Santo Agostinho
Sermão 18
Guardou
silêncio quando era julgado, porém não guardará quando vier para julgar
Vem o nosso Deus e não se calará.
Cristo, o Senhor, Deus nosso e Filho de Deus, em sua primeira vinda se apresentou
de forma velada, porém em sua segunda vinda aparecerá publicamente. Quando se
apresentou de forma velada, somente se deu a conhecer aos seus servos; quando
aparecer publicamente, se dará a conhecer aos bons e aos maus. Apresentando-se
veladamente, veio para ser julgado; quando aparecer publicamente, virá para
julgar. Por fim, quando foi julgado guardou o silêncio, e deste silêncio havia
predito o profeta: Como cordeiro levado
ao matadouro, como ovelha ante o tosquiador, emudeceu e não abriu a boca.
Porém, vem o nosso Deus e não se calará.
Guardou silêncio quando era julgado, porém não guardará quando vier para
julgar. Na realidade, nem mesmo agora Ele guarda silêncio se houver quem o
escute; porém se disse: então Ele não se
calará, quando reconhecerão a sua voz inclusive os que agora a desprezam.
Atualmente, quando os mandamentos de Deus são recitados, há aqueles que se põem
a rir. E como, por enquanto, o que Deus prometeu não é visível, nem é
comprovável o cumprimento de suas ameaças, faz-se burla de seus preceitos. Por
enquanto, até mesmo os maus desfrutam do que o mundo chama de felicidade;
enquanto que a nomeada infelicidade deste mundo, sofrem-na até mesmo os bons.
Os homens que
acreditam nas realidades presentes, porém não nas futuras, observam que os bens
e os males da vida presente são vividos indistintamente por bons e maus.
Anseiam-se pelas riquezas, e veem que entre os ricos há homens maldosos e
homens de bem. E se sentem pânico ante a pobreza e as misérias deste mundo,
observam igualmente que nestas misérias se debatem não somente os bons, mas
também os maus. E dizem para si mesmos que Deus não se ocupa nem governa as
coisas humanas, mas as têm abandonado completamente à má sorte no profundo
abismo deste mundo, e não se preocupa em absoluto conosco. E passam então a
desdenhar dos mandamentos, pois não veem manifestação alguma do juízo.
Porém, também
agora cada um deve refletir que, quando Deus quer, observa e condena sem
demora, e, quando quer, usa de paciência. E por que age assim? Porque se no
presente Ele nunca exercesse seu poder judicial, se chegaria à conclusão de que
Deus não existe; e se julgar tudo agora, não reservaria nada para o juízo
final. A razão de diferir muitas coisas até o juízo final, e de julgar outras
em seguida, é para que aqueles aos quais seja concedida uma trégua, temam e se
convertam. Pois Deus não tem prazer em condenar, mas em salvar; por isso usa de
paciência com os maus, para convertê-los em bons. Diz o Apóstolo que Deus revela sua reprovação de toda a
impiedade, e pagará a cada um conforme as suas obras. E ao pejorativo o
admoesta, o corrige e lhe diz: Como
desprezas o tesouro de sua bondade, tolerância e paciência? Porque Deus é
bom contigo, porque é tolerante, porque te concede a mercê de sua paciência,
porque te concede tempo e não te retira do teu ambiente, desprezas e fazes
pouco caso do juízo de Deus, ignorando que essa mesma bondade tem por
finalidade te levar à conversão. Com a dureza do teu coração impenitente estás
armazenando para ti os castigos do dia do castigo, quando então se revelará o
justo juízo de Deus, pagando a cada um
conforme as suas obras.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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