“Deixai-vos reconciliar com Deus: é agora o
momento favorável, é agora o dia da salvação!” (2Cor 5,20; 6,2).
A Quarta-feira
de Cinzas marca, no Rito Romano, o início do Tempo da Quaresma, tempo batismal
e penitencial em preparação à Páscoa do Senhor.
Nesse dia,
conforme a tradição bíblica e eclesial, os fiéis recebem o sinal das cinzas
sobre suas cabeças, no qual “é
significada a condição do homem pecador; confessando exteriormente a sua culpa
diante do Senhor, exprime assim a vontade de conversão, confiado em que o
Senhor seja benigno e compassivo para com ele, paciente e cheio de misericórdia”
(Cerimonial dos Bispos, n. 253).
Para acessar nossa postagem sobre a história da Quarta-feira de Cinzas, clique aqui.
1.
O que se deve preparar:
- Todo o necessário para a celebração da
Missa
- Turíbulo com naveta do incenso e colher
- Cruz processional
- Dois castiçais com velas
- Missal Romano
- Recipientes para as cinzas
- Caldeirinha de água benta e aspersório
O
uso do incenso é
sempre facultativo na Missa (cf.
Instrução Geral sobre o Missal Romano [IGMR], 3ª edição, nn. 276-277),
incluindo as Missas de Advento e Quaresma. Portanto, o incenso pode ser usado na Quarta-feira de Cinzas, como indica o Cerimonial dos Bispos (n.
255).
Durante
toda a Quaresma é proibido ornamentar o altar com flores (exceto no IV Domingo da Quaresma, chamado Laetare, nas solenidades e festas) e os
instrumentos musicais devem ser usados de maneira sóbria, apenas para sustentar
o canto (cf. Cerimonial dos Bispos, n. 252; IGMR, n. 305).
Sobre o toque das sinetas durante a consagração nas Missas da Quaresma:
O Cerimonial dos Bispos indica no n. 300 que o toque dos sinos é previsto no Glória da Missa da Ceia do Senhor (Quinta-feira Santa) e no Glória da Vigília Pascal, sendo proibido nesse intervalo.
Sobre as demais celebrações, os livros litúrgicos não se pronunciam. Portanto, valem os costumes locais: a comunidade pode tocar os sinos durante a consagração nas Missas da Quaresma, omitindo-os apenas no Tríduo Pascal; ou omitir o toque dos sinos durante toda a Quaresma.
As cinzas são preparadas através da queima dos ramos abençoados na Semana Santa do ano anterior. Podem estar dispostas na credência ou numa mesa em um lugar adequado do presbitério - não porém no altar, sobre o qual se coloca apenas o estritamente necessário para a celebração (cf. IGMR, n. 306).
2.
Ritos iniciais
A celebração
inicia-se como de costume, com a procissão de entrada do sacerdote acompanhado dos
ministros e a incensação do altar.
O sacerdote
inicia a Missa com o sinal-da-cruz e a saudação. Omitidos o Ato Penitencial (substituído pela imposição das cinzas) e
o Glória (omitido durante a Quaresma),
recita-se logo a oração do dia ou coleta: “Concedei-nos,
ó Deus todo-poderoso, iniciar com este dia de jejum...” (Missal Romano, p. 175).
3. Liturgia da Palavra e imposição das
cinzas
A Liturgia da
Palavra celebra-se como de costume, até a homilia inclusive. Apesar de ser um
dia de semana, são indicadas duas leituras, além do salmo e do Evangelho: Jl 2,12-18; Sl 50 (51); 2Cor
5,20–6,2; Mt 6,1-6.16-18.
Vale recordar
que durante toda a Quaresma omite-se o Aleluia (cf. Normas Universais sobre o Ano Litúrgico e o Calendário, n. 28; Missal Romano, p. 105). Assim, antes do
Evangelho entoa-se uma aclamação a Cristo (como: “Louvor e glória a ti, Senhor, Cristo, Palavra de Deus!”) unida ao
versículo do dia indicado no Lecionário.
Após a homilia,
aproximam-se do sacerdote os acólitos ou outros ministros com os recipientes com
as cinzas a serem abençoadas. Os recipientes podem também dispor-se sobre uma
mesa preparada em lugar adequado do presbitério (não, porém, sobre o altar,
como indicamos anteriormente).
Os recipientes com as cinzas preparados na credência |
O sacerdote, em
pé diante da cadeira ou na frente do altar, convida o povo a orar, proferindo a
monição indicada no Missal: “Caros irmãos e irmãs, roguemos instantemente a
Deus Pai que abençoe com a riqueza de sua graça estas cinzas...” (p. 175).
Após alguns
instantes de silêncio, o sacerdote recita uma das duas orações indicadas no Missal: “Ó Deus, que vos deixais
comover pelos que se humilham...” ou
“Ó Deus, que não quereis a morte do pecador, mas a sua conversão...” (pp.
175-176).
Em seguida, um
acólito entrega-lhe o aspersório e o sacerdote asperge as cinzas em silêncio. Segue-se
a imposição das cinzas: um concelebrante, um diácono ou outro ministro
aproxima-se do sacerdote que, inclinado, recebe as cinzas sobre a cabeça.
Papa Francisco asperge as cinzas |
O sacerdote
impõe então as cinzas aos ministros e aos fiéis, ajudado por concelebrantes,
diáconos ou outros ministros. Por exemplo, reforçando o caráter batismal da
Quaresma (cf. Constituição Sacrosanctum
Concilium, n. 109), na ausência de ministros ordenados o sacerdote poderia
ser ajudado na imposição das cinzas pelos catequistas.
O sacerdote e os
ministros podem impor as cinzas em pé aos fiéis inclinados ou sentados aos fiéis
ajoelhados. Se estiver sentado, o sacerdote pode utilizar um gremial.
Aquele que impõe
as cinzas diz: “Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15) ou “Lembra-te de que és pó e
ao pó hás de voltar” (Gn 3,19). Enquanto
isso se entoa um canto adequado, preferencialmente inspirado nas antífonas indicadas
no Missal (pp. 176-177), à luz dos próprios
textos bíblicos da celebração (Jl 2; Sl 50).
Imposição das cinzas |
Terminada a
imposição, o sacerdote e os ministros que distribuíram as cinzas lavam as mãos.
Não se reza o Creio, mas sim as Preces ou Oração dos Fiéis (Cerimonial dos Bispos, n. 259).
4. Liturgia Eucarística e ritos finais
A Liturgia
Eucarística celebra-se como de costume. Reza-se o Prefácio da Quaresma III, “Os
frutos da abstinência”, ou IV, “Os frutos do jejum” (Missal Romano, pp. 416-417), próprios
para os dias de jejum. Recomenda-se recitar a Oração Eucarística II, indicada para os dias de semana (cf. IGMR, n. 365).
Confira nossa postagem sobre quando usar cada Oração Eucarística clicando aqui.
No final da
celebração convém utilizar a bênção do
Tempo da Quaresma: “Deus, Pai de
misericórdia...” (Missal Romano,
pp. 521-522).
A 3ª edição
típica do Missal Romano (2002), por
sua vez, trará uma “oração sobre o povo” para cada dia da Quaresma, incluindo a
Quarta-feira de Cinzas. Essa edição do Missal, porém, ainda não foi traduzida
para o Brasil.
Para saber mais sobre a 3ª edição do Missal Romano e as suas mudanças, clique aqui.
Confira nossa postagem sobre em que momento cantar o hino da Campanha da Fraternidade clicando aqui.
5. Liturgia estacional
Na Quarta-feira
de Cinzas (assim como nos domingos ou mesmo em outros dias da Quaresma) pode ser celebrada a “Liturgia estacional”, marcada pela procissão penitencial, como
vimos em nossa postagem sobre as estações quaresmais romanas (cf. Cerimonial dos Bispos, nn. 260-262; Missal Romano, p. 174).
a) Procissão penitencial
Os fiéis se
reúnem em uma igreja menor ou em outro lugar adequado fora da igreja onde se
celebrará a Missa.
O sacerdote,
revestido de pluvial roxo ou, na sua falta, já com a casula roxa, dirige-se ao lugar
onde estão os fiéis, acompanhado dos acólitos e demais ministros. Esses levam o
turíbulo e a naveta, a cruz, os castiçais com velas e o Missal Romano. Se há diácono, convém que este leve o Livro dos
Evangelhos (Evangeliário).
À chegada do
sacerdote entoa-se uma antífona, isto é, um breve canto ou refrão quaresmal. A
celebração inicia-se então com o sinal da cruz e a saudação, após a qual o
sacerdote pode proferir uma monição, introduzindo os fiéis no sentido da
celebração.
Papa Francisco dá início à "estação quaresmal" da Quarta-feira de Cinzas |
Recita-se a
oração inicial, que pode ser:
- a oração do
dia da Missa votiva da Santa Cruz, que é a mesma oração da Festa da Exaltação
da Santa Cruz (Missal Romano, p. 656);
- uma das
orações da Missa pelo perdão dos pecados (p. 932);
- uma das
orações das Missas pela Igreja (pp. 876-880);
- uma das
“orações sobre o povo” (pp. 531-534).
O diácono ou o
próprio sacerdote convida então à procissão com essas palavras: “Vamos em paz, ao encontro do Senhor” ou
outras semelhantes. Forma-se a procissão, como de costume: acólitos com o
incenso, a cruz e as velas; demais ministros; o sacerdote; e os fiéis.
Nessa procissão,
seria importante valorizar a cruz processional, que depois é colocada junto ao
altar, demonstrando a unidade entre os dois momentos da celebração (procissão e
Missa). Se, porém, já houver uma cruz no presbitério, a cruz processional é
colocada na sacristia, preservando a autenticidade do sinal: uma cruz, assim
como também foi único o sacrifício de Cristo (cf. Instrução Geral sobre o Missal Romano, 3ª edição, nn.
117.122.308; Cerimonial dos Bispos,
n. 129).
Durante a
procissão se entoa a Ladainha de Todos os Santos, na qual podem inserir-se
alguns santos, como o santo titular da igreja ou o padroeiro do lugar [1]. Se o
trajeto da procissão for mais longo, podem entoar-se também um ou mais “Salmos
Penitenciais” (Sl 6; 31; 37; 50; 101;
129; 142), ou mesmo cantos quaresmais adequados.
Chegando à
igreja, após incensar o altar, o sacerdote depõe o pluvial, se o usou, e
reveste a casula (ou, se preferir, pode também trocar o pluvial pela casula
antes de incensar o altar). Recita-se então a oração do dia e a Missa prossegue
como indicado acima.
b) Entrada solene
Na
impossibilidade de realizar a procissão, a Liturgia estacional pode também ser
celebrada na forma de uma “entrada solene”: o sacerdote dirige-se à porta da
igreja com os ministros, onde inicia a celebração com o sinal da cruz, a
saudação e a oração inicial, como indicado acima.
Forma-se então a
procissão de entrada ao canto da Ladainha de Todos os Santos. Após incensar o
altar, o sacerdote recita a oração do dia e a Missa prossegue como indicamos acima.
Nos domingos e no Tempo Pascal (a partir da Vigília
Pascal inclusive) todos recitam a Ladainha em pé, e, nos demais dias,
ajoelhados (cf. Cerimonial dos Bispos,
nn. 359.507.529 et al.). Porém, uma
vez que aqui a Ladainha substitui a procissão de entrada, todos a recitam em
pé.
Nota:
[1] A forma “básica” da Ladainha de Todos os Santos é aquela entoada na Vigília Pascal (Missal Romano, pp. 284-285), no Batismo
e nas Exéquias, com versões ligeiramente distintas para outras celebrações:
ordenações, profissão religiosa, dedicação de igreja...
Para as
procissões solenes, como é o caso das “estações quaresmais”, há uma versão mais
longa da Ladainha, indicada no Graduale
Romanum (1974). Esta, porém, infelizmente não possui uma tradução oficial
para o português do Brasil.
Referências:
ALDAZÁBAL, José.
Instrução Geral sobre o Missal Romano -
Texto e Comentário. São Paulo: Paulinas, 2007.
CERIMONIAL DOS
BISPOS. Cerimonial da Igreja. Tradução
portuguesa da edição típica. São Paulo: Paulus, 1988.
MISSAL ROMANO. Tradução portuguesa da 2ª edição típica para
o Brasil. São Paulo: Paulus, 1991.
Confira também a
Carta Circular Paschalis Sollemnitatis,
promulgada pela Congregação para o Culto Divino em 1988, particularmente o cap.
I (nn. 6-26), dedicado à Quaresma.
Postagem
publicada originalmente em 20 de fevereiro de 2012. Revista e ampliada em 02 de janeiro de 2022.
Obrigado me ajudou muito.
ResponderExcluirMuito bom! Obrigado!
ResponderExcluirÉ correto incensar a cruz velada na quaresma?
ResponderExcluirNão. Nas comunidades que, segundo o costume, velam-se a cruz e as imagens desde o V Domingo da Quaresma (e não desde o início da Quaresma; cf. Carta Circular Paschalis Sollemnitatis, n. 26), convém conservar a cruz do altar descoberta, a fim de que possa ser incensada nas Missas solenes. Inclusive no Domingo de Ramos a cruz é ornada com um ramo.
ExcluirNão faz sentido incensar uma cruz ou imagem coberta, uma vez que a incensação é um gesto de veneração, enquanto que a velação das imagens é um gesto de despojamento e de luto.
Lembrando que as novas rubricas orientam velar cruz e imagens apenas no final da Missa da Ceia do Senhor.
É obrigatório uso do Turíbulo na missa de cinzas
ResponderExcluirÉ obrigatório uso do Turíbulo na missa de cinzas
Excluirsim ou nao
O n. 276 da Introdução Geral do Missal Romano afirma que o incenso pode ser usado facultativamente em qualquer Missa. Portanto, não é obrigatório.
Excluiré liturgico enfeitar o altar com flores.
ResponderExcluirDurante o tempo da Quaresma é proibido ornar o altar com flores (Cerimonial dos Bispos, n. 252).
Excluirpode um ministro que não seja ordenado distribuir as cinzas ? por motivos práticos como só ter na celebração um Padre.
ResponderExcluirSim. Sendo a imposição das cinzas um sacramental, o sacerdote pode associar a si acólitos ou leitores instituídos, religiosos ou outros ministros leigos, como catequistas ou Ministros da Sagrada Comunhão.
ExcluirBom dia. O que fazee com as cinzas que sobraram do ano anterior?
ResponderExcluirSe já foram abençoadas, convém ser descartadas de maneira digna: por exemplo, lançando-as em água corrente ou dissolvendo-as em água e lançando esta em plantas.
ExcluirAndré, você diz no início sobre o costume local de tocar os sinos no Glória no tempo quaresmal. Mas logo em seguida diz que não tem glória nesse tempo. Tenho certeza de que foi erro de interpretação da minha parte. Pode me explicar melhor?
ResponderExcluirNa Quarta-feira de Cinzas tem ou não o Glória? Nas solenidades e festas - como nos Domingos ou dia de São José - da Quaresma tem o Glória?
De fato, durante a Quaresma não se canta o Glória, exceto em eventuais solenidades e festas, como São José (19 de março) e a Anunciação do Senhor (25 de março).
ExcluirNa postagem eu me referia ao toque das sinetas na consagração. Vou reelaborar a frase para ficar mais claro.
GOSTARIA DE COMPARTILHAR VIA WHATAPP. GRATA
ResponderExcluirE nas missas em que o número de fiéis é muito grande? Como proceder com a. Distribuição das cinzas?
ResponderExcluirO sacerdote pode associar a si mais ministros para ajudar na imposição das cinzas: catequistas ou outros ministros devidamente instruídos.
ExcluirBoa tarde André.
ResponderExcluirOnde não houver a missa, se faz a celebração da palavra...neste caso o Ato Penitencial também é omitido ?
Você tem algum post onde se fala somente sobre Celebração ?
O que pode e não pode ?
Obrigado!
Sim. A imposição das cinzas substitui o Ato Penitencial. A Celebração da Palavra na Quarta-feira de Cinzas segue basicamente a mesma estrutura da Missa até as Preces, como indica o Missal Romano (na 2ª edição, na p. 178).
ExcluirObrigado André...mas no caso por ser celebração da Palavra pode tb fazer um rito penitencial né por exemplo o Confesso a Deus seguido de um refrão?
ResponderExcluirComo fica a questão da benção das cinzas, quem deve fazer neste caso?
Você tem algum posto sobre celebração ao da Palavra?
No caso da Quarta-feira de Cinzas não há Ato Penitencial. O Missal deixa claro que após o sinal da cruz e a saudação passa-se diretamente à coleta.
ExcluirSe a celebração é presidida por um diácono, este abençoa as cinzas. Se é presidida por outro ministro, não há uma normativa clara. Creio que neste caso o mais adequado é impor as cinzas previamente abençoadas por um sacerdote.
Pretendo preparar algumas postagens sobre a Celebração da Palavra no futuro, mas não há uma normativa muito clara. No Brasil a principal referência é o Documento n. 108 da CNBB, "Ministério e celebração da Palavra".