São Gregório Magno
Sermão 9 sobre os Evangelhos
Com o nome de talento se deve entender aquilo
que qualquer pobre recebeu
Mas deve-se
saber que não existe nenhum ocioso que esteja seguro de não ter recebido algum
talento, porque não existe ninguém que diga com verdade: “Eu não recebi nenhum
talento, portanto não estou obrigado a prestar contas”; pois com o nome de
talento se deve entender aquilo que qualquer pobre recebeu, por menor que isso
seja.
Um, pois, recebeu
o entendimento da pregação, e este deve o ministério como talento; outro
recebeu bens terrenos e deve distribuir ou administrar o talento destas coisas;
outro ainda não recebeu a compreensão das coisas interiores nem a abundância de
bens, mas aprendeu uma arte, com a qual se sustenta, e essa arte se considera
como o talento que recebeu; o seguinte não alcançou nada destas coisas, mas
talvez mereceu a amizade íntima com algum rico: recebeu, portanto, o talento da
amizade. Portanto, se não fala ao rico em favor dos miseráveis, é condenado por
retenção do talento.
Então, quem tem
entendimento, esforce-se por não estar sempre calado; quem tiver bens
abundantes, vigie para não se descuidar de exercitar a misericórdia; quem
possui uma arte pela qual se sustenta, procure com grande diligência que o
próximo participe de seu uso e utilidade; quem tem oportunidade de falar ao
rico, tema ser castigado por retenção do talento se, podendo, não intercede
junto dele em favor dos pobres, porque o Juiz que virá exige de cada um de nós
o talento, ou seja, aquilo que nos concedeu.
Consequentemente,
para que, quando volte o Senhor, alguém se encontre seguro da conta de seu
talento, pense cada dia com temor no que recebeu. Cuidem que já está próximo o
retorno d’Aquele que foi para longe; porque, mesmo que pareça ter-se
distanciado aquele que foi para longe desta terra em que nasceu, porém volta em
breve para pedir prestação de contas dos talentos; e se formos preguiçosos, nos
julgará com mais rigor sobre os dons concedidos.
Consideremos,
pois, o que é que temos recebido, e estejamos atentos para empregá-lo bem. Que
não exista algum cuidado terreno que nos impeça a vida espiritual, para que não
venha a acontecer que, escondendo o talento na terra, provoque-se a ira do
Senhor do talento.
O servo
preguiçoso, quando o juiz já pede contas das culpas, desenterra o talento;
existe, portanto, muitos que se afastam dos desejos e obras terrenas, por aviso
do juiz, quando já são entregues ao suplício eterno. Vigiemos, portanto, antes
que nos seja solicitada a conta de nosso talento, para que, quando o juiz já
estiver ameaçando com o castigo, sejamos libertos dele pelo lucro que tivermos
alcançado.
Fonte:
Lecionário Patrístico Dominical, pp. 250-251. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
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