quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Leitura litúrgica do Livro da Sabedoria (3)

“Dai-me vossa sabedoria, ó Senhor” (Sb 9,4)

Nas últimas duas postagens desta série sobre a leitura litúrgica, consideramos as celebrações em que o Livro da Sabedoria (Sb) é lido sob o critério da composição harmônica: a Missa, os sacramentos, os sacramentais e a Liturgia das Horas. Agora daremos continuidade a esta proposta com o critério da leitura semicontínua.

3. Leitura litúrgica de Sb: Leitura semicontínua

Como indica o n. 66 do Elenco das Leituras da Missa, a leitura semicontínua consiste na proclamação dos principais textos de um livro na sequência, de modo a oferecer aos fiéis um contato mais amplo com a Sagrada Escritura [1].

a) Celebração Eucarística

No caso de Sabedoria, sua leitura semicontínua na Celebração Eucarística está concentrada em uma semana do Tempo Comum, especificamente a XXXII semana do Tempo Comum do ano ímpar. Sendo uma das últimas semanas do Ano Litúrgico, é compreensível essa escolha, dada a índole escatológica de alguns trechos do livro.

De segunda-feira a sábado são lidos seis textos do livro, dois de cada sessão [2]:
Segunda-feira: Sb 1,1-7 - uma exortação a buscar o caminho da sabedoria.
Terça-feira: Sb 2,23–3,9 - o destino escatológico dos justos.
Quarta-feira: Sb 6,1-11 - Salomão exorta os governantes a buscar a sabedoria.
Quinta-feira: Sb 7,22–8,1 - trecho do elogio de Salomão à sabedoria.
Sexta-feira: Sb 13,1-9 - condenação da idolatria e convite a contemplar na criação um reflexo da beleza do Criador.
Sábado: Sb 18,14-16; 19,6-9 - recordação do episódio do êxodo, particularmente da passagem do Mar Vermelho, interpretada como o início de uma “nova criação”.

Salomão, modelo do rei sábio

b) Liturgia das Horas

Na Liturgia das Horas o Livro da Sabedoria também é lido por uma semana, no Ofício das Leituras da XXX semana do Tempo Comum.

As sete perícopes escolhidas aqui são:
Domingo: Sb 1,1-15 - “Elogio à sabedoria de Deus”;
Segunda-feira: Sb 1,16–21a.10-24 - “As maquinações dos ímpios contra o justo”;
Terça-feira: Sb 3,1-19 - “Os justos possuirão o reino”;
Quarta-feira: Sb 6,1-25 - “A sabedoria deve ser amada”;
Quinta-feira: Sb 7,15-30 - “A sabedoria, imagem de Deus”;
Sexta-feira: Sb 8,1-21 - “A sabedoria deve ser pedida a Deus”;
Sábado: Sb 11,20b–12,2.11b-19 - “A misericórdia e a paciência de Deus” [3].

No ciclo bienal do Ofício das Leituras, que não foi traduzido para o Brasil, nosso livro é lido por duas semanas, na XXX e na XXXI semanas do Tempo Comum no ano par. Indicamos a seguir em negrito os dias com leituras “inéditas” de Sb:

Ofício das Leituras da XXX semana do Tempo Comum (ano par)
Domingo a terça-feira: como no ciclo anual;
Quarta-feira: Sb 4,1-20 - “A verdadeira e a falsa felicidade”;
Quinta-feira: Sb 5,1-24 - “Os homens ímpios são condenados por Deus”;
Sexta e sábado: como na quarta e quinta do ciclo anual.

Ofício das Leituras da XXXI semana do Tempo Comum (ano par)
Domingo: como na sexta-feira do ciclo anual.
Segunda-feira: Sb 8,21b–9,19 - “Oração para alcançar a Sabedoria”;
Terça-feira: Sb 10,1–11,4 - “A Sabedoria foi a salvação dos patriarcas”;
Quarta-feira: como no sábado do ciclo anual.
Quinta-feira: Sb 13,1-10; 14,15-21; 15,1-6 - “O homem sábio rejeita aos ídolos”;
Sexta-feira: Sb 16,2b-13.20-26 - “Benefícios que Deus concede a seu povo”;
Sábado: Sb 18,1-16; 19,3-9 - “A noite da Páscoa” [4].

Alegoria da divina sabedoria
(Luca Giordano - séc. XVII)

Além das leituras longas do Ofício, estão previstas cinco leituras breves da Sabedoria, distribuídas na Hora Média das quatro semanas do Saltério.

Os salmos organizados nessas quatro semanas são entoados ao longo de todo o ano, porém as leituras são proferidas apenas no Tempo Comum, uma vez os tempos do Advento, Natal, Quaresma e Páscoa possuem leituras próprias.

- Hora Média (15h) do sábado da I semana do Saltério: para este dia estão previstos dois versículos do elogio de Salomão à sabedoria: Sb 7,27a; 8,1 [4]. A sabedoria é aclamada aqui como aquela que tudo renova e tudo governa.

- Hora Média (15h) da sexta-feira da II semana do Saltério: aqui lemos Sb 1,13-15 [5], a proclamação do poder de Deus sobre a morte.

- Hora Média (9h) da quinta-feira da III semana do Saltério: o versículo conclusivo do nosso livro: Sb 19,22 [6], louvor final de Deus que glorifica e socorre o seu povo.

- Hora Média (12h) da segunda-feira da IV semana do Saltério: Sb 15,1.3 [7]. Como parte da releitura da história da salvação presente na 3ª parte do livro, esses versículos integram a condenação à idolatria e a afirmação do verdadeiro culto a Deus.

- Hora Média (12h) da quinta-feira da IV semana do Saltério: lemos Sb 1,1-2 [8]. Se na semana anterior lemos a conclusão do livro, aqui encontramos a sua introdução, com seu convite a buscar a Deus com simplicidade de coração.

4. Leitura litúrgica de Sb: Cânticos

Na Liturgia das Horas, por fim, temos ainda cinco trechos do Livro da Sabedoria que são proclamados na forma de cânticos. São textos já proferidos como leituras, em seu caráter exortativo, que agora, equiparados aos salmos, adquirem um caráter orante, laudativo.

No ciclo ordinário do Ofício encontramos apenas um cântico de Sb entoado nas Laudes, a oração da manhã, uma vez que nas Vésperas, a oração da tarde, se entoam cânticos do Novo Testamento [9].

Nas Laudes do sábado da III semana do Saltério entoamos o cântico de Sb 9,1-6.9-11 [10]. Trata-se de um trecho da oração de Salomão pedindo a sabedoria, como indica o título proposto: “Senhor, dai-me a Sabedoria”. O texto adquire, portanto, um caráter deprecatório, isto é, de súplica.

Há ainda outras quatro perícopes de Sb que podem ser entoadas como cânticos nas Vigílias. Estas não fazem parte da recitação ordinária da Liturgia das Horas, podendo ser rezadas de modo facultativo junto ao Ofício das Leituras dos domingos e solenidades [11]. Constituem-se de três cânticos e um Evangelho.

Primeiramente, como III cântico para a Vigília da Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo (Corpus Christi), temos Sb 16,20-21.26; 17,1a [12]. Com o título “Com alimento dos anjos o Senhor nutriu seu povo”, é um cântico de caráter sapiencial, na forma anamnética, isto é, de memória da história da salvação, recordando o episódio do maná no deserto.

O maná cai sobre o acampamento de Israel

O texto de Sb 3,1-9, que narra o destino dos justos, foi dividido em dois trechos. Os vv. 1-6 constituem o I cântico das Vigílias do Comum de vários Mártires [13], intitulado “As almas dos justos estão na mão de Deus”. Assim como o trecho seguinte, trata-se de um cântico de caráter deprecatório: a súplica, porém, vem na forma de uma afirmação de confiança em Deus, como em alguns salmos.

Os vv. 7-9 deste capítulo 3, por sua vez, aparecem em duas celebrações: são entoados como II cântico das Vigílias do Comum de vários Mártires e II Cântico das Vigílias do Comum dos Apóstolos [14]. O breve trecho é intitulado “A glória futura dos justos”.

Por fim, o texto de Sb 10,17-21 é o III cântico das Vigílias do Comum de vários Mártires, bem como o III Cântico das Vigílias do Comum dos Apóstolos. O cântico, intitulado “Deus, guia do seu povo à salvação”, possui um sentido de ação de graças, agradecendo a Deus por sua ação salvífica, particularmente pelo episódio do êxodo, lido como recompensa dos santos.

Cumpre dizer ainda que o texto de Sb 3,1-3, acompanhado dos versos do Salmo 14, integra o canto adequado para a apresentação das oferendas da Solenidade de Todos os Santos e da Comemoração dos Fiéis Defuntos, conforme indicado no Hinário Litúrgico.


Para acessar a primeira parte dessa pesquisa, publicada no dia 01 de agosto, clique aqui.

Para acessar a segunda parte dessa pesquisa, publicada no dia 08 de agosto, clique aqui.

Notas:
[1] ALDAZÁBAL, José. A Mesa da Palavra I: Elenco das Leituras da Missa - Texto e Comentário. São Paulo: Paulinas, 2007, p. 76.
[2] LECIONÁRIO II: Semanal. Tradução portuguesa da 2ª edição típica para o Brasil. São Paulo: Paulus, 1995, pp. 1167.1171.1174.1178.1182.1186.
[3] OFÍCIO DIVINO. Liturgia das Horas segundo o Rito Romano. Tradução para o Brasil da segunda edição típica. São Paulo: Paulus, 1999, v. IV, pp. 378.382.386.389.393.397.401.
[4] ibid., v. III, p. 748; v. IV, p. 702.
[5] ibid., v. III, p. 870; v. IV, p. 824.
[6] ibid., v. III, p. 986; v. IV, p. 940.
[7] ibid., v. III, p. 1064; v. IV, p. 1018.
[8] ibid., v. III, p. 1121; v. IV, p. 1075.
[9] cf. ALDAZÁBAL, José. Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas - Texto e Comentário. São Paulo: Paulinas, 2010, p. 83.
[10] OFÍCIO DIVINO, v. I, p. 894; v. II, p. 1292; v. III, p. 1019; v. IV, p. 973.
[11] cf. ALDAZÁBAL, op. cit., pp. 62-63.
[12] OFÍCIO DIVINO, v. III, p. 1805.
[13] ibid., v. I, pp. 1439-1440; v. II, p. 2011-2012; v. III, p. 1821-1822; v. IV, p. 1829-1830.
[14] ibid., v. I, p. 1438; v. II, p. 2010; v. III, p. 1820; v. IV, p. 1828.

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