quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Homilia: Natal do Senhor - Missa da Noite

São Pedro Crisólogo
Sermão 145
Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e o chamará Emanuel

É meu propósito falar-vos hoje, irmãos, de como o santo Evangelista nos relata o mistério da geração de Cristo. Ele diz: O nascimento de Jesus Cristo aconteceu desta forma. A mãe de Jesus estava desposada com José e, antes de viverem juntos, ela ficou grávida por obra do Espírito Santo. José, seu esposo, que era bom e não queria denunciá-la, decidiu repudiá-la em segredo. Porém, como se concilia esta bondade com a decisão de não discutir a gravidez de sua esposa? As virtudes não podem sustentar-se isoladamente: a equidade desprovida de bondade se converte em severidade, e a justiça sem piedade torna-se crueldade. É com razão, pois, que se qualifica a José de bom, porque era piedoso; e de piedoso, por ser bom. Ao pensar piedosamente, livra-se da crueldade, e ao julgar benignamente, observou a justiça; não querendo erigir-se em acusador, evitou a sentença. Ressentia-se a alma do justo, perplexa ante a novidade do evento: tinha diante de si uma esposa grávida, porém virgem; grávida do dom não menos que do pudor; solícita pelo concebido, porém segura de sua integridade; revestida da função maternal, mas sem perder o decoro virginal.

Qual devia ser a conduta do esposo frente a tal situação? Acusá-la de infidelidade? Não, pois ele era testemunha de sua inocência. Ventilar a culpa? Tampouco, pois ele era o guardião de seu pudor. Acusá-la de adultério? Menos ainda, pois estava plenamente convencido de sua virgindade. O que fazer então? Pensa em repudiá-la em segredo, pois nem podia ir por aí ventilando o acontecido, nem ocultá-lo na intimidade do lugar. Decide repudiá-la em segredo, e confia a Deus a questão, já que não tem nada para comunicar aos homens.

José, filho de Davi, não tenhas dúvida em tomar Maria por tua esposa, porque o ente que nela foi gerado procede do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho e tu lhe porás o nome Jesus, porque ele salvará ao povo de seus pecados. Vês, irmãos, como somente uma pessoa representa toda uma raça; vês como somente um indivíduo representa toda uma estirpe; vede como em José se dá a nomeação à série genealógica de Davi.

José, filho de Davi, nascido da vigésima oitava geração. Por que é chamado filho de Davi, a não ser porque nele se desvela o mistério de uma estirpe, cumpre-se a fidelidade da promessa, e na carne virginal já aparece o selo da concepção sobrenatural de um parto celeste? A promessa de Deus Pai feita a Davi está expressa nos seguintes termos: O Senhor fez a Davi uma promessa que não voltará atrás: A um descendente teu porei sobre o trono. Do fruto do teu ventre: sim, fruto de teu ventre, de teu seio, sim, porque o hóspede celeste, o supremo morador desceu de tal modo ao receptáculo de suas entranhas que ignorou as limitações corporais; e de tal modo saiu do claustro materno que deixou intacto o selo da virgindade, cumprindo-se desta maneira o que se canta no Cântico dos Cânticos: És jardim fechado, irmã e noiva minha; és jardim fechado, fonte selada.

O ente que nela está vem do Espírito Santo. Concebeu a Virgem, porém do Espírito; a virgem deu à luz, porém àquele que Isaías predisse: Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e lhe porá o nome Emanuel (que significa Deus conosco).


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 285-286. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

Confira também uma homilia de São Jerônimo para essa Missa clicando aqui.

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