Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 03 de outubro de 2021
Estimados
irmãos e irmãs, bom dia!
No Evangelho da Liturgia de hoje (Mc 10,2-16), vemos uma reação bastante
insólita de Jesus: indigna-se. E o mais surpreendente é que a sua indignação
não é causada pelos fariseus que o põem à prova com perguntas sobre a liceidade
do divórcio, mas pelos seus discípulos que, para o protegerem da multidão,
repreendem algumas crianças que são levadas a Jesus. Por outras palavras, o
Senhor não se indigna com quantos discutem com ele, mas com aqueles que, a fim
de aliviá-lo do cansaço, afastam as crianças. Por quê? É uma boa pergunta: por
que faz isto o Senhor?
Recordemos - era o Evangelho há dois domingos - que Jesus, ao fazer o gesto de abraçar uma criança,
identificou-se com os pequeninos: ensinou que são precisamente os pequeninos,
ou seja, aqueles que dependem dos outros, que estão em necessidade e não podem
retribuir, que devem ser servidos em primeiro lugar (cf. Mc 9,35-37). Quem procura Deus, encontra-o
neles, nos pequeninos, nos necessitados: necessitados não só de bens, mas de
cuidados e conforto, como os doentes, os humilhados, os prisioneiros, os
imigrantes e os encarcerados. Ele está ali: nos mais pequeninos. Eis porque
Jesus se indigna: cada afronta feita a um pequenino, a um pobre, a uma criança,
a um indefeso, é feita a Ele.
Hoje o Senhor retoma este ensinamento e
completa-o. De fato, acrescenta: «Em verdade vos digo: Quem não receber o reino
de Deus como uma criancinha, não entrará nele» (Mc 10,15). Eis a
novidade: o discípulo deve não só servir os mais pequeninos, mas também reconhecer-se
como pequeno. E cada um de nós, reconhecemo-nos a nós mesmos pequenos
perante Deus? Pensemos nisto, nos ajudará. Reconhecermo-nos pequenos,
necessitados de salvação, é indispensável para acolher o Senhor. É o primeiro
passo para nos abrirmos a Ele. No entanto, esquecemo-nos frequentemente disto.
Na prosperidade, no bem-estar, temos a ilusão de sermos autossuficientes, de
bastarmos a nós próprios, de não precisarmos de Deus. Irmãos e irmãs, isto é um
engano, pois cada um de nós é um ser necessitado, um pequenino. Devemos
procurar a nossa própria pequenez e reconhecê-la. E nisto encontraremos Jesus.
Na vida, reconhecer-se pequeno é um
ponto de partida para se tornar grande. Se pensarmos nisto, crescemos não tanto
com base nos sucessos e nas coisas que temos, mas sobretudo nos momentos de
luta e fragilidade. Na necessidade, amadurecemos; abrimos o coração a Deus, aos
outros, ao sentido da vida. Abrimos os olhos aos outros. Abrimos os olhos,
quando somos pequenos, para o verdadeiro sentido da vida. Quando nos sentimos
pequenos diante de um problema, pequenos diante de uma cruz, de uma doença,
quando sentimos fadiga e solidão, não desanimemos. A máscara da
superficialidade está a cair e a nossa fragilidade radical está a reemergir: é
a nossa base comum, o nosso tesouro, porque com Deus as fragilidades
não são obstáculos, mas oportunidades. Uma boa oração seria
esta: “Senhor, olha para as minhas fragilidades...” e enumerá-las perante Ele.
Esta é uma boa atitude diante de Deus.
Na verdade, é precisamente na
fragilidade que descobrimos quanto Deus se preocupa conosco. O Evangelho de
hoje diz que Jesus é muito terno com os pequeninos: «Depois, tomou-as nos
braços, abençoou-as, impondo-lhes as mãos» (v. 16). As contrariedades, as
situações que revelam a nossa fragilidade são ocasiões privilegiadas para
experimentar o seu amor. Sabem bem isto quantos rezam com perseverança: em
momentos de escuridão ou solidão, a ternura de Deus para conosco torna-se - por
assim dizer - ainda mais presente. Quando somos pequeninos, sentimos ainda mais
a ternura de Deus. Esta ternura dá-nos paz, esta ternura faz-nos crescer,
porque Deus se aproxima de nós à sua maneira, que é proximidade, compaixão e
ternura. E quando nos sentimos sem importância, isto é, pequenos, por qualquer
razão, o Senhor aproxima-se, sentimo-lo mais próximo. Ele dá-nos paz, faz-nos
crescer. Na oração, o Senhor abraça-nos, como um pai com o seu filho. Assim,
tornamo-nos grandes: não na ilusória pretensão da nossa autossuficiência - isto
não faz grande ninguém - mas na força de recolocar toda a esperança no Pai.
Precisamente como fazem os pequeninos, eles fazem assim.
Peçamos hoje à Virgem Maria uma grande
graça, a da pequenez: sermos crianças que confiam no Pai, certos de que Ele não
deixa de cuidar de nós.
Jesus abençoa as crianças (Igreja do Salvador sobre o Sangue Derramado, São Petersburgo) |
Fonte: Santa Sé.
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