terça-feira, 31 de outubro de 2023

Ângelus: XXX Domingo do Tempo Comum - Ano A

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 29 de outubro de 2023

Amados irmãos e irmãs, bom dia!
O Evangelho de hoje fala-nos do maior dos mandamentos (cf. Mt 22,34-40). Um doutor da lei interroga Jesus sobre o assunto e Ele responde com o “grande mandamento do amor”: «Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua mente (...) e o teu próximo como a ti mesmo» (vv. 37.39). Amor a Deus e ao próximo, inseparáveis um do outro. Reflitamos um pouco sobre isto.

O primeiro: o fato de o amor ao Senhor vir em primeiro lugar recorda-nos que Deus nos precede sempre, antecipa-nos com a sua ternura infinita (cf. Jo 4,19), com a sua proximidade, com a sua misericórdia, porque Ele está sempre próximo, é terno e misericordioso. A criança aprende a amar no colo da mãe e do pai, e nós fazemo-lo nos braços de Deus. O Salmo diz: «Como uma criança saciada no colo da sua mãe» (Sl 130,2), assim devemos sentir-nos nos braços de Deus. E é aí que absorvemos o afeto do Senhor, é aí que encontramos o amor que nos impele a doarmo-nos generosamente. São Paulo recorda-o quando diz que a caridade de Cristo tem em si uma força que impele a amar (cf. 2Cor 5,14). E tudo parte d’Ele. Não podeis amar seriamente os outros se não tiverdes esta raiz, que é o amor de Deus, o amor de Jesus.

E agora o segundo aspecto que transparece do mandamento do amor. Ele liga o amor a Deus ao amor ao próximo: significa que, amando os irmãos, refletimos, como espelhos, o amor do Pai. Refletir o amor de Deus, eis o objetivo; amar a Ele, que não vemos, através do irmão que vemos (cf. 1Jo 4,20). Um dia, Santa Teresa de Calcutá, a um jornalista que lhe perguntou se, com o que fazia, tinha a convicção de mudar o mundo, respondeu: «Nunca pensei que pudesse mudar o mundo! Apenas procuro ser uma gota de água limpa, na qual o amor de Deus possa brilhar» (Encontro com jornalistas após receber o Prêmio Nobel da Paz, Roma, 1979). Foi assim que ela, tão pequena, foi capaz de fazer tanto bem: refletindo o amor de Deus como uma gota. E se, por vezes, olhando para ela e para os outros santos, chegamos a pensar que são heróis inimitáveis, voltemos a pensar nesta pequena gota: o amor é uma gota que pode mudar tantas coisas. E como se faz isso? Dando o primeiro passo, sempre. Às vezes não é fácil dar o primeiro passo, esquecer as coisas..., dar o primeiro passo. Mãos à obra! Esta é a gota: dar o primeiro passo.

Então, queridos irmãos e irmãs, pensando no amor de Deus que nos precede sempre, podemos perguntar-nos: estou grato ao Senhor, que me ama primeiro? Sinto o amor de Deus e sou-lhe grato?  E procuro refletir o seu amor? Comprometo-me a amar os irmãos, a dar este segundo passo?

Que a Virgem Maria nos ajude a viver o grande mandamento do amor na nossa vida quotidiana: amar e deixar-se amar por Deus e amar os irmãos.

Jesus dialoga com os fariseus e doutores da Lei
(James Tissot)

Fonte: Santa Sé.

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Fotos da Conclusão do Sínodo dos Bispos (2023)

No dia 29 de outubro de 2023 o Papa Francisco presidiu sem celebrar a Missa do XXX Domingo do Tempo Comum (Ano A) na Basílica de São Pedro na conclusão da Primeira Sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos.

A Liturgia Eucarística, por sua vez, foi celebrada pelo Cardeal Mario Grech, Secretário Geral do Sínodo dos Bispos, assistido pelo Monsenhor Krzysztof Marcjanowicz.

O Santo Padre foi assistido por Dom Diego Giovanni Ravelli e pelo Monsenhor Cristiano Antonietti. O livreto da celebração pode ser visto aqui.

Procissão de entrada
Incensação do altar
Patriarcas e Arcebispos-Maiores das Igrejas Católicas Orientais
Liturgia da Palavra

Homilia do Papa: Conclusão do Sínodo dos Bispos (2023)

Conclusão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos (1ª Sessão)
Homilia do Papa Francisco
Basílica de São Pedro
Domingo, 29 de outubro de 2023 - XXX Domingo do Tempo Comum (Ano A)

É precisamente um pretexto que leva o doutor da Lei a apresentar-se a Jesus; pretende unicamente colocá-lo à prova. Todavia, sua pergunta é importante, uma pergunta sempre atual, surgindo de vez em quando no nosso coração e na vida da Igreja: «Qual é o maior mandamento?» (Mt 22,36). Mergulhados no rio vivo da Tradição, também nós nos interrogamos: Qual é a coisa mais importante? Qual é o centro propulsor? Qual é a coisa que conta tanto a ponto de ser o princípio inspirador de tudo? E a resposta de Jesus é clara: «Amarás ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua mente. Este é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo» (vv. 37-39).


Prezados Cardeais, Bispos e sacerdotes, religiosas e religiosos, irmãs e irmãos, ao concluirmos este trecho do caminho que percorremos, é importante fixar o «princípio e fundamento», do qual uma vez e outra tudo começa: amar. Amar a Deus com toda a vida e amar o próximo como a si mesmo. Não está nas nossas estratégias, nos cálculos humanos, nem nas modas do mundo, mas no amor a Deus e ao próximo: é aqui que está o coração de tudo. Mas como traduzir tal impulso de amor? Proponho-vos dois verbos, dois movimentos do coração, sobre os quais quero refletir convosco: adorar e servir. Ama-se a Deus com a adoração e o serviço.

O primeiro verbo: adorar. Amar é adorar. A adoração é a primeira resposta que podemos oferecer ao amor gratuito, ao amor surpreendente de Deus. A maravilha própria da adoração é essencial na Igreja, sobretudo neste tempo em que perdemos o hábito da adoração. De fato, adorar significa reconhecer na fé que só Deus é Senhor e que, da ternura do seu amor, dependem as nossas vidas, o caminho da Igreja, o destino da história. Ele é o sentido do nosso viver.

sábado, 28 de outubro de 2023

Fotos da oração pela paz no Vaticano

Na sexta-feira, 27 de outubro de 2023, o Papa Francisco presidiu um momento de oração pela paz na Basílica de São Pedro no Vaticano.

O Santo Padre, assistido por Dom Diego Giovanni Ravelli, presidiu a oração do terço do rosário. A meditação dos mistérios dolorosos foi acompanhada de leituras do Evangelho e dos escritos dos Santos Padres, concluindo com o canto da Ladainha da Coroação de Nossa Senhora e com uma súplica pela paz recitada pelo Papa.

Seguiu-se a adoração do Santíssimo Sacramento, com leituras, preces, e momentos de silêncio. A bênção eucarística, por fim, foi concedida pelo Cardeal Michael Czerny, Prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral.

O livreto da celebração pode ser visto aqui.

Ícone da Virgem Maria, Salus populi romani
Oração do terço do rosário



Súplica do Papa Francisco pela paz

Papa Francisco
Oração pela paz
Basílica de São Pedro
Sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Maria, pousa o teu olhar sobre nós; eis-nos aqui na tua presença! Tu és Mãe, conheces o nossos cansaços e as nossas feridas. Tu, Rainha da Paz, sofres conosco e por nós, ao ver muitos dos teus filhos provados pelos conflitos, angustiados com as guerras que dilaceram o mundo.

É uma hora sombria. Esta é uma hora sombria, Mãe. E, nesta hora sombria, colocamo-nos sob os teus olhos luminosos e confiamo-nos ao teu coração, sensível aos nossos problemas. O teu coração não esteve imune de inquietações e temores: quanta apreensão ao ver que não havia lugar para Jesus na hospedaria! Quanto medo naquela fuga precipitada para o Egito, pois Herodes queria matá-lo! Quanta angústia, quando o perdestes no templo! Mas Mãe, nas provações, tu foste corajosa, foste audaz: confiaste em Deus, e à apreensão respondeste com a solicitude, ao pavor com o amor, à angústia com o oferecimento. Mãe, não te alienaste, mas, nos momentos decisivos, tomaste a iniciativa: foste apressadamente ter com Isabel, nas bodas de Caná obtiveste de Jesus o primeiro milagre, no Cenáculo mantiveste os discípulos unidos. E, quando no Calvário uma espada te transpassou a alma, tu, Mãe, mulher humilde, mulher forte, teceste com a esperança pascal a noite do sofrimento.

Agora, Mãe, toma mais uma vez a iniciativa; toma-a por nós, nestes tempos dilacerados pelos conflitos e devastados pelas armas. Volta o teu olhar de misericórdia para a família humana, que perdeu a senda da paz, preferiu Caim a Abel e, tendo esquecido o sentido da fraternidade, não readquire a atmosfera de casa. Intercede pelo nosso mundo em perigo e tumulto. Ensina-nos a acolher e cuidar da vida - de toda a vida humana! - e a repudiar a loucura da guerra, que semeia morte e apaga o futuro.

Maria, já muitas vezes tu vieste ter conosco, pedindo oração e penitência. Nós, porém, ocupados com as nossas necessidades e distraídos por tantos interesses mundanos, temos permanecido surdos aos teu convites. Contudo, tu, que nos amas, não te canses de nós, Mãe. Toma-nos pela mão. Toma-nos pela mão e guia-nos para a conversão, faz-nos colocar Deus em primeiro lugar. Ajuda-nos a guardar a unidade na Igreja, a ser artesãos de comunhão no mundo. Recorda-nos a importância do nosso papel, faz-nos sentir responsáveis pela paz, chamados a rezar e adorar, a interceder e reparar por todo o gênero humano.

Mãe, sozinhos, não conseguimos; sem o teu Filho, nada podemos fazer. Mas tu nos levas a Jesus, que é a nossa paz. Por isso, Mãe de Deus e nossa, vimos até ti, buscamos refúgio no teu Coração Imaculado. Imploramos misericórdia, Mãe da misericórdia; paz, Rainha da paz! Move o íntimo de quem está preso no ódio, converte quem alimenta e suscita conflitos. Enxuga as lágrimas das crianças - nesta hora, choram tanto! -, assiste os idosos que estão sozinhos, ampara os feridos e os doentes, protege quem teve de deixar a sua terra e os afetos mais queridos, consola os desanimados, desperta a esperança.

Para sempre te confiamos e consagramos as nossas vidas, todas as fibras do nosso ser, aquilo que temos e somos. A ti consagramos a Igreja para que, dando ao mundo testemunho do amor de Jesus, seja sinal de concórdia, seja instrumento de paz. A ti consagramos o nosso mundo, de modo especial te consagramos os países e as regiões em guerra.

O povo fiel chama-te aurora da salvação: Mãe, abre frestas de luz na noite dos conflitos. Tu, morada do Espírito Santo, inspira caminhos de paz aos responsáveis das nações. Tu, Senhora de todos os povos, reconcilia os vossos filhos, seduzidos pelo mal, cegados pelo poder e pelo ódio. Tu, que estás próxima de cada um, encurta as nossas distâncias. Tu, que tens compaixão de todos, ensina-nos a cuidar dos outros. Tu, que revelas a ternura do Senhor, torna-nos testemunhas da sua consolação. Mãe, tu, Rainha da Paz, derrama nos corações a harmonia de Deus. Amém.


Fonte: Santa Sé.

Observação: A tradução para o português divulgada no site da Santa Sé utiliza a 2ª pessoa do plural (vós) para referir-se a Maria. Nesta postagem optamos por manter a 2ª pessoa do singular (tu), como no original italiano.

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Revista Notitiae 2021

Recentemente o Dicastério para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos divulgou em seu site a edição de 2021 da Revista Notitiae.

Esta Revista é o veículo oficial de informação do Dicastério (até então Congregação para o Culto Divino, renomeada como Dicastério em 2022 com a promulgação da Constituição Apostólica Praedicate Evangelium) desde a conclusão do Concílio Vaticano II em 1965.

Inicialmente com periodicidade mensal ou bimestral, a publicação tornou-se anual a partir de 2016. Portanto, a edição de 2021 é o volume 598 (6º da nova série), relativo ao ano 57 de publicação.


O ano de 2021 foi marcado por importantes decisões do Papa Francisco a respeito da Liturgia, razão pela qual essa edição da Revista possui 306 páginas.

A seguir apresentamos brevemente essa edição da Revista, que pode ser acessada na íntegra no site do Dicastério:

Primeiramente a publicação destaca a nomeação dos superiores da Congregação para o Culto Divino no dia 27 de maio de 2021:
Prefeito: Dom Arthur Roche, até então Secretário, sucedendo o Cardeal Robert Sarah;
Secretário: Dom Vittorio Francesco Viola, O.F.M., até então Bispo da Diocese de Tortona (Itália);
Subsecretário: Monsenhor Aurelio García Macías (nomeado Bispo Titular de Rotdon) [1].

O Padre Corrado Maggioni, S.M.M, até então Subsecretário da Congregação, seria nomeado Presidente do Pontifício Comitê para os Congressos Eucarísticos Internacionais em setembro de 2021, sucedendo Dom Piero Marini, que renunciou por limite de idade.

Segue-se a tradicional divisão da Revista em quatro seções, algumas com suas respectivas subdivisões:

1. Acta Francisci - Atos do Papa Francisco (pp. 06-88):

Os documentos do Papa relacionadas à Liturgia são publicados aqui em vários idiomas:

Motu proprio Spiritus Domini sobre os ministérios instituídos de leitor e acólito;

- Motu proprio Antiquum Ministerium instituindo o ministério de catequista;

- Motu proprio Traditionis custodes sobre o uso da Liturgia Romana anterior à reforma do Concílio Vaticano II;

- Carta ao Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé acompanhando o Motu proprio Spiritus Domini;



Além desses documentos, a Revista traz também o texto (em italiano) da Catequese do Papa Francisco do dia 03 de fevereiro de 2021, sobre o tema “Rezar na Liturgia”, dentro do ciclo de Catequeses sobre a oração (2020-2021).

O Papa Francisco institui novos leitores e catequistas

2. Congregatio de Cultu Divino et Disciplina Sacramentorum - Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos (pp. 89-247):

Esta seção da Revista é dedicada aos textos oficiais da Congregação, subdivididos em três partes:

2.1 Acta (pp. 89-234):

- Rito da Instituição de Catequistas (De Institutione Catechistarum), publicado em sua forma típica (em latim), acompanhado de uma Carta aos Presidentes das Conferências Episcopais sobre o novo rito;

Nomeado novo Metropolita da Igreja Católica Eslovaca

Na quinta-feira, 26 de outubro de 2023, o Papa Francisco nomeou o Padre Jonáš Jozef Maxim, Higúmeno da Lavra Estudita de Univ (Ucrânia), como novo Metropolita de Prešov e hierarca da Igreja Greco-Católica Eslovaca, uma das 23 Igrejas Católicas Orientais.


Jozef Maxim nasceu em Levoča (Eslováquia) no dia 21 de novembro de 1974 e recebeu a ordenação presbiteral no dia 11 de julho de 1998, incardinado na Eparquia de Prešov (elevada a Metropolia em 2008).

Após obter o Mestrado em Teologia pelo Pontifício Instituto Oriental em Roma no ano 2000, foi nomeado Diretor Espiritual do Seminário de Prešov, ao mesmo tempo que atuava como professor na Faculdade de Teologia da Universidade de Prešov.

No ano de 2004 iniciou sua formação como monge estudita na Lavra de Univ (Ucrânia), professando os votos monásticos em 22 de maio de 2008, assumindo o nome religioso de Jonáš.

Em 2013 retornou a Roma para os estudos de Doutorado no Pontifício Instituto Oriental, título obtido em 2017 com uma tese sobre o monaquismo estudita.


De volta à Ucrânia, foi nomeado Superior do Mosteiro de São Miguel em Lviv, atendendo também a paróquia local. Em 2020 foi eleito Higúmeno (o equivalente a Abade) da Lavra de Univ.

Como novo Metropolita de Prešov e hierarca da Igreja Greco-Católica Eslovaca, o Padre Jonáš Maxim sucede Dom Ján Babjak, que renunciou ao ofício em 25 de abril de 2022.

Até a ordenação episcopal do novo Metropolita, a Arquieparquia de Prešov continua sendo guiada pelo Administrator Apostólico, Dom Peter Rusnák, Eparca de Bratislava.



Com informações do site da Santa Sé.

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio: Jesus Cristo 20

Confira nesta postagem as Catequeses nn. 31-32 do Papa São João Paulo II sobre Jesus Cristo, que prosseguem a reflexão sobre Jesus como “verdadeiro Deus”. 

Para acessar a Introdução, com o Índice das Catequeses, clique aqui.

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
CREIO EM JESUS CRISTO

31. “Credes em Deus, crede também em mim”
João Paulo II - 21 de outubro de 1987

1. Em seu conjunto, os fatos que analisamos nas Catequeses anteriores são eloquentes e demonstram a consciência da própria divindade que Jesus tinha quando refere a si mesmo o nome de Deus, os atributos divinos, o poder de julgamento final sobre as obras de todos os homens, o poder de perdoar os pecados, o poder sobre a própria Lei de Deus. São todos aspectos da única verdade que Ele afirma com força, a de ser verdadeiro Deus, um só com o Pai. É o que diz abertamente aos judeus conversando com eles no templo durante a festa da Dedicação: “Eu e o Pai somos um” (Jo 10,30). E, no entanto, ao atribuir a si o que é próprio de Deus, Jesus fala de si mesmo como “Filho do homem”, tanto pela unidade pessoal do homem e de Deus n’Ele, como seguindo a pedagogia escolhida de conduzir gradualmente os discípulos, quase tomando-os pela mão, às alturas e profundezas misteriosas da sua verdade. Como “Filho do homem” Ele não hesita em pedir: “Credes em Deus, crede também em mim” (Jo 14,1).

O desenvolvimento de todo o discurso dos capítulos 14–17 do Evangelho de João, especialmente as respostas dadas por Jesus a Tomé e Filipe, demonstram que, quando pede que creiam n’Ele, trata-se não só da fé no Messias como o Ungido e o Enviado de Deus, mas da fé no Filho que é da mesma natureza do Pai. “Credes em Deus, crede também em mim” (Jo 14,1).

Mosaico da Catedral de St. Louis, EUA
Na inscrição, a exortação a “guardar a fé” (2Tm 4,7)

2. É preciso examinar essas palavras no contexto do diálogo de Jesus com os Apóstolos na Última Ceia, relatado no Evangelho de João. Jesus diz aos Apóstolos que vai preparar-lhes um lugar na casa do Pai (cf. Jo 14,2-3). E quando Tomé lhe pergunta pelo caminho para ir a essa casa, a esse novo reino, Jesus responde que Ele é o caminho, a verdade e a vida (v. 6). Quando Filipe lhe pede que mostre o Pai aos discípulos, Jesus replica de modo absolutamente unívoco: “Quem me viu, viu o Pai. Como tu dizes: ‘Mostra-nos o Pai’? Não crês que Eu estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que Eu vos falo, não as falo por mim mesmo, mas é o Pai que, permanecendo em mim, realiza as suas obras. Crede-me: Eu estou no Pai e o Pai está em mim. Crede ao menos por causa dessas obras” (vv. 9-11).

quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Leitura litúrgica do Livro de Daniel (2)

“Bendito sois, Senhor, no firmamento dos céus! Sois digno de louvor e de glória eternamente” (Dn 3,56).

Na última postagem da nossa série sobre a leitura litúrgica dos livros da Sagrada Escritura iniciamos um estudo sobre o Livro de Daniel (Dn), considerado pela tradição cristã como um dos quatro “profetas maiores” do Antigo Testamento (AT), junto com Isaías, Jeremias e Ezequiel.

Na primeira parte, após uma breve introdução, analisamos sua leitura em composição harmônica na Missa e na Liturgia das Horas. Cabe-nos agora considerar o segundo critério de seleção dos textos bíblicos: a leitura semicontínua.

Profeta Daniel (Aleijadinho)
(Santuário de Bom Jesus de Matosinhos - Congonhas, MG)

3. Leitura litúrgica do Livro de Daniel: Leitura semicontínua

Como indica o n. 66 do Elenco das Leituras da Missa (ELM), a leitura semicontínua é a proclamação dos principais textos de um livro na sequência, oferecendo aos fiéis um contato mais amplo com a Palavra de Deus [1].

a) Celebração Eucarística

Na Celebração Eucarística, os livros do AT são lidos de maneira semicontínua nos dias de semana do Tempo Comum, várias semanas cada um, conforme sua extensão (cf. ELM, n. 1110) [2]. Daniel é lido por uma semana: da segunda-feira ao sábado da XXXIV semana do Tempo Comum no ano ímpar, logo após os Livros dos Macabeus.

Esta escolha é feita “em consonância com a índole escatológica deste tempo” (ibid.) [3], uma vez que se trata da última semana do Ano Litúrgico. As seis perícopes selecionadas aqui são:

XXXIV semana do Tempo Comum (ano ímpar):
Segunda-feira: Dn 1,1-6.8-20;
Terça-feira: Dn 2,31-45;
Quarta-feira: Dn 5,1-6.13-14.16-17.23-28;
Quinta-feira: Dn 6,12-28;
Sexta-feira: Dn 7,2-14;
Sábado: Dn 7,15-27 [4].

Como veremos adiante nesta postagem, durante toda essa semana o “salmo” é substituído pelos cânticos do capítulo 3 de Daniel.

b) Liturgia das Horas

Também na Liturgia das Horas a leitura semicontínua de Daniel estende-se por uma semana ao final do Ano Litúrgico, mais especificamente no Ofício das Leituras da XXXII semana do Tempo Comum, igualmente após os Livros dos Macabeus e antes dos profetas Joel e Zacarias (cap. 9–14).

As sete perícopes escolhidas, boa parte das quais não foi lida na Missa, são:

Ofício das Leituras: XXXII semana do Tempo Comum
Domingo: Dn 1,1-21 - “Fidelidade dos jovens israelitas no palácio do rei da Babilônia”;
Segunda-feira: Dn 2,26-47 - “Visão da estátua e da pedra. O Reino eterno de Deus”;
Terça-feira: Dn 3,8-12.19-24.91-97 - “A estátua de ouro do rei. Os jovens salvos da fornalha”;
Quarta-feira: Dn 5,1-2.5-9.13-17.25–6,1 - “Sentença de Deus no banquete de Baltasar”;
Quinta-feira: Dn 9,1-4a.18-27 - “Oração e visão de Daniel”;
Sexta-feira: Dn 10,1-21 - “Visão do homem e aparição do anjo”;
Sábado: Dn 12,1-13 - “Profecia sobre o último dia e a ressurreição” [5].

O banquete de Baltasar (Dn 5) - Rembrandt

No ciclo bienal do Ofício das Leituras, que infelizmente não foi traduzido para o Brasil, nosso livro é lido por dez dias, da quinta-feira da XXXIII semana ao sábado da XXXIV semana do Tempo Comum no ano par, novamente após os Livros dos Macabeus, como no ciclo anual, dando espaço para a leitura da profecia de Ezequiel no ano ímpar.

terça-feira, 24 de outubro de 2023

Celebrações durante o Sínodo dos Bispos (2023)

De 04 a 29 de outubro de 2023 acontece no Vaticano a Primeira Sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, com o tema “Por uma Igreja Sinodal: Comunhão, participação, missão”.

Durante as diversas etapas da assembleia sinodal foram celebradas quatro Missas no altar da Cátedra da Basílica de São Pedro, presididas por representantes das Igrejas Católicas Orientais e das Conferências Episcopais dos diversos continentes:

09 de outubro: Divina Liturgia segundo o Rito Bizantino
Presidida por Dom Youssef Absi, Patriarca da Igreja Católica Greco-Melquita




13 de outubro: Sexta-feira da XXVII semana do Tempo Comum
Presidida pelo Cardeal Fridolin Ambongo Besungu, Arcebispo de Kinshasa (República Democrática do Congo), Presidente do Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagascar (SECAM)



Ângelus: XXIX Domingo do Tempo Comum - Ano A

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 22 de outubro de 2023

Amados irmãos e irmãs, bom dia!
O Evangelho da Liturgia de hoje diz-nos que alguns fariseus se unem aos herodianos para armar uma cilada a Jesus. Estavam sempre procurando fazer-lhe armadilhas. Aproximam-se d’Ele e perguntam-lhe: «É lícito ou não pagar o tributo a César?» (Mt 22,17). É um engano: se Jesus legitima o imposto, coloca-se do lado de um poder político mal tolerado pelo povo, enquanto que, se diz para não pagá-lo, pode ser acusado de rebelião contra o império. Uma verdadeira armadilha. Mas Ele escapa a esta cilada. Pede-lhes que lhe mostrem uma moeda, que tem a imagem de César, e diz: «Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus» (v. 21). O que significa isto?

Estas palavras de Jesus tornaram-se de uso corrente, mas por vezes foram mal utilizadas - ou pelo menos reduzidas - para falar da relação entre a Igreja e o Estado, entre os cristãos e a política; muitas vezes são entendidas como se Jesus quisesse separar “César” e “Deus”, isto é, a realidade terrena e a realidade espiritual. Às vezes também pensamos assim: a fé com as suas práticas é uma coisa e a vida quotidiana é outra. E isso é errado. É uma “esquizofrenia”, como se a fé não tivesse nada a ver com a vida concreta, com os desafios da sociedade, com a justiça social, com a política, etc.

Na realidade, Jesus quer ajudar-nos a colocar “César” e “Deus” cada um no seu devido lugar. A César - isto é, à política, às instituições civis, aos processos sociais e econômicos - pertence o cuidado da ordem terrena; e nós, que estamos imersos nesta realidade, devemos devolver à sociedade o que ela nos oferece através do nosso contributo como cidadãos responsáveis, cuidando do que nos é confiado, promovendo o direito e a justiça no mundo do trabalho, pagando honestamente os impostos, empenhando-nos no bem comum, etc. Ao mesmo tempo, porém, Jesus afirma a realidade fundamental: que o homem pertence a Deus, o homem todo e todo o ser humano. E isto significa que não pertencemos a nenhuma realidade terrena, a nenhum “César” de turno. Pertencemos ao Senhor e não devemos ser escravos de nenhum poder mundano. Na moeda, portanto, está a imagem do imperador, mas Jesus lembra-nos que na nossa vida está gravada a imagem de Deus, que nada nem ninguém pode ofuscar. A César pertencem as coisas deste mundo, mas o homem e o próprio mundo pertencem a Deus: não nos esqueçamos disso!

Compreendamos, então, que Jesus está a restituir cada um de nós à própria identidade: na moeda deste mundo está a imagem de César, mas tu - eu, cada um de nós - que imagem trazes dentro de ti? Façamos esta pergunta a nós mesmos: eu, que imagem trago dentro de mim? Tu, que imagem trazes na tua vida? Lembramo-nos de que pertencemos ao Senhor, ou deixamo-nos moldar pela lógica do mundo e fazemos do trabalho, da política, do dinheiro os nossos ídolos a adorar?
Que a Virgem Santíssima nos ajude a reconhecer e a honrar a nossa dignidade e a de cada ser humano. 

O tributo de César (Philippe de Champaigne)

Fonte: Santa Sé.

sexta-feira, 20 de outubro de 2023

Mensagem do Papa Francisco: Dia Mundial das Missões 2023

Confira a Mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial das Missões 2023, inspirada no relato dos discípulos de Emaús.

O Dia Mundial das Missões é celebrado no penúltimo domingo de outubro - neste ano no dia 22, coincidindo com a Memória de São João Paulo II, que se destacou por suas viagens missionárias:

Papa Francisco
Mensagem para o Dia Mundial das Missões
22 de outubro de 2023
Corações ardentes, pés a caminho (cf. Lc 24,13-15)

Queridos irmãos e irmãs!
Para o Dia Mundial das Missões deste ano escolhi um tema que se inspira na história dos discípulos de Emaús, narrada por Lucas no seu Evangelho (cf. Lc 24,13-35): «Corações ardentes, pés a caminho». Aqueles dois discípulos estavam confusos e desiludidos, mas o encontro com Cristo na Palavra e no Pão partido acendeu neles o entusiasmo para pôr os pés a caminho rumo a Jerusalém e anunciar que o Senhor tinha verdadeiramente ressuscitado. Na narração evangélica, apreendemos a transformação dos discípulos a partir de algumas imagens sugestivas: corações ardentes pelas Escrituras explicadas por Jesus, olhos abertos para reconhecê-lo e, como ponto culminante, pés a caminho. Meditando sobre estes três aspectos, que traçam o itinerário dos discípulos missionários, podemos renovar o nosso zelo pela evangelização no mundo de hoje.

1. Corações ardentes, «quando nos explicava as Escrituras» - A Palavra de Deus ilumina e transforma o coração na missão

No caminho de Jerusalém para Emaús, os corações dos dois discípulos estavam tristes - como transparecia em seus rostos - por causa da morte de Jesus, em quem haviam acreditado (v. 17). Perante o fracasso do Mestre crucificado, a esperança de que fosse Ele o Messias desmoronou-se neles (v. 21).

E eis que, «enquanto conversavam e discutiam, aproximou-se deles o próprio Jesus e pôs-se com eles a caminho» (v. 15). Como no início da vocação dos discípulos, também agora, no momento da frustração, o Senhor toma a iniciativa de aproximar-se dos seus discípulos e caminhar junto a eles. Na sua grande misericórdia, Ele nunca se cansa de estar conosco, apesar dos nossos defeitos, dúvidas, fraquezas e não obstante a tristeza e o pessimismo nos reduzam a «homens sem inteligência e lentos de espírito» (v. 25), pessoas de pouca fé.


Hoje como então, o Senhor Ressuscitado está próximo dos seus discípulos missionários e caminha junto a eles, sobretudo quando se sentem frustrados, desanimados, temerosos perante o mistério da iniquidade que os rodeia e quer sufocá-los. Por isso, «não deixemos que nos roubem a esperança!» (Exortação Apostólica Evangelii gaudium, n. 86). O Senhor é maior do que os nossos problemas, sobretudo quando os encontramos ao anunciar o Evangelho ao mundo, porque esta missão, afinal, é d’Ele e nós somos simplesmente os seus humildes colaboradores, «servos inúteis» (Lc 17,10).

Artigos sobre Liturgia: Revista de Cultura Teológica 2009-2010

Há dez dias destacamos aqui em nosso blog cinco artigos sobre Liturgia publicados pela Revista de Cultura Teológica, ligada ao Programa de Estudos Pós Graduados em Teologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), nos anos de 2011 e 2012.

Com esta postagem demos continuidade à “retrospectiva” dos textos publicados na Revista: 2022 (9 artigos); 2020 (3 artigos); 2016-2018 (6 artigos); 2013-2015 (5 artigos).

Aqui, por sua vez, trazemos outros cinco artigos publicados na Revista de Cultura Teológica nos anos de 2009 e 2010.

Seguem os resumos dos textos, que podem ser acessados na íntegra no site da Revista:

Resgate da mística na Liturgia a partir do Concílio Vaticano II
Valeriano dos Santos Costa

Este estudo é desenvolvido em quatro partes. A primeira parte define o que é mística, enquanto experiência pascal que extasiava as comunidades primitivas e que, de certa forma, se alojou nas apologias e bênçãos da Idade Média. A segunda parte trata da rígida uniformidade que se instalou na Liturgia a partir do Concílio de Trento, prejudicando a entrega ritual que a mística extática exige. A terceira aborda o Movimento Litúrgico como a fonte do resgate da mística na Liturgia. A quarta, por fim, trata do resgate da mística a partir do Concílio Vaticano II, mostrando que é uma mística que leva à participação litúrgica ativa porque é de cunho extático.



“Fazei isto em memória de mim” (1Cor 11,24) - Oração Eucarística: Memorial da Páscoa do Senhor Jesus
Antonio Spirandeli Junior

O presente artigo discute o que é o memorial, passando pelo conceito de memória até sua formulação religiosa na tradição judaica como um ato religioso, cúltico e litúrgico do antigo Israel. Apresenta como esta celebração memorial está presente desde o início do cristianismo e como se estruturou a celebração deste memorial na tradição primitiva dos cristãos. Faz uma análise da estrutura das Orações Eucarísticas e o seu significado teológico e litúrgico. Ao final, apresenta aspectos para uma vivência espiritual e pastoral deste momento celebrativo.


quinta-feira, 19 de outubro de 2023

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio: Jesus Cristo 19

Jesus Cristo como “Legislador divino” foi o tema da 30ª Catequese de São João Paulo II sobre Deus Filho.

Para acessar nossa postagem com os links para todas as Catequeses do Papa polonês, clique aqui.

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
CREIO EM JESUS CRISTO

30. Jesus Cristo, Legislador divino
João Paulo II - 14 de outubro de 1987

1. Nos Evangelhos encontramos outro fato que atesta a consciência que Jesus tinha de possuir uma autoridade divina e a convicção que os evangelistas e a primeira comunidade cristã tinham dessa autoridade. Com efeito, os Sinóticos são concordes em dizer que os ouvintes de Jesus “ficaram maravilhados com seu ensinamento, pois Ele os ensinava como quem tem autoridade, não como os escribas” (Mc 1,22; Mt 7,29; Lc 4,32). É uma informação preciosa, que Marcos nos dá já no início do seu Evangelho, atestando que as pessoas haviam captado imediatamente a diferença entre o ensinamento de Cristo e aquele dos escribas israelitas, não só no modo, mas na própria substância: os escribas apoiavam seu ensinamento no texto da Lei mosaica, da qual eram intérpretes e comentadores; Jesus não seguia o método de um “professor” ou de um “comentador” da Lei antiga, mas se comportava como um legislador e, definitivamente, como alguém que tinha autoridade sobre a Lei. Notemos que os ouvintes sabiam bem que se tratava da Lei divina, dada por Moisés em virtude de um poder que Deus mesmo lhe havia concedido como seu representante e mediador junto ao povo de Israel.

Jesus pregando o “Sermão da Montanha”
(Carl Bloch)

Os evangelistas e a primeira comunidade cristã, que refletiam sobre aquela observação dos ouvintes a respeito do ensinamento de Jesus, compreenderam ainda melhor o seu significado integral, porque podiam confrontá-la com todo o sucessivo ministério de Cristo. Para os Sinóticos e para seus leitores era, pois, lógica a passagem da afirmação de um poder sobre a Lei mosaica e sobre todo o Antigo Testamento àquela da presença de uma autoridade divina em Cristo. E não só como um “enviado” ou “legado” de Deus, como no caso de Moisés: Cristo, atribuindo a si o poder de completar e interpretar com autoridade ou, ainda mais, de apresentar a Lei de Deus de um, mostrava sua consciência de ser “igual a Deus” (cf. Fl 2,6).

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Leitura litúrgica do Livro de Daniel (1)

“Sede bendito, Senhor Deus de nossos pais! A vós louvor, honra e glória eternamente!” (Dn 3,52).

Na tradição cristã, os livros proféticos do Antigo Testamento (AT) costumam ser divididos em dois grupos: os quatro “profetas maiores” (Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel) e os doze “profetas menores”, assim chamados conforme a extensão dos seus escritos.

Em nossa série sobre a leitura litúrgica dos livros da Sagrada Escritura já tratamos da obra de Ezequiel. Aqui gostaríamos de dar continuidade à proposta com o Livro de Daniel (Dn).

Profeta Daniel
(Michelangelo, Capela Sistina)

1. Breve introdução ao Livro de Daniel

Diferentemente da tradição cristã, na Bíblia hebraica o Livro de Daniel não consta entre os Profetas (Nebiim), mas sim entre os Escritos (Ketubim ou Ketuvim), uma vez que, quando foi escrito, o “cânon dos profetas” provavelmente já estava formado. Além disso, como veremos, este se aproxima mais da apocalíptica do que do profetismo.

Assim como Ester, Daniel possui alguns acréscimos em grego que não são aceitos pelos judeus e pelos cristãos protestantes. Em hebraico (e aramaico), o livro está dividido em duas grandes partes:
a) Dn 1–6: Série de relatos edificantes sobre o jovem Daniel na Babilônia;
b) Dn 7–12: Série de visões de caráter apocalíptico.

Embora a primeira parte da narrativa aconteça durante o exílio da Babilônia (séc. VI a. C.), esta é fictícia, como as “novelas bíblicas”: o autor usa eventos do passado para falar do presente. Isto fica comprovado pelos “erros históricos” presentes no relato.

A redação da obra situa-se no século II a. C., durante o período helênico, mais especificamente sob o reinado de Antíoco IV Epífanes (175-164 a. C.), que tentou impor a cultura e a religião helênicas a Israel, contra o qual ocorreu a “revolta dos Macabeus”.

A literatura apocalíptica, com efeito, é um gênero literário próprio de épocas de “crise”, que recorre ao passado e ao “futuro escatológico” (messiânico) para exortar à esperança em Deus, senhor da história.

A história de Daniel tem vários paralelos com a de José (Gn 37–50): ambos são levados para um país estrangeiro, interpretam sonhos, assumem uma posição de prestígio...

Os episódios dos três jovens na fornalha (Dn 3) e de Daniel na “cova dos leões” (Dn 6), por sua vez, imagens presentes na arte cristã desde a época das catacumbas, representam os justos perseguidos de todos os tempos, recompensados por Deus por sua fidelidade.

A seção mais apocalíptica da obra traz várias visões simbólicas: os animais, representação das potências estrangeiras, são derrotados, ao passo que o “Ancião de muitos dias” e o “Filho do homem”, simbolizando Deus e o “o povo dos santos do Altíssimo” (Dn 7,27), são vitoriosos. Cumpre recordar que no Novo Testamento o título de “Filho do homem” será atribuído ao Messias.

Destacam-se ainda outras características da apocalíptica, como as intervenções de anjos (sendo nomeados Miguel e Gabriel) e a escatologia bem desenvolvida, inclusive com referências à ressurreição dos mortos (Dn 12,2-3.13).

Por fim, os acréscimos em grego ao Livro de Daniel são:
a) Dn 3,24-90: A oração de Azarias na fornalha (de caráter penitencial) e o cântico de louvor dos três jovens, provavelmente composições mais antigas que foram acrescentadas à narrativa;
b) Dn 13: A história de Susana, salva de uma condenação injusta pela sabedoria do jovem Daniel. Na Bíblia grega este conto serve como prólogo ao livro;
c) Dn 14: Os episódios de Bel e do dragão, duas narrativas contra a idolatria, “debochando” dos deuses pagãos (como na “Epístola de Jeremias” em Br 6).

Para saber mais, confira a bibliografia indicada no final da postagem.

Daniel na cova dos leões (Dn 6)
(Catacumbas de Marcelino e Pedro, Roma - Século III)

2. Leitura litúrgica do Livro de Daniel: Composição harmônica

Como temos feito nessa série, analisaremos a presença do Livro de Daniel nas celebrações litúrgicas seguindo os dois critérios de seleção dos textos propostos no Elenco das Leituras da Missa (ELM): a composição harmônica e a leitura semicontínua (n. 66) [1]. Dos quatro “profetas maiores”, como veremos, este é o escrito menos utilizado na Liturgia.

Começaremos nosso percurso pela composição harmônica: a escolha dos textos em sintonia com o tempo ou a festa litúrgica.

terça-feira, 17 de outubro de 2023

Nota de falecimento: Dom Dimitrios Salachas

Faleceu na segunda-feira, 16 de outubro de 2023, aos 84 anos, Dom Dimitrios Salachas (Δημήτριος Σαλαχας), Exarca Apostólico Emérito para os católicos de Rito Bizantino na Grécia.


Dimitrios Salachas nasceu em Atenas (Grécia) no dia 07 de junho de 1939. Recebeu a ordenação presbiteral no dia 09 de fevereiro de 1964, incardinado no mencionado Exarcado Apostólico.

Após obter o Doutorado em Direito Canônico e Civil (in utroque iure) pela Universidade de Atenas, tornou-se professor de Direito Canônico Oriental no Pontifício Instituto Oriental em Roma e em diversas Universidades.

Nesse período serviu também como consultor em alguns organismos da Cúria Romana, além de publicar numerosos livros e artigos sobre Direito Canônico Oriental.

No dia 23 de abril de 2008 o Papa Bento XVI nomeou o Padre Dimitrios Salachas como Exarca Apostólico para os católicos de Rito Bizantino na Grécia e Bispo Titular de Carcabia, sucedendo Dom Anárghyros Printesis (†2012).

Recebeu a ordenação episcopal no dia 24 de maio seguinte na Catedral da Santíssima Trindade em Atenas, sendo ordenante principal Dom Mihai Cătălin Frăţilă, então Bispo Auxiliar de Fagaras e Alba Iulia dos Romenos.


No dia 14 de maio de 2012 foi “transferido” de sede titular, sendo nomeado Bispo Titular de Gratianopolis, a qual pertencia ao seu antecessor, Dom Anárghyros.

No dia 02 de fevereiro de 2016, tendo superado o limite de idade de 75 anos, o Papa Francisco aceitou a renúncia de Dom Dimitrios Salachas ao ofício de Exarca Apostólico da Grécia, sendo sucedido por Dom Manuel Nin.

Eterna seja sua memória! Αιωνία η μνήμη!

Para saber mais sobre o Exarcado Apostólico na Grécia, confira nossas postagens sobre as Igrejas Católicas Orientais.

Aniversário da Dedicação do Duomo de Milão (2023)

A Arquidiocese de Milão (Itália) celebra no terceiro domingo do mês de outubro a Solenidade do Aniversário da Dedicação da Catedral de Santa Maria Nascente, o Duomo de Milão.

Neste ano de 2023, a Missa da Solenidade, no dia 15 de outubro, foi presidida pelo Arcebispo, Dom Mario Enrico Delpini, segundo o Rito Ambrosiano, próprio dessa Arquidiocese.

No início da celebração foi retomado o antigo rito da “trasmigratio”, a entrada solene no Duomo, que marcava a “passagem” do título de Catedral da igreja de Santa Tecla à igreja de Santa Maria Maior. Posteriormente ambas foram destruídas para dar lugar ao atual Duomo de Milão.

Entrada do Arcebispo
Rito da transmigratio: Abertura solene das portas do Duomo
Procissão de entrada

Doze Kyries

Ângelus: XXVIII Domingo do Tempo Comum - Ano A

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 15 de outubro de 2023

Amados irmãos e irmãs, bom dia!
O Evangelho de hoje fala-nos de um rei que prepara um banquete de núpcias para o seu filho (Mt 22,1-14). É um homem poderoso, mas é sobretudo um pai generoso, que convida a participar na sua alegria. Em particular, revela a bondade do seu coração no fato de não obrigar ninguém, mas convida todos, mesmo que este modo de agir o exponha à possibilidade de rejeição. Reparemos: ele prepara um banquete, oferecendo gratuitamente a oportunidade de se encontrar, de festejar. É isto que Deus prepara para nós: um banquete, para estarmos em comunhão com Ele e uns com os outros. E nós, todos nós, portanto, somos os convidados de Deus. Mas um banquete de núpcias exige tempo e participação da nossa parte, requer um “sim”: ir, responder ao convite do Senhor. Ele convida, mas deixa-nos livres.

É este o tipo de relação que o Pai nos oferece: chama-nos a estar com Ele, deixando-nos a possibilidade de aceitar ou não. Não nos propõe uma relação de sujeição, mas de paternidade e de filiação, necessariamente condicionada pelo nosso livre consentimento. Deus é muito respeitador da liberdade, muito respeitador. Santo Agostinho usa uma expressão muito bonita a este respeito, dizendo: «Deus, que te criou sem ti, não te pode salvar sem ti» (Sermão 169, 13). E certamente não porque não tenha capacidade para isso - Ele é onipotente! - mas porque, sendo amor, respeita plenamente a nossa liberdade. Deus propõe-se, não se impõe, nunca.

Voltamos assim à parábola: o rei - diz o texto - «mandou os seus servos chamar os convidados para o casamento, mas eles não quiseram vir» (v. 3). Aqui está o drama da história: o “não” a Deus. Mas porque recusam os homens o seu convite? Será porventura um convite desagradável? Não, e, no entanto, - diz o Evangelho – «não se importaram e foram uns para o seu campo, outros para os seus negócios» (v. 5). Não se importaram porque pensavam nos seus próprios assuntos. E aquele rei que é pai, Deus, o que faz? Não desiste, continua a convidar, aliás alarga o convite, até encontrar quem o aceite, entre os pobres. Entre eles, que sabem que não têm muito, vêm tantos, em grande número, até encherem a sala (vv. 8-10).

Irmãos e irmãs, quantas vezes não atendemos ao convite de Deus porque estamos ocupados com os nossos assuntos! Muitas vezes lutamos para ter o nosso tempo livre, mas hoje Jesus convida-nos a encontrar o tempo que liberta: o tempo a dedicar a Deus, que alivia e cura o nosso coração, que aumenta em nós a paz, a confiança e a alegria, que nos salva do mal, da solidão e da perda de sentido. Vale a pena, porque é bom estar com o Senhor, dar-lhe. Onde? Na Missa, na escuta da Palavra, na oração e também na caridade, pois ajudando quem é fraco ou pobre, fazendo companhia a quem está só, escutando quem pede atenção, consolando quem sofre, estamos com o Senhor, presente em quem está em necessidade. Muitos, porém, pensam que estas coisas são “perda de tempo” e fecham-se no seu mundo privado; é triste. E isto gera tristeza. Quantos corações tristes! Porque estão fechados.

Perguntemo-nos então: como respondo eu aos convites de Deus? Que espaço lhe dou nos meus dias? A qualidade da minha vida depende dos meus negócios e do meu tempo livre ou do meu amor ao Senhor e aos irmãos, especialmente aos mais necessitados?
Maria, que com um “sim” abriu espaço para Deus, nos ajuda a não sermos surdos aos seus convites.

O convite para o banquete de casamento
(Andrei Mironov)

Fonte: Santa Sé.