Textos publicados pelo site Vatican News no início deste mês de julho:
03
de julho de 2019
No nosso espaço Memória Histórica – 50 anos do
Concílio Vaticano II, vamos falar hoje sobre a contribuição de Annibale Bugnini
à Liturgia.
Damos continuidade a nossa série de programas
dedicados à Liturgia. E, naturalmente, damos espaço aos grandes nomes que de
forma ou outra contribuíram para seu enriquecimento, entre os quais, o Arcebispo
italiano Annibale Bugnini, que teve um papel decisivo na reforma litúrgica
seguida ao Concílio Vaticano II.
De 1948 a 1960, foi secretário da Comissão para a
reforma geral da Liturgia, instituída pelo Papa Pio XII. Em 1957 foi nomeado
professor de Liturgia da Pontifícia Universidade Lateranense e de 1959 a 1962
foi, em vista do Concílio Vaticano II, secretário da Comissão preparatória para
a Liturgia.
A partir de 1964, foi secretário da Comissão para a
Liturgia instituída por Paulo VI, que tinha por objetivo estabelecer e
sucessivamente aplicar as mudanças da Liturgia. Do trabalho de tal Comissão,
surgiu o que hoje é conhecida como a reforma litúrgica, sancionada pela adoção
do Missal Romano de 1969.
De 1969 a 1975, Annibale Bugnini também foi
secretário da Congregação para o Culto Divino, até esta ser unida à Congregação
dos Sacramentos na Congregação do Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos.
Quem nos traz mais detalhes, é o sacerdote incardinado na Arquidiocese de Porto
Alegre, padre Gerson Schmidt:
Um dos grandes expoentes para a reforma litúrgica,
já bem antes do Concílio e na sua efetiva aplicação, foi o Mons. Annibale
Bugnini, que aqui merece referência à parte. Está à disposição no mercado
bibliográfico brasileiro uma grande obra sobre a Liturgia, agora já na segunda
edição do livro magnifico editado por três livrarias católicas brasileiras
(Paulus, Paulinas e Loyola), de mais de 800 páginas, traduzida para o português
de autoria Annibale Bugnini, “A reforma Litúrgica (1948-1975)”, traduzida por
Paulo Valério, que aqui vamos referendar inúmeras vezes em nosso resgate
histórico.
Monsenhor Annibale Bugnini foi um dos peritos do
Concilio Vaticano II, que teve acesso em suas pesquisas litúrgicas à Biblioteca
e ao Arquivo do Vaticano. Já oferecia à Igreja, nos seus estudos, uma tese
sobre a Liturgia no Concílio de Trento que lhe proporcionou contato com os
bastidores do Concilio de Trento, através das santas Liturgias
[1]. Foi aluno no Pontifício Instituto de Arqueologia Cristã, que era
considerada a ciência litúrgica antes do Concílio Vaticano II. Nesse ambiente
Bugnini trava conhecimento dos grandes nomes de arqueólogos como Enrico Josi,
Antônio Ferrua e Engelbert Kirschbaum, que desenterraram a Necrópole Vaticana e
encontraram o túmulo de São Pedro. Na sua formação lazarista, entra em contato
com a revista de Liturgia Ephemerides Liturgicae, onde se encontra
com editores como o monge beneditino de Maria Laach, D. Cunibert Mohlberg (1878-1963),
um dos maiores estudiosos dos textos antigos de Liturgia. Também conhece D.
Alfredo Ildefondo Schuster (1880-1954), Abade de São Paulo Fora dos Muros - que
chama de “seu primeiro professor de Liturgia” - que publicou a obra
impactante Liber Sacramentorum sobre a importância fundamental
da Liturgia [2].
Posteriormente, assume a cátedra de Liturgia, como
Mestre, na Pontifícia Universidade Urbaniana e posteriormente é professor no
Pontifício Instituto de Música Sacra, onde permanece até 1965, no ano de
encerramento do Concílio. Já em 1948, por convite de Pio XII, Bugnini foi
nomeado secretário da Comissão Piana, um organismo criado por
Pio XII que estava encarregada de pensar a reforma litúrgica, que já se
pretendia antes mesmo do Concílio. Com a convocação do Concílio Vaticano II, em
1959, Bugnini foi nomeado para ser secretário da Comissão Litúrgica
preparatória para o Concílio.
Só não foi secretário da Sacrosanctum Concilium porque foi perseguido e caluniado, que lhe
custou uma cruz muito pesada por muitos anos. Posteriormente foi secretário da Comissão
Consilium, com “s”, a partir de 1969,
organismo encarregado de aplicar a reforma da Sacrosanctum Concilium, que
oficialmente é chamada de Consilium ad
Exsequandam Constitutionem de Sacra Liturgia. A partir de 1969, torna-se
secretário da recém-criada Congregação para o Culto Divino que posteriormente é
extinta para ser anexada à Congregação dos Sacramentos e do Culto divino.
É nessa transição que fica de fora das comissões. Em 1972 recebe a ordenação
episcopal de Paulo VI. Depois, em 1976, recebeu o encargo de Núncio Apostólico
no Irã, contra a sua vontade, saindo do cenário das grandes decisões sobre as reformas
litúrgicas. Nesses anos do que ele chamou de “exílio”, se dedica a reunir tudo
o que tinha participado nos bastidores das reformas na Liturgia, compendiando
nesse livro que mencionamos, “A reforma Litúrgica (1948-1975)”. Uma obra, sem
sombra de dúvida, que vale a pena ser aprofundada, que aqui em nosso estudo vamos
referendar com abundância.
10 de julho de 2019
Liturgia, um tema sempre
apaixonante. Por ela, “especialmente
no sacrifício eucarístico, «se opera o fruto da nossa Redenção», contribui em
sumo grau para que os fiéis exprimam na vida e manifestem aos outros o mistério
de Cristo e a autêntica natureza da verdadeira Igreja, que é simultaneamente
humana e divina, visível e dotada de elementos invisíveis, empenhada na ação e
dada à contemplação, presente no mundo e, todavia, peregrina, mas de forma que
o que nela é humano se deve ordenar e subordinar ao divino, o visível ao
invisível, a ação à contemplação, e o presente à cidade futura que buscamos. A
Liturgia, ao mesmo tempo em que edifica os que estão na Igreja em templo santo
no Senhor, em morada de Deus no Espírito, até à medida da idade da plenitude de
Cristo, robustece de modo admirável as suas energias para pregar Cristo e
mostra a Igreja aos que estão fora, como sinal erguido entre as nações, para
reunir à sua sombra os filhos de Deus dispersos, até que haja um só rebanho e
um só pastor” [3].
No programa de hoje, padre
Gerson Schmidt nos fala sobre “A atualidade da reforma litúrgica”:
Falamos na ocasião anterior
da importância fundamental de Monsenhor Annibale Bugnini, que foi um dos peritos
do Concilio Vaticano II. Há quem afirme que sem ele não teria acontecido a
Reforma Litúrgica e há quem arisque dizer que sem Bugnini, e lógico sem o Papa
Paulo VI, não teria havido nem mesmo a Constituição Sacrosanctum
Concilium nos moldes que ela foi proclamada. No seu túmulo, depois de
ter sofrido muita perseguição e sido caluniado, foi escrito assim: “Annibale
Bugnini, bispo, cultivador e amante da Liturgia, serviu a Igreja”.
A reforma litúrgica
realmente sofreu muitos ataques desde seus inícios, mas, apesar disso,
mostrou-se cada vez mais como um dos legados do Concilio Vaticano II, que fez
recentemente o Papa Francisco dizer assim: “O Vaticano II foi uma releitura do
Evangelho à luz da cultura contemporânea. Produziu um movimento de renovação
que simplesmente vem do próprio Evangelho. Os frutos são enormes. Basta
recordar a Liturgia. O trabalho da reforma litúrgica foi um serviço ao povo
como releitura do Evangelho a partir de uma situação histórica concreta. Sim,
há linha de hermenêutica de continuidade e descontinuidade, todavia, uma coisa
é clara: a dinâmica de leitura do Evangelho atualizada no hoje, e que é própria
do Concílio, é absolutamente irreversível” [4].
O Papa Francisco disse que
a Reforma da Liturgia não pode retroceder [5]. No seu discurso na 68ª Semana
Litúrgica Nacional, por ocasião do aniversário de 50 anos da Constituição
Dogmática Sacrosanctum Concilium, ao grupo de Liturgia da
Conferência Episcopal da Itália, na Sala Paulo VI, o Papa Francisco foi bem
claro, usando novamente a palavra “irreversível”:
“E hoje ainda é preciso
trabalhar neste sentido, em particular redescobrindo os motivos das decisões
tomadas com a reforma litúrgica, superando leituras infundadas e superficiais,
recepções parciais e práticas que a desfiguram. Não se trata de reconsiderar a
reforma revendo as suas escolhas, mas de conhecer melhor as razões subjacentes,
inclusive através da documentação histórica, assim como interiorizar os seus
princípios inspiradores e de observar a disciplina que a regula”.
Conclui dizendo ainda:
“Depois deste Magistério e, após este longo caminho podemos afirmar com certeza
e com autoridade magisterial que a reforma litúrgica é irreversível”. Portanto,
se há grupos que querem retroceder e engessar a Liturgia, é preciso saber que o
Magistério da Igreja pensa diferente.
Há uma irreversibilidade na
reforma da Liturgia, o que fazia Dom Clemente Isnard, Bispo brasileiro, falar
da atualidade e necessidade da reforma usando a imagem de um pé na porta
daqueles que querem impedir a reforma litúrgica. Muitos desejariam voltar atrás
e trancar a porta aberta pelo Concílio, mas não se pode mais fechar a porta.
Doravante essa só poderá ser aberta sempre mais, mas claro, respeitando a
índole própria da liturgia [6].
[1] Gabriel
Frade, Prefácio à edição brasileira de: Annibale Bugnini, A reforma
Litúrgica (1948-1975). Tradução de Paulo F. Valério. 2ª edição. Editoras
Paulus, Paulinas e Loyola: SP, 2018, p.17.
[2] ibid., pp. 18-19.
[3] Proêmio da
Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada
Liturgia, n. 2.
[4] Papa Francisco. Entrevista ao Diretor
da Revista La Cività Cattolica, n.3918 (19.09.2013), p. 467.
[5] Discurso
do Papa Francisco na 68ª Semana Litúrgica Nacional, por ocasião do aniversário
de 50 anos da Constituição Sacrosanctum
Concilium, ao grupo de Liturgia da Conferência Episcopal da Itália, na Sala
Paulo VI, 24 de agosto de 2017.
[6] Essa imagem foi usada originalmente pelo
Pe. Josef Andreas Jungmann. in: Gabriel
Frade, Prefácio à edição brasileira de: Annibale Bugnini, A reforma
Litúrgica (1948-1975). Tradução de Paulo F. Valério. 2ª edição. Editoras
Paulus, Paulinas e Loyola: SP, 2018, p. 21.
Dom Annibale Bugnini |
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