São João Cassiano
Conferências 3
“Sobre
as três renúncias”
Cabe-nos agora
falar das renúncias. Tanto a tradição dos padres como a autoridade das Sagradas
Escrituras demonstram que são três renúncias que cada um de nós há de trabalhar
com afinco para colocá-las em prática.
Mediante a
primeira desprezamos todas as riquezas e bens materiais do mundo; mediante a
segunda desprezamos os costumes, vícios e paixões da vida passada, tanto da
alma como da carne; mediante a terceira afastamos o pensamento de todos os bens
presentes e visíveis, para centrar-nos exclusivamente na contemplação das
realidades futuras e no anelo do invisível. Que estas três renúncias devem ser
praticadas lemos que o Senhor já ordenara a Abraão, quando disse: Sai da tua terra, de tua pátria e da casa de
teu pai.
Primeiro ele
disse: Sai de tua terra, isto é, dos
bens deste mundo e das riquezas terrenas; em segundo lugar: sai da tua pátria, isto é, do modo de
viver, dos costumes e vícios do passado, todas elas coisas tão estritamente
vinculadas a nós desde o nosso nascimento, que se converteram em nossos
parentes baseado em uma espécie de afinidade e consanguinidade. Em terceiro
lugar: sai da casa de teu pai, ou
seja, de toda memória deste mundo e que se encontra debaixo do campo de
observação de nossos olhos. E saindo com o coração desta casa temporal e
visível, dirigimos os nossos olhos e nosso contemplar para aquela casa na qual
habitaremos para sempre. O que cumpriremos quando, sendo homens e procedendo
como tais, começarmos a militar nas fileiras do Senhor guiados não por
objetivos humanos, confirmando com as obras e a virtude aquela sentença do
bem-aventurado Apóstolo: Nós, pelo
contrário, somos cidadãos do céu.
Por este motivo,
de nada nos adiantaria ter empreendido com toda a devoção de nossa fé a
primeira renúncia, se não colocássemos em obra a segunda com o mesmo empenho e
idêntico ardor. E assim, uma vez alcançada esta, poderemos chegar também àquela
terceira renúncia, mediante a qual, saindo da casa de nosso primeiro pai,
centramos toda a atenção de nossa alma nos bens celestiais.
Assim,
mereceremos alcançar a verdadeira perfeição da terceira renúncia quando nosso
espírito, não debilitado por contágio algum de estupidez carnal, mas purificado
de todo afeto e apego terreno mediante um notável trabalho de acabamento,
através da incessante meditação das divinas Escrituras e o exercício da
contemplação, se houvesse transladado de tal modo ao mundo do invisível que,
atento somente às realidades soberanas e incorpóreas, não perceba que está
ainda envolto na fragilidade da carne e circunscrito a um determinado lugar.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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