São Gregório Magno
Sermão sobre o Livro do Profeta Ezequiel
“Sobre
a vida ativa e contemplativa”
A vida ativa
consiste em dar pão ao faminto, ensinar a sabedoria ao ignorante, corrigir ao
que erra, reconduzir o soberbo ao caminho da humildade, cuidar do enfermo,
proporcionar a cada qual o que lhe convém e prover os meios de subsistência aos
que nos foram confiados.
A vida
contemplativa, porém, consiste, é verdade, em manter com toda a alma a caridade
de Deus e do próximo, mas abstendo-se de toda atividade exterior e deixando-se
invadir somente pelo desejo do Criador, de modo que já não encontre atrativo em
atuar, porém, descartada qualquer outra preocupação, a alma arda em desejos de
ver a face de seu Criador, até o ponto de que começa a suportar com fastio o
peso da carne corruptível e aspirar com todo o dinamismo do desejo unir-se aos
coros angélicos que entoam hinos, confundir-se entre os cidadãos do céu e gozar
na presença de Deus da eterna incorrupção.
Um bom modelo
destes dois tipos de vida foram aquelas duas mulheres, a saber, Marta e Maria,
das quais uma se desdobrava para dar conta do serviço, enquanto a outra,
sentada aos pés do Senhor, escutava as palavras de sua boca. Como Marta se
queixa de que sua irmã não se preocupava de ajudá-la, o Senhor lhe contestou: Marta, andas inquieta e nervosa com muitas
coisas; mas somente uma é necessária. Maria escolheu a melhor parte, e não lhe
será tirada. Observa que não se reprova a parte de Marta, mas se louva a de
Maria. Nem se limita a dizer que Maria escolheu a boa parte, mas a parte
melhor, para indicar que também a parte de Maria era boa. E porque a parte de
Maria seja a melhor, o destaca na continuação, dizendo: E não lhe será tirada.
De fato, a vida
ativa acaba com a morte. Pois quem pode dar pão ao faminto na pátria eterna, na
qual ninguém terá fome? Quem pode dar de beber ao sedento, se ninguém tem sede?
Quem pode enterrar os mortos, se ninguém morre? Portanto, enquanto que a vida
ativa acaba neste mundo, a vida contemplativa, iniciada aqui, aperfeiçoa-se na
pátria celestial, pois o fogo do amor que aqui começa a arder, à vista do Amado
ainda se aviva em seu amor.
Assim, a vida
contemplativa não cessará jamais, pois alcança precisamente sua perfeição ao
apagar-se a luz do mundo atual.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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