São Cirilo de Alexandria
Comentário sobre o Evangelho de São João
Aqueles que desfrutam da presença de Cristo,
é lógico que estejam tranquilos
Observa como
Cristo, penetrando milagrosamente através das portas fechadas, demonstrou aos
seus discípulos que era Deus por natureza, embora não fosse distinto daquele
que anteriormente tinha convivido com eles; e, mostrando-lhes o seu lado e os
sinais dos cravos, manifestou que o templo que pendeu da cruz e o corpo que nele
tinha-se encarnado, Ele o tinha ressuscitado, depois de ter destruído a morte
da carne, já que ele é a vida por natureza e Deus.
Agora, tem-se a
impressão de que foi tão grande sua preocupação por deixar bem fundada a fé na
ressurreição da carne que, apesar de ter chegado o tempo de transladar seu
corpo a uma glória inefável e sobrenatural, quis, entretanto, aparecer-lhes por
divina dispensação, tal e como era antes, e não chegassem a pensar que agora
tinha um corpo distinto daquele que morrera na cruz. Que nossos olhos não são
capazes de suportar a glória do santo corpo – supondo que Cristo quisesse
manifestá-la antes de subir ao Pai – o compreenderás facilmente se lembrares
aquela transfiguração operada anteriormente na montanha, na presença dos santos
discípulos.
De fato, o
evangelista São Mateus conta que Cristo, tomando consigo a Pedro, Tiago e João,
subiu a uma montanha e ali se transfigurou diante deles; que seu rosto
resplandecia como o sol e que suas vestes tornaram-se brancas como a neve; e
que eles, não podendo suportar a visão, caíram de bruços.
Então, por um
singular desígnio, nosso Senhor Jesus Cristo, antes de receber a glória que lhe
era devida e conveniente ao seu templo já transfigurado, apareceu ainda em sua
primitiva condição, não querendo que a fé na Ressurreição recaísse em outra
forma e em outro corpo distinto daquele que tinha assumido da Santíssima
Virgem, no qual igualmente tinha morrido crucificado, segundo as Escrituras, já
que a morte só tinha poder sobre a carne, e até mesmo da carne tinha sido
expulsa. Pois se o seu corpo morto não ressuscitou, onde está a vitória sobre a
morte?
Ou, como podia
acessar o império da corrupção, a não ser mediante uma criatura racional, que
tivesse passado pela experiência da morte? Por certo, não mediante uma alma ou
um anjo, nem sequer por mediação do próprio Verbo de Deus. E como a morte
somente obteve poder sobre o que por natureza é corruptível, sobre isso mesmo é
justo pensar que devia empregar-se toda a virtualidade da Ressurreição para
destruir o tirânico poder da morte.
Portanto, todo
aquele que tenha um pouco de sentido comum contará entre os milagres do Senhor
aquele que entrasse na casa estando as portas fechadas. Saúda, pois, aos
discípulos com estas palavras: A paz
esteja convosco, designando-se a si mesmo com o nome de “paz”. Realmente,
aos que exatamente o que Paulo desejava aos fieis, dizendo: E a paz de Cristo, que ultrapassa todo
julgamento, guarde vossos corações e vossos pensamentos. E a paz de Cristo,
que ultrapassa todo julgamento, diz não ser outra que seu Espírito, o qual
transborda de todo tipo de bens a quem dele participar.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 92-93. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
Confira também uma homilia de São Basílio de Selêucia para este domingo clicando aqui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário