São João Clímaco
Da escada, cap. 28
A
maneira correta de orar
A oração,
segundo sua condição e natureza, é a união do homem com Deus; mas segundo seus
efeitos e operações, oração é vigia do mundo, reconciliação com Deus, mãe e
filha das lágrimas, perdão dos pecados, ponte para atravessar as tentações,
muro contra as tribulações, vitória das batalhas, obra dos anjos, sustento das
substâncias incorpóreas, deleite da alegria vindoura, obra que não se acaba,
fonte de virtudes, procuradora das graças, aproveitamento invisível,
sustentáculo do espírito, luz do entendimento, coação da desesperação,
argumento da fé, desterro da tristeza dos monges, tesouro dos solitários,
diminuição da ira, modelo de aproveitamento, indício da medida das virtudes,
manifestação de nosso estado, revelação das coisas vindouras e significação da
clemência divina aos que perseverarem chorando nela. Tudo isso se diz ser a
oração, porque ajuda ao homem em todas as coisas, pedindo e alcançando a
caridade, a devoção e a graça, as quais nos administram todas as coisas.
A oração, para
aqueles que oram corretamente, é um espiritual juízo e tribunal de Deus, que
antecede o tribunal do juízo vindouro; porque ali o homem se conhece, se acusa
e se julga para dispensar o juízo e a condenação de Deus, conforme disse o
Apóstolo. Levantemo-nos, pois, irmãos, ouçamos esta grande auxiliadora de todas
as virtudes, que com alta voz clama e diz: Vinde
a mim todos que estais cansados e sobrecarregados, que eu vos animarei.
Tomai sobre vós o meu jugo e encontrareis descanso para vossas almas, e remédio
para vossas chagas; porque meu jugo é suave, e cura o homem de grandes chagas.
Aqueles dentre
nós que chegamos a falar e participar diante de nosso Deus, não façamos isso
despreparados; porque fitando-nos aquele longânime e misericordioso Senhor, sem
armas e sem vestes dignas de seu real acatamento, não mande a seus criados e
ministros que nos desterrem de sua presença atados de mãos e pés, e nos deem em
face com a negligência e interrupção de nossas orações. Quando fores
apresentar-te diante da face do Senhor, procura levar a veste de tua alma
costurada com o fio daquela virtude que se chama esquecimento das injúrias;
porque de outra maneira nada ganharás com a oração. Seja todo o fio da oração
singelo, sem multiplicação e elegância de muitas palavras, pois somente com uma
se reconciliaram com Deus o publicano do Evangelho e o filho pródigo.
O estado dos que
oram é um; porém, nele existe uma variedade e diferença de orações. Porque
existem alguns que comparecem diante de Deus como diante de um amigo e Senhor
familiar, oferecendo-lhe orações e louvores, não tanto pela sua própria
salvação como pela dos outros, como fazia Moisés. Outros, por sua vez,
pedem-lhe maiores riquezas, maior glória e confiança. Outros pedem com
insistência para serem livres do inimigo. Alguns pedem honras e dignidades;
outros, perfeita quitação de suas dívidas; outros, ser livres do cárcere desta
vida; outros desejam ter como responder às acusações e objeções do divino
juízo.
Diante de todas
as coisas coloquemos no primeiro lugar de nossa oração - que é a entrada dela -
uma sincera ação de graças; e em segundo lugar suceda a confissão e contrição
dos pecados, que brote do íntimo afeto de nosso coração; e depois destas duas
coisas expressemos nossas necessidades a nosso rei, e façamos-lhe nossas
petições. Esta é uma boa ordem e maneira de orar, a qual foi revelada por um
anjo a um dos monges.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 306-308. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
Para ler uma homilia de São João Crisóstomo para esse dia, clique aqui.
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