“Tu és o rei dos
judeus? Jesus respondeu, declarando: Tu o dizes!” (Lc 23,3).
Dom Henrique Soares da Costa
Quaresma 2019
A Paixão de nosso Senhor Jesus Cristo segundo Lucas
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Paixão segundo Lucas
XI: Lc 22,66–23,1
Ao amanhecer, os
anciãos do povo, os sumos sacerdotes e os escribas reuniram-se em conselho e
levaram Jesus ao tribunal deles. E diziam: “Se és o Cristo, dize-nos!” Jesus
respondeu: “Se Eu vos disser, não Me acreditareis e, se Eu vos fizer perguntas,
não Me respondereis. Mas, de agora em diante, o Filho do Homem estará sentado à
direita do Deus Poderoso”. Então, todos perguntaram: “Tu és, portanto, o Filho
de Deus?” Jesus respondeu: “Vós mesmos estais dizendo que Eu Sou!” Eles
disseram: “Será que ainda precisamos de testemunhas? Nós mesmos o ouvimos de
Sua própria boca!” Em seguida, toda a multidão se levantou e levou Jesus a
Pilatos (Lc 22,66–23,1).
Por que Jesus foi condenado à morte? As motivações foram
políticas ou religiosas? Que fique claro: Jesus foi morto essencialmente por
motivo religioso: Ele Se declarou o Messias esperado por Israel e, mais ainda,
o Filho do Homem descrito por Daniel, fazendo-Se Filho de Deus de um modo
único, nunca imaginado pelos judeus, apresentando-Se, assim, como igual a Deus!
Se Jesus apenas tivesse afirmado ser o Messias não seria
condenado à morte pelos judeus; seria, talvez, declarado um falso profeta...
Mas, Jesus pretendia mais, dizia ser mais: Ele Se colocava claramente diante do
Sumo Sacerdote e do inteiro Sinédrio como o Filho do Homem à direita de Deus,
vindo sobre as nuvens; Ele Se colocava acima da Torá, a Lei de Moisés.
Jesus é entregue pelo Sinédrio a Pilatos - Duccio di Buoninsegna |
Fique claro, claríssimo: Jesus não cabe no Judaísmo! Ele
realiza e ultrapassa as expectativas judaicas! Israel, se aceitasse Jesus como
o Messias, teria que dar um enorme salto qualitativo: teria que reconhecer que
agora o Senhor Deus selava uma nova e eterna Aliança que incluiria todos os
povos da terra. Isto iria mexer com a prática da Lei e com a própria identidade
de Israel, seria tirar a ênfase de Israel como Povo eleito, único, escolhido,
para colocá-la no Israel servo da salvação e do Reino de Deus para todos os
povos da terra... Era um passo grande demais para a grande maioria dos
judeus...
Mas, os judeus não podiam condenar ninguém à morte. O
Sinédrio, em nome do inteiro povo de Israel, condenou o Senhor a morrer... No
entanto, o poder de fato pertencia aos romanos, que não davam a mínima
importância para as questões religiosas judaicas. Então, era preciso
urgentemente, encontrar um motivo político que convencesse Pilatos a condenar
Jesus. E o motivo foi dado: Ele agita o povo, incentiva a que não se pague o imposto
a César e, pior ainda, diz-Se rei dos judeus, colocando-Se em confronto com
César! Tudo armação, tudo falso, tudo deturpado, truncado, para fazer alguém
inocente parecer odioso! Então: Pilatos condenou Jesus à morte por um crime
político que Ele não cometeu nem pensou em cometer: revoltoso, subversivo da
ordem romana, com a pretensão de Se tornar rei dos judeus. É este a causa da
condenação: “Jesus de Nazaré (que cometeu o crime de Se dizer) rei dos judeus”.
Mas, a questão realmente profunda e decisiva era religiosa!
Israel, o Povo santo de Deus, a quem fora prometido o Messias, foi incapaz de
acolher o Messias enviado por Deus! E aqui atenção: hoje, pelo justificado
cuidado com o antissemitismo e com a moda do politicamente correto, com essa
mania de cristãos bonzinhos numa Igreja boazinha, tornou-se um hábito afirmar
que foram somente as autoridades judaicas quem condenaram Jesus à morte. Não é
assim que os Evangelhos dizem, não é esta a leitura teológica do Novo
Testamento! Foi Israel como um todo - o Sinédrio com o Sumo Sacerdote
representam todo o Povo de Israel, enquanto entidade religiosa: “Toda a multidão se levantou e levou Jesus a
Pilatos!”. Israel rejeitou e rejeita ainda hoje Jesus como Messias! Israel
como um todo condenou Jesus à morte! É um mistério tremendo! Jamais poderemos
compreender isso totalmente, pois pertence ao íntimo do Coração de Deus! Como
pode o Povo santo da antiga Aliança não ter acolhido o Salvador que lhe fora
enviado, o Salvador tão desejado por todo o Antigo Testamento? Vale a pena ler
atentamente sobre este tema as palavras de São Paulo nos capítulos 9–11 da Carta aos Romanos.
Israel, apesar de tudo, é ainda o Povo de Deus da Primeira
Aliança, Povo sempre amado pelo Senhor. Também por Israel Cristo morreu e, no
final dos tempos, todo Israel verá o Cristo em glória e o proclamará como o seu
Messias esperado e amado! Em relação ao Povo da antiga Aliança, o cristão deve
ter um sentimento de profundo respeito e gratidão pela herança recebida. Nenhum
cristão tem o direito de julgar Israel: ele rejeitou o Messias, ele um dia, no
final de tudo, O reconhecerá! Isto faz parte de um misterioso desígnio de Deus!
Admiremos, adoremos! Até o fato de Israel ter rejeitado Jesus aconteceu, como
afirma São Paulo, para nos servir de exemplo, pois nenhum de nós está livre de
rejeitar Jesus e matá-Lo no nosso coração! Aliás, atualmente, na Igreja,
inclusive tantos ministros sagrados, tantos e tantos, o tem feito...
Atenção: isto não nos dá o mínimo direito de odiar os judeus
ou de desprezá-los! Nós somos o novo Israel, e não somos melhores que o
primeiro Israel! Também nós somos capazes de renegar Jesus, de traí-Lo, de
fugir e deixá-Lo sozinho... Foi um dos nossos quem entregou Jesus aos chefes
judeus... Além do mais, se Israel foi culpado por rejeitar Jesus e entregá-Lo à
morte, os pagãos (e nós somos os descendentes desses pagãos) levaram Jesus à
Cruz... Em suma: é toda a humanidade a culpada pela morte do Salvador. Uma
morte que não pode, não deve e não precisa nunca ser vingada, pois ela mesma é
uma vingança: a morte de Cristo por amor é a vingança de Deus contra o pecado.
Isto: Deus Se vinga do pecado amando, dando a vida para destruir o pecado!
Certamente, a Igreja como um todo, a Igreja em si mesma,
nunca poderá abandonar o seu Senhor e Esposo, pois que, na força do Espírito
Santo do Ressuscitado, ela é indefectivelmente santa. Mas, em nós, leigos,
religiosos ou ministros ordenados, individualmente, quanta infidelidade, quanta
frieza, quanta covardia, quantos cristãos sem uma real experiência de Cristo e
de amor por Ele, quanto relativismo, quanta mentalidade mundana ideologicamente
inspirada, quanto relaxamento moral!
Só nos resta pedir pelos judeus de ontem e de hoje e pelos
cristãos de ontem e de hoje e pela humanidade de ontem e de hoje: Senhor, tem
piedade de nós!
Nós Vos adoramos,
Santíssimo Senhor Jesus Cristo, e Vos bendizemos, porque pela Vossa santa Cruz
remistes o mundo!
Paixão segundo Lucas XII: Lc
23,2-7
Começaram então a
acusá-Lo, dizendo: “Achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo,
proibindo pagar impostos a César e afirmando ser Ele mesmo Cristo, o Rei”.
Pilatos O interrogou: “Tu és o rei dos judeus?” Jesus respondeu, declarando:
“Tu o dizes!” Então Pilatos disse aos sumos sacerdotes e à multidão: “Não encontro
neste homem nenhum crime”. Eles, porém, insistiam: “Ele agita o povo, ensinando
por toda a Judeia, desde a Galileia, onde começou, até aqui”. Quando ouviu
isto, Pilatos perguntou: “Este homem é galileu?” Ao saber que Jesus estava sob
a autoridade de Herodes, Pilatos enviou-O a este, pois também Herodes estava em
Jerusalém naqueles dias (Lc 23,2-7).
Já expliquei, caro irmão, a falsidade, a montagem das
acusações dos judeus contra Jesus diante do tribunal de Pilatos. O Procurador
romano interroga o Senhor e Jesus responde. Pilatos percebe claramente que a
resposta de Jesus está num plano diferente daquele da pergunta. O Procurador
havia perguntado num sentido político; Jesus respondera num sentido religioso.
Jesus é, sim, rei dos judeus, enquanto Messias descendente de Davi. Mas Seu
reinado não trazia nenhuma reivindicação política: “Meu Reino não é deste mundo, Meu Reino não é daqui!” (Jo 18,36). O Reinado de Cristo é aquele
do Pai: trata-se de fazer com que o mundo acolha no coração o Reinado do Pai
que Ele anuncia e cuja Face Ele veio revelar. O Reinado do Pai é Seu porque “tudo que o Pai tem é Meu. Eu e o Pai somos
um!” (Jo 16,15; 10,30). Além do
mais, porque Jesus Se fez obediente até a morte e morte de Cruz, o Pai O
exaltou e Lhe deu o Nome acima de todo nome, o Nome de Senhor, isto é, o Nome
do próprio Deus de Israel: Adonai! (Fl 2,6-11).
Os judeus persistem na acusação. Pilatos procura livrar-se
daquele julgamento, para ele sem sentido. Escutando que Jesus vinha da
Galileia, vê aí a sua chance: ele era Procurador da Judeia. Roma havia deixado
que a Galileia fosse governada por um rei fantoche: Herodes Antipas, o filho de
Herodes o Grande (o que matou as criancinhas em Belém). Antipas fora o que
mandara matar João Batista... O rei galileu também estava em Jerusalém, porque
tinha vindo para a Páscoa... Pilatos mandou Jesus para Antipas! E lá foi o
Senhor, joguete dos grandes do mundo, ridicularizado, tido por um demente...
Deus Santo, por que tem que ser assim? Por que os Teus são
pisados e tidos por loucos? Por que o Teu Reino aparece sempre tão pequeno, tão
ridículo, tão sem lógica, importância ou expressão?
Converte-nos, Senhor - converte-me a mim! - para que eu
compreenda a Tua lógica, tão diversa daquela outra, do mundo!
Bendito o Teu Reino, Pai santo, Reino que se manifesta no
Teu Ungido preso, humilhado, ridicularizado!
Bendito o Teu Reino que perdura para sempre, de eternidade
em eternidade!
Nós Vos adoramos,
Santíssimo Senhor Jesus Cristo, e Vos bendizemos, porque pela Vossa santa Cruz
remistes o mundo!
Dom Henrique venera a Cruz |
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