Em nossa postagem anterior da série sobre as Missas votivas dos Santuários da Terra Santa, começamos a apresentar as “Missas votivas do
lugar” das igrejas ligadas à Paixão do
Senhor: Betfagé e os santuários junto ao Monte das
Oliveiras, em Jerusalém (Dominus
Flevit e Basílica da Agonia).
Aqui prosseguiremos com os santuários da Paixão em
Jerusalém, falando sobre as igrejas de São
Pedro in Gallicantu, da Flagelação e da Condenação.
Como temos feito em todas as postagens desta série,
apresentaremos a “oração do lugar”, as indicações de leituras e do prefácio de
cada celebração, além de algumas adaptações mais dignas de nota.
2. JERUSALÉM
2c. Santuário de São Pedro in Gallicantu
Na encosta do Monte Sião, próximo ao Cenáculo, encontra-se a
igreja de São Pedro in Gallicantu (latim
para “canto do galo”). Esta igreja marca o local onde, segundo a tradição, Jesus foi interrogado pelo Sinédrio (Mt 26,57-68 e paralelos) e Pedro o
negou três vezes (Mt 26,69-75 e paral.).
Uma capela recordando a negação de Pedro e seu
arrependimento (Mt 26,75 e paral.) foi construída no local durante o século V,
sendo destruída pelos muçulmanos no início do século XI. No século seguinte os
cruzados reconstruiriam a igreja, mas esta se deteriorou após o fim do reino
cristão de Jerusalém.
Santuário de São Pedro in Gallicantu - Jerusalém |
A igreja atual foi construída em 1931, sob os cuidados da
Congregação dos Agostinianos da Assunção (assuncionistas), de origem francesa. Como está
construído na encosta de um monte, o templo possui três níveis: a capela
superior, dedicada ao interrogatório de Jesus pelo Sinédrio; a capela do nível
médio, recordando o arrependimento de Pedro após negar Jesus; e o nível inferior, composto por antigas grutas onde, segundo a tradição, Jesus passou a noite preso
antes de ser levado a Pilatos.
Na parte externa da igreja há uma escadaria de pedras
conhecida como a “escada santa”, pois teria sido o caminho que Jesus fez com os
Apóstolos após a Ceia até o Getsêmani e o caminho por onde foi conduzido preso
até o sumo-sacerdote.
Embora não esteja confiada à Custódia Franciscana da Terra
Santa, esta igreja possui um Missal votivo (embora este não tenha sido
divulgado em latim, apenas nas outras línguas), com três formulários de Missa.
Destaque para os dois primeiros que, como veremos a seguir, possuem até mesmo
um prefácio e uma bênção próprios.
Missa votiva do
pranto de São Pedro
A primeira Missa votiva do lugar celebra o pranto de São
Pedro (“De Sancti Petri fletu”), que
expressa seu arrependimento após negar Jesus (Lc 22,61-62). As orações e
leituras desta Missa são específicos desta igreja, sem paralelo no Missal
Romano, como podemos ver a seguir.
Oração do lugar:
“Senhor, Vós sois a fonte do amor e do perdão: escutai a súplica dos vossos
fiéis que se reconhecem pecadores. Como vosso Filho olhou para Pedro quando
este o negou, fazei que Seu olhar se volte também para nós, conduzindo-nos à
vossa paz”;
Leituras: Sb 11,23–12,2
/ Sl 129,1-8 (R: v. 7b) (*) / Tg 4,5-10 / Lc 22,54-62;
(*) Em português
consta aqui o Sl 21, indicado para a Missa de Cristo, Servo sofredor;
Prefácio: “Na
verdade, ó Pai, é justo e bom glorificar-vos e oferecer-vos nossa ação de
graças, sempre e em todo lugar. Celebrando a memória de São Pedro (neste lugar), proclamamos a vossa
paciência infinita e o vosso grande amor. Vós amais os homens e não vos
afastais daqueles que tropeçam, mas os levantais quando se voltam para Vós com
confiança, por Jesus Cristo, nosso Senhor. Ele, abandonado por todos, pousou
seu olhar compassivo sobre Pedro, convidando-o a levantar-se e segui-lo de novo
com fé. Hoje ele nos faz o mesmo convite. Por isso, com a multidão daqueles que
foram perdoados e que vivem junto de Vós, proclamamos a vossa glória, cantando
a uma só voz...” (A frase entre
parênteses não aparece em português, mas sim nas outras línguas);
Bênção: “Deus
fundou a nossa fé sobre o testemunho dos apóstolos. Pela intercessão de São
Pedro, Ele vos abençoe e vos guarde na sua graça. / Ele vos conceda seguir com
fervor o caminho da paixão de Cristo, conduzindo-vos à glória da ressurreição.
/ Ele vos oriente por sua palavra de reconciliação e confirme os vossos
corações no amor fraterno”.
Missa votiva da
conversão de São Pedro (Tempo Pascal)
Este formulário substitui o anterior durante o Tempo Pascal,
celebrando a “vida nova de São Pedro” ou a “conversão de São Pedro” (“De Sancti Petri conversione”). As
orações e leituras desta celebração traçam um paralelo entre a tríplice negação
de Pedro e sua tríplice profissão de amor após a Páscoa (Jo 21).
Oração do lugar:
“Pai santíssimo, que restaurais o mundo por vosso Filho humilhado, Vós destes
ao apóstolo Pedro a graça de proclamar por três vezes o seu amor, depois de ter
negado Jesus por três vezes. Concedei-nos um arrependimento sincero a fim de
que possamos alegrar-nos na vida nova que nos ofereceis em vosso Filho, que
convosco vive e reina...”;
Leituras: Os
14,2-10 / Sl 138,1-3.11-12.23-24 (R: cf.
v. 1) / 1Pd 2,20b-25 / Jo 21,15-19;
Prefácio: “Na
verdade ó Pai, é justo e bom dar-vos glória em todo tempo, e mais ainda nestes
dias em que Cristo, nossa Páscoa, foi imolado. Destruindo o mundo decaído, ele
fez uma nova criação como nos mostra a vida nova de Pedro. Pois, quando o galo
cantou por três vezes sobre (este)
Monte Sião, o apóstolo, antes tomado pelo medo, recuperou a fé no seu Mestre.
E, após a Páscoa, à beira do Lago de Tiberíades, sua fé foi fortalecida e
recompensada depois de professar por três vezes seu amor em Jesus ressuscitado.
Por isso, vosso povo perdoado, exultando de alegria pascal, com os anjos do
céu, canta por toda a terra o hino de vossa glória...” (A palavra entre parênteses não aparece em português, mas sim nas outras
línguas);
Bênção: “Deus vos
conceda nos sacramentos a graça da Páscoa. Que ela vos fortifique e vos proteja
na hora da dúvida. / Sobre a fé renovada do Apóstolo Pedro, Deus fundou a sua
igreja. Que a graça da fé esteja sempre nos vossos corações. / Deus vos convida
a seguir a cada dia os passos do Ressuscitado. Que possais assim entrar no seu reino
onde o amor permanece para sempre”.
Missa votiva de
Cristo, Servo sofredor
Por fim, temos a Missa votiva de Cristo, Servo sofredor (“De Christo, servo patiente”).
Diferentemente das duas anteriores, esta não possui tantos textos próprios,
tomando do Missal Romano o Prefácio da Santíssima Eucaristia I e a bênção da
Paixão do Senhor. As leituras, por sua vez, são adaptadas do Domingo de Ramos.
Oração do lugar:
“Deus eterno e todo-poderoso, a fim de mostrar-nos seu amor, o vosso Filho
aceitou ser vosso Servo Sofredor. Ele foi desprezado e preso, carregando assim
as nossas dores. Humilhado até a morte, ele apagou os nossos pecados.
Transformai o nosso egoísmo em gestos de doação; ajudai-nos a viver neste mundo
que nos destes transformando o ódio em amor, o conflito em paz e o desespero em
esperança”;
Leituras: Is
53,1-10 / Sl 21, 8-9.17-20.22-24 (R: v. 2) / Fl 2,1-11 / Mc 14,55-65;
Prefácio próprio
(Cristo, Servo Sofredor): Na verdade é bom e justo dar-vos graças e elevar
a vós um hino de bênção e de louvor, Deus onipotente e eterno, por Cristo nosso
Senhor. Embora inocente, o Senhor Jesus quis sofrer pelos pecadores, e, sem ter
cometido nenhum mal, se deixou julgar como um malfeitor. Morrendo destruiu
nosso pecado, ressurgindo dos mortos nos santifica dando-nos a vida verdadeira.
Por este mistério de salvação, unidos aos coros dos anjos, proclamamos
(cantamos) a vossa glória... (Em
português é indicado o Prefácio da Eucaristia I, como afirmamos acima. O
prefácio próprio aparece nas demais línguas).
2d. Santuários da Flagelação e da
Condenação
O convento franciscano da Flagelação compreende duas
igrejas: o Santuário da Flagelação e o Santuário da Condenação e Imposição da
Cruz. Ambos marcam também o início da célebre Via Dolorosa.
As igrejas foram construídas sobre o local onde a
tradição identifica o Lithostrotos
(grego para “Pavimento”), o mosaico em frente ao tribunal onde Pilatos
sentou-se para julgar Jesus (Jo 19,13).
A igreja da Flagelação foi construída pelos cruzados no
século XII, tendo sido abandonada após a queda do reino cristão de Jerusalém, quando todo o complexo foi transformado em estábulos e casas particulares. O terreno
só foi recuperado pela Custódia em 1838. A atual igreja foi construída em 1929.
Igreja da flagelação - Jerusalém |
A igreja da Condenação, por sua vez, foi construída em 1904
sobre uma série de lajes da época romana (que continuam sob o adjacente
convento das Irmãs de Sião, a igreja do “Ecce
Homo”) que supostamente seriam do Lithostrotos.
Missa votiva do
Preciosíssimo Sangue do Senhor
O Missal votivo em português propõe para as duas igrejas a
Missa votiva do Preciosíssimo Sangue do Senhor, já indicada, como vimos na postagem anterior, para a Basílica do Getsêmani, com as mesmas orações, mas com
leituras próprias:
Leituras: Is 50,4-9a
/ Sl 115,12-.1315-18 (R: 1Cor 10,16) / 1Pd 1,17-21 / Mc 15,15-20 ou Jo 19,28-37.
Missa votiva da
Flagelação do Senhor
Os Missais em outras línguas, porém, trazem uma
Missa votiva do lugar própria para cada uma das igrejas. Para o Santuário da
Flagelação está prevista a Missa votiva da Flagelação do Senhor (“De flagellatione Domini”), com leituras
e orações específicas (tomando do Missal Romano apenas o Prefácio da Paixão I).
Oração do lugar: “Ó
Deus, que segundo a riqueza da vossa misericórdia, a fim de nos livrar do
castigo eterno, dispusestes que o vosso Filho aqui sofresse a cruel flagelação, dai-nos reparar o mal que fizemos
com a devida penitência e, pela memória de suas chagas, evitar novas ofensas”;
Leituras: Is 50,4-10
/ Sl 68,8-10.21-22.31.33-34 (R: v. 14) / 1Pd 4,12-19 / Jo 18,38-39; 19,1-5;
Evangelho: “Então
Pilatos aqui mandou flagelar Jesus”
(Jo 19,1).
Missa votiva da Via Crucis
Para o Santuário da Condenação e Imposição da Cruz, por sua
vez, é prevista a Missa votiva da Via
Crucis (“De commemoratione Viae
Crucis”). Como a anterior, esta Missa possui leituras e orações específicas
(tomando do Missal Romano novamente o Prefácio da Paixão I).
Oração do lugar:
“Ó Deus, que pela gloriosa paixão do vosso Filho nos ensinastes que pelo
caminho da Cruz podemos chegar à eterna glória, concedei-nos que, com
sentimentos de piedade, acompanhemos o Cristo no caminho do Calvário, para
segui-lo também no triunfo da sua ressurreição”;
Leituras: Is 53,1-10
/ Sl 68,8-10.15-19 (R: v. 14) / 1Pd 2,20-25 / Jo 19,16-22.
Ecce Homo e Via Dolorosa
Antes de concluir esta postagem, vale uma menção à Basílica
do Ecce Homo e à Via Dolorosa.
A Basílica do Ecce Homo (em referência às palavras
de Pilatos em Jo 19,5: “Eis o homem”) foi construída sobre o mesmo conjunto de
lajes romanas do Santuário da Condenação. Pertence ao convento da Congregação
francesa das Irmãs de Nossa Senhora de Sion.
O co-fundador da Congregação, Padre Marie-Alphonse
Ratisbonne, um judeu convertido ao Catolicismo, adquiriu o terreno em 1857,
construindo entre 1858 e 1862 a igreja e o convento anexo, além de um orfanato.
Como não pertence à Custódia, não é extensiva a esta igreja
a concessão das Missas votivas do lugar. Porém, nos dias em que as Missas
votivas são permitidas, o sacerdote poderia celebrar, por exemplo, a Missa do
Preciosíssimo Sangue do Senhor.
Basílica do "Ecce homo" |
A Via Dolorosa, por sua vez, é uma
rota processional que refaz, segundo a tradição, o caminho que fez Jesus
carregando a cruz. Seu percurso foi elaborado pelos franciscanos no século XIV.
A primeira estação é diante do Santuário da Flagelação,
enquanto as cinco últimas são dentro da Basílica do Santo Sepulcro. As demais
se distribuem ao longo do caminho. Enquanto algumas são assinaladas apenas por
um medalhão em uma parede, outras possuem pequenas capelas, algumas sob a responsabilidade
da Custódia, outras das igrejas católicas orientais (melquitas, armênios).
Capela da IV Estação (Jesus encontra sua Mãe) |
Imagens: Wikimedia Commons
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