Em nossa postagem anterior começamos a apresentar os hinos
da Liturgia das Horas para a Memória facultativa de São José Operário, no dia
01 de maio.
Após falar do hino do Ofício das Leituras, Te, pater Ioseph, ópifex (Nossas vozes
te celebram), cabe-nos agora tratar do hino das Laudes, Auróra solis núntia (Anuncia a aurora o dia), uma vez que para as
Vésperas retoma-se o hino da Solenidade do dia 19 de março, Te, Ioseph, célebrent (Celebre a José a
corte celeste), sobre o qual já falamos anteriormente em nosso blog.
Segue, portanto, o hino das Laudes de São José Operário em
seu texto original (em latim) e em sua atual tradução oficial para o Brasil,
com alguns comentários.
Laudes: Auróra solis núntia
Auróra solis núntia,
mundi labóres éxcitans,
fabri sonóram málleo
domum salútat Názarae.
Salve, caput domésticum,
sub quo supérnus Artifex,
sudóre salso róridus,
exércet artem pátriam.
Altis locátus sédibus
celsaeque Sponsae próximus,
adésto nunc cliéntibus,
quos vexat indigéntia.
Absíntque vis et iúrgia,
fraus omnis a mercédibus,
victus cibíque cópiam
mensúret una párcitas.
Sit Trinitáti glória,
quae, te precánte, iúgiter
in pace nostros ómnium
gressus viámque dírigat. Amen [1].
Laudes: Anuncia a
aurora o dia
Anuncia a aurora o dia,
chama todos ao trabalho;
como outrora em Nazaré,
já se escutam serra e malho.
Salve, ó chefe de família!
Que mistério tão profundo
ver que ensinas teu ofício
a quem fez e salva o mundo!
Habitando agora o alto
com a Esposa e o Salvador,
vem e assiste aqui na terra
todo pobre e sofredor!
Ganhe o pobre um bom salário,
e feliz seja em seu lar;
gozem todos de saúde
com modéstia e bem-estar.
São José, roga por nós
à Trindade que é um só Deus;
encaminha os nossos passos,
guia a todos para os céus [2].
Comentário:
As Laudes (palavra que significa
“louvores” em latim) constituem a oração da manhã da Liturgia das Horas e formam,
junto com as Vésperas, os dois grandes polos da santificação do dia.
O hino que abre essa hora, Auróra solis núntia, como indica seu
título, nos situa justamente no início do dia, ao mesmo tempo em que nos
convida a contemplar o mistério do trabalho de José.
Segue-se o corpo do hino,
integrado pelas estrofes 2-4, no qual se elencam os motivos do louvor e se
dirigem súplicas a São José. É também uma súplica a José, pedindo-lhe que
interceda por nós junto à Trindade, a compor a quinta estrofe, concluindo o
hino.
a) Primeira estrofe:
Como vimos acima, mais do que um
convite direto ao louvor, a primeira estrofe do nosso hino nos introduz ao
louvor de São José Operário nos situando no “tempo” e no “espaço”.
Os dois primeiros versos nos
situam no “tempo”: “Auróra solis núntia,
mundi labóres éxcitans”, isto é, “A aurora anuncia o sol, despertando o mundo
ao trabalho”.
Os dois versos seguintes, por sua vez, nos convidam a
contemplar um “espaço”: a oficina de trabalho de José em Nazaré. Canta o hino:
“Fabri sonóram málleo domum salútat
Názarae” - “[A aurora] saúda a casa de Nazaré, onde soa o martelo do
operário”.
Vale destacar o uso do termo “faber” para referir-se a São José, o mesmo usado por São Jerônimo
na sua tradução da Bíblia para o latim. Em grego o termo usado para o trabalho de José (e, por
conseguinte, também de Jeusus) é τέκτων (tékton), relacionado à palavra τέχνη
(tékhne, arte ou ofício manual, donde vem “técnica”), que pode referir-se a
qualquer pessoa que trabalha com as mãos.
Portanto, José e também Jesus poderiam ser tanto carpinteiros
como pedreiros. A tradução brasileira do nosso hino, fiel à tradição popular,
tende a associar José ao ofício de carpinteiro, uma vez que, além do martelo (malho),
menciona a serra.
A Sagrada Família na oficina de trabalho com Santa Ana, São João Batista e um jovem que simboliza os futuros Apóstolos de Jesus (John Everett Milais) |
b) Segunda estrofe:
Antes de entrar propriamente nas súplicas, que dominam as
estrofes seguintes, a segunda estrofe inicia o corpo do hino indicando o motivo
do louvor: José é celebrado por ter ensinado um ofício ao próprio Artífice do
mundo:
“Salve, caput domésticum,
sub quo supérnus Artifex, sudóre salso róridus, exércet artem pátriam” -
“Salve, cabeça da casa, sob quem o supremo Artífice, molhado de salgado suor,
exerce o ofício paterno”.
A tradução oficial brasileira, embora use outras palavras,
transmite a mesma mensagem: “Salve, ó chefe de família! Que mistério tão
profundo ver que ensinas teu ofício a quem fez e salva o mundo!”.
c) Terceira estrofe:
Uma vez recordada a relação de José com Jesus, aqui se
celebra sua comunhão com a Esposa, a Virgem Maria, com quem partilha a glória
celeste: “Altis locátus sédibus celsaeque
Sponsae próximus” - “Colocado em alta sede, próximo à celeste Esposa...”. A
tradução brasileira, por sua vez, recorda também Jesus: “Habitando agora o alto
com a Esposa e o Salvador”.
Os dois últimos versos da estrofe passam do louvor à
súplica. Inicia-se com um pedido genérico, invocando a intercessão de José aos
seus devotos: “adésto nunc cliéntibus,
quos vexat indigéntia” - “Assiste agora teus devotos, afligidos pela
indigência”. Ou, para usar a tradução oficial, “Vem e assiste aqui na terra
todo pobre e sofredor!”.
d) Quarta estrofe:
A quarta estrofe, que conclui o corpo do hino, prossegue com
as súplicas a José. Os quatro versos da estrofe comportam três pedidos.
Os primeiros dois pedidos dizem respeito às relações de
trabalho: “Absíntque vis et iúrgia, fraus
omnis a mercédibus”; “Afastem-se a violência e a discórdia, e toda fraude
nos salários”. A tradução oficial simplifica um pouco os pedidos: “Ganhe o
pobre um bom salário, e feliz seja em seu lar”.
O terceiro pedido, por sua vez, diz respeito aos próprios
trabalhadores, aos quais São José serve como exemplo de virtude: “Victus cibíque cópiam mensúret una párcitas”,
que em uma tradução livre significa: “que a mesma sobriedade modere qualquer
excesso”.
O termo utilizados aqui, “victus”, indicam tanto os alimentos quanto a conduta (“cibus”, por sua vez, indica
especificamente o alimento). Portanto, a exortação do texto é à virtude da
temperança, à exemplo de São José, evitando excessos em qualquer dimensão da
vida.
A tradução oficial brasileira infelizmente esvaziou esta
dimensão de “compromisso”, limitando-se a um desejo genérico: “gozem todos de
saúde com modéstia e bem-estar”.
e) Quinta estrofe:
Por fim, como de costume nos hinos da Liturgia das Horas, a
última estrofe, como conclusão do poema, comporta uma referência à Santíssima
Trindade.
Em nosso hino esta estrofe é também uma súplica a São José,
pedindo-lhe que interceda por nós junto à Trindade.
Após uma breve exortação ao louvor - “Sit Trinitáti glória”, “Seja dada glória à Trindade” -, formula-se
o pedido: “quae, te precánte, iúgiter in
pace nostros ómnium gressus viámque dírigat. Amen”, “para que, por tuas
súplicas [de São José], dirija sempre
os nossos passos no caminho da paz. Amém”.
Notas:
[2] OFÍCIO DIVINO. Liturgia
das Horas segundo o Rito Romano. Tradução para o Brasil da segunda edição
típica. São Paulo: Paulus, 1999, v. II, p. 1560.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirMuito belo.
ResponderExcluir