Com essa postagem concluímos nossa série dedicada ao
subsídio “Un Messale per le nostre
Assemblee: La terza edizione italiana del Messale Romano tra Liturgia e
Catechesi” (Um Missal para as nossas Assembleias: A terceira edição
italiana do Missal Romano entre Liturgia e Catequese), publicado pelo Ofício
Litúrgico da Conferência Episcopal Italiana (CEI) em preparação à 3ª edição do
Missal Romano. Segue, portanto, nossa tradução do décimo e último encontro
formativo do subsídio.
10. Da celebração à «Igreja em saída»
Do ponto de vista teológico, o livro litúrgico é guardião da
fé acreditada, celebrada e vivida, sendo, portanto, testemunha autorizada da
profunda unidade que vincula a lei do rezar (lex orandi) à lei do crer (lex
credendi) e, por fim, à lei do viver (lex
vivendi). Um longo caminho foi percorrido nessas décadas [desde o Concílio Vaticano II] para
aproximar o povo de Deus dos tesouros da Sagrada Escritura: urge agora um
empenho correspondente para que a celebração litúrgica seja vivida como um
lugar privilegiado de transmissão da autêntica Tradição da Igreja e de acesso
aos mistérios da fé, em uma conexão sempre mais estreita com as diversas
dimensões da vida quotidiana (CEI, Apresentação
da 3ª edição do Missal Romano, n. 10).
"Docete omnes gentes" - "Fazei discípulos entre todas as nações" (Mt 28,19) (Vitral da Catedral de Santiago do Chile) |
Da Missa à missão
O uso material do livro litúrgico “termina”, cada celebração
individual, no momento em que essa se conclui. Mas, como a Celebração
Eucarística se conclui com um envio («Ide em paz») dirigido à comunidade que
celebrou os santos mistérios, o Missal não é alheio à missão confiada aos
fiéis, porque o próprio rito propõe um “estilo” de missão.
«Quando a assembleia se dissolve e é reenviada à vida, é
toda a vida que deve se tornar dom de si. Também este é um significado do
mandamento do Senhor: “Fazei isto em memória de mim”. Todo cristão que tenha
compreendido o sentido daquilo de que participou, se sentirá em dívida com cada
irmão por aquilo que recebeu. “Ide e anunciai a meus irmãos” (Mt 28,10): o chamado se torna missão, o
dom se torna responsabilidade, e requer ser compartilhado» [1].
Olhar para a Eucaristia como fonte da missão permitirá antes
de tudo determinar melhor as coordenadas da missão da Igreja, e recordar que o
sentido do seu anseio apostólico «não consiste em um aumento das atividades a
desenvolver, mas si em um estilo de testemunho que devemos aos irmãos, isto é:
devemos viver as coisas cotidianas com espírito missionário. Isto ajudará a
evitar que a comunidade seja uma “uma estrutura complicada, separada das
pessoas, ou um grupo de eleitos que olham para si mesmos” (Evangelii gaudium, n. 28) e nos preservará do perigo de
afogarmo-nos em uma série de iniciativas que alcançam e envolvem sempre as
mesmas pessoas. Muitas vezes a ação pastoral corre o risco de sugerir a ideia
de que a Igreja é alimentada mais pela multiplicação dos projetos e das obras
do que pelo Pão do céu oferecido por Deus» [2].
De fato, a Eucaristia constitui não só um ponto de
referência determinante, mas a verdadeira fonte da missão. Ela evidencia que a
missão, antes de tudo, não é uma atividade nossa para difundir certas ideias e
valores, mas é o realizar-se em nós do movimento com o qual Deus vem ao
encontro de cada homem por Cristo no Espírito Santo. O testemunho da Igreja
nasce da Eucaristia justamente porque a sua missão não é “outra” senão a de
Jesus, e nem mesmo “sucede” ou vem “depois” que a sua. Com efeito, «a missão
primeira e fundamental, que deriva dos Santos Mistérios que celebramos, é dar
testemunho com a nossa vida. O enlevo pelo dom que Deus nos concedeu em Cristo
imprime à nossa existência um dinamismo novo que nos compromete a ser
testemunhas do seu amor» (Bento XVI, Exortação Apostólica Sacramentum caritatis, n. 85).
Uma celebração que
dispõe à missão
Para que tudo isso seja possível, trata-se agora, em
primeiro lugar, de valorizar a “dimensão missionária” já presente na própria
celebração, e de ajudar a comunidade a reconhecê-la e a vivê-la, antes de tudo
mediante o cuidado atento da dinâmica celebrativa («per ritus et preces»: Sacrosanctum
Concilium, n. 48), e depois com a ajuda de uma sábia catequese mistagógica.
Pensemos, por exemplo, no modo como a celebração da Liturgia da Palavra pode
conduzir a assembleia - certamente, em última análise, pelo dom do Espírito - a
refazer a experiência dos discípulos na estrada de Emaús (“Não estava ardendo o
nosso coração quando Ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as
Escrituras?”: Lc 24,33), de modo que
depois o reconhecimento do Senhor na fração do pão a impulsione a retomar o
caminho, para tornar-se testemunha do encontro com o Ressuscitado.
Dispõe à missão o cuidado geral por uma Liturgia celebrada
com propriedade e com beleza. É muito difícil, de fato, sentir o desejo de
transmitir aos outros aquilo que “vimos e ouvimos” (cf. 1Jo 1,3) se não partimos da grata recordação de termos visto
qualquer coisa ao mesmo tempo “bela” e “transparente”: bela, precisamente, nas
diversas dimensões celebrativas, e transparente do mistério de amor em torno do
qual a comunidade se reúne e para o qual se orienta. Assim se poderá dizer com
Paulo: «Nós... não anunciamos a nós mesmos, mas Cristo Jesus, o Senhor» (2Cor 4,5), aquele Senhor que
contemplamos, ouvimos, “tocamos com a mão” e cuja bondade misericordiosa
“provamos”. Como recorda o Papa Francisco, «a evangelização alegre torna-se
beleza na Liturgia. A Igreja evangeliza e se evangeliza com a beleza da Liturgia,
que é também celebração da atividade evangelizadora e fonte de um renovado
impulso para se doar» (Exortação Apostólica Evangelii
gaudium, n. 24).
A comunidade litúrgica
evangeliza
Não nos esqueçamos de que também a celebração enquanto tal,
se bem que em si mesma orientada aos cristãos já iniciados, pode tornar-se um
singular lugar de anúncio. São ainda muitas as ocasiões em que estão presentes
na Celebração Eucarística tanto batizados que abandonaram a participação
regular na vida litúrgica e, mais amplamente, a prática da vida cristã, quanto
também não batizados, presentes, por exemplo, por razões de parentesco ou amizade
nas celebrações do Matrimônio, dos sacramentos da Iniciação Cristã ou dos
funerais [3].
A comunidade cristã evangeliza, é missionária, pelo próprio
fato de reunir-se “em nome do Senhor”, e pelo modo como se apresenta neste
reunir-se: portanto, uma comunidade que acolhe e na qual nos deixamos acolher,
uma comunidade na qual os diversos dons e carismas são postos à disposição de
todos e, reciprocamente, são reconhecidos e valorizados; consequentemente, uma
assembleia litúrgica onde há espaço para a variedade dos serviços, das
competências, onde há respeito pelas potencialidades e também pelos limites
encontrados (nem todos podem compreender certo tipo de linguagem, cantar certo
tipo de canto, cumprir com naturalidade e facilidade um gesto, dispor-se para
um serviço...); uma comunidade litúrgica na qual ninguém se “impõe” sobre os
outros, mas onde todos convergem no reconhecimento orante e alegre do único que
é Cabeça e Senhor, Jesus Cristo... Uma comunidade assim tem muito mais
possibilidade de se tornar um sinal transparente do “Corpo de Cristo” que vive
em um bairro ou em uma cidade.
Uma Igreja “enviada”
Um modo correto de celebrar o mistério de Cristo ajudará a
superar até mesmo aquele individualismo religioso que ainda é muito presente e
que torna mais difícil a missão evangelizadora da comunidade. «Muitas vezes, de
fato, a Eucaristia corre o risco de ser vivida de maneira “privada”, como se
fosse puramente a resposta a uma necessidade individual, ou mesmo a oferta a
Deus das nossas boas ações. Assim se perde a dimensão mais verdadeira da
assembleia litúrgica, que não é uma reunião de indivíduos, que agem de maneira
privada, mas é a realização visível, em um lugar e em um tempo, do mistério da
Igreja» [4].
Apenas uma Igreja fraterna, comunhão verdadeira, corpo ao
mesmo tempo unido e variado, submetido à sua Cabeça, Cristo, e por Ele enviada,
poderá anunciar o “Evangelho da alegria”. Por isto, pensar «a celebração como
momento de convocação da comunidade é diferente de propô-la como “serviço
religioso” oferecido aos indivíduos; compreendê-la e vivê-la como alimento da
missão é diferente de concebê-la como um momento fechado em si mesmo, em uma
inércia repetitiva que não perturba» [5]. «A comunidade evangelizadora alegre
sabe sempre “festejar”: celebra e festeja cada pequena vitória, cada passo à
frente na evangelização» (Evangelii
gaudium, n. 24): como ninguém faz festa sozinho, assim também não há
Eucaristia nem missão sem a fraternidade e a comunhão da Igreja.
Procissão de saída da Missa Crismal no Vaticano |
Para refletir juntos:
- Como repensar o nosso modo de celebrar, para que esteja
atento também aos «não iniciados» que também participam, em certas ocasiões, da
Celebração Eucarística?
- Quais aspectos de uma catequese
mistagógica podem favorecer a passagem da celebração à missão?
- Como favorecer a percepção da
dimensão comunitária da Eucaristia, irredutível a um serviço religioso
oferecido aos indivíduos?
Notas:
[1] CONFERENZA EPISCOPALE ITALIANA, Il giorno del Signore: Nota pastorale, 15 luglio 1984, n. 13.
[2] COMITATO PER I CONGRESSI EUCARISTICI NAZIONALI, L’Eucaristia sorgente della missione: «Nella
tua Misericordia a tutti sei venuto incontro», XXVI Congresso Eucaristico
Nazionale (Genova, 15-18 ottobre 2016), pp. 22-23.
[3] cf. CONFERENZA
EPISCOPALE ITALIANA, Comunicare il
Vangelo in un mondo che cambia: Orientamenti pastorali dell’Episcopato italiano
per il primo decennio del 2000, 29 giugno 2001, n. 57.
[4] COMITATO PER I CONGRESSI EUCARISTICI NAZIONALI, op. cit., p. 27.
[5] ibid, p. 28.
Fonte:
CONFERENZA EPISCOPALE ITALIANA. Dalla celebrazione alla «Chiesa in uscita». in: Un Messale per le nostre Assemblee: La terza
edizione italiana del Messale Romano tra Liturgia e Catechesi. Fondazione
di Religione Santi Francesco d’Assisi e Caterina da Siena: Roma, 2020, pp.
61-66.
Disponível em: https://liturgico.chiesacattolica.it/un-messale-per-le-nostre-assemblee/
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