quinta-feira, 29 de agosto de 2019

VI Catequese do Papa sobre os Atos dos Apóstolos

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 21 de agosto de 2019
Atos dos Apóstolos (6)

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
A comunidade cristã nasce da efusão superabundante do Espírito Santo e cresce graças ao fermento da partilha entre os irmãos e irmãs em Cristo. Existe um dinamismo de solidariedade que edifica a Igreja como família de Deus, de onde resulta central a experiência da koinonía. O que quer dizer esta palavra estranha? É uma palavra grega que quer dizer «colocar em comunhão», «colocar em comum», ser como uma comunidade, não isolados. Esta é a experiência da primeira comunidade cristã, ou seja, colocar em comunhão, «compartilhar», «comunicar, participar», não isolar-se. Na Igreja das origens esta koinonía, esta comunidade nos leva sobretudo à participação no Corpo e no Sangue de Cristo. Por isto, quando recebemos a comunhão nós dizemos “comungamos”, entramos em comunhão com Jesus e esta comunhão com o Corpo e Sangue de Cristo, que se realiza na Santa Missa, se traduz em união fraterna e, portanto, também naquilo que é mais difícil para nós: colocar em comum os bens e recolher o dinheiro para a coleta em favor da Igreja mãe de Jerusalém (cf. Rm 12,13; 2Cor 8-9) e das demais Igrejas. Se vocês querem saber se são bons cristãos devem rezar, buscar aproximar-se da comunhão, do sacramento da reconciliação. Porém o sinal que teu coração se converteu é quando a conversão chega aos bolsos, quando toca o próprio interesse: ali é onde se vê se alguém é generoso com os demais, se ajuda aos mais débeis, aos mais pobres: quando a conversão chega ali, fica tranquilo que é uma verdadeira conversão. Se fica só nas palavras não é uma boa conversão.
A vida eucarística, as orações, a pregação dos Apóstolos e a experiência da comunhão (cf. At 2,42) fazem dos crentes uma multidão de pessoas que têm - diz o livro dos Atos dos Apóstolos - «um só coração e uma só alma» e que não consideram de sua propriedade o que possuem, mas que colocam tudo em comum (cf. At 4,32). É um modelo de vida tão forte que nos ajuda a ser generosos e não mesquinhos. Por este motivo, «não havia entre eles nenhum necessitado, porque todos que possuíam - diz o livro - campos ou casas vendiam-nas, levavam o dinheiro e o colocavam aos pés dos apóstolos e se repartia conforme a necessidade de cada um» (At 4,34-35). Sempre a Igreja cumpriu este gesto dos cristãos que se despojavam das coisas que tinham demais, das coisas que não eram necessárias para dá-las àqueles que tinham necessidade. E não era apenas dinheiro: também tempo! Quantos cristãos - vocês, por exemplo, aqui na Itália -, quantos cristãos fazem voluntariado! E isto é belíssimo. É comunhão, compartilhar meu tempo com os demais, para ajudar aqueles que têm necessidade. É assim o voluntariado, as obras de caridade, as visitas aos enfermos; é necessário sempre compartilhar com os demais, e não buscar apenas o próprio interesse.
A comunidade, ou koinonía, se converte deste modo na nova modalidade de relação entre os discípulos do Senhor. Os cristãos experimentam uma nova modalidade de ser entre eles, de comportar-se. E é a modalidade própria do cristão, a tal ponto que os pagãos olhavam os cristãos e exclamavam: “Vede como se amam!”. O amor era a modalidade. Porém não amor apenas de palavra, não amor fingido: amor de obras, de ajudarem-se uns aos outros, amor concreto, o concreto do amor. O vínculo com Cristo estabelece um vínculo entre os irmãos que conflui e se expressa também na comunhão dos bens materiais. Sim, esta modalidade de estar juntos, este amar-se assim chega até os bolsos, chega ao desprender-se também do obstáculo do dinheiro para dá-lo aos demais, indo contra o próprio interesse. Ser membros do corpo de Cristo faz os crentes corresponsáveis uns com os outros. “Mas olha aquele, o problema que tem: a mim não importa, é assunto dele”. Não, entre os cristãos não podemos dizer: “Pobre desta pessoa, tem um problema em sua casa, está passando esta dificuldade de família”. Eu, porém, tenho que rezar, eu tomo como meu, não sou indiferente. Isso é ser cristão. Por isto os fortes sustentam aos fracos (cf. Rm 15,10) e ninguém experimenta a indigência que humilha e desfigura a dignidade humana, porque eles vivem esta comunidade; colocar em comum o coração. Amam-se. Este é o sinal: amor concreto.
Tiago, Pedro e João, que são os três Apóstolos como as “colunas” da Igreja de Jerusalém, estabelecem em comunhão que Paulo e Barnabé evangelizem os pagãos enquanto eles evangelizarão os judeus, e pedem apenas a Paulo e Barnabé, qual é a condição: não esquecer-se dos pobres, recordar os pobres (cf. Gl 2,9-10). Não apenas os pobres materiais, mas também os pobres espirituais, a gente que tem problemas e tem necessidade de nossa proximidade. Um cristão parte sempre de si mesmo, do próprio coração, e se aproxima dos demais como Jesus se aproximou de nós. Esta é a primeira comunidade cristã.
Um exemplo concreto de partilha e de comunhão de bens nos vem do testemunho de Barnabé: ele possui um campo e vende-o para entregar o valor da venda aos Apóstolos (cf. At 4,36-37). Porém junto a seu exemplo positivo aparece outro tristemente negativo: Ananias e sua mulher Safira, vendendo um terreno, decidem entregar apenas uma parte aos Apóstolos e reter para eles uma parte (At 5,1-12). Esta enganação interrompe a cadeia da partilha gratuita, da partilha serena, desinteressada, e as consequências são trágicas, são fatais (At 5,5.10). O Apóstolo Pedro desmascara a falta de Ananias e de sua mulher e lhes diz: «Como é que Satanás encheu teu coração para mentir ao Espírito Santo e ficar com parte do preço do campo? (...) Não mentiste aos homens, mas a Deus» (At 5,3-4). Poderíamos dizer que Ananias mentiu a Deus por meio de uma consciência isolada, de uma consciência hipócrita, com uma pertença eclesial “negociada”, parcial e oportunista. A hipocrisia é o pior inimigo desta comunidade cristã, deste amor cristão: é fingir amar muito mas buscar apenas o próprio interesse.
Trair a sinceridade da partilha, com efeito, ou trair a sinceridade do amor, significa cultivar a hipocrisia, afastar-se da verdade, tornar-se egoísta, apagar o fogo da comunhão e destinar-se ao frio de uma morte interior. Quem se comporta assim caminha na Igreja como um turista. Há tantos turistas na Igreja que estão sempre de passagem, mas que nunca entram na Igreja: é o turismo espiritual que os faz crer que são cristãos, enquanto são apenas turistas das catacumbas. Não, não devemos ser turistas na Igreja, mas irmãos uns dos outros. Uma vida dirigida apenas a tirar proveito e vantagem das situações em detrimento dos demais provoca inevitavelmente a morte interior. E quantas pessoas se dizem próximas da Igreja, amigos de sacerdotes, de Bispos, enquanto buscam apenas o próprio interesse. Estas são as hipocrisias que destroem a Igreja.
O Senhor - peço para todos nós - volte a derramar sobre nós seu Espírito de ternura, que vence a hipocrisia e faz circular esta verdade que nutre a solidariedade cristã, a qual, longe de ser atividade de assistência social, é a expressão irrenunciável da natureza da Igreja, mãe terníssima de todos, especialmente dos mais pobres.


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