Orígenes
Sobre a oração
“Em
nenhuma parte Deus foi invocado como Pai desta forma”
Seria digno de
observar se no Antigo Testamento se encontra uma oração na qual alguém invoca a
Deus como Pai, porque nós, até o presente, não a temos encontrado, apesar de
tê-la buscado com interesse. E não dizemos que Deus não foi chamado com o
título de Pai, ou que aqueles que nele têm crido não foram chamados filhos de
Deus; mas que em nenhuma parte encontramos em uma oração essa confiança
proclamada pelo Salvador de invocar Deus como Pai.
Além disso, que
Deus é chamado de Pai e filhos os que se ativeram à palavra divina, pode-se
constatar em muitas passagens veterotestamentárias. Assim: Deixaste ao Deus que te gerou, e deste ouvido ao Deus que te alimentou?
E ainda na mesma passagem: São filhos sem
fidelidade alguma. E em Isaías: Eu
criei filhos e os tenho enaltecido, porém eles me têm desprezado; e em
Malaquias: O filho honrará ao seu pai e o
servo ao seu Senhor. Porque se eu sou pai, onde está a minha honra?
Ainda que em
todos estes textos Deus seja chamado Pai, e filhos aqueles que foram gerados
pela palavra da fé nele, não se encontra, contudo, na Antiguidade uma afirmação
clara e infalível desta filiação. Desta forma os mesmos lugares citados mostram
que eram realmente súditos aqueles que se chamavam filhos. Já que, segundo o
Apóstolo, enquanto o herdeiro é menor,
sendo o Senhor de tudo, não difere do servo; mas está sob tutores e
encarregados até a data assinalada pelo pai.
Mas a plenitude
dos tempos chegou com a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, quando pode se
receber livremente a adoção, como ensina São Paulo, afirmando que tendes recebido o espírito de adoção, pelo
qual clamamos: Abbá, Pai! E no Evangelho de São João lemos: Mas a todos os que o receberam deu-lhes o
poder de se tornarem filhos de Deus; aos que creem em seu nome. E por este
espírito de adoção de filhos sabemos que todo
aquele que nasceu de Deus não peca, porque a semente de Deus está nele; e não
pode pecar, porque nasceu de Deus.
Por tudo isto,
se entendêssemos o que escreve São Lucas ao dizer: Quando oreis, dizei: “Pai”, nos envergonharíamos de invocá-lo sob
esse título se não somos filhos legítimos. Porque seria triste que, junto aos
nossos outros pecados, acrescentássemos o crime da impiedade.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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