Na manhã de hoje, 11 de maio de 2021, foi divulgada a Carta Apostólica sob a forma de Motu Proprio Antiquum Ministerium (Ministério antigo), pela qual o Papa Francisco institui na Igreja o ministério de Catequista.
Ao lado dos catequistas que exercem essa função por um certo período de tempo em nossas comunidades (ministério confiado), abre-se agora a possibilidade de conferir a fiéis leigos, homens e mulheres, o ministério de Catequista de maneira permanente. Sua instituição (cujo rito será publicado em breve pela Congregação para o Culto Divino) será precedida de um itinerário de formação, a ser definido pelas Conferências Episcopais de cada país.
Confira o Motu proprio na íntegra:
Carta Apostólica sob a forma de Motu Proprio Antiquum Ministerium
Do Sumo Pontífice Francisco
Pela qual se institui o Ministério de Catequista
1. Ministério antigo é o de Catequista na Igreja. Os teólogos
pensam, comumente, que se encontram os primeiros exemplos já nos escritos do
Novo Testamento. A primeira forma, germinal, deste serviço do ensinamento
achar-se-ia nos «mestres» mencionados pelo apóstolo Paulo ao escrever à
comunidade de Corinto: «E aqueles que Deus estabeleceu na Igreja são, em primeiro
lugar, apóstolos; em segundo, profetas; em terceiro, mestres; em seguida, há o
dom dos milagres, depois o das curas, o das obras de assistência, o de governo
e o das diversas línguas. Porventura são todos apóstolos? São todos profetas?
São todos mestres? Fazem todos milagres? Possuem todos o dom das curas? Todos
falam línguas? Todos as interpretam? Aspirai, porém, aos melhores dons. Aliás
vou mostrar-vos um caminho que ultrapassa todos os outros» (1Cor 12,28-31).
O próprio Lucas afirma, na abertura do seu Evangelho: «Resolvi eu
também, depois de tudo ter investigado cuidadosamente desde a origem, expô-los
[os fatos que entre nós se consumaram] a ti por escrito e pela sua
ordem, caríssimo Teófilo, a fim de reconheceres a solidez da doutrina em que
foste instruído» (Lc 1,3-4). O evangelista parece bem ciente
de estar a fornecer, com os seus escritos, uma forma específica de ensinamento
que permite dar solidez e vigor a quantos já receberam o Batismo. E voltando ao
mesmo tema, o apóstolo Paulo recomenda aos gálatas: «Mas quem está a ser
instruído na Palavra esteja em comunhão com aquele que o instrui, em todos os
bens» (Gl 6,6). Como se vê, o texto acrescenta uma
peculiaridade fundamental: a comunhão de vida como caraterística da fecundidade
da verdadeira catequese recebida.
2. Desde os seus primórdios, a comunidade cristã conheceu uma
forma difusa de ministerialidade, concretizada no serviço de homens e mulheres
que, obedientes à ação do Espírito Santo, dedicaram a sua vida à edificação da
Igreja. Os carismas, que o Espírito nunca deixou de infundir nos batizados,
tomaram em certos momentos uma forma visível e palpável de serviço à comunidade
cristã nas suas múltiplas expressões, chegando ao ponto de ser reconhecido como
uma diaconia indispensável para a comunidade. E assim o interpreta o apóstolo
Paulo, com a sua autoridade, quando afirma: «Há diversidade de dons, mas o
Espírito é o mesmo; há diversidade de serviços, mas o Senhor é o mesmo; há
diversos modos de agir, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos. A cada um
é dada a manifestação do Espírito, para proveito comum. A um é dada, pela ação
do Espírito, uma palavra de sabedoria; a outro, uma palavra de ciência, segundo
o mesmo Espírito; a outro, a fé, no mesmo Espírito; a outro, o dom das curas,
no único Espírito; a outro, o poder de fazer milagres; a outro, a profecia; a
outro, o discernimento dos espíritos; a outro, a variedade de línguas; a outro,
por fim, a interpretação das línguas. Tudo isto, porém, o realiza o único e o
mesmo Espírito, distribuindo a cada um, conforme lhe apraz» (1Cor 12,4-11).
Por conseguinte é possível reconhecer, dentro da grande tradição
carismática do Novo Testamento, a presença concreta de batizados que exerceram
o ministério de transmitir, de forma mais orgânica, permanente e associada com
as várias circunstâncias da vida, o ensinamento dos apóstolos e dos
evangelistas (cf. Conc. Ecum. Vat.
II, Const. Dogm. Dei Verbum, 8). A Igreja quis reconhecer este
serviço como expressão concreta do carisma pessoal, que tanto favoreceu o exercício
da sua missão evangelizadora. Olhar para a vida das primeiras comunidades
cristãs, que se empenharam na difusão e progresso do Evangelho, estimula também
hoje a Igreja a perceber quais possam ser as novas expressões para continuarmos
a permanecer fiéis à Palavra do Senhor, a fim de fazer chegar o seu Evangelho a
toda a criatura.
3. Toda a história da evangelização destes dois milénios
manifesta, com grande evidência, como foi eficaz a missão dos catequistas.
Bispos, sacerdotes e diáconos, juntamente com muitos homens e mulheres de vida
consagrada, dedicaram a sua vida à instrução catequética, para que a fé fosse
um válido sustentáculo para a existência pessoal de cada ser humano. Além
disso, alguns reuniram à sua volta outros irmãos e irmãs, que, partilhando o
mesmo carisma, constituíram Ordens religiosas totalmente dedicadas ao serviço
da catequese.
Não se pode esquecer a multidão incontável de leigos e leigas que
tomaram parte, diretamente, na difusão do Evangelho através do ensino
catequístico. Homens e mulheres, animados por uma grande fé e verdadeiras
testemunhas de santidade, que, em alguns casos, foram mesmo fundadores de
Igrejas, chegando até a dar a sua vida. Também nos nossos dias, há muitos
catequistas competentes e perseverantes que estão à frente de comunidades em
diferentes regiões, realizando uma missão insubstituível na transmissão e
aprofundamento da fé. A longa série de Beatos, Santos e Mártires catequistas
que marcou a missão da Igreja, merece ser conhecida, pois constitui uma fonte fecunda
não só para a catequese, mas também para toda a história da espiritualidade
cristã.
4. A partir do Concílio Ecumênico Vaticano II, a Igreja
apercebeu-se, com renovada consciência, da importância do compromisso do
laicado na obra de evangelização. Os Padres conciliares reafirmaram várias
vezes a grande necessidade que há, tanto para a implantação da Igreja como para
o crescimento da comunidade cristã, do envolvimento direto dos fiéis leigos nas
várias formas em que se pode exprimir o seu carisma. «É digno de elogio aquele
exército com tantos méritos na obra das missões entre pagãos, o exército dos
catequistas, homens e mulheres, que, cheios do espírito apostólico, prestam com
grandes trabalhos uma ajuda singular e absolutamente necessária à expansão da
fé e da Igreja. Hoje em dia, em razão da escassez de clero para evangelizar tão
grandes multidões e exercer o ministério pastoral, o ofício dos catequistas tem
muitíssima importância» (Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Ad gentes,
17).
A par do rico ensinamento conciliar, é preciso referir o interesse
constante dos Sumos Pontífices, do Sínodo dos Bispos, das Conferências
Episcopais e dos vários Pastores, que, no decorrer destas décadas, imprimiram
uma notável renovação à catequese. O Catecismo da Igreja Católica,
a Exortação apostólica Catechesi tradendae, o Diretório
Catequístico Geral, o Diretório Geral da Catequese, o
recente Diretório da Catequese, juntamente com inúmeros Catecismos nacionais,
regionais e diocesanos são expressão do valor central da obra catequística, que
coloca em primeiro plano a instrução e a formação permanente dos crentes.
5. Sem diminuir em nada a missão própria do Bispo - de ser o
primeiro Catequista na sua diocese, juntamente com o presbitério que partilha
com ele a mesma solicitude pastoral - nem a responsabilidade peculiar dos pais
relativamente à formação cristã dos seus filhos (cf. CIC cân.
774 §2; CCEO cân.
618), é necessário reconhecer a presença de leigos e leigas que, em virtude do
seu Batismo, se sentem chamados a colaborar no serviço da catequese (cf. CIC cân. 225; CCEO cân.
401 e 406). Esta presença torna-se ainda mais urgente nos nossos dias, devido à
renovada consciência da evangelização no mundo contemporâneo (cf. Francisco, Exort. Ap. Evangelii
gaudium, 163-168) e à imposição duma cultura globalizada (cf. Francisco, Carta Enc. Fratelli
tutti, 100.138), que requer um encontro autêntico com as jovens
gerações, sem esquecer a exigência de metodologias e instrumentos criativos que
tornem o anúncio do Evangelho coerente com a transformação missionária que a
Igreja abraçou. Fidelidade ao passado e responsabilidade pelo presente são as
condições indispensáveis para que a Igreja possa desempenhar a sua missão no
mundo.
Despertar o entusiasmo pessoal de cada batizado e reavivar a consciência
de ser chamado a desempenhar a sua missão na comunidade requer a escuta da voz
do Espírito que nunca deixa faltar a sua presença fecunda (cf. CIC cân.
774 §1; CCEO cân.
617). O Espírito chama, também hoje, homens e mulheres para irem ao encontro de
tantas pessoas que esperam conhecer a beleza, a bondade e a verdade da fé
cristã. É tarefa dos Pastores sustentar este percurso e enriquecer a vida da
comunidade cristã com o reconhecimento de ministérios laicais capazes de
contribuir para a transformação da sociedade através da «penetração dos valores
cristãos no mundo social, político e económico» (Evangelii gaudium,
102).
6. O apostolado laical possui, indiscutivelmente, uma valência
secular. Esta exige «procurar o Reino de Deus, tratando das realidades
temporais e ordenando-as segundo Deus» (Conc. Ecum. Vat. II, Const. Dogm. Lumen
gentium, 31). A sua vida diária é tecida de encontros e relações familiares
e sociais, o que permite verificar como «são especialmente chamados a tornarem
a Igreja presente e ativa naqueles locais e circunstâncias em que, só por meio
deles, ela pode ser o sal da terra» (Lumen gentium, 33). Entretanto é
bom recordar que, além deste apostolado, «os leigos podem ainda ser chamados,
por diversos modos, a uma colaboração mais imediata no apostolado da
Hierarquia, à semelhança daqueles homens e mulheres que ajudavam o apóstolo
Paulo no Evangelho, trabalhando muito no Senhor» (Lumen gentium, 33).
No entanto, a função peculiar desempenhada pelo Catequista
especifica-se dentro doutros serviços presentes na comunidade cristã. Com
efeito, o Catequista é chamado, antes de tudo, a exprimir a sua competência no
serviço pastoral da transmissão da fé que se desenvolve nas suas diferentes
etapas: desde o primeiro anúncio que introduz no querigma, passando
pela instrução que torna conscientes da vida nova em Cristo e prepara de modo
particular para os sacramentos da iniciação cristã, até à formação permanente
que consente que cada batizado esteja sempre pronto «a dar a razão da sua
esperança a todo aquele que lha peça» (cf. 1Pd 3,15).
O Catequista é simultaneamente testemunha da fé, mestre e mistagogo,
acompanhante e pedagogo que instrui em nome da Igreja. Uma identidade que só
mediante a oração, o estudo e a participação direta na vida da comunidade é que
se pode desenvolver com coerência e responsabilidade (cf. Cons. Pont. para a Promoção da Nova Evangelização, Diretório
da Catequese, 113).
7. Com grande clarividência, São Paulo VI emanou a Carta
apostólica Ministeria quaedam tendo em vista não só adaptar ao
novo momento histórico os ministérios de Leitor e Acólito (cf. Carta Ap. Spiritus Domini), mas também pedir às
Conferências Episcopais para promoverem outros ministérios, entre os quais o de
Catequista: «Além destes ministérios comuns a toda a Igreja Latina, nada impede
que as Conferências Episcopais peçam outros à Sé Apostólica, se, por motivos
particulares, julgarem a sua instituição necessária ou muito útil na sua
região. Tais são, por exemplo, as funções de Ostiário, de Exorcista e
de Catequista». O mesmo instante convite voltava na Exortação Apostólica Evangelii
nuntiandi, quando, ao pedir para saber ler as exigências atuais da
comunidade cristã numa continuidade fiel com as origens, exortava a encontrar
novas formas ministeriais para uma pastoral renovada: «Tais ministérios, novos
na aparência mas muito ligados a experiências vividas pela Igreja ao longo da
sua existência – por exemplo, o de Catequista (...) - , são preciosos para a
implantação, a vida e o crescimento da Igreja e para a sua capacidade de
irradiar a própria mensagem à sua volta e para aqueles que estão distantes»
(São Paulo VI, Exort. Ap. Evangelii nuntiandi, 73).
Com efeito, não se pode negar que «cresceu a consciência da
identidade e da missão dos leigos na Igreja. Embora não suficiente, pode-se
contar com um numeroso laicado, dotado de um arreigado sentido de comunidade e
uma grande fidelidade ao compromisso da caridade, da catequese, da celebração
da fé» (Evangelii gaudium, 102). Por conseguinte, receber um ministério
laical como o de Catequista imprime uma acentuação maior ao empenho missionário
típico de cada um dos batizados que, no entanto, deve ser desempenhado de forma
plenamente secular, sem cair em qualquer tentativa de clericalização.
8. Este ministério possui uma forte valência vocacional, que
requer o devido discernimento por parte do Bispo e se evidencia com o Rito de
instituição. De facto, é um serviço estável prestado à Igreja local de acordo
com as exigências pastorais identificadas pelo Ordinário do lugar, mas desempenhado
de maneira laical como exige a própria natureza do ministério. Convém que, ao
ministério instituído de Catequista, sejam chamados homens e mulheres de fé
profunda e maturidade humana, que tenham uma participação ativa na vida da
comunidade cristã, sejam capazes de acolhimento, generosidade e vida de
comunhão fraterna, recebam a devida formação bíblica, teológica, pastoral e
pedagógica, para ser solícitos comunicadores da verdade da fé, e tenham já
maturado uma prévia experiência de catequese (cf. Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Christus Dominus,
14; CIC cân. 231
§1; CCEO cân. 409
§1). Requer-se que sejam colaboradores fiéis dos presbíteros e diáconos,
disponíveis para exercer o ministério onde for necessário e animados por
verdadeiro entusiasmo apostólico.
Assim, depois de ter ponderado todos os aspectos, em virtude da
autoridade apostólica, instituo o ministério
laical de Catequista.
A Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos
providenciará, dentro em breve, a publicação do Rito de Instituição do
ministério laical de Catequista.
9. Convido, pois, as Conferências Episcopais a tornarem realidade
o ministério de Catequista, estabelecendo o iter formativo
necessário e os critérios normativos para o acesso ao mesmo, encontrando as
formas mais coerentes para o serviço que estas pessoas serão chamadas a
desempenhar em conformidade com tudo o que foi expresso por esta Carta
Apostólica.
10. Os Sínodos das Igrejas Orientais ou as Assembleias dos
Hierarcas poderão receber quanto aqui estabelecido para as respetivas
Igrejas sui iuris, com base no próprio direito particular.
11. Os Pastores não cessem de abraçar esta exortação que lhes
recordavam os Padres conciliares: «Sabem que não foram instituídos por Cristo
para se encarregarem por si sós de toda a missão salvadora da Igreja para com o
mundo, mas que o seu cargo sublime consiste em pastorear de tal modo os
fiéis e de tal modo reconhecer os seus serviços e carismas, que todos, cada um
segundo o seu modo próprio, cooperem na obra comum» (Lumen gentium, 30).
O discernimento dos dons que o Espírito Santo nunca deixa faltar à sua Igreja
seja para eles o apoio necessário para tornar concreto o ministério de
Catequista para o crescimento da própria comunidade.
Quanto estabelecido por esta Carta Apostólica em forma de “Motu
proprio”, ordeno que tenha vigor firme e estável, não obstante qualquer coisa
em contrário ainda que digna de menção particular, e que seja promulgado
mediante publicação no jornal L’Osservatore Romano, entrando em
vigor no mesmo dia, e publicado depois no órgão oficial Acta
Apostolicae Sedis.
Dado em Roma, junto de São João de Latrão, na Memória litúrgica de São João de Ávila, Presbítero e Doutor da Igreja, dia 10 de maio do ano de 2021, nono do meu pontificado.
FRANCISCO
Fonte: Santa Sé
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