Neste dia em que celebramos a eleição do Papa Bento XVI (19 de abril de 2005), damos início à publicação da terceira parte das suas Catequeses sobre a oração, dedicada à oração no Novo Testamento (Atos dos Apóstolos, Cartas de Paulo e Apocalipse).
Confira a postagem com os links para todas as Catequeses sobre a oração clicando aqui.
Papa Bento XVI
Audiência Geral
Quarta-feira, 14 de março de 2012
A oração (29):
A oração nos Atos dos Apóstolos
Queridos irmãos e irmãs,
Com a Catequese
de hoje gostaria de começar a falar sobre a oração nos Atos dos Apóstolos e nas Cartas
de São Paulo. São Lucas transmitiu-nos, como sabemos, um dos quatro
Evangelhos, dedicado à vida terrena de Jesus, mas deixou-nos também aquilo que
foi definido o primeiro livro sobre a história da Igreja, isto é, os Atos dos Apóstolos. Nestes dois livros
um dos elementos recorrentes é precisamente a oração: de Jesus, de Maria, dos
discípulos, das mulheres e da comunidade cristã. O caminho inicial da Igreja é
ritmado, antes de tudo, pela obra do Espírito Santo, que transforma os
Apóstolos em testemunhas do Ressuscitado até à efusão do sangue, e pela rápida
difusão da Palavra de Deus rumo ao Oriente e ao Ocidente.
Todavia, antes que o
anúncio do Evangelho se propague, Lucas cita o episódio da Ascensão do
Ressuscitado (cf. At 1,6-9).
Aos discípulos o Senhor confia o programa da sua existência votada à
evangelização e diz: «Recebereis o poder do Espírito Santo que descerá sobre
vós, para serdes minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e na
Samaria, e até os confins da terra» (v. 8). Em Jerusalém os Apóstolos se tornaram
Onze, devido à traição de Judas Iscariotes; estão reunidos em casa para rezar,
e é precisamente na oração que esperam o dom prometido por Cristo Ressuscitado,
o Espírito Santo.
A Virgem Maria em oração com os Apóstolos |
Neste contexto
de expectativa, entre a Ascensão e o Pentecostes, São Lucas menciona pela
última vez Maria, a Mãe de Jesus, e os seus familiares (At 1,14). A
Maria ele dedicou o início do seu Evangelho, do anúncio do Anjo ao nascimento e
à infância do Filho de Deus que se fez homem. Com Maria começa a vida terrena
de Jesus, e com Maria têm início também os primeiros passos da Igreja; em ambos
os momentos, o clima é a escuta de Deus e o recolhimento. Portanto, hoje
gostaria de meditar sobre esta presença orante da Virgem no grupo dos
discípulos, que serão a primeira Igreja nascente.
Maria acompanhou com
discrição todo o caminho do seu Filho durante a vida pública, até aos pés da
Cruz, e agora continua a acompanhar, com uma prece silenciosa, o caminho da
Igreja. Na Anunciação, na casa de Nazaré, Maria recebe o Anjo de Deus, está
atenta às suas palavras, acolhe-as e responde ao desígnio divino, manifestando
a sua plena disponibilidade: «Eis aqui a serva do Senhor: faça-se em mim
segundo a tua palavra» (Lc 1,38).
Precisamente pela atitude interior de escuta, Maria é capaz de ler a própria
história, reconhecendo com humildade que é o Senhor quem age. Em visita à prima
Isabel, ela irrompe em uma oração de louvor e de alegria, de celebração da
graça divina, que encheu o seu coração e a sua vida, tornando-a Mãe do Senhor (Lc 1,46-55). Louvor, ação de graças e
alegria: no cântico do Magnificat,
Maria não olha só para aquilo que Deus realizou nela, mas também para quanto
Ele fez e faz continuamente na história. Em um célebre comentário ao Magnificat, Santo Ambrósio convida a ter
o mesmo espírito na oração, e escreve: «Esteja em cada um a alma de Maria para
enaltecer o Senhor; esteja em cada um o espírito de Maria para exultar em Deus»
(Expositio Evangelii secundum Lucam
2, 26: PL 15, 1561).
Ela também está
presente no Cenáculo, em Jerusalém, na «sala de cima, onde costumavam ficar» os
discípulos de Jesus (At 1,13), em um
clima de escuta e de oração. Ela está presente antes que as portas se abram de
par em par e eles comecem a anunciar Cristo Senhor a todos os povos, ensinando
a observar tudo o que Ele tinha ordenado (Mt
28,19-20). As etapas do caminho de Maria, da casa de Nazaré à de Jerusalém,
através da Cruz onde o Filho lhe confia o Apóstolo João, são marcadas pela
capacidade de manter um clima perseverante de recolhimento, para meditar cada
acontecimento no silêncio do seu Coração, diante de Deus (Lc 2,19-51) e, na meditação perante Deus, compreender também a Sua vontade
e tornar-se capaz de aceitá-la interiormente. A presença da Mãe de Deus com os
Onze, depois da Ascensão, não é então uma simples anotação histórica de algo do
passado, mas adquire um significado de grande valor, porque com eles ela
partilha aquilo que há de mais precioso: a memória viva de Jesus, na oração;
compartilha esta missão de Jesus: conservar a memória de Jesus e assim conservar
a sua presença.
A última menção
de Maria nos dois escritos de São Lucas está inserida no dia de sábado: o dia
do descanso de Deus depois da Criação, o dia do silêncio depois da Morte de
Jesus e da expectativa da sua Ressurreição. E é neste episódio que se arraiga a
tradição de Santa Maria no sábado. Entre a Ascensão do Ressuscitado e o
primeiro Pentecostes cristão, os Apóstolos e a Igreja reúnem-se com Maria para
esperar com ela o dom do Espírito Santo, sem o qual não podemos tornar-nos
testemunhas. Ela, que já o recebeu para gerar o Verbo encarnado, compartilha
com toda a Igreja a expectativa do mesmo dom, para que no coração de cada
crente «se forme Cristo» (Gl 4,19).
Se não há Igreja sem Pentecostes, também não há Pentecostes sem a Mãe de Jesus,
porque ela viveu de modo único aquilo que a Igreja experimenta todos os dias
sob a ação do Espírito Santo. São Cromácio de Aquileia comenta assim a anotação
dos Atos dos Apóstolos: «Portanto, a
Igreja congregou-se na sala de cima juntamente com Maria, Mãe de Jesus, e com
os seus irmãos. Por conseguinte, não se pode falar de Igreja, se não estiver
presente Maria, Mãe do Senhor... A Igreja de Cristo encontra-se onde se anuncia
a Encarnação de Cristo através da Virgem, e onde os Apóstolos, que são irmãos
do Senhor, pregam ali ouve-se o Evangelho» (Sermão
30, 1: SC 164, 135).
O Concílio
Vaticano II quis ressaltar de modo particular este vínculo, que se manifesta
visivelmente na oração conjunta de Maria e dos Apóstolos, no mesmo lugar, à
espera do Espírito Santo. A Constituição Dogmática Lumen gentium afirma: «Tendo sido do
agrado de Deus não manifestar solenemente o mistério da salvação humana antes
que viesse o Espírito prometido por Cristo, vemos que, antes do dia de
Pentecostes, os Apóstolos “perseveravam na oração em comum, junto com algumas
mulheres, entre as quais Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos de Jesus” (At 1,14); e vemos também Maria implorando,
com as suas orações, o dom daquele Espírito que já descera sobre ela na
Anunciação» (n. 59). O lugar privilegiado de Maria é a Igreja, onde é «saudada
como membro eminente e inteiramente singular... seu modelo e exemplar
perfeitíssimo na fé e na caridade» (ibid.,
n. 53).
Então, venerar a
Mãe de Jesus na Igreja significa aprender dela a ser comunidade que reza: esta
é uma das características essenciais da primeira descrição da comunidade
cristã, delineada nos Atos dos Apóstolos
(At 2,42). Muitas vezes, a oração é determinada por situações de
dificuldade, por problemas pessoais que nos levam a dirigir-nos ao Senhor para
receber luz, consolação e ajuda. Maria convida a abrir as dimensões da oração,
a dirigir-nos a Deus não só na necessidade, nem só para nós mesmos, mas de modo
unânime, perseverante e fiel, com «um só coração e uma só alma» (At 4,32).
Caros amigos, a
vida humana atravessa várias fases de passagem, com frequência difíceis e
exigentes, que requerem escolhas inadiáveis, renúncias e sacrifícios. A Mãe de
Jesus foi posta pelo Senhor em momentos decisivos da história da salvação, e
soube responder sempre com plena disponibilidade, fruto de um vínculo profundo
com Deus amadurecido na oração assídua e intensa. Entre a sexta-feira da Paixão
e o domingo da Ressurreição, a ela foi confiado o discípulo predileto e, com
ele, toda a comunidade dos discípulos (Jo
19,26). Entre a Ascensão e o Pentecostes, ela encontra-se com e na Igreja em oração
(At 1,14). Mãe de Deus e Mãe da
Igreja, Maria exerce esta sua maternidade até ao fim da história. Confiemos-lhe
cada fase da nossa existência pessoal e eclesial, também a da nossa passagem
final. Maria ensina-nos a necessidade da oração e indica-nos que só com um
vínculo constante, íntimo e cheio de amor com o seu Filho podemos sair da
«nossa casa», de nós mesmos, com coragem, para alcançar os confins do mundo e
anunciar em toda a parte o Senhor Jesus, Salvador do mundo.
Fonte: Santa Sé.
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