Na última quarta-feira, 19 de maio, o Papa Francisco
prosseguiu com suas Catequeses sobre a oração à luz do Catecismo da Igreja
Católica. Ainda dentro do tema do “combate da oração” (nn. 2725-2751), o Papa
refletiu sobre três inimigos da oração (nn. 2729-2733):
Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 19 de maio de 2021
A oração (34): Distrações, aridez, acídia
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Seguindo o exemplo do Catecismo,
nesta catequese referimo-nos à experiência vivida da oração, procurando mostrar
algumas das suas dificuldades muito comuns, que devem ser identificadas e
superadas. Rezar não é fácil: há muitas dificuldades que surgem na oração. É
preciso conhecê-las, identificá-las e superá-las.
O primeiro problema que se apresenta para
aqueles que rezam é a distração (cf. CIC, 2729). Começas a rezar e depois a mente roda, roda
pelo mundo inteiro; o teu coração está ali, a mente está acolá... a distração
da prece. A oração convive frequentemente com a distração. De fato, a mente
humana tem dificuldade de se concentrar por muito tempo num único pensamento.
Todos nós experimentamos este turbilhão contínuo de imagens e ilusões em
movimento perpétuo, que nos acompanha até durante o sono. E todos sabemos que
não é bom dar seguimento a esta inclinação fragmentada.
A luta para alcançar e manter a concentração não
se limita à oração. Se não se atinge um grau de concentração suficiente, não se
pode estudar com proveito, nem se pode trabalhar bem. Os atletas sabem que as
competições são ganhas não só pelo treino físico, mas também pela disciplina
mental: acima de tudo, pela capacidade de estarem concentrados e de manter
alerta a atenção.
As distrações não são culpadas, mas devem ser
combatidas. No patrimônio da nossa fé há uma virtude que é frequentemente
esquecida, mas que está muito presente no Evangelho. Chama-se “vigilância”. E
Jesus repete-o com frequência: “Vigiai. Rezai”. O Catecismo menciona-a
explicitamente na sua instrução sobre a oração (cf. n. 2730). Jesus chama frequentemente os discípulos ao dever de
uma vida sóbria, guiada pelo pensamento de que mais cedo ou mais tarde Ele
voltará, como um noivo volta das bodas ou um senhor da viagem. No entanto, sem
saber o dia nem a hora do Seu regresso, todos os minutos da nossa vida são
preciosos e não devem ser desperdiçados em distrações. Num momento que não
conhecemos, a voz do nosso Senhor ressoará: nesse dia, bem-aventurados os
servos que Ele encontrará laboriosos, ainda concentrados no que realmente
importa. Não se dispersaram perseguindo todas as atrações que lhes vinham à
mente, mas procuraram empreender o caminho certo, praticando o bem e
desempenhando a própria tarefa. Esta é a distração: que a imaginação roda,
roda, roda... Santa Teresa definia esta imaginação que roda, roda na oração, “a
louca da casa”: é como uma louca que te faz rodar, rodar... Devemos impedi-la e
aprisioná-la com a atenção.
O tempo da aridez merece um discurso diferente. O Catecismo descreve-o deste modo: «O coração está seco, sem gosto pelos pensamentos, lembranças e sentimentos, mesmo espirituais. É o momento da fé pura, que se aguenta fielmente ao lado de Jesus na agonia e no sepulcro» (n. 2731). A aridez faz-nos pensar na Sexta-Feira Santa, na noite e no Sábado Santo, o dia inteiro: Jesus não está presente, está no sepulcro; Jesus morreu: estamos sozinhos. E este é o pensamento-mãe da aridez. Muitas vezes não sabemos quais são as razões da aridez: pode depender de nós, mas também de Deus, que permite certas situações na vida exterior ou interior. Ou, às vezes, pode ser uma dor de cabeça ou no fígado que te impede de entrar na oração. Com frequência não sabemos a razão. Os mestres espirituais descrevem a experiência da fé como uma alternância contínua de tempos de consolação e tempos de desolação; momentos em que tudo é fácil, enquanto outros são marcados por uma grande dificuldade. Muitas vezes, ao encontrarmos um amigo, dizemos: “Como estás?” - “Hoje me sinto abatido”. Acontece que às vezes nos sentimos “abatidos”, isto é, não temos sentimentos, não temos consolação, não aguentamos mais. São aqueles dias cinzentos... e existem muitos na vida! Mas o perigo é ter o coração cinzento: quando este “sentir-se abatido” chega ao coração e o faz adoecer... e há pessoas que vivem com o coração cinzento. Isto é terrível: não se pode rezar, não se pode sentir consolação com o coração cinzento! Ou não se pode levar adiante uma aridez espiritual com o coração cinzento. O coração deve ser aberto e luminoso, para que entre a luz do Senhor. E se não entrar, é preciso aguardá-la com esperança. Mas não devemos fechá-la no cinzento.
Depois, algo diverso é a acídia,
outro defeito, outro vício, que é uma verdadeira tentação contra a oração e,
mais geralmente, contra a vida cristã. A acídia é «uma forma de depressão
devida ao relaxamento da ascese, à diminuição da vigilância, à negligência do
coração» (CIC, 2733). É um dos sete “pecados capitais” pois, alimentado
pela presunção, pode levar à morte da alma.
O que devemos fazer, então, nesta sucessão de
entusiasmos e desânimos? Deve-se aprender a caminhar sempre. O verdadeiro
progresso na vida espiritual não consiste em multiplicar os êxtases, mas em ser
capaz de perseverar em tempos difíceis: caminha, caminha, caminha... E se te
sentires cansado, para um pouco e volta a caminhar. Mas com perseverança.
Recordemos a parábola de São Francisco sobre a alegria perfeita: não é nas
infinitas fortunas que caem do céu que se mede a capacidade de um frade, mas em
caminhar com constância, mesmo quando não se é reconhecido, mesmo quando se é
maltratado, ou quando tudo perdeu o sabor do princípio. Todos os santos
passaram por este “vale escuro”, e não nos escandalizemos se, lendo os seus
diários, ouvirmos o relato de noites de oração sem vontade, vivida sem gosto.
Temos de aprender a dizer: “Ainda que Tu, meu Deus, pareças fazer tudo para que
eu deixe de acreditar em Ti, continuo a rezar a Ti”. Os crentes nunca apagam a
oração! Por vezes pode assemelhar-se à oração de Jó, o qual não aceita que Deus
o trate injustamente, protesta e chama-o em juízo. Mas, muitas vezes, protestar
diante de Deus é também um modo de rezar ou, como dizia aquela velhinha,
“zangar-se com Deus também é um modo de rezar”, pois com frequência o filho
zanga-se com o pai: é um modo de se relacionar com o pai; pois o reconhece como
“pai”, zanga-se...
E também nós, que somos muito menos santos e
pacientes do que Jó, sabemos que no final, no fim deste tempo de desolação, em
que elevamos ao Céu gritos silenciosos e muitos “por quês?”, Deus nos responderá.
Não esqueçais a oração do “por quê?”: é a prece que recitam as crianças quando
começam a não entender as coisas e os psicólogos definem-na “a idade dos por quês”,
pois a criança pergunta ao pai: “Pai, por quê...? Pai, por quê...? Papai, por
quê...?”. Mas prestemos atenção: a criança não ouve a resposta do pai. O pai
começa a responder e a criança apresenta outro por quê. Só quer
chamar para si a atenção do pai; e quando nos zangamos um pouco com Deus e
começamos a pronunciar os por quês, estamos a atrair o coração do
nosso Pai na direção da nossa miséria, da nossa dificuldade, da nossa vida. Mas
sim, tende coragem de dizer a Deus: “Mas por quê...?”. Pois às vezes, zangar-se
um pouco faz bem, faz-nos despertar esta relação de filho com o Pai, de filha
com o Pai, que devemos manter com Deus. E até as nossas expressões mais duras e
amargas, Ele as acolherá com o amor de um pai, e as considerará como um ato de
fé, como uma oração.
Fonte: Santa Sé
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