Há cerca de 20 anos, para a Via
Sacra presidida pelo Papa João Paulo II na Sexta-feira Santa de 2001 junto ao
Coliseu, foram utilizadas as meditações escritas pelo Cardeal John Henry Newman
(1801-1890), por ocasião dos 200 anos do
seu nascimento.
O Cardeal Newman seria beatificado pelo Papa Bento XVI em
2010 e canonizado pelo Papa Francisco em 2019.
Seguem abaixo suas meditações
para a Via Sacra, que ilustramos com as 14 estações esculpidas por Arthur Eric
Rowton Gill para a Catedral do Preciosíssimo Sangue do Senhor em Londres, a Catedral de Westminster:
Departamento para as Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice
Via-Sacra no Coliseu presidida pelo Santo Padre João Paulo II
Sexta-feira Santa, 13 de abril de 2001
Oração inicial
Santo Padre: Em
nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo.
R. Amém.
Primeira Sexta-feira Santa do Terceiro Milênio. Caiu a
noite. Alta no céu brilha a lua. Os fiéis de Roma e inúmeros peregrinos se
reuniram para percorrer com Jesus o caminho da Cruz: o Coliseu, insigne
monumento do Império Romano, é agora Statio
Urbis et Orbis [1].
Via Crucis, caminho de solidariedade. Jesus, o Filho de Deus,
nascido de uma Mulher, é solidário com os seus irmãos, humanidade sofredora e
perdida: nos seus passos, o passo do exilado e do deportado, do homem
desiludido que vagueia incerto, o passo vacilante da criança, do enfermo, do
ancião, do condenado que se aproxima do patíbulo. Mas Jesus, caminhando para o
“lugar da Caveira”, conduz a humanidade para o esplendor da Glória.
Via Crucis, caminho discipular. Jesus, o único Mestre, disse: “Se
alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e me siga” (Mt 16,24). Siga-me sempre. Siga-me ao
Calvário. Junto à Cruz, de fato, estão a Mãe, a primeira discípula, e o
Discípulo amado. Subindo o Calvário, Jesus sabe que se dirige para a cátedra
suprema, para confirmar com o dom de Si o seu ensinamento: “Ninguém tem amor
maior do que aquele que dá sua vida pelos amigos” (Jo 15,13).
Via Crucis, caminho real
e sacerdotal. Jesus, consagrado pelo Espírito, é Rei e Sacerdote. No caminho do
Calvário, porém, não porta nenhuma insígnia real, nem endossa nenhuma veste
sacerdotal. Mesmo assim, sabe que inicia o seu Reino, da única forma possível
para ele: Ele reina com a força do amor. Agora inicia o seu Sacerdócio: o
Cordeiro manso e inocente oferece a Si mesmo, vítima de expiação pelos pecados
do mundo.
Via Crucis, caminho de esperança. No pôr-do-sol já está
presente a certeza da aurora. No entardecer da vida, Jesus está seguro do amor
do Pai, espera contra as evidências da “derrota”; está seguro que do ventre
escuro da terra ressurgirá qual “brilhante estrela da manhã” (Ap 22,16). Jesus sabe que, caminhando
para a morte, apressa o passo rumo à ressurreição.
Via Crucis, caminho de plenitude: de dor e de amor sem limites,
de total rebaixamento e de suprema exaltação; plenitude do Espírito, que flui
do lado aberto do Salvador, como torrente de vida e de graça; plenitude de
perdão e de misericórdia, de reconciliação e de paz. Hora do “forte grito” (Mc 15,37) e do silêncio do cosmo, que
chora a morte do seu Criador. Hora do amor obediente: “Pai, tudo está consumado”
(cf. Jo 19,30). Hora da cabeça
inclinada e do operante repouso. E, no coração da Mãe, hora de imensa piedade e
de ansiosa expectativa.
Deus todo-poderoso, fortifica-me com a tua força, consola-me
com a tua paz, ilumina-me com a beleza do teu Rosto, ilumina-me com a luz que
brota do teu incriado esplendor, purifica-me com o perfume da tua inefável
santidade, mergulha-me em ti para que eu beba da água viva que flui de ti, Pai
Santo, e do teu Filho e do teu co-eterno Amor.
Ó meu Senhor, tu és tudo para mim, só tu me bastas.
Ó meu Senhor Jesus, o teu Sangue basta para o mundo inteiro.
Tu bastas para mim e para toda a linhagem de Adão.
Ó meu Senhor Jesus, faz com que a tua Cruz baste para toda a
humanidade.
Faz com que seja eficaz. Faz que seja eficaz para mim mais
do que tudo, para evitar que eu tenha tudo em abundância sem levar nenhum fruto
à perfeição. Amém [2].
Cruz da Catedral do Preciosíssimo Sangue - Londres |
I Estação: Jesus é condenado à morte
Do Evangelho segundo Mateus (Mt 27,22-23.26)
Pilatos perguntou: “Que farei com Jesus, que chamam de
Cristo?” Todos gritaram: “Seja crucificado!”. Pilatos falou: “Mas, que mal ele
fez?” Eles, porém, gritaram com mais força: “Seja crucificado!”. (...) Então
Pilatos soltou Barrabás, mandou flagelar Jesus, e entregou-o para ser
crucificado.
O Santo, Justo e Verdadeiro é julgado pelos pecadores e
condenado à morte. No entanto, enquanto o julgavam, eram compelidos a
absolvê-lo. Judas, que o traiu, disse: “Pequei, entregando sangue inocente” (Mt 27,4). Pilatos, que emitiu a
sentença, proclama: “Eu sou inocente do sangue deste justo” (Mt 27,24). O centurião, que o viu
crucificado, exclama: “Verdadeiramente este homem era justo!” (Lc 23,47).
Senhor, és sempre justo quando falas e vences quando és
julgado. Ainda mais no último dia, quando os homens “olharão para aqueles que
transpassaram” (cf. Zc 12,10; Jo 19,37). E Tu, condenado na fraqueza,
julgarás o mundo com poder, e mesmo aqueles que serão condenados reconhecerão
que foram julgados com justiça.
A ti, Jesus, justo Juiz, a honra e a glória pelos séculos
sem fim. Amém.
I Estação: Jesus é condenado à morte (Catedral de Westminster) |
II Estação: Jesus é carregado com a Cruz
Do Evangelho segundo Mateus (Mt 27,27-31)
Os soldados de Pilatos levaram Jesus ao palácio do
governador, e reuniram toda a tropa em volta dele. Tiraram sua roupa e o
vestiram com um manto vermelho; depois teceram uma coroa de espinhos, puseram a
coroa em sua cabeça, e uma vara em sua mão direita. Então se ajoelharam diante
de Jesus e zombaram, dizendo: “Salve, rei dos judeus!”. Cuspiram nele e,
pegando uma vara, bateram na sua cabeça. Depois de zombar dele, tiraram-lhe o
manto vermelho e, de novo, o vestiram com suas próprias roupas. Daí o levaram
para crucificar.
Jesus sustenta o mundo inteiro com o seu poder divino,
porque é Deus; mas esta carga é menos pesada que a Cruz que os nossos pecados
prepararam para Ele. Os nossos pecados lhe custaram esta humilhação. Ele quis
tomar sobre si a nossa natureza, aparecer entre nós como homem, e oferecer por
nós um grande sacrifício. Quis enfrentar uma vida de sofrimento e suportar a
Paixão e, enfim, a Morte por nós.
Ó Senhor Deus todo-poderoso, que
sustentas o peso do universo sem cansar-te, e tomastes sobre ti o peso dos nossos
pecados, embora estes, sim, te cansassem, como sustentas os nossos corpos com a
tua Providência, assim salva as nossas almas com o teu sangue precioso.
A ti, Jesus, sacerdote e vítima, o louvor e a glória pelos
séculos. Amém.
II Estação: Jesus recebe sua Cruz (Catedral de Westminster) |
III Estação: Jesus cai pela primeira vez
Do Livro do Profeta Isaías (Is 53,4-6)
Ele tomava sobre si nossas enfermidades e sofria, ele mesmo,
nossas dores; e nós pensávamos fosse um chagado, golpeado por Deus e humilhado!
Mas ele foi ferido por causa de nossos pecados, esmagado por causa de nossos
crimes; a punição a ele imposta era o preço da nossa paz, e suas feridas, o
preço da nossa cura. Todos nós vagávamos como ovelhas desgarradas, cada qual
seguindo seu caminho; e o Senhor fez recair sobre ele o pecado de todos nós.
No princípio Satanás cai do céu; cai por causa da justa
sentença do Criador, contra quem se rebelou. Quando conseguiu envolver o homem
na sua rebelião, e o Criador veio para salvar a descendência de Adão, então se
apresentou para Satanás a sua breve hora de triunfo, e ele tirou o máximo
proveito disso. Quando o Santo se fez homem e esteve em seu poder, Satanás, em
seu desejo de vingança e malícia, decide que, como ele havia sido abatido pelo
braço do Todo-poderoso, assim ele lhe desferiria um duro golpe. Por isto Jesus
cai assim em terra tão rapidamente.
Ó bom Senhor, por esta tua primeira queda, elevas a todos
nós do pecado, sob cujo poder caímos tão miseravelmente.
A ti, Jesus, caído sob o peso da cruz, o nosso louvor e o
nosso amor pelos séculos. Amém.
III Estação: Jesus cai pela primeira vez (Catedral de Westminster) |
IV Estação: Jesus encontra sua Mãe
Do Evangelho segundo Lucas (Lc 2,34-35.51)
Simeão disse a Maria, a mãe de
Jesus: “Este menino vai ser causa tanto de queda como de reerguimento para
muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição. Assim serão revelados os
pensamentos de muitos corações. Quanto a ti, uma espada te traspassará a alma”.
(...) Sua mãe conservava no coração todas estas coisas.
Não há fase da vida terrena de Jesus na qual Maria não
tivesse tomado parte. Alguns, que se professam servos de Cristo, creem que a
missão dela terminou no momento em que deu à luz a Jesus. Depois disto nada lhe
teria sobrado, a não ser desaparecer e ser esquecida. Nós não pensamos assim da
Mãe de Cristo. Ela levou Jesus recém-nascido ao Templo; ela o ergue em seus braços
quando os Magos vieram adorá-lo. Ela fugiu com ele ao Egito, o acompanhou a
Jerusalém à idade de doze anos. Ela viveu com ele por trinta anos em Nazaré, e
estava com ele nas bodas de Caná. Também quando Jesus a deixou para iniciar a
sua pregação, Maria não o perdeu de vista. E agora ela se apresenta a ele
enquanto percorre laboriosamente a Via Sacra com a cruz aos ombros.
Doce Mãe, permite-nos pensar também em ti quando pensamos em
Jesus, e quando rezamos a Ele, fica conosco com a tua poderosa intercessão.
A ti, santa Maria, Mãe intrépida, transpassada pela espada
da dor, o nosso louvor consciente e grato. Amém.
IV Estação: Jesus encontra sua Mãe (Catedral de Westminster) |
V Estação: Jesus é ajudado por Simão Cireneu a levar a Cruz
Do Evangelho segundo Lucas (Lc 23,26-27)
Enquanto levavam Jesus, pegaram certo Simão, de Cirene, que
voltava do campo, e impuseram-lhe a cruz para carregá-la atrás de Jesus. Seguia-o
uma grande multidão do povo e de mulheres que batiam no peito e choravam por
ele.
Jesus poderia ter carregado a Cruz sozinho, se assim o
quisesse; mas ele permite que Simão o ajude, para recordar-nos que devemos
tomar parte nos seus sofrimentos e colaborar na sua obra. O seu mérito é
infinito; no entanto, ele aceita que nós, seu povo, acrescentamos o nosso
mérito ao seu. A santidade da Bem-aventurada Virgem, o sangue dos Mártires, as
orações e penitências dos Santos, as boas obras de todos os fiéis tomam parte
daquela obra que, todavia, mesmo sem estas contribuições humanas seria
perfeita. Ele nos salva com o seu sangue, mas nos salva também através de nós e
conosco.
Amado Senhor, ensina-nos a sofrer contigo; faz que sofrer
por teu amor seja doce para nós, e santifica com os teus méritos todos os
nossos sofrimentos.
A ti, Jesus, força e sustento do universo, toda honra e
glória pelos séculos sem fim. Amém.
V Estação: Simão de Cirene ajuda Jesus a carregar a Cruz (Catedral de Westminster) |
VI Estação: A Verônica enxuga o rosto de Jesus
Do Livro do Profeta Isaías (Is 53,2-3)
Não tinha beleza nem atrativo para o olharmos, não tinha
aparência que nos agradasse. Era desprezado como o último dos mortais, homem
coberto de dores, cheio de sofrimentos; passando por ele, tapávamos o rosto.
Jesus permitiu a uma mulher piedosa conservar impressos em
um véu os traços da sua sagrada face, para que permanecessem para os tempos
futuros. O quis para recordar a todos nós que a sua imagem deve permanecer sempre
impressa em nossos corações. Quem quer que sejamos, em qualquer região da terra
ou época da história, Jesus deve sempre morar em nosso coração. Podemos ter
opiniões diversas uns dos outros sobre muitas coisas, mas sobre isto devemos
todos concordar, se somos seus discípulos fiéis. Devemos portar conosco o véu
da Verônica; devemos sempre meditar a Morte e Ressurreição de Cristo e sempre
imitar, na medida que nos é dada, a sua divina perfeição.
Ó Senhor, faz que o nosso rosto seja sempre agradável aos
teus olhos, não manchado pelo pecado, mas limpo e iluminado pelo teu sangue
precioso.
A ti, Jesus, esplendor da glória do Pai, o nosso amor fiel e
grato. Amém.
VI Estação: Jesus e Verônica (Catedral de Westminster) |
VII Estação: Jesus cai pela segunda vez
Do Livro das Lamentações (Lm 3,1-2.9.16)
Sou um homem que vejo a minha miséria, como punição da ira
de Deus. Ele me levou a caminhar nas trevas, e não na luz. (...) Fechou meu
caminho com pedras, obstruiu minha passagem. (...) Quebrou-me os dentes com
cascalho, cobriu-me de cinza.
Satanás experimentou uma segunda queda quando nosso Seio
veio à terra. Há muito tempo ele havia usurpado o domínio do mundo inteiro e se
considerava o seu rei. Ele então ousou tomar o santo Salvador em seus braços e
mostrar-lhe todos os reinos, e impiamente prometeu dar-lhes a Ele, seu Criador,
se o adorasse. Jesus responde: “Vai-te embora, Satanás!” (Mt 4,10), e Satanás caiu do alto do monte. Jesus dá testemunho
disso quando diz: “Eu vi Satanás cair do céu, como um relâmpago” (Lc 10,18). O Maligno recordou-se dessa
segunda derrota e lançou por terra uma segunda vez, agora que o tinha em seu
poder, o inocente Senhor.
Amado Senhor, ensina-nos a sofrer contigo e a não temer os
golpes de Satanás, quando são consequência da resistência que lhe opomos.
A ti, Jesus, sustento da nossa fraqueza, o puro louvor e o
cântico amigo. Amém.
VII Estação: Jesus cai pela segunda vez (Catedral de Westminster) |
VIII Estação: Jesus encontra as mulheres de Jerusalém que choram por Ele
Do Evangelho segundo Lucas (Lc 23,28-31)
Jesus voltou-se para as mulheres e disse: “Filhas de
Jerusalém, não choreis por mim! Chorai por vós mesmas e por vossos filhos!
Porque dias virão em que se dirá: ‘Felizes as mulheres que nunca tiveram
filhos, os ventres que nunca deram à luz e os seios que nunca amamentaram’.
Então começarão a pedir às montanhas: ‘Caí sobre nós!’ e às colinas: ‘Escondei-nos!’
Porque, se fazem assim com a árvore verde, o que não farão com a árvore seca?”.
Desde que a antiga profecia havia anunciado que o Salvador
nasceria de uma mulher da linhagem de Abraão, todas as jovens hebreias
ansiavam por tal maternidade. Mas agora que Ele finalmente chegou, quão
diferente, segundo o Evangelho, é a realidade daquele que esperavam! Ele diz às
mulheres: “Dias virão em que se dirá: ‘Felizes as mulheres que nunca tiveram
filhos, os ventres que nunca deram à luz e os seios que nunca amamentaram’”.
Senhor, não sabemos o que é bom para nós e o que é mau. Não
podemos prever o futuro; não sabemos quando virás visitar-nos e de que modo
virás. E por isso nós confiamos tudo a Ti. Age conosco e em nós segundo o teu
bem-querer. Faz com o nosso olhar esteja sempre voltado para Ti, e dirige
sempre o teu olhar para nós; dá-nos a graça da tua Cruz e amarga Paixão, e
consola-nos da maneira que Tu sabes e na hora que Tu quiseres.
A ti, Jesus, nascido da Virgem Filha de Sião, o nosso
agradecimento comovido e humilde. Amém.
VIII Estação: Jesus conforta as mulheres de Jerusalém (Catedral de Westminster) |
IX Estação: Jesus cai pela terceira vez
Do Livro das Lamentações (Lm 3,27-32)
É bom para o homem sofrer o jugo na sua mocidade. Quando
isto lhe é imposto, queda-se em solidão e em silêncio. Deita-se com o rosto no
chão, implorando a esperança. Oferece o rosto a quem o espanca, sacia-se de
opróbrios. É certo que o Senhor a ninguém repele para sempre. Se ele aflige,
também se compadece com infinitos gestos de misericórdia.
Satanás sofrerá uma terceira e última queda no fim do mundo,
quando será para sempre trancado na prisão de fogo. Ele sabe que este será o
seu fim; não tem esperança alguma, apenas desespero. Sabe que nenhum dos
sofrimentos que agora pode infligir ao Salvador dos homens poderá subtraí-lo à
inevitável condenação. Todavia, em sua terrível raiva, em seu ódio, ele está
determinado a ultrajar e torturar enquanto possa o Rei dos reis, cujo reino é
eterno. Por isso, por uma terceira vez, o lança ferozmente ao chão.
Ó Jesus, Filho Unigênito de Deus, Verbo encarnado, nós adoramos
com temor e tremor e com infinita gratidão a terrível humilhação pela qual Tu,
que és o Altíssimo, quiseste submeter-te, ainda que por um momento apenas, qual
motivo de riso e presa do Maligno.
A ti, Jesus, força da nossa fraqueza, o hino de louvor, de
honra e de glória. Amém.
IX Estação: Jesus cai pela terceira vez (Catedral de Westminster) |
X Estação: Jesus é despojado das suas vestes
Do Evangelho segundo Mateus (Mt 27,33-36)
E chegaram a um lugar chamado Gólgota, que quer dizer “lugar
da caveira”. Ali deram vinho misturado com fel para Jesus beber. Ele provou,
mas não quis beber. Depois de o crucificarem, fizeram um sorteio, repartindo
entre si as suas vestes. E ficaram ali sentados, montando guarda.
Jesus quis renunciar a todas as coisas deste mundo antes de
deixá-lo: praticou, assim, a mais perfeita pobreza. Quando deixou a santa casa
de Nazaré para iniciar sua pregação, não tinha onde repousar a cabeça. Vivia do
alimento mais pobre e daquilo que lhe era dado por aqueles que o amavam e
serviam. Escolheu, portanto, uma morta na qual nem mesmo as vestes lhe foram deixadas.
Separou-se daquilo que, por lei natural depois da culpa original, parece mais
necessário e quase parte do ser humano.
Concede também a nós, ó bom Senhor, não nos preocupar por
coisa alguma sobre a terra, suportar a perda de tudo, e sofrer até mesmo
vergonha, reprovação, desprezo e zombaria, desde que Tu não te envergonhes de
nós no último dia.
A ti, Jesus, vestido de luz como um manto, honra, glória e
sabedoria pelos séculos dos séculos. Amém.
X Estação: Jesus é despojado de suas vestes (Catedral de Westminster) |
XI Estação: Jesus é pregado na Cruz
Do Evangelho segundo Marcos (Mc 15,25-27)
Eram nove horas da manhã quando o crucificaram. E ali estava
uma inscrição com o motivo de sua condenação: “O Rei dos Judeus”. Com Jesus
foram crucificados dois ladrões, um à direita e outro à esquerda.
Jesus tem mãos e pés perfurados por cravos afiados. Os seus
olhos estão turvos de sangue sob as pálpebras inchadas e a face lívida pelos
golpes dos algozes. A boca está cheia de vinagre e fel, a cabeça apertada por
uma coroa de afiados espinhos. O coração é transpassado por uma lança. Todos os
seus sentidos são golpeados e crucificados, a fim de oferecer expiação por todo
gênero de pecado humano.
Ó Jesus, mortifica-nos e crucifica-nos contigo. Faz com que
nunca pequemos com as mãos ou com os pés, com os olhos ou com a boca, com a mente
ou com o coração. Que todos os nossos sentidos sejam sacrifício oferecido a ti;
que cada um dos nossos membros cante o teu louvor. Faz com que o sagrado
sangue, que fluiu das tuas cinco chagas, nos inunde com tal graça santificante
que possamos morrer para o mundo e viver só para ti.
A ti, Jesus, pregado sobre a Cruz, o nosso olhar para
alcançar de ti graça e salvação. Amém.
XI Estação: Jesus é pregado na Cruz (Catedral de Westminster) |
XII Estação: Jesus morre na Cruz
Do Evangelho segundo Mateus (Mt 27,45-47.50)
Desde o meio-dia até as três horas da tarde, houve escuridão
sobre toda a terra. Pelas três horas da tarde, Jesus deu um forte grito: “Eli,
Eli, lamá sabactâni?”; que quer dizer: “Meu Deus, meu Deus, por que me
abandonaste?”. Alguns dos que ali estavam, ouvindo-o, disseram: “Ele está
chamando Elias!”. (...) Então Jesus deu outra vez um forte grito e entregou o
espírito.
Consummatum est. Tudo
está consumado, tudo chegou ao seu pleno fim. O mistério do amor de Deus por
nós está realizado. O preço foi pago, e nós fomos redimidos. O Eterno Pai
decidiu não perdoar-nos sem um preço, para mostrar-nos uma especial
benevolência. Ele se dignou tornar-nos preciosos para Si. Atribui-se valor
àquilo que se adquire pagando. Ele poderia salvar-nos sem nenhum preço, com um
simples “fiat” (“faça-se”) da sua
vontade. Mas, para mostrar o seu amor por nós, Ele fixou um preço; e se alguma
vez houvesse um preço por nós, se alguma vez houvesse um resgate a exigir em
expiação dos nossos pecados, outro não poderia ser que a morte do Filho em
nossa natureza.
Ó meu Deus e Pai, Tu nos estimas tanto a ponto de pagar o
mais alto de todos os preços pelas nossas almas de pecadores... Não deveríamos
amar-te e escolher-te sobre todas as coisas como o nosso único bem necessário?
A ti, Jesus crucificado, poder e sabedoria de Deus, toda
honra e toda glória pelos séculos eternos. Amém.
XII Estação: Jesus morre na Cruz (Catedral de Westminster) |
XIII Estação: Jesus é descido da Cruz e entregue a sua Mãe
Do Evangelho segundo Mateus (Mt 27,54-55)
O oficial e os soldados que estavam com ele guardando Jesus,
ao notarem o terremoto e tudo que havia acontecido, ficaram com muito medo e
disseram: “Ele era mesmo Filho de Deus!”. Grande número de mulheres estava ali,
olhando de longe. Elas haviam acompanhado Jesus desde a Galileia, prestando-lhe
serviços.
Agora Jesus é novamente teu, ó Virgem Mãe, porque, depois do
seu encontro com o mundo, Ele e o mundo estão de novo separados. Ele saiu de ti
para cumprir a obra do seu Pai, e com sofrimento Ele a cumpriu. Satanás e os
ímpios agora não têm mais nada que reivindicar d’Ele: há muito tempo Ele estava
em suas mãos. Satanás o havia levado sobre um alto monte; homens ímpios o
elevaram sobre a Cruz.
Ele não esteve em teus braços, ó Mãe de Deus, desde que era
uma criança; mas tu podes reivindicar teu direito sobre Ele, agora que o mundo
fez o seu pior. Porque tu és rica de todo favor divino, a toda bendita, cheia
de toda graça, a Mãe do Altíssimo, nós nos alegramos por este grande mistérios.
Ele permaneceu escondido no teu ventre, dormiu sobre teu seio, sugou os teus
peitos, foi levado em teus braços, e, agora que está morto, é depositado sobre
o teu colo. Virgem Mãe de Deus, intercede por nós.
A ti, Mãe, mulher de imensa piedade, que estreitas entre os
braços o Filho, imerso no sono da morte, o nosso amor fiel e grato. Amém.
XIII Estação: O corpo de Jesus é descido da Cruz e depositado no colo de Maria (Catedral de Westminster) |
XIV Estação: Jesus é depositado no sepulcro
Do Evangelho segundo Mateus (Mt 27,57-60)
Ao entardecer, veio um homem rico de Arimateia, chamado
José, que também se tornara discípulo de Jesus. Ele foi procurar Pilatos e
pediu o corpo de Jesus. Então Pilatos mandou que lhe entregassem o corpo. José,
tomando o corpo, envolveu-o num lençol limpo, e o colocou em um túmulo novo,
que havia mandado escavar na rocha. Em seguida, rolou uma grande pedra para
fechar a entrada do túmulo, e retirou-se.
No limiar do seu triunfo eterno, Jesus parece o mais longe
possível da vitória. Próximo de entrar no seu reino para exercer todo o poder
no céu e sobre a terra, Ele jaz sem vida em uma cavidade da rocha. É envolto em
um lençol fúnebre e encerrado em um sepulcro de pedra. Ele, porém, logo terá um
glorioso corpo espiritual, capaz de passar através de qualquer elemento e de
mover-se mais rápido que o pensamento; um corpo que em breve ascenderá ao Céu.
Faz, ó Jesus, que nos confiemos a ti, esperando que
disponhas para nós um destino semelhante ao teu.
Torna-nos seguros, ó Senhor, de que quanto maior for a nossa
aflição, mais próximos estaremos de ti;
quanto mais os homens zombam de nós, mais Tu nos honras;
quanto mais os homens nos desprezam, mais Tu nos exaltas;
quanto mais nos esquecem, mais Tu recordas-te de nós;
quanto mais nos abandonam, mais nos aproximarás de ti.
Jesus, grão de trigo depositado na terra, à espera de brotar
como imagem gloriosa do Homem novo, recebe o nosso louvor fervoroso e perene. Amém.
XIV Estação: O corpo de Jesus é depositado no sepulcro (Catedral de Westminster) |
[1] Statio, em
latim, que originalmente significava “posto de guarda”, na Liturgia passou a
designar o local onde os fiéis se reúnem para celebrar. Statio Urbis et Orbis
seria o local que reúne a cidade (urbis),
no caso Roma, e o mundo (orbis). Saiba mais em nossa postagem sobre as estações quaresmais romanas, clicando aqui.
[2] Os textos das
meditações e das orações da Via Sacra presidida pelo Papa João Paulo II no
Coliseu foram tomados do livro “Meditations and Devotions” (Meditações e
Devoções) do Cardeal John Henry Newman (1801-1890).
Tradução nossa a partir do texto italiano divulgado no site da Santa Sé (os textos bíblicos foram tomados da tradução oficial brasileira para a Liturgia).
Cardeal São John Henry Newman (1801-1890) |
Para acessar outros modelos de meditações para a Via Sacra, confira nossa postagem sobre a história da Via Sacra presidida pelo Papa no Coliseu.
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