quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

XVII Catequese do Papa sobre a oração

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 02 de dezembro de 2020
A oração (17): A bênção

Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje refletimos sobre uma dimensão essencial da oração: a bênção. Continuemos as reflexões sobre a oração. Nas narrações da criação (cfGn 1–2) Deus abençoa continuamente a vida, sempre. Abençoa os animais (Gn  1,22), abençoa o homem e a  mulher (Gn  1,28), e no final abençoa o sábado, dia de descanso e de fruição de toda a criação (Gn  2,3). É Deus quem abençoa.  Nas primeiras páginas da Bíblia, é uma repetição contínua de bênçãos. Deus abençoa, mas também os homens abençoam, e depressa se descobre que a bênção possui uma força especial, que acompanha o destinatário ao longo da vida e dispõe o coração humano a deixar-se mudar por Deus (Conc. Ecum. Vat. II, Const. Sacrosanctum concilium, 61).
Portanto, no início do mundo há Deus que “bendiz”, abençoa, bendiz. Ele vê que cada obra das suas mãos é boa e bela, e quando chega ao homem e se cumpre a criação, Ele reconhece que é «muito boa» (Gn 1,31). Pouco tempo depois, aquela beleza que Deus imprimiu na sua obra será alterada e o ser humano se tornará uma criatura degenerada, capaz de difundir o mal e a morte no mundo; mas jamais  nada poderá  apagar a primeira marca de Deus, uma marca de bondade que Deus colocou no mundo, na natureza humana, em todos nós: a capacidade de abençoar e o fato de sermos abençoados. Deus não errou com a criação, nem com a criação do homem. A esperança do mundo reside completamente na bênção de Deus: Ele continua a amar-nos, Ele primeiro, como diz o poeta Péguy, continua a esperar o nosso bem (Le porche du mystère de la deuxième vertu, 1ª ed., 1911. [ed. port.: Os portais do mistério da segunda virtude, Edições Paulinas, Portugal, 2014]).
A grande bênção de Deus é Jesus Cristo, é o grande dom de Deus, o seu Filho. É uma bênção para toda a humanidade, é uma bênção que nos salvou a todos. Ele é a Palavra eterna com a qual o Pai nos abençoou, «quando éramos ainda pecadores» (Rm 5,8) diz São Paulo: Palavra que se fez carne e foi oferecida por nós na cruz.
São Paulo proclama com comoção o desígnio de amor de Deus e diz assim: «Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que do alto do céu nos abençoou com toda a bênção espiritual em Cristo e nos escolheu nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, diante dos seus olhos. No seu amor predestinou-nos para sermos adotados como filhos seus por Jesus Cristo, segundo o beneplácito da sua livre vontade, para fazer resplandecer a sua maravilhosa graça, que nos foi concedida por Ele no Amado» (Ef 1,3-6). Não há pecado que possa cancelar completamente a imagem de Cristo presente em cada um de nós. Nenhum pecado pode cancelar aquela imagem que Deus nos concedeu. A imagem de Cristo.  Pode desfigurá-la, mas não a pode subtrair à misericórdia de Deus. Um pecador pode permanecer nos seus erros por muito tempo, mas Deus é paciente até ao fim, esperando que no final aquele coração se abra e mude. Deus é como um bom pai e como uma boa mãe, também Ele é uma boa mãe: nunca deixam de amar o seu filho, por mais que ele possa errar, sempre. Faz-me lembrar das muitas vezes que vi pessoas na fila para entrar na prisão. Tantas mães que esperam na fila para entrar e ver o seu filho na prisão: não deixam de amar o seu filho e sabem que as pessoas que passam no automóvel pensam: “Ah, esta é a mãe do prisioneiro”. Contudo, não sentem vergonha, ou melhor, sentem vergonha, mas ficam ali, pois o filho é mais importante do que a vergonha. Portanto, somos mais importantes para Deus do que todos os pecados que podemos cometer, porque Ele é pai, Ele é como mãe, Ele é puro amor, Ele abençoou-nos para sempre. E Ele nunca deixará de nos abençoar.
Uma forte experiência é ler estes textos bíblicos de bênção em uma prisão, ou em uma comunidade de recuperação. Fazer com que as pessoas, que permanecem abençoadas apesar dos seus graves erros, sintam que o Pai celeste continua a amá-las e espera que elas finalmente se abram ao bem. Se até os seus parentes mais próximos os abandonaram porque agora são considerados irrecuperáveis, para Deus continuam a ser sempre filhos. Deus não pode cancelar em nós a imagem de filho, cada um de nós é filho, é filha.  Às vezes acontecem milagres: homens e mulheres renascem. Porque encontram a bênção que os unge como filhos. Pois a graça de Deus muda a vida: nos aceita como somos, mas nunca nos deixa como somos.
Pensemos no que Jesus fez com Zaqueu (cfLc 19,1-10), por exemplo. Todos viam nele o mal; ao contrário, Jesus vê nele um vislumbre de bem, e dali, da sua curiosidade em ver Jesus, faz passar a misericórdia que salva. Assim, mudou primeiro o coração e depois a vida de Zaqueu. Nas pessoas menosprezadas e rejeitadas, Jesus via a bênção indelével do Pai. Zaqueu é um pecador público, ele praticou muitas ações  más, mas Jesus via aquele sinal indelével da bênção do Pai e por isso teve compaixão. Aquela frase que se repete tanto no Evangelho, “teve compaixão”, e aquela  compaixão leva Jesus a ajudá-lo e a mudar o seu coração. Mais ainda, chegou a identificar-se com cada pessoa em necessidade (cf. Mt 25,31-46). No trecho do “protocolo” final sobre o qual seremos todos julgados, Mateus 25, Jesus diz: “Tive fome, estava nu, estava na prisão, estava no hospital, estava ali...”. 
A Deus que abençoa, nós também respondemos abençoando: Deus ensinou-nos a abençoar e nós devemos abençoar - é a oração de louvor, de adoração, de ação de graças. O Catecismo escreve: «A oração de bênção é a resposta do homem aos dons de Deus: uma vez que Deus abençoao coração do homem pode responder, bendizendo Aquele que é a fonte de toda a bênção» (n. 2626). A oração é alegria e gratidão. Deus não esperou que nos convertêssemos para começar a amar-nos, mas fê-lo muito antes, quando ainda estávamos no pecado.
Não  podemos só abençoar este Deus que nos abençoa, devemos abençoar tudo n’Ele, todo o povo, abençoar Deus e abençoar os irmãos, abençoar o mundo: esta é a raiz da mansidão cristã, a capacidade de se sentir abençoado e a capacidade de abençoar. Se todos fizéssemos isto, certamente não haveria guerras. Este mundo precisa de bênção e nós podemos dar a bênção e receber a bênção. O Pai ama-nos. E tudo o que nos resta é a alegria de bendizê-lo e a alegria de lhe agradecer, e de aprender com Ele a não amaldiçoar, mas a abençoar. E aqui apenas uma palavra para as pessoas que estão habituadas a amaldiçoar, as pessoas que têm sempre na boca, até no coração, uma palavra negativa, uma maldição. Cada um de nós pode pensar: tenho o hábito de amaldiçoar desta maneira? E peçamos ao Senhor a graça de mudar este hábito porque temos um coração abençoado e de um coração abençoado a maldição não pode sair. Que o Senhor nos ensine a nunca amaldiçoar, mas a abençoar.


Fonte: Santa Sé

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