São Gregório Magno
Sermão 14
Cristo,
o Bom Pastor
Ouvistes,
caríssimos irmãos, no ensinamento do santo Evangelho preceitos para a vida; e
ouvistes também coisas que revelam nosso perigo; e observai com atenção que o
Senhor, que é bom por seu próprio ser, e não por alguma virtude adquirida,
disse: Eu sou o bom pastor. E para
que seu exemplo nos torne bons, disse: O
bom pastor dá a vida por suas ovelhas. Ele fez o que nos ensina, e nos
mostrou o que é que devemos fazer.
O bom pastor deu
a vida por suas ovelhas para dar-nos sua Carne e seu Sangue no Santíssimo
Sacramento, aonde as ovelhas redimidas poderiam se sustentar em sua graça. E
tendo-nos ensinado que devemos fazer pouco caso da morte, quis dar-nos a regra
para que a sigamos. A primeira coisa que nos manda é que, para auxílio de suas
ovelhas, nós, os pastores, partilhemos com liberalidade todos os nossos bens
exteriores com muita caridade; e depois disto, de for necessário, que
ofereçamos também nossa vida pela salvação das mesmas ovelhas.
Do primeiro, que
é muito pouco, sobe-se ao segundo, que é mais importante. Mas como a alma é
mais estimada, e sem comparação de alto valor, e mediante a qual vivemos, que
não há bem que lhe compare; aquele que não oferta seus bens como socorro para
suas ovelhas, quando creremos que dará a própria vida? E é daqui que muitos
perdem o nome de pastores, e com razão, pois valorizam mais os bens do que a
vida das ovelhas que lhe foram confiadas, e é deles que se diz: O mercenário, que não é pastor e não é dono
das ovelhas, vê o lobo chegar, abandona as ovelhas e foge.
Este não é
pastor, mas mercenário, porque não apascenta as ovelhas do Senhor pelo amor que
as tem, mas somente para ganhar a diária que lhe pagam. Sem dúvida, é
mercenário aquele que tem emprego de pastor, e não procura o bem das almas de
suas ovelhas, dando atenção apenas para as rendas e a ganância que dali colhe.
Desfruta na honra de pastor na qual se vê: apascenta-se a si mesmo dos proveitos
temporais que dali tira, e se alegra de ver que todos o têm em grande
reverência.
Esta é a
verdadeira paga do mercenário, encontrar as coisas que ama desta vida em
pagamento de seu trabalho, ainda que nunca suba nem entre no céu, que é a
herança das ovelhas. Verdade é que, não havendo ocasião ou necessidade, muitas
vezes não conhecereis facilmente qual é pastor ou mercenário: porque quando o
tempo está calmo e tranquilo, também se está com o ganho tanto o mercenário
quanto o pastor; mas vindo o lobo se conhece qual é o pastor, e qual é o
mercenário, e o cuidado que cada um destes tem com suas ovelhas.
Sabei que o lobo
vem para junto das ovelhas, sempre que algum tirano e poderoso maltrata aos
cristãos pobres e humildes por ver que não oferecem grande resistência; e neste
gosto, o que parecia pastor e não o era, deixa as ovelhas e foge, porque,
temendo o perigo que lhe podia advir de defender as ovelhas, esqueceu-se da
salvação destas visando seu próprio interesse. E este fugir não se entende como
mudando de lugar, nem indo de uma parte a outra, mas deixando de pastorear as
ovelhas com a consolação das palavras e com a esmola das obras, segundo a
necessidade.
Foge, também,
quando vê que as suas ovelhas são oprimidas, e se cala. Foge, porque se esconde
na casa do silêncio, não querendo falar em favor delas. Pois, falando desses
pastores, o Senhor disse pela boca do profeta Ezequiel: Não subistes para ir ao encontro, nem pusestes muralha em defesa da
casa de Israel, para que o dia do Senhor vos encontrasse no combate.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 351-352. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
Para ler uma homilia de São Pedro Crisólogo para este domingo, clique aqui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário