O site Vatican News publicou recentemente em sua coluna "Memória histórica - 50 anos do Concílio Vaticano II" um breve texto no qual se traça um perfil histórico do Missal Romano, principal livro litúrgico do nosso rito:
12 de junho de 2019
No nosso espaço “Memória Histórica - 50 anos do
Concílio Vaticano II”, vamos falar no programa de hoje sobre “O rito e o
Missal Romano” [1].
O Missal Romano (Missale Romanum), é o Missal
do Rito Romano da Igreja Católica. A primeira edição impressa de um livro com o
título de Missale Romanum e que se propunha trazer os textos
da Santa Missa segundo os usos da Cúria Romana (“Ordo Missalis Secundum
Consuetudinem Curiae Romanae”) remonta a 1474 e foi impressa em Milão [2].
Daquela data até a publicação da primeira edição oficial do Missal Romano,
publicada pela Santa Sé, passou-se quase um século. Durante este período,
surgiram pelo menos outras 14 edições do livro litúrgico: dez em Veneza, três
em Paris e uma em Lyon. Devido à falta de um órgão de supervisão de sua
qualidade, estas diferentes edições acabaram sofrendo várias modificações pelos
editores, algumas dos quais não foram triviais.
A edição de 1474 é considerada o arquétipo de todas
as publicações que mais tarde se fundiram na edição oficial aprovada pelo Papa
Pio V em 1570, também conhecido como “Missal Tridentino” ou “Missal de São Pio
V” [3]. As notas do Cardeal Guglielmo Sirleto em um exemplar da edição com
o título “Missale secundum morem Sanctae Romanae Ecclesiae”, impresso em Veneza em 1497
(substancialmente idêntico ao de 1474), demonstram que esta edição veneziana
foi usada como modelo para a edição de 1570 [4].
Missais com maior ou menor número de modificações
foram publicados sucessivamente pelos Papas Clemente VIII em 1604, Urbano VIII
em 1634, Leão XIII em 1884, Bento XV em 1920 (Missal cuja revisão foi iniciada
por Pio X).
Pio XII reformou profundamente a Liturgia da Semana
Santa e da Vigília Pascal, modificando não somente o texto das orações, mas
também o horário das celebrações.
A sexta e última edição típica do Missal Romano
“revisado por decreto do Concílio de Trento” foi aquela publicada pelo Papa
João XXIII em 1962.
Ao aplicar a Constituição Sacrosanctum Concilium do Concílio Vaticano II, o Papa Paulo VI,
assistido por uma comissão de Cardeais, Bispos e peritos (o Consilium
ad exsequendam Constitutionem de Sacra Liturgia), criou uma nova
edição do Missal Romano, promulgada com a Constituição Apostólica Missale
Romanum de 03 de abril de
1969 e que entrou em vigor em 30 de novembro sucessivo, início do novo Ano
Litúrgico. A forma ordinária da celebração da Missa segundo o Rito Romano
continua a ser a do Missal Romano reformado e publicado por Paulo VI.
Antes da grande reforma litúrgica realizada por
Paulo VI, o Missal Romano previa a celebração da chamada Missa
tridentina, que era a forma anterior do Rito Romano e cujo uso
foi amplamente restaurado pelo Papa Bento XVI através do Motu Proprio Summorum Pontificum e da instrução Universae
Ecclesiae.
Apenas três anos depois do término do Concilio
Vaticano II, o Papa Paulo VI surpreendia o universo católico com a publicação
de um novo “Ordo missae” - um novo Missal Romano - que levava a data de
6 de abril de 1969. Os Papas, até Paulo VI, não modificaram o Ordo
Missae , mesmo introduzindo-se modos próprios para novas festas, o que
não destrói a chamada Missa Tridentina ou Missa de São Pio V.
Uma Missa Tridentina ou de São Pio V na verdade
nunca existiu, já que, seguindo as instâncias do Concílio de Trento, não foi
formado um Novus Ordo Missae, dado que a Missa de Pio V não é mais
que o Missal da Cúria Romana, que foi se formando em Roma muitos séculos antes,
e difundido especialmente pelos franciscanos em numerosas regiões do Ocidente.
As modificações efetuadas em sua época por São Pio V são tão pequenas, que são perceptíveis
tão somente pelos olhos dos especialistas.
O que fez, na verdade, Pio V? Não fez grande
modificação. Tomou o Missal em uso em Roma e em tantos outros lugares, deu-lhe
retoques, especialmente reduzindo o número das festas dos Santos que continha.
Não o tornou obrigatório para toda a Igreja. Respeitou até as tradições locais
que pudessem se gloriar de ter, pelo menos, duzentos anos de idade.
Assim, propriamente, era suficiente que o Missal
estivesse em uso, pelo menos, há duzentos anos, para que pudesse permanecer em
uso ao lado e no lugar daquele publicado por São Pio V.
O fato de que o Missale Romanum tenha
se difundido tão rapidamente e tenha sido espontaneamente adotado também em
dioceses que tinham o modo próprio mais que bicentenário, deve-se a outras
causas. Roma não exerceu sobre elas nenhuma pressão, e isto numa época em que,
bem diferente do que acontece hoje, não se falava de pluralismo, nem de
tolerância.
Portanto, deixando de lado a expressão imprópria de
Missa Tridentina, falamos melhor de um Ritus Romanus. O Rito Romano
remonta em suas partes mais importantes pelo menos ao século V, e mais
precisamente ao Papa São Dâmaso (366-384).
O Canon Missae, com exceção de alguns
retoques efetuados por São Gregório I (590-604), alcançou com São Gelásio I
(492-496) a forma que conservou até há pouco. A única coisa sobre a qual os
Romanos Pontífices não cessaram de insistir, do século V em diante, foi a
importância para todos de adotar o Canon Missae
Romanae, dado que dito cânon remonta nada menos que ao próprio Apóstolo
Pedro.
O primeiro Papa que ousou inovar o Missal
tradicional foi Pio XII, quando modificou a Liturgia da Semana Santa. Seja-nos
permitido observar, a respeito, que nada impedia de restabelecer a Missa do
Sábado Santo no curso da noite de Páscoa, ainda que sem modificar o rito. João
XXIII o seguiu por este caminho, retocando as rubricas. Mas nem um nem o outro
ousaram inovar sobre o Ordo Missae, que continuou invariável. Porém, a porta tinha sido
aberta, e por ela cruzaram aqueles que queriam uma substituição radical da Liturgia
tradicional e que a obtiveram.
Muitos não concordaram com as mudanças de Paulo VI
com um novo Rito Romano e preveem consequências desastrosas. Outros, no lado
oposto, prefeririam ainda inventar uma Liturgia totalmente nova, perdendo-se a
tradição milenar. Mas sabemos que conservar o Rito Romano não é uma questão
puramente de estética, de conservadorismo, mas de zelar pela natureza própria
da Liturgia milenar, que remonta à comunidade primitiva. Por isso, o Papa Paulo
VI trouxe essa renovação, conservando a tradição, com a publicação de um novo “Ordo
Missae” – o novo Missal Romano - em 1969, três anos depois
do Concilio Vaticano II.
[1] Resgate histórico feito por Monsenhor Klaus
Gamber, Reforma da Liturgia Romana. Disponível em: http://www.unavocesevilla.info/reformaliturgia.pdf
[3] Manlio Sodi e Achille Maria Triacca. Missale
Romanum: Editio Princeps (1570) (Libreria Editrice Vaticana, 1998), p.
XV.
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