quinta-feira, 28 de abril de 2022

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio (1): Deus Pai

“Estai sempre prontos a dar razão da vossa esperança” (1Pd 3,15).

No ano de 2025, além do Jubileu Ordinário, celebraremos o XVII Centenário do 1º Concílio de Niceia, o primeiro Concílio Ecumênico da Igreja, que teve lugar de 20 de maio a 19 de junho de 325 na cidade de Niceia (na atual Turquia).

O Concílio formulou o célebre Credo de Niceia, completado pelo 1º Concílio de Constantinopla (381) com a reflexão sobre o Espírito Santo, uma vez que o Concílio de Niceia se centrou na relação entre o Pai e o Filho.

Deus Pai em glória
(Basílica de Santo Estêvão, Budapeste, Hungria)

A síntese da fé dos dois Concílios, portanto, é conhecida como Símbolo Niceno-Constantinopolitano:
Creio em um só Deus, Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis.
Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos: Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai. Por ele todas as coisas foram feitas. E por nós, homens, e para nossa salvação, desceu dos céus: e se encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem Maria, e se fez homem. Também por nós foi crucificado sob Pôncio Pilatos; padeceu e foi sepultado. Ressuscitou ao terceiro dia, conforme as Escrituras, e subiu aos céus, onde está sentado à direita do Pai. E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os mortos; e o seu reino não terá fim.
Creio no Espírito Santo, Senhor que dá a vida, e procede do Pai (e do Filho); e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado: Ele que falou pelos profetas. Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica. Professo um só Batismo para a remissão dos pecados. E espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo que há de vir. Amém [1].

O Concílio de Niceia é chamado “Ecumênico” (do grego οἰκουμένη, “o habitado”, no sentido de “o mundo todo”) porque participaram Bispos do Oriente e do Ocidente e porque suas decisões foram acolhidas tanto pela Igreja Católica quanto pelas Igrejas Ortodoxas Bizantinas e Ortodoxas Orientais, além das comunidades protestantes mais tradicionais (anglicanos, luteranos, etc.).

O XVII Centenário de Niceia será, pois, uma grande celebração ecumênica, sobretudo considerando os passos dados durante e após Concílio Vaticano II (1962-1965).

Assim, preparando-nos para tão grande celebração, publicaremos aqui em nosso blog o ciclo de Catequeses do Papa São João Paulo II sobre o Creio, assim como fizemos com suas Catequeses sobre os salmos e cânticos da Liturgia das Horas (2001-2005).

I Concílio de Niceia (Cesare Nebbia)

As Catequeses sobre o Creio foram proferidas pelo Papa polonês por cerca de treze anos, de dezembro de 1984 a novembro de 1997, após as Catequeses sobre a “Teologia do Corpo” (1979-1984) e antes das Catequeses em vista do Grande Jubileu do ano 2000 (1997-2001), que retomaram alguns dos temas sobre a fé, ainda que de maneira menos sistemática.

O ciclo de Catequese sobre o Creio está dividido em cinco partes, precedidas por uma Introdução:

Introdução: 1984-1985 (20 catequeses);

1. Creio em Deus Pai: 1985-1986 (59 catequeses);

2. Creio em Jesus Cristo: 1987-1989 (85 catequeses);

3. Creio no Espírito Santo: 1989-1991 (82 catequeses);

4. A Santa Igreja Católica: 1991-1995 (137 catequeses);

5. A Virgem Maria: 1995-1997 (70 catequeses).

Vale recordar que a maior parte dessas Catequeses é anterior à publicação do Catecismo da Igreja Católica em outubro de 1992, o qual completa 30 anos neste ano de 2022 - ocasião mais do que oportuna para redescobrir a riqueza do seu conteúdo [2].

Ao longo deste ano de 2022 publicaremos as 20 Catequeses introdutórias (05 de dezembro de 1984 a 26 de junho de 1985) e as 59 Catequeses sobre Deus Pai (03 de julho de 1985 a 17 de dezembro de 1986), concluindo no início de 2023.

Em cada postagem, sempre às quintas-feiras, publicaremos uma ou duas Catequeses.

Padres do I Concílio de Niceia com o texto do Creio

INTRODUÇÃO GERAL (1984-1985)

O QUE É A CATEQUESE? (nn. 1-6)

1. O anúncio do Evangelho (05 de dezembro de 1984)
2. A escuta da Palavra de Deus (12 de dezembro de 1984)

4. Transmitir o dom integral da fé (09 de janeiro de 1985)

5. Características do ensino catequético (16 de janeiro de 1985)
6. O ensino da doutrina cristã (06 de março de 1985)

O QUE É A FÉ?

I. Origem da fé: Resposta à iniciativa de Deus (n. 7-12)

7. O que quer dizer crer? (13 de março de 1985)
8. O conhecimento racional de Deus (20 de março de 1985)

Exéquias do Cardeal Javier Lozano Barragán

No dia 25 de abril de 2022 foram celebradas no altar da Cátedra da Basílica de São Pedro as Exéquias do Cardeal Javier Lozano Barragán, Presidente Emérito do Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde, falecido em Roma no dia 20 de abril aos 89 anos.

A Missa Exequial foi presidida pelo Cardeal Giovanni Battista Re, Decano do Colégio Cardinalício, com a participação do Papa Francisco, que presidiu os ritos da Última Encomendação e Despedida no final da celebração.

O Santo Padre foi assistido pelos Monsenhores Diego Giovanni Ravelli e Ján Dubina.

Missa Exequial: Procissão de entrada
Ritos iniciais
Homilia
Apresentação das oferendas
Rito da Última Encomendação

quarta-feira, 27 de abril de 2022

Semana Santa segundo o calendário juliano: Jerusalém

Assim como a maioria das Igrejas Orientais (Católicas e Ortodoxas), o Patriarcado Greco-Ortodoxo de Jerusalém segue o calendário juliano. Neste calendário, a Páscoa de 2022foi celebrada no dia 24 de abril (uma semana após a Páscoa do Rito Romano, que segue o calendário gregoriano).

Portanto, após destacar as celebrações da Semana Santa 2022 na Igreja Greco-Católica Ucraniana e no Patriarcado de Constantinopla, nesta postagem trazemos algumas imagens das celebrações na Basílica do Santo Sepulcro, sob a presidência do Patriarca Theophilos III:

17 de abril: Divina Liturgia do Domingo de Ramos


O Patriarca abençoa com o dikirion e o trikirion
Conclusão do rito da proskomêdia
Grande Entrada
Procissão de ramos

Semana Santa segundo o calendário juliano: Constantinopla

Como recordamos em nossa postagem anterior, devido ao uso de distintos calendários, neste ano de 2022 a maioria das Igrejas Orientais (Católicas e Ortodoxas) celebrou a Páscoa no dia 24 de abril (uma semana após o Rito Romano).

Após postar as imagens da Igreja Greco-Católica Ucraniana, destacamos aqui as celebrações da Semana Santa 2022 no Patriarcado Ecumênico de Constantinopla, presididas pelo Patriarca Bartolomeu na Catedral de São Jorge em Istambul:

21 de abril: Divina Liturgia da Quinta-feira Santa com a consagração do myron

Procissão de entrada
Grande Entrada
Anáfora
Incensação
Consagração do myron

Semana Santa segundo o calendário juliano: Kiev

Neste ano de 2022, as Igrejas Orientais, tanto Católicas quanto Ortodoxas, que seguem o calendário juliano, celebraram a Páscoa no dia 24 de abril, uma semana após as Igrejas que seguem o calendário gregoriano.

Apesar do atual conflito com a Rússia, o Arcebispo-Maior da Igreja Greco-Católica Ucraniana, Dom Sviatoslav Shevchuk (Святосла́в Шевчу́к), presidiu as principais celebrações de Semana Santa segundo o Rito Bizantino na Catedral da Ressurreição em Kiev, ainda que com um número reduzido de fiéis.

17 de abril: Divina Liturgia do Domingo de Ramos

Incensação
Evangelho
Homilia
Grande Entrada
Consagração

terça-feira, 26 de abril de 2022

Renúncia do Metropolita de Presov

Na segunda-feira, 25 de abril de 2022, o Papa Francisco aceitou a renúncia de Dom Ján Babjak ao ofício de Metropolita de Prešov e hierarca da Igreja Greco-Católica Eslovaca, uma das 23 Igrejas Católicas Orientais.

Dom Ján Babjak

Ján Babjak nasceu em 28 de outubro de 1953 em Hažin nad Cirichou (Eslováquia) e foi ordenado sacerdote em 11 de junho de 1978, sendo incardinado na Eparquia de Prešov.

Em 18 de junho de 1987, ingressou na Companhia de Jesus (jesuítas). Em 1991 foi enviado a Roma para estudar, obtendo o Mestrado em Espiritualidade no Pontifício Instituto Oriental em 1993. De 1994 a 1996, por sua vez, realizou os estudos para o Doutorado em Espiritualidade (1996), enquanto trabalhava na seção eslovaca da Rádio Vaticano.

De volta à Eslováquia, exerceu diversas funções: reitor de Seminário, pároco, diretor do centro de espiritualidade dos jesuítas, ao mesmo tempo que proferiu diversas palestras sobre espiritualidade oriental nas Universidades de Bratislava e Prešov.

Dom Ján Babjak durante a visita do Papa Francisco à Eslováquia (2021)

Em 11 de dezembro de 2002 o Papa João Paulo II nomeou o Padre Ján Babjak como novo Bispo de Prešov. Ele receberia a ordenação episcopal em 06 de janeiro de 2003, na Basílica de São Pedro no Vaticano, sendo ordenante principal o próprio Papa.

Em 30 de janeiro de 2008 o Papa Bento XVI elevou a Igreja Greco-Católica Eslovaca à categoria de Igreja Metropolitana, promovendo a Eparquia de Prešov a Arquieparquia. Assim, Dom Ján Babjak torna-se seu primeiro Metropolita.

Em setembro de 2021, Dom Ján acolheu o Papa Francisco durante sua Viagem Apostólica à Eslováquia, particularmente na Divina Liturgia em Prešov.

Ao aceitar a renúncia de Dom Ján Babjak, o Papa Francisco nomeou Dom Peter Rusnák, Bispo da Eparquia de Bratislava, como Administrador Apostólico da Arquieparquia de Prešov, até que seja eleito o novo Metropolita.

Dom Peter Rusnák, Eparca de Bratislava

Com informações do site da Santa Sé.

II Domingo da Páscoa em Cracóvia

Ao longo do último domingo, 24 de abril de 2022, II Domingo da Páscoa, foram diversas as Missas celebradas no Santuário da Divina Misericórdia no distrito de Łagiewniki em Cracóvia.

Destacamos aqui a Missa presidida pelo Arcebispo de Cracóvia, Dom Marek Jędraszewski, na esplanada diante do Santuário, durante a qual foi abençoado um sino:

Procissão de entrada
Incensação do altar
Ritos iniciais
Liturgia da Palavra
Evangelho

Regina Coeli do Papa: II Domingo da Páscoa

Papa Francisco
Regina Coeli
II Domingo de Páscoa (Domingo da Divina Misericórdia)
24 de abril de 2022

Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje, último dia da Oitava de Páscoa, o Evangelho narra sobre a primeira e a segunda aparições do Senhor Ressuscitado aos discípulos. Jesus vem na Páscoa, enquanto os Apóstolos estão fechados no Cenáculo, por medo, mas como Tomé, um dos Doze, não está presente, regressa oito dias depois (cf. Jo 20,19-29). Concentremo-nos nos dois protagonistas, Tomé e Jesus, olhando primeiro para o discípulo e depois para o Mestre. E entre eles surge um lindo diálogo.

Antes de tudo, o Apóstolo Tomé. Ele representa todos nós, que não estávamos presentes no Cenáculo quando o Senhor apareceu e não tivemos outros sinais físicos nem aparições d’Ele. Também nós, como aquele discípulo, por vezes temos dificuldade: como podemos acreditar que Jesus ressuscitou, que nos acompanha e é Senhor da nossa vida sem o termos visto, sem o termos tocado? Como podemos acreditar nisto? Por que o Senhor não nos dá um sinal mais evidente da sua presença e do seu amor? Algum sinal que eu possa ver melhor... Bem, nós também somos como Tomé, com as mesmas dúvidas, o mesmo raciocínio.
Mas não devemos ter vergonha disto. Ao contar-nos a história de Tomé, de fato, o Evangelho diz-nos que o Senhor não procura cristãos perfeitos. O Senhor não procura cristãos perfeitos. Digo-vos: receio quando vejo alguns cristãos, alguma associação de cristãos que pensam que são perfeitos. O Senhor não procura cristãos perfeitos; o Senhor não procura cristãos que nunca duvidam e sempre ostentam uma fé segura. Quando um cristão é assim, há algo errado. Não, a aventura da fé, como para Tomé, é feita de luzes e sombras. Se não, que tipo de fé seria? Ela conhece tempos de consolação, ímpeto e entusiasmo, mas também de cansaço, desorientação, dúvida e escuridão. O Evangelho mostra-nos a “crise” de Tomé para nos dizer que não devemos temer as crises da vida e da fé. As crises não são um pecado, são um caminho: não devemos receá-las. Muitas vezes tornam-nos humildes, porque nos despojam da ideia de estarmos certos, de sermos melhores do que os outros. As crises ajudam-nos a reconhecer que estamos em necessidade: despertam a nossa necessidade de Deus e permitem-nos assim regressar ao Senhor, tocar as suas feridas, experimentar novamente o seu amor, como fizemos na primeira vez. Estimados irmãos e irmãs, é melhor ter uma fé imperfeita, mas humilde, sempre orientada para Jesus, do que uma fé forte, mas presunçosa, que nos torna orgulhosos e arrogantes. Ai destes, ai!

E perante a ausência e o caminho de Tomé, que muitas vezes também é nosso, qual é a atitude de Jesus? O Evangelho diz duas vezes que ele «veio» (vv. 19.26). Uma primeira vez, depois uma segunda vez, oito dias mais tarde. Jesus não desiste, não se cansa de nós, não tem medo das nossas crises, das nossas fraquezas. Ele volta sempre: quando as portas estão fechadas, Ele volta; quando duvidamos, Ele volta; quando, como Tomé, precisamos encontrá-Lo e tocá-Lo mais de perto, Ele volta. Jesus volta sempre, bate sempre à porta, e não volta com sinais poderosos que nos fariam sentir pequenos e inadequados, até envergonhados, mas com as suas feridas; Ele volta mostrando-nos as suas chagas, sinais do seu amor que abraçou as nossas fragilidades.
Irmãos e irmãs, especialmente quando experimentamos cansaço ou momentos de crise, Jesus, o Ressuscitado, deseja regressar para estar conosco. Ele espera unicamente que o procuremos, que o invoquemos, até mesmo que protestemos, como Tomé, mostrando-lhe as nossas necessidades e a nossa incredulidade. Ele regressa sempre. Por quê? Porque é paciente e misericordioso. Ele vem para abrir os cenáculos dos nossos medos e das nossas incredulidades, pois quer sempre dar-nos outra oportunidade. Jesus é o Senhor das “outras oportunidades”: Ele dá-nos sempre mais uma, sempre. Pensemos então na última vez - lembremo-nos - quando, durante um momento difícil, ou um período de crise, nos fechamos em nós próprios, barricando-nos em nossos problemas e deixando Jesus fora de casa. E prometemos, na próxima vez, no nosso cansaço, procurar Jesus, voltar para Ele, para o Seu perdão - Ele perdoa sempre, sempre! - voltemos para as feridas que nos curaram. Desta forma, nos tornaremos também capazes de compaixão, de nos aproximar das feridas dos outros sem rigidez nem preconceitos.

Que Nossa Senhora, Mãe de Misericórdia - gosto de pensar nela como Mãe da Misericórdia na segunda-feira depois do Domingo da Misericórdia - nos acompanhe no caminho da fé e do amor. 

A "dúvida de Tomé" (Duccio di Buoninsegna)

Fonte: Santa Sé.

segunda-feira, 25 de abril de 2022

Fotos da Missa do II Domingo da Páscoa no Vaticano

No dia 24 de abril de 2022, II Domingo da Páscoa (dito "Domingo da Divina Misericórdia), o Papa Francisco participou da Santa Missa na Basílica de São Pedro.

Devido às suas dores no joelho, o Papa não presidiu a celebração, sendo substituído por Dom Rino Fisichella, Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização. Não obstante, o Santo Padre proferiu a homilia, sendo assistido por Monsenhor Diego Giovanni Ravelli.

Dom Rino Fisichella, por sua vez, foi assistido por Monsenhor L'ubomir Welnitz. O livreto da celebração pode ser visto aqui.

Chegada do Santo Padre antes do início da celebração
Incensação da imagem da Virgem Maria
Ritos iniciais

Liturgia da Palavra

Homilia do Papa: II Domingo da Páscoa

Santa Missa do II Domingo da Páscoa
Homilia do Papa Francisco
Basílica de São Pedro
24 de abril de 2022

Hoje o Senhor Ressuscitado aparece aos discípulos e oferece a eles - que o haviam abandonado - a sua misericórdia, mostrando as suas chagas. As palavras que lhes dirige estão cadenciadas por uma saudação, que aparece três vezes no Evangelho de hoje: “A paz esteja convosco!” (Jo 20,19.21.26). “A paz esteja convosco!” é a saudação do Ressuscitado que vem ao encontro de todas as fraquezas e erros humanos. Vamos então seguir as três saudações de paz de Jesus: descobriremos em nós três ações da misericórdia divina. Em primeiro lugar, dá alegria; depois, desperta o perdão; e finalmente, consola durante o cansaço.

1. Em primeiro lugar, a misericórdia de Deus dá alegria, uma alegria especial, a alegria de se sentir gratuitamente perdoado. Quando, na noite de Páscoa, os discípulos veem Jesus e o ouvem dizer pela primeira vez “A paz esteja convosco!”, alegram-se (v. 20). Eles estavam trancados em casa com medo; mas também estavam fechados em si mesmos, dominados por uma sensação de fracasso. Eram discípulos que haviam abandonado o Mestre: no momento de sua prisão, haviam fugido. Pedro até o negou três vezes e alguém pertencente ao seu grupo - mesmo um deles! - havia sido o traidor. Tinham motivos para se sentir não apenas assustados, mas fracassados, gente sem valor algum. No passado, é claro, eles tinham feito escolhas corajosas, haviam seguido o Mestre com entusiasmo, compromisso e generosidade, mas no final tudo havia desmoronado; o medo havia prevalecido e eles tinham cometido o grande pecado: deixar Jesus sozinho no momento mais trágico. Antes da Páscoa, eles pensavam que eram feitos para grandes coisas, discutiam sobre quem era o maior entre eles e assim por diante... Agora, eles se encontram mesmo no fundo do poço.
Nesse clima, ouvem por primeira vez “A paz esteja convosco!”. Os discípulos poderiam ter se sentido envergonhados e, em vez disso, se alegraram - Quem os entende? - Por quê? Porque aquele rosto, aquela saudação, aquelas palavras desviam o foco de sua atenção de si mesmos para Jesus: de fato, “os discípulos se alegraram - o texto especifica - ao ver o Senhor” (v. 20). Eles são distraídos de si mesmos e de seus fracassos e atraídos pelo olhar do Senhor, onde não há severidade, mas misericórdia. Cristo não se queixa do passado, mas transmite-lhes a benevolência de sempre. E isso os reanima, infunde a paz perdida em seus corações, os torna homens novos, purificados por um perdão concedido sem cálculos, um perdão concedido sem méritos.
Esta é a alegria de Jesus, a alegria que também nós sentimos ao experimentar o seu perdão. Já nos aconteceu de assemelhar-nos aos discípulos da Páscoa: depois de uma queda, um pecado, um fracasso. Nesses momentos parece que não há mais nada a ser feito. Mas ali mesmo o Senhor tudo faz para nos dar a sua paz: através de uma Confissão, das palavras de uma pessoa que se aproxima, de uma consolação interior do Espírito, de um acontecimento inesperado e surpreendente... De várias maneiras Deus se desvela para fazer-nos sentir o abraço de sua misericórdia, uma alegria que vem de receber “o perdão e a paz”. Sim, a alegria de Deus é uma alegria que nasce do perdão e que traz paz. É assim mesmo: nasce do perdão e traz a paz; uma alegria que eleva sem humilhar, como se o Senhor não entendesse o que está acontecendo. Irmãos e irmãs, lembremo-nos do perdão e da paz recebidos de Jesus. Cada um de nós já os recebemos; cada um de nós já fez a experiência. Recordemo-nos brevemente: nos fará bem! Coloquemos a memória do abraço e das carícias de Deus antes da lembrança dos nossos erros e das nossas quedas. Assim alimentaremos a alegria. Porque nada pode ser como antes para quem experimenta a alegria de Deus! Esta alegria que transforma!

2. “A paz esteja convosco!” O Senhor o diz uma segunda vez, acrescentando: “Assim como o Pai me enviou, também eu vos envio” (v. 22). E dá aos discípulos o Espírito Santo, para torná-los agentes de reconciliação: “A quem perdoardes os pecados, lhes serão perdoados” (v. 23). Eles não apenas recebem misericórdia, mas tornam-se dispensadores da mesma misericórdia que receberam. Eles recebem esse poder, mas não por seus méritos, por seus estudos, não: é um puro dom da graça, que, no entanto, se baseia em sua experiência como homens perdoados. Agora dirijo-me a vós, missionários da Misericórdia: se cada um de vós não se sente perdoado, que deixe de ser um missionário da Misericórdia, até o momento em que se sinta novamente perdoado. E daquela misericórdia recebida sereis capazes de dar tanta misericórdia, de dar tanto perdão. E hoje e sempre na Igreja, o perdão deve chegar-nos assim, através da humilde bondade de um confessor misericordioso, que sabe que não é detentor de algum poder, mas canal de misericórdia, que derrama sobre os outros o perdão do qual ele primeiro se beneficiou. E daqui nasce aquela disposição de perdoar tudo, pois Deus perdoa tudo. Tudo e sempre. Somos nós que nos cansamos de pedir o perdão, mas Ele perdoa sempre. E vós deveis ser canais deste perdão, através da experiência de ter sido perdoados. Não é necessário torturar os fiéis que chegam até vós com os seus pecados, mas entender o que lhes acontece, escutar, perdoar e dar bons conselhos ajudando-os a seguir em frente. Deus perdoa tudo: não é preciso fechar aquela porta...
“A quem perdoardes os pecados, lhes serão perdoados.” Estas palavras estão na origem do sacramento da Reconciliação, mas não só. Toda a Igreja foi feita por Jesus uma comunidade dispensadora de misericórdia, um sinal e um instrumento de reconciliação para a humanidade. Irmãos, irmãs, cada um de nós recebeu o Espírito Santo no Batismo para ser homem e mulher de reconciliação. Quando experimentamos a alegria de sermos libertos do peso dos nossos pecados, dos nossos fracassos; quando sabemos em primeira mão o que significa renascer, depois de uma experiência que parecia não ter saída, então precisamos compartilhar o pão da misericórdia com aqueles que nos rodeiam. Sintamo-nos chamados a isso. E perguntemo-nos: eu, aqui onde vivo, na minha família, no meu trabalho, na minha comunidade, promovo a comunhão, sou um “tecelão de reconciliação”? Comprometo-me a desarmar conflitos, a trazer perdão onde há ódio, paz onde há ressentimento? Ou caio no mundo das murmurações, que sempre matam? Jesus procura em nós testemunhas para o mundo destas suas palavras: “A paz esteja convosco!” Recebi a paz, devo transmiti-la ao outro.

3. “A paz esteja convosco!” repete o Senhor pela terceira vez quando reaparece oito dias depois aos discípulos, para confirmar a fé laboriosa de Tomé. Tomé quer ver e tocar. E o Senhor não se escandaliza com a sua incredulidade, mas vem ao seu encontro: “Coloque o dedo aqui e veja as minhas mãos” (v. 27). Não são palavras de desafio, mas de misericórdia. Jesus compreende a dificuldade de Tomé: não o trata com severidade e o Apóstolo fica abalado interiormente com tanta benevolência. E é assim que, de incrédulo, ele se torna crente e faz a mais simples e bela confissão de fé: “Meu Senhor e meu Deus!” (v. 28). É uma bela invocação, podemos torná-la nossa e repeti-la ao longo do dia, especialmente quando experimentamos dúvidas e trevas, como Tomé.
Porque em Tomé está presente a história de cada crente, de cada um de nós, de cada fiel: há momentos difíceis, nos quais a vida parece negar a fé, nos quais estamos em crise e precisamos tocar e ver. Mas, como Tomé, é precisamente aqui que redescobrimos o coração do Senhor, a sua misericórdia. Nessas situações, Jesus não vem em nossa direção triunfante e com provas contundentes, não realiza milagres prodigiosos, mas oferece sinais calorosos de misericórdia. Ele nos conforta com o mesmo estilo do Evangelho de hoje: oferecendo-nos suas chagas. Não esqueçamos isto: diante dos pecados, do pecado mais horrendo, nosso ou dos demais, existe sempre a presença do Senhor que oferece as suas chagas. Não esqueçam disto! E, em nosso ministério como confessores, devemos fazer ver às pessoas que diante dos seus pecados estão as chagas do Senhor, que são mais poderosas que o pecado.
E também nos faz descobrir as feridas dos irmãos e irmãs. Sim, a misericórdia de Deus, nas nossas crises e nos nossos esforços, coloca-nos muitas vezes em contato com os sofrimentos do próximo. Achávamos que estávamos no ápice do sofrimento, no auge de uma situação difícil, e então descobrimos aqui, permanecendo em silêncio, que existe alguém que está passando por momentos, por períodos piores. E, se cuidarmos das feridas do próximo e derramarmos misericórdia sobre ele, renasce em nós uma nova esperança, que nos consola no cansaço. Então, perguntemo-nos se nos últimos tempos tocamos as feridas de alguém que sofre no corpo ou no espírito; se trouxemos paz a um corpo ferido ou a um espírito quebrantado; se passamos algum tempo ouvindo, acompanhando, consolando. Quando fazemos isso, encontramos Jesus que, com os olhos de quem é provado pela vida, nos olha com misericórdia e diz: “A paz esteja convosco!” E, me agrada pensar na presença de Nossa Senhora ali, em meio aos Apóstolos, e como, depois de Pentecostes, a pensamos como Mãe da Igreja: me agrada muito pensar n’Ela na segunda-feira após o Domingo da Misericórdia como Mãe da Misericórdia. Que Ela nos ajude a seguir em frente em nosso ministério que é tão belo.


Fonte: Santa Sé.

Homilia: Festa de São Marcos, Evangelista

Santo Irineu, Bispo
Do Tratado contra as heresias
A pregação da verdade

A Igreja, espalhada pelo mundo inteiro até os confins da terra, recebeu dos apóstolos e de seus discípulos a fé em um só Deus, Pai todo-poderoso, que criou o céu, a terra, o mar e tudo o que neles existe (cf. At 4,24); em um só Jesus Cristo Filho de Deus, que se fez homem para nossa salvação; e no Espírito Santo, que, pela boca dos profetas, anunciou antecipadamente os desígnios de Deus: a vinda de Jesus Cristo, nosso amado Senhor, o seu nascimento de uma Virgem, a sua paixão e ressurreição de entre os mortos, a ascensão corporal aos céus, a sua futura vinda do céu na glória do Pai. Então ele virá para recapitular o universo inteiro (cf. Ef 1,10) e ressuscitar todos os homens, a fim de que, segundo a vontade do Pai invisível, diante de Cristo Jesus nosso Senhor, Deus, Salvador e Rei, todo joelho se dobre no céu, na terra e abaixo da terra, e toda língua o proclame (cf. Fl 2,10-11), e ele julgue todos os homens com justiça.

A Igreja recebeu, como dissemos, e guarda com todo cuidado esta pregação e esta fé; apesar de espalhada pelo mundo inteiro, guarda-a como se morasse em uma só casa. Acredita nela como quem possui uma só alma e um só coração; e a proclama, ensina e transmite, como se tivesse uma só boca. Porque, embora através do mundo haja línguas muito diferentes, a força da Tradição é uma só e a mesma para todos.

As Igrejas fundadas na Germânia, as que se encontram na Ibéria e nas terras celtas, as do Oriente, do Egito e Líbia, ou as do centro do mundo, não creem nem ensinam de modo diferente. Assim como o sol, criatura de Deus, é um só e o mesmo para todo o universo, igualmente a pregação da verdade brilha em toda parte e ilumina todos os homens que querem chegar ao conhecimento da verdade.

E dos que presidem às Igrejas, nem mesmo o mais eloquente, dirá coisas diferentes das que afirmamos, pois ninguém está acima do divino Mestre; nem o orador menos hábil enfraquecerá a Tradição. Sendo uma só e mesma a fé, nem aquele que muito diz sobre ela a aumenta, nem aquele que diz menos a diminui.

Santo Irineu de Lião

Responsório (1Cor 1,17-18.21)

Cristo enviou-me a pregar o Evangelho, não com sábias palavras humanas, para não tornar vã sua cruz.
R. A linguagem da cruz é loucura, para aqueles que vão se perder;
para aqueles, porém, que se salvam, para nós é a força de Deus. Aleluia.

Porque o mundo não reconheceu a Deus pela sabedoria, agradou-lhe salvar os que creem pelo anúncio da louca mensagem.
R. A linguagem da cruz é loucura, para aqueles que vão se perder;
para aqueles, porém, que se salvam, para nós é a força de Deus. Aleluia.

Oração 
Ó Deus, que concedestes a São Marcos, vosso evangelista, a glória de proclamar a Boa-nova, dai-nos assimilar de tal modo seus ensinamentos, que sigamos fielmente os caminhos do Cristo. Que convosco vive e reina, na unidade do Espírito Santo. Amém.

Fonte: Liturgia das Horas, vol. II, pp. 1541-1542.

sábado, 23 de abril de 2022

Postagens sobre o Tempo da Páscoa

“Na verdade o Cristo ressuscitou! Aleluia!” (Lc 24,34).

Desde o início de nosso blog em dezembro de 2011 foram diversas as postagens publicadas sobre cada um dos tempos do Ano Litúrgico.

Anteriormente publicamos “índices” com as principais postagens sobre:

Nesta postagem, por sua vez, propomos os links para as principais postagens sobre o Tempo da Páscoa ou Tempo Pascal. À medida que realizarmos novas postagens atualizaremos os links neste índice.

Para as postagens específicas sobre o Domingo de Páscoa, por sua vez, confira o índice da Semana Santa.

No futuro publicaremos também os índices para os demais tempos litúrgicos:

1. Tempo Pascal




2. Solenidade da Ascensão do Senhor



3. Domingo de Pentecostes


A história da Solenidade de Pentecostes (2016, atualizada em 2022)



Aparição do Cristo Ressuscitado aos Apóstolos

Postagem publicada em 23 de abril de 2022. Última atualização: 15 de abril de 2023.

sexta-feira, 22 de abril de 2022

Segunda-feira da Oitava Pascal em Emaús

Na Terra Santa, a Segunda-feira da Oitava Pascal é dedicada à comemoração do encontro de Jesus Ressuscitado com os dois discípulos a caminho de Emaús (cf. Lc 24,13-35).

Portanto, o Vigário da Custódia Franciscana da Terra Santa, Padre Dobromir Jasztal, celebrou a Santa Missa no dia 18 de abril de 2022 no Santuário da Manifestação do Senhor em El Qubeibeh (ou Al-Qubeibeh).

Durante a Missa houve a tradicional bênção e distribuição dos pães. Na tarde do mesmo dia, por sua vez, teve lugar  no Santuário da Manifestação a oração das Vésperas com a exposição e bênção com o Santíssimo Sacramento.

Para saber mais sobre o Santuário de Emaús, clique aqui.

Procissão de entrada
Incensação do altar
Homilia
Oração Eucarística
Distribuição dos pães abençoados
Exposição do Santíssimo Sacramento

Imagens: Custódia Franciscana da Terra Santa.

Regina Coeli do Papa: Segunda-feira da Oitava Pascal 2022

Papa Francisco
Regina Coeli
Segunda-feira do Anjo, 18 de abril de 2022

Prezados irmãos e irmãs, bom dia!
Os dias da Oitava da Páscoa são como um único dia em que a alegria da Ressurreição se prolonga. Assim, o Evangelho da Liturgia de hoje continua a falar-nos do Ressuscitado, da sua aparição às mulheres que tinham ido ao sepulcro (Mt 28,8-15). Jesus vai ao encontro delas, saúda-as; depois lhes diz duas coisas, que também para nós será bom ouvir como dom de Páscoa. São dois conselhos do Senhor, um dom pascal!

Primeiro, tranquiliza-as com duas simples palavras: «Não temais!» (v. 10). Não tenhais medo! O Senhor sabe que os receios são os nossos inimigos diários. Sabe também que os nossos temores nascem do grande medo, do medo da morte: medo de esvanecer, de perder os entes queridos, de adoecer, de não aguentar mais... Mas, na Páscoa, Jesus venceu a morte. Portanto, ninguém nos pode dizer de modo mais convincente: «Não temais!», «Não tenhais medo!». O Senhor di-lo ali, ao lado do sepulcro do qual saiu vitorioso. Assim, convida-nos a sair dos túmulos dos nossos medos. Ouçamos bem: sair dos túmulos dos nossos medos, porque os nossos temores são como túmulos, enterram-nos lá dentro. Ele sabe que o medo está sempre à espreita diante da porta do nosso coração e que temos necessidade de ouvir repetir: não temas, não tenhas medo, não temas; na manhã da Páscoa, como na manhã de cada dia, ouvir: “Não tenhas medo!”. Tem coragem! Irmão, irmã que acreditas em Cristo, não tenhas medo! “Eu”, diz-te Jesus, “experimentei a morte por ti, assumi sobre mim o teu mal. Agora ressuscitei para te dizer: estou aqui, contigo, para sempre. Não temas!”.  Não tenhais medo!

Mas como fazer, podemos dizer, para combater o medo? Ajuda-nos a segunda coisa que Jesus diz às mulheres: «Ide dizer aos meus irmãos que vão à Galileia, pois é lá que me verão» (v. 10). Ide e anunciai! O medo sempre nos fecha em nós mesmos; fecha-nos em nós mesmos. Por outro lado, Jesus faz-nos sair e envia-nos ao encontro dos outros. Eis o remédio. Mas eu - podemos dizer - não sou capaz! Mas pensai, certamente aquelas mulheres não eram as mais adequadas ou preparadas para anunciar o Ressuscitado, mas o Senhor não se preocupa. Ele quer que se saia e que se anuncie. Sair e anunciar. Sair e anunciar. Porque não devemos guardar para nós a alegria pascal. A alegria de Cristo é fortalecida com a sua doação, multiplicada com a sua partilha. Se nos abrirmos e levarmos o Evangelho, o nosso coração dilata-se e supera o medo. Este é o segredo: anunciar para vencer o medo.

O texto de hoje diz-nos que a proclamação pode encontrar um obstáculo: a falsidade. Na verdade, o Evangelho fala de “contra-anúncio”. Qual? O dos soldados que tinham guardado o sepulcro de Jesus. São pagos - diz o Evangelho - «com uma importante soma de dinheiro» (v. 12), com um bom suborno, e recebem estas instruções: «Direis que os seus discípulos vieram tirá-lo à noite, enquanto dormíeis» (v. 13). Dormíeis? Vistes como eles roubaram o corpo durante o sono? Há aí uma contradição, mas uma contradição em que todos acreditam, porque pelo meio há o dinheiro. É o poder do dinheiro, aquele outro senhor que Jesus diz que nunca devemos servir. Há dois senhores: Deus e o dinheiro. Nunca servir o dinheiro! Isto é falsidade, a lógica do engano, que se opõe à proclamação da verdade. É um lembrete também para nós: a falsidade, nas palavras e na vida, polui a proclamação, corrompe no seu interior, reconduz ao túmulo. As falsidades levam-nos para trás, levam-nos diretamente para a morte, para o túmulo. O Ressuscitado, por outro lado, quer tirar-nos dos túmulos das falsidades e das dependências. Diante do Senhor Ressuscitado, existe este outro “deus”: o deus dinheiro, que suja tudo, arruína tudo, fecha as portas à salvação. E isto está em todo o lado: na vida quotidiana há a tentação de adorar este deus dinheiro.

Caros irmãos e irmãs, sentimo-nos justamente escandalizados quando, através da informação, descobrimos mentiras e enganos na vida das pessoas e na sociedade. Mas demos também um nome à falsidade que existe dentro de nós! E coloquemos a nossa opacidade, as nossas falsidades, perante a luz de Jesus Ressuscitado. Ele quer trazer à luz as coisas escondidas, para nos tornar testemunhas transparentes e luminosas da alegria do Evangelho, da verdade que nos liberta (cf. Jo 8,32).

Que Maria, a Mãe do Ressuscitado, nos ajude a superar os nossos medos e nos conceda a paixão pela verdade.

As santas mulheres ao sepulcro (Bartolomeo Schedoni)

Fonte: Santa Sé.

Homilias do Patriarca de Lisboa: Semana Santa 2022

Como de costume em nosso blog, publicamos aqui as homilias do Patriarca de Lisboa (Portugal), Cardeal Manuel José Macário do Nascimento Clemente, proferidas na Sé de Lisboa durante as celebrações da Semana Santa, neste ano de 2022 de 10 a 17 de abril:

Homilia no Domingo de Ramos da Paixão do Senhor
O caminho aberto na humildade de Cristo
Sé de Lisboa, 10 de abril de 2022

Caríssimos,
Iniciamos esta Semana Maior de 2022 num tempo difícil para a humanidade, em que os males sempre temidos da peste, da fome e da guerra se traduzem de novo em muitas situações, mais próximas ou mais distantes, mas que são irrecusavelmente nossas, na terra comum de todos.
Principalmente nesta semana, queremos avivar a consciência de que esses males tiveram e continuam a ter resposta da parte de Deus. Sim, de Deus que os compartilha e salva na Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo. Batizados em Cristo, continuaremos a ser essa resposta, no mesmo Espírito e em idêntica comunhão com todos. Deus responde como companhia e fonte inesgotável de vida, agora para depois.
Convém sempre, em cada celebração, guardar as palavras da “oração coleta”, que geralmente acentuam o seu sentido particular. A de hoje deu à Paixão de Cristo um significado talvez surpreendente. Começava assim: «Deus eterno e onipotente, que, para dar aos homens um exemplo de humildade, quisestes que o nosso Salvador se fizesse homem e padecesse o suplício da cruz...».
Prestemos toda a atenção a este passo: a Encarnação e a Cruz são o exemplo de humildade que Deus eterno e onipotente nos quis dar em Jesus. Modo de dizer que a onipotência divina não se manifesta como qualquer poder mundano, mas precisamente ao contrário, como entrega de si próprio, acompanhando-nos na fragilidade humana e mesmo na dor mais aguda e imerecida, como foi a de Cristo, que assumiu a de tantos.
Precisamente no “húmus” da nossa humanidade comum. Reparemos como humanidade e humildade se aproximam na grafia e no significado a não perder... Só a onipotência do amor divino conseguiria tanto, salvando-nos a todos com humildade vitoriosa.
E a oração continuava, pedindo que a mesma humildade que venceu em Jesus nos assegure a nós a sua vitória pascal. Uma humildade que vence no contraste com os poderes impositivos daquela ou desta altura, esses sim passageiros e derrotados como acabam por ser: «Fazei que sigamos os ensinamentos da sua Paixão, para tomarmos parte na glória da sua Ressurreição».


Trata-se de uma Via-Sacra a percorrer com Jesus, como Ele a percorreu conosco e continua a percorrer nos mais árduos caminhos das vidas individuais e coletivas. Se o fizermos, chegaremos aonde Ele chegou e alargaremos no mundo a sua Páscoa. É o que celebramos agora e nos incumbe sempre.
Deus salva porque nos acompanha onde mais precisamos ser acompanhados. Pouco mais de trinta anos da vida de Jesus neste mundo, mostram-nos como foi e como continua a ser. Como naquela altura aconteceu, nascido pobre em Belém, refugiado a seguir no Egito, humilde e trabalhador na oficina de Nazaré, calcorreando depois as margens do lago e os caminhos da Galileia à Judeia, sem evitar sequer os da Samaria, ou saindo de Israel para terra de gentios: eis Deus humanado e convivente, até na própria morte, a que não se eximiu por fim.
Assim continua a ser, agora e ressuscitado, multiplicando os sinais da sua presença no mundo, também e sobretudo junto dos mais pobres de todas as pobrezas, ou oprimidos de todas as opressões. Sinais da sua presença são os que, movidos pelo Espírito que nos deixou, lhe reproduzem os gestos salvadores e ecoam a sua voz consoladora, daqui até à Ucrânia e da Ucrânia a todos os cenários de muitos dramas e tragédias que não faltam por esse mundo além, ou aquém.
Muito significativo é o fato de entre tantos deuses e imperadores daquela altura, com o seu cortejo de pompas e opressões, os primeiros cristãos terem descoberto e cantado o inaudito contraste da humildade de Cristo. Ouvimo-lo há pouco, num hino bem precoce, que havemos de retomar frequentemente, para que ele ressoe nas nossas vidas e atitudes. «Cristo Jesus, que era de condição divina, não se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-se a si próprio. (...) Por isso Deus o exaltou e lhe deu o nome que está acima de todo o nome» (cf. Fl 2,6-11). Foi este o caminho da Páscoa de Cristo e é o que nos dispomos a seguir também.
Foi este o caminho da humildade de Deus e só este pode ser o nosso, para que a Páscoa continue a acontecer. Deus é sempre humilde e assim se diz em Cristo, sua Palavra encarnada. Assim como na criação que nos mantém vivos Deus é tão discreto que corremos o risco de não O perceber, assim na redenção com que nos recria em Cristo, tudo é humilde porque tudo é dom. Dom que não se impõe mas se oferece, para que todos tenham vida e vida em abundância - e apenas isto procurando.