Como indicamos na postagem anterior desta série, em
preparação à 3ª edição do Missal Romano, o Ofício Litúrgico da Conferência
Episcopal Italiana (CEI) publicou o subsídio formativo “Un Messale per le nostre Assemblee: La terza edizione italiana del
Messale Romano tra Liturgia e Catechesi” (Um Missal para as nossas
Assembleias: A terceira edição italiana do Missal Romano entre Liturgia e
Catequese).
Com objetivo pastoral, publicaremos em nosso blog uma
tradução dos dez “encontros” do subsídio, que serão muito úteis também para a realidade
brasileira, enquanto aguardamos a tradução da 3ª edição do Missal por parte da
CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).
2. Um Missal para uma Igreja a caminho
A recepção das principais novidades contidas na nova edição
italiana do Missal Romano (MR) e da Introdução
Geral do Missal Romano (IGMR) deve ocorrer dentro de um processo mais amplo
de aprofundamento da reta compreensão e celebração da Eucaristia. Tal processo
é chamado a valorizar de modo mais convicto alguns princípios já presentes na
Constituição Conciliar Sacrosanctum
Concilium (CEI, Apresentação da 3ª
edição do Missal Romano, n. 7).
Como recordou o Papa Francisco, hoje é necessário continuar
este trabalho de aprofundamento, «em particular redescobrindo os motivos das
decisões tomadas com a reforma litúrgica, superando leituras infundadas e
superficiais, recepções parciais e práticas que a desfiguram. Não se trata de
reconsiderar a reforma revendo as suas escolhas, mas de conhecer melhor as
razões subjacentes, inclusive através da documentação histórica, assim como de
interiorizar os seus princípios inspiradores e de observar a disciplina que a
regula. Depois deste magistério e, após este longo caminho podemos afirmar com
certeza e com autoridade magistral que a reforma litúrgica é irreversível» [1]
(ibid., n. 5).
O Missal de Paulo VI
Quando se fala de um novo Missal, pensamos nas possíveis
novidades que poderiam enriquecer a Celebração Eucarística da comunidade. Pensamos
em novos textos de oração e novos gestos, talvez mais adaptados à sensibilidade
do nosso tempo. Em realidade, ainda que novo na edição gráfica, nas traduções e
em alguns textos que são adicionados, o MR na sua substância será a fiel
tradução do Missal de Paulo VI, que alcançou sua terceira editio typica (edição típica) em 2002 (revista em 2008).
Fruto de um longo trabalho de pesquisa, confronto e
verificação, o Missal de Paulo VI (1970) se apresenta como uma acurada operação
de renovação do precedente Missal, chamado “tridentino”, do qual também mantém
algumas linhas básicas: a estrutura da Missa ordenada segundo os ritos
iniciais, a Liturgia da Palavra, a Liturgia Eucarística e os ritos finais. Também
os textos de oração das coletas, das orações sobre as oferendas e após a
Comunhão são tomados dos antigos sacramentários, que constituem a base do
Missal de Pio V, mas em número muito mais amplo, graças a um maior conhecimento
das fontes antigas da Liturgia.
Deste modo, foi salvaguardado o princípio da substancial
continuidade e do desenvolvimento orgânico de uma forma ritual a outra, cujas
novidades devem ser entendidas a partir das indicações fundamentais emanadas
pelo Concílio Vaticano II.
O Missal do Concílio
Acolher o MR corresponde, em boa medida, à retomada e ao
aprofundamento do caminho de recepção do próprio Concílio e da renovação da
Igreja que começou com ele. Por isso, é oportuno que a acolhida da nova edição
do MR comece com uma tomada de consciência grata do percurso realizado e das
aquisições amadurecidas em relação à vida litúrgica da Igreja. A Constituição
Conciliar Sacrosanctum Concilium
sobre a Sagrada Liturgia (SC) nos ofereceu estas grandes diretrizes:
- afirmou que, na celebração dos santos mistérios, Cristo de
faz presente de um modo rico e pluriforme, «sobretudo sob as espécies
eucarísticas», mas também na palavras, nos gestos do ministro ordenado e em
toda a assembleia orante (SC, n. 7);
- insistiu sobre a necessidade de uma formação litúrgica
para todos (fiéis e ministros) e posta a serviço daquela participação plena,
consciente, ativa (e piedosa) na
Liturgia, da qual podemos haurir o genuíno espírito cristão (nn. 14-20);
- recordou que toda ação litúrgica pertence a todo o corpo da
Igreja e que, por isso, se deve preferir a forma comunitária das celebrações e
se deve promover uma rica e articulada ministerialidade (nn. 26-32);
- deu novamente amplo espaço à Palavra de Deus no rito,
retomando a homilia como parte da ação litúrgica e inculcando uma catequese
mais diretamente litúrgica (nn. 33-36);
- recordou-nos a dupla exigência de fidelidade à tradição e
de abertura ao contexto cultural e às problemáticas do nosso tempo (nn. 37-40),
abrindo a estrada à adaptação da Liturgia à índole dos povos;
- por fim, recordou a importância da vida litúrgica e da
Eucaristia na vida da Diocese e das paróquias, promovendo uma nova pastoral
litúrgica no quadro mais amplo da pastoral da fé (nn. 41-46).
A realização do
Missal Romano
O MR, com base nas indicações dos nn. 47-58 da SC, deu forma
concreta às diretrizes conciliares, encaminhando-nos para uma prática
celebrativa que valoriza a participação de todos e promove os diversos
ministérios litúrgicos. A celebração da Eucaristia nos introduziu e formou
novamente a escutar a Palavra proclamada, a anunciar a sua atualidade na
homilia e a formular a Oração Universal. O Missal envolve-nos ativamente no
diálogo entre ministros e fiéis, permite-nos aceder conscientemente às várias
orações, em particular à grande Oração Eucarística, convidando-nos a valorizar
também o silêncio nos momentos oportunos. Valoriza os gestos rituais e
recomenda a verdade dos sinais, desejando, por exemplo, que os fiéis comunguem
as hóstias consagradas na própria Missa (IGMR, n. 85). Requer um novo cuidado
dos lugares celebrativos, oportunamente adequados e devidamente bem
conservados, bem como uma renovada atenção a tudo o que está envolvido na
celebração: das vestes às alfaias, das obras de arte aos arranjos florais. Da
mesma forma, exorta-nos a cuidar, com paciência e coragem, a fim de que toda a
assembleia celebrante participe do canto litúrgico, e este corresponda melhor
ao tempo litúrgico e ao espírito da ação litúrgica.
Uma reforma a ser
aprofundada
A entrada em vigor da 3ª edição do MR será acolhida com
seriedade se aproveitarmos a ocasião para tomar consciência de forma positiva daqueles
valores que a prática celebrativa já “sedimentou” em nossas comunidades. Ao
mesmo tempo, será útil verificar de maneira construtiva quais aspectos ainda
não receberam a devida atenção e, portanto, estão ainda pouco assimilados no
“tecido” da comunidade cristã, identificando as causas e as necessidades
subjacentes.
Como afirmam os Bispos italianos na sua Apresentação, «esta nova edição italiana do Missal Romano é
oferecida ao povo de Deus em uma etapa de aprofundamento da reforma litúrgica
inspirada pelo Concílio Vaticano II» (n. 5). Este trabalho de aprofundamento
exige superar leituras infundadas e superficiais, recepções parciais e práticas
que a desfiguram: a publicação da nova edição do MR constitui uma ocasião
propícia para refletir sobre o caminho de uma reforma litúrgica que é
certamente “irreversível”, como recordou com autoridade o Papa Francisco (Discurso aos participantes da LXVIII Semana Litúrgica Nacional. Roma, 24 de agosto de 2017), mas está “a caminho”,
sempre necessitada de aprimoramento e interiorização. Uma atenção mais viva à
arte de celebrar (ars celebrandi),
juntamente com um sentido mais forte do valor da orientação da oração ao
protagonista divino da celebração, são alguns dos desafios que a nova edição do
MR nos chama a acolher e confrontar.
Para refletir juntos:
- Traçando uma “história celebrativa” da nossa comunidade,
quais são as diretrizes do Concílio que acolhemos melhor?
- Quais são, ao contrário, os aspectos que ainda devemos
conquistar?
- Estamos conscientes de que o nosso modo de celebrar a
Eucaristia deve ser compreendido no horizonte de um caminho contínuo de
aprofundamento da reforma litúrgica?
Nota:
[1] FRANCISCO. Discurso aos participantes da LXVIII Semana Litúrgica Nacional. Roma, 24 de agosto de
2017.
Fonte:
CONFERENZA EPISCOPALE ITALIANA. Un Messale per una Chiesa in cammino. in: Un Messale per le nostre Assemblee: La terza edizione italiana del
Messale Romano tra Liturgia e Catechesi. Fondazione di Religione Santi
Francesco d’Assisi e Caterina da Siena: Roma, 2020, pp. 13-17.
Disponível em: https://liturgico.chiesacattolica.it/un-messale-per-le-nostre-assemblee/
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