“Desejei ardentemente
comer convosco esta ceia pascal” (Lc 22,15).
Dom Henrique Soares da Costa
Quaresma 2019
A Paixão de nosso Senhor Jesus Cristo segundo Lucas
Para acessar o índice, com os links para todas as meditações, clique aqui.
Paixão segundo Lucas I: Lc 22,14-18
Quando chegou a hora,
Jesus pôs-Se à mesa com os apóstolos e disse: “Desejei ardentemente comer
convosco esta ceia pascal, antes de sofrer. Pois Eu vos digo que nunca mais a
comerei, até que ela se cumpra no Reino de Deus”. Então Jesus tomou um cálice,
deu graças e disse: “Tomai este cálice e reparti entre vós; pois Eu vos digo
que, de agora em diante, não mais beberei do fruto da videira, até que venha o
Reino de Deus” (Lc 22,14-18).
Palavras tremendas, estas de Jesus, na Paixão que escutamos
neste Domingo de Ramos...
“Desejei ardentemente
comer convosco esta ceia pascal!” Cada um de nós deveria escutar, de modo
grato, comovido, esta revelação tão doce do Coração do nosso Salvador! Estas
palavras, ditas naquele Cenáculo de Jerusalém, ecoam de geração em geração de
cristãos e, chegam hoje aos nossos ouvidos - quem dera chegassem também ao
nosso coração: ardentemente, o Salvador deseja comer Sua Páscoa deste ano
conosco; Sua única e eterna Páscoa, tornada verdadeiramente presente e atuante
em cada Celebração pascal! Este não é tempo de viagens, de passeios, de casas
de praia ou de campo; este é tempo de comer com o Senhor e com os irmãos
reunidos em Igreja a Sua Ceia pascal!
Última Ceia - Duccio di Buoninsegna |
Jesus sabia que iria morrer, sabia do sacrifício tremendo,
do drama horrendo que O esperava e O colocava todo presente nesta Ceia, Ceia
comida “antes de sofrer”. Esta Ceia é a Ceia do Seu Sacrifício, a Ceia bendita
na qual a Igreja celebrará, até que Seu Esposo volte, o Banquete do Seu Sacrifício
pascal! E aí vem a revelação misteriosa, profunda, forte: “Nunca mais a comerei, até que ela se realize no Reino de Deus!” É a
última refeição pascal do Senhor Jesus neste mundo.
A ceia judaica, celebrada a cada ano por Israel, tinha um
sentido profundo: tornava presente a libertação da escravidão do Egito, quando
Deus fez de um bando de perdidos um Povo, o Seu Povo. Comendo a Páscoa, os
judeus não somente entravam nesta salvação de Deus, mas experimentavam já,
naqueles ritos solenes, a salvação definitiva e completa que ocorreria quando o
Messias viesse. O cordeiro macho e sem defeito, sem nenhum de seus ossos
quebrado; as ervas amargas das amarguras da vida; o molho avermelhado, como os
tijolos do Egito; o pão da miséria, pão ázimo, sinal das misérias e
precariedades de nossa vida: tudo profecia, tudo preparação, tudo saudade do
Messias bendito que deveria vir...
E agora Ele veio: Sua Páscoa, saída deste mundo em dores de
Cruz, passagem pelo Mar Vermelho da tremenda Morte e saída do outro lado, lado
da Vida, lado do Pai, Deus de Israel - tudo isto estaria presente naquela Ceia
derradeira, nos ritos judaicos que o Senhor agora faria Seus ritos, ritos de
Sua Páscoa e da Páscoa de Sua Igreja, princípio de toda Liturgia cristã... “Nunca mais comerei desta Ceia! Ela é
princípio e presença do Reino que Eu trouxe. Um dia, no Meu Dia, na Glória, Eu
a comerei eternamente convosco, Meus discípulos, no Banquete sem fim do Céu, no
qual Eu mesmo serei vosso alimento!”
E Jesus, seguindo o rito pascal judaico, tomou o primeiro
dos quatro cálices, o Cálice da Aceitação. Sim, Jesus aceita o desígnio do Pai
a Seu respeito, como o Pai aceitará o sacrifício do Filho por nós! “Não mais beberei deste cálice até que venha
o Reino de Deus!” Sim, o Reino virá nas dores da Cruz e se manifestará de
modo pleno no Dia sem fim da Minha Glória!
É isto, caro Irmão meu! Esta Ceia bendita na verdade é já um
Sacrifício, ou melhor, o Sacrifício único e perfeito do Salvador nosso! Aquilo
que Ele realizaria na Cruz dando-nos o Reino, antecipou ritualmente, tornou
verdadeiramente presente de modo litúrgico naquela Ceia!
Ceia de despedida, de saudade, de Amor que se entrega
totalmente, sem nada reservar para Si. Santa Teresinha dizia que “amar é tudo
dar e dar-se a si mesmo”. Nesta Ceia, Ceia da Eucaristia de cada Domingo, Jesus
Se nos deu assim!
Nós Vos adoramos,
Santíssimo Senhor Jesus Cristo, e Vos bendizemos, porque pela Vossa santa Cruz
remistes o mundo!
Paixão segundo Lucas II: Lc 22,19-20
A seguir, Jesus tomou
um pão, deu graças, partiu-o e deu-o aos discípulos, dizendo: “Isto é o Meu
corpo, que é dado por vós. Fazei isto em memória de Mim”. Depois da ceia, Jesus
fez o mesmo com o cálice, dizendo: “Este cálice é a nova Aliança no Meu sangue,
que é derramado por vós” (Lc 22,19-20).
Aquilo que o Senhor iria realizar dolorosamente na Sexta-feira,
Ele o realizou ritualmente na Quinta. Basta recordar o Êxodo: Deus ia fazer Israel atravessar o Mar Vermelho (na Escritura
o mar tem sempre a ver com o caos, a morte); ordenou-lhe que antes celebrasse
ritualmente essa passagem na ceia pascal judaica como memorial perpétuo. O
mesmo fez Jesus: na Sexta, entraria no terrível Mar da Morte - morte tremenda,
morte de pecado; Ele, que não cometeu pecado. Entrando neste Mar, Ele abriria
um caminho até o outro lado, até o Pai, Deus vivo e vivificante! Seus
discípulos, novo Israel, Sua Igreja, poderia passar por esta passagem que Ele
iria abrir... Mas, antes, o Senhor quis entregar para sempre Sua Passagem, Seu
Sacrifício de Morte e Ressurreição à Sua Igreja. Por isto, na Páscoa judaica,
Ele instituiu a Sua Páscoa que, celebrada, se tornaria Páscoa da Igreja, nossa
Páscoa.
Agora, o pão ázimo (pão da miséria) da Páscoa judaica se tornaria
Corpo do Senhor, Corpo quebrado, oferecido na Cruz como imolação.
“Isto é o Meu Corpo
dado por vós”. Corpo, aqui, não é a simples musculatura. Corpo significa,
neste contexto, a humanidade de alguém. “O que Eu recebi no ventre da Virgem,
toda a Minha natureza humana, com Meus sonhos, Meu amor, Minha alma e Meu
corpo, tudo Eu entrego sacrificalmente em vosso favor!”. Em outras palavras: “Eu
vos entrego toda a Minha existência, Eu Me entrego à morte totalmente por
vós!”.
“Este cálice é a nova
Aliança no Meu Sangue, que é derramado por vós!” Sangue, na Escritura,
significa a vida. O sangue derramado é a vida entregue, esparramada. Pois bem:
“Eu vos dou a Minha morte, derramo na Cruz, por vossa causa, para vossa
salvação, a vida que derramei a vida toda! Fui Me derramando desde que Me fiz
homem: derramei-Me no ventre da Virgem, derramei-Me na pobreza de Belém, na
fuga para o Egito, nos anos silenciosos de Nazaré... Derramei-Me, cansado, nas
estradas da Palestina, derramei-Me pregando, curando, nas noites em oração...
Agora completo a entrega, o derramamento de Minha vida! É por vós! Sangue da
nova Aliança. Não mais o sangue do cordeiro lá no Êxodo, mas o Meu Sangue, Cordeiro que o Pai entrega agora por vós e
pela multidão para a remissão dos pecados!”.
E o Senhor ordenou à Sua Igreja que celebrasse este
Sacrifício ritual, este Sacrifício em forma de ceia até que Ele volte. E cada
vez que a Igreja celebrasse o santíssimo Sacrifício do Salvador, oferecido uma
vez por todas, cada geração de cristãos entraria no Sacrifício do Senhor e o
Sacrifício do Senhor entraria na vida do discípulo... E aí, as dores do Senhor se
tornariam nossas e nossas dores se tornariam as d’Ele!
Eis o Sacrifício da nova e eterna Aliança! Eis a fonte da
Vida e santidade da Igreja! Eis o verdadeiro Cordeiro imolado como nosso perdão
e nossa oferta: o Cristo no altar, o Cristo na cruz!
Obrigado, Senhor Jesus, por tão grande dom!
Dom Henrique venera a Cruz |
Nenhum comentário:
Postar um comentário