é nenhuma invenção nova, mas um tesouro que nos guardaram os antigos, e deles chegou até nós. Tudo aquilo que possui em si a recomendação da antiguidade, ao mesmo tempo é digno de veneração. Venera, pois, e reverencia as cinzas e a antiguidade do jejum. Ele é tão antigo quanto o primeiro homem, porque no paraíso o jejum foi promulgado.
O primeiro preceito que teve Adão foi este: Da árvore da ciência do bem e do mal não comereis. Estas palavras, não comereis, expressam uma rigorosa lei de jejum e de abstinência. Se Eva houvesse observado o jejum da árvore, não teríamos necessidade do jejum atual, porque os sãos não necessitam de médico, mas os enfermos. Pelo pecado todos fomos feridos: esforcemo-nos, portanto, pela penitência. Porém, é penitência vã e infrutuosa a que não vai acompanhada pelo jejum. A terra maldita não produzirá senão espinhos e abrolhos. Está ordenado que vivas em penitência, e que não te entregues às delícias. Satisfaz, pois, a Deus com o jejum.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 54-55. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Confira também uma homilia de São João Crisóstomo para esta celebração clicando aqui
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