Santo Agostinho
Sermão 87
O
denário é a vida eterna
Acabais de
escutar a parábola evangélica dos trabalhadores da vinha, que encaixa
perfeitamente com a presente estação. Pois agora nos encontramos na época da
vindima material. E digo “material”, porque existe uma vindima “espiritual”, na
qual Deus se alegra com os frutos de sua vinha. O Reino dos Céus se assemelha a um proprietário que saiu para contratar
trabalhadores para a sua vinha.
E o que
significa esse gesto de pagar a diária começando pelos últimos? Não lemos em
outra passagem do Evangelho que todos receberão simultaneamente a recompensa?
De fato, lemos em outro texto do Evangelho que o rei dirá àqueles que estiverem
à sua direita: Vinde, benditos de meu
Pai; herdai o reino que está preparado para vós desde a criação do mundo.
Portanto, se todos receberão o denário ao mesmo tempo, como entender o que aqui
se diz sobre que primeiro receberão a diária os contratados ao entardecer, e,
por último, os do amanhecer? Se consigo explicar-me de modo que consigais
entendê-lo, louvado seja Deus. Pois a Ele deveis agradecer pelo que vos concede
pela minha mão: porque o que vos dou não o dou de minha colheita.
Se perguntas,
por exemplo, quem dos dois trabalhadores recebeu o pagamento primeiro: o que
recebeu depois de uma hora de trabalho ou aquele que o recebeu depois de uma
jornada laboral de doze horas, todos responderão que quem o recebeu ao final de
somente uma hora o recebeu antes daquele que o recebeu depois de doze horas.
Assim, ainda que todos cobrassem ao mesmo tempo, contudo, como alguns receberam
a diária ao final de uma hora e os outros depois de doze horas, diz-se que
aqueles a receberam primeiro, posto que a receberam em breve espaço de tempo.
Os primeiros
justos como Abel, Noé, que são os chamados na primeira hora, receberão ao mesmo
tempo que nós a felicidade da ressurreição. Posteriormente, outros justos
depois deles, tais como Abraão, Isaac, Jacó e seus contemporâneos, chamados ao
meio da manhã, receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da ressurreição.
Outros justos: Moisés, Aarão e aqueles que com eles foram chamados ao meio-dia,
receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da ressurreição. Depois deles, os
santos profetas, chamados como ao cair da tarde, receberão ao mesmo tempo que
nós a felicidade da ressurreição. Ao final do mundo, todos os cristãos, como os
chamados à hora undécima, receberão juntamente com eles a felicidade da
ressurreição. Todos a receberão ao mesmo tempo, porém observai após quanto
tempo os primeiros a receberão. Portanto, se os primeiros chamados recebem a
felicidade depois de tanto tempo, ao passo que nós a recebemos depois de um
breve intervalo, mesmo que todos a recebamos simultaneamente, parece como se
nós a recebêssemos primeiro, porque nossa recompensa não se fará esperar.
No que se refere
à retribuição, todos seremos iguais: os últimos como os primeiros, e os
primeiros como os últimos, pois aquele denário é a vida eterna, e na vida
eterna todos serão iguais. E apesar de que, conforme a diversidade de méritos,
brilharão de forma diversa, no que se refere à vida eterna, ela será igual para
todos. Não será mais longo para um e mais curto para outros o que em ambos os
casos será sempiterno: o que não tem fim, não terá nem para ti nem para mim.
Ali brilharão de forma diferente a castidade conjugal e a integridade virginal;
um será o fruto das boas obras e a outra a coroa do martírio; porém, no que se
refere a viver eternamente, nem este viverá mais que aquele, nem aquele mais do
que este. Todos viverão uma vida sem fim, embora cada um com seu brilho e
auréola peculiar. E aquele denário é a vida eterna.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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