Em sua 13ª Catequese sobre a Carta de São Paulo aos Gálatas,
o Papa Francisco refletiu, à luz de Gl 5,22-24, sobre “os frutos do Espírito
Santo”:
Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 27 de outubro de 2021
Carta aos Gálatas (13): O fruto do Espírito
Estimados irmãos e irmãs,
bom dia!
A pregação de São Paulo é totalmente centrada em
Jesus e no seu Mistério Pascal. De fato, o Apóstolo apresenta-se como
anunciador de Cristo, e de Cristo Crucificado (cf. 1Cor 2,2). Aos gálatas, tentados a basear a
sua religiosidade na observância de preceitos e tradições, ele recorda o centro
da salvação e da fé: a Morte e a Ressurreição do Senhor. O faz colocando diante
deles o realismo da cruz de Jesus. Escreve: «Quem vos fascinou para não
obedecerdes à verdade, vós, perante cujos olhos foi apresentado Jesus Cristo Crucificado?»
(Gl 3,1). Quem vos fascinou para vos afastar de Cristo Crucificado?
Trata-se de um momento terrível para os gálatas...
Ainda hoje, muitos procuram a certeza religiosa em
vez do Deus vivo e verdadeiro, concentrando-se em rituais e preceitos em vez de
abraçar o Deus do amor com todo o seu ser. E esta é a tentação dos novos
fundamentalistas, daqueles aos quais parece que a estrada a percorrer provoque
temor e não vão em frente, mas voltam para trás, pois se sentem mais seguros:
procuram a segurança de Deus e não o Deus da segurança. É por isso que Paulo
pede aos gálatas que voltem ao essencial, a Deus que nos dá a vida em Cristo Crucificado.
Ele testemunha isto em primeira pessoa: «Já não sou eu que vivo, é Cristo que
vive em mim» (Gl 2,20). E no final da Carta, afirma: «Quanto a mim,
Deus me livre de me gloriar a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo» (Gl 6,14).
Se nós perdermos o fio da nossa vida espiritual, se
mil problemas e pensamentos nos assolarem, façamos nossos os conselhos de
Paulo: coloquemo-nos diante de Cristo Crucificado, comecemos de novo a partir
d’Ele. Peguemos o crucifixo nas mãos, tenhamo-lo perto do nosso coração. Ou
façamos uma pausa em adoração antes da Eucaristia, onde Jesus é Pão partido
para nós, o Crucificado Ressuscitado, o poder de Deus que derrama o seu amor
nos nossos corações.
E agora, novamente guiados por São Paulo, demos um
ulterior passo. Perguntemo-nos: o que acontece quando encontramos Jesus
Crucificado na oração? Verifica-se o que aconteceu sob a cruz: Jesus entrega o
Espírito (cf. Jo 19,30),
ou seja, doa a sua própria vida. E o Espírito, que flui da Páscoa de Jesus, é o
princípio da vida espiritual. É Ele que muda o coração: não as nossas obras. É
Ele que muda o coração, não as coisas que nós fazemos, mas a ação do Espírito
Santo em nós muda o coração! É Ele quem guia a Igreja, e nós somos chamados a
obedecer à sua ação, que vai para onde e como Ele quiser. Além disso, foi
precisamente a constatação de que o Espírito Santo descia sobre todos e que a
sua graça agia sem exclusão que convenceu também os mais relutantes dos
Apóstolos de que o Evangelho de Jesus era destinado a todos e não a uns poucos
privilegiados. E aqueles que procuram a segurança, o pequeno grupo, as coisas
claras como outrora, afastam-se do Espírito, não deixam que a liberdade do
Espírito entre neles. Assim, a vida da comunidade regenera-se no Espírito
Santo; e é sempre graças a Ele que alimentamos a nossa vida cristã e
continuamos a nossa luta espiritual.
Precisamente o combate espiritual é outro grande
ensinamento da Carta aos Gálatas. O
Apóstolo apresenta duas frentes opostas: por um lado as «obras da carne», por
outro o «fruto do Espírito». Quais são as obras da carne? São comportamentos
contrários ao Espírito de Deus. O Apóstolo chama-lhes obras da carne não porque
há algo de errado ou mau na nossa carne humana; pelo contrário, vimos como ele
insiste no realismo da carne humana suportada por Cristo na cruz! Carne aqui é
uma palavra que indica o homem na sua dimensão terrena, fechado em si mesmo,
numa vida horizontal, onde os instintos mundanos são seguidos e a porta se
fecha ao Espírito, que nos eleva e nos abre a Deus e aos outros. Mas a carne
também nos lembra que tudo isto envelhece, que tudo isto passa, apodrece,
enquanto o Espírito dá vida. Paulo enumera assim as obras da carne, que se
referem ao uso egoísta da sexualidade, a práticas mágicas que são idolatrias e
ao que mina as relações interpessoais, como «contendas, ciúmes, iras, rixas,
discórdias, partidos...» (cf. Gl 5,19-21).
Tudo isto é o fruto - digamos assim - da carne, de um comportamento apenas
humano, “doentiamente” humano, pois o humano tem os seus valores, mas tudo isto
é “doentiamente” humano.
O fruto do Espírito, ao contrário, é «caridade,
alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão,
temperança» (Gl 5,22): assim diz Paulo. Os cristãos, que no Batismo
se revestiram «de Cristo» (cf. Gl 3,27),
são chamados a viver deste modo. Pode ser um bom exercício espiritual, por
exemplo, ler a lista de São Paulo e observar a própria conduta, para verificar
se corresponde, se a nossa vida está verdadeiramente de acordo com o Espírito
Santo, se dá estes frutos. A minha vida produz estes frutos de caridade,
alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão,
temperança? Por exemplo, os três primeiros são caridade, paz e alegria: por
isto se reconhece se uma pessoa é habitada pelo Espírito Santo. Uma pessoa que
está em paz, que rejubila e que ama: com estas três características vê-se a
ação do Espírito.
Este ensinamento do Apóstolo representa também um
grande desafio para as nossas comunidades. Por vezes, aqueles que se aproximam
da Igreja têm a impressão de estar perante uma grande quantidade de comandos e
preceitos: mas não, esta não é a Igreja! Esta pode ser qualquer
associação. Na realidade, porém, a beleza da fé em Jesus Cristo não pode ser
apreendida com base em demasiados mandamentos e numa visão moral que,
desenvolvendo-se em muitas correntes, pode fazer-nos esquecer a fecundidade
original do amor, alimentado pela oração que doa a paz e pelo testemunho
jubiloso. Da mesma forma, a vida do Espírito expressa nos sacramentos não pode
ser abafada por uma burocracia que impede o acesso à graça do Espírito, autor
da conversão do coração. E quantas vezes nós mesmos, sacerdotes ou Bispos,
temos tanta burocracia para dar um Sacramento, para acolher as pessoas, que
consequentemente dizem: “Não, não gosto disto”, e vão embora, e não veem em
nós, muitas vezes, a força do Espírito que regenera, que nos faz novos. Por
conseguinte, temos a grande responsabilidade de anunciar Cristo Crucificado e Ressuscitado,
animados pelo sopro do Espírito de amor. Pois só este Amor tem o poder de
atrair e mudar o coração do homem.
Fonte: Santa Sé.
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