Após as meditações sobre o Pai e o Filho dentro de suas Catequeses sobre o Creio, o Papa São João Paulo II dedicou duas reflexões à Pessoa do Espírito Santo (nn. 18-19).
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Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
CREIO EM DEUS PAI
18.
O Espírito Santo
João Paulo II - 13 de novembro
de 1985
1. “Creio no Espírito
Santo, Senhor que dá a vida, e procede do Pai e do Filho; e com o Pai e o Filho
é adorado e glorificado: Ele que falou pelos profetas”.
Também hoje, na abertura da
Catequese sobre o Espírito Santo, assim como fizemos ao falar do Pai e do Filho,
nos servimos da formulação do Símbolo Niceno-Constantinopolitano, segundo o
costume difundido na Liturgia latina.
No século IV os Concílios de Niceia
(325) e de Constantinopla (381) contribuíram para precisar os conceitos comumente
utilizados para apresentar a doutrina sobre a Santíssima Trindade:
um único Deus que é, na unidade da sua divindade, Pai e Filho e Espírito Santo.
A formulação da doutrina sobre o Espírito Santo provém particularmente do
mencionado Concílio de Constantinopla.
2. A Igreja confessa, portanto, sua
fé no Espírito Santo com as palavras antes citadas. A fé é a resposta à
autorrevelação de Deus: Ele se deu a conhecer “pelos profetas” e, por último, “por
meio do Filho” (Hb 1,1-2). O Filho, que nos revelou o Pai, nos
deu a conhecer também o Espírito Santo. “Qual como é o Pai, tal é o Filho,
tal é o Espírito Santo”, proclama o Símbolo Atanasiano ou “Quicumque”, do século V. Esse “tal” é explicado pelas palavras seguintes
do Símbolo, e quer dizer: “incriado, imenso, eterno, onipotente... não três onipotentes,
mas um só onipotente: assim o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é
Deus... não três deuses, mas um só Deus”.
O Espírito Santo representado como "pomba" (Basílica da Imaculada Conceição, Washington) |
3. É bom começar com a
explicação da denominação Espírito, Espírito Santo. A palavra “espírito”
aparece desde as primeiras páginas da Bíblia: “o espírito de Deus pairava sobre
as águas” (Gn 1,2), se diz na descrição da criação. Espírito traduz
o hebraico “ruah”, que equivale a respiro, sopro, vento, e é expresso em
grego por “pneuma”, de “pneo”, e em latim por “spiritus”,
de “spiro”. A etimologia é importante, porque, como veremos, ajuda a
explicar o sentido do dogma e sugere o modo de compreendê-lo.
A espiritualidade é
atributo essencial da Divindade: “Deus é Espírito...”, disse Jesus
Cristo no colóquio com a Samaritana (Jo 4,24). Em uma das Catequeses
anteriores falamos de Deus como espírito infinitamente perfeito (cf. Catequese n. 9). Em Deus, “espiritualidade”
quer dizer não só suma e absoluta imaterialidade, mas também ato puro e eterno
de conhecimento e de amor.
4. A Bíblia, e especialmente o Novo
Testamento, falando do Espírito Santo, não se refere ao próprio Ser de Deus, mas
a Alguém que está em particular relação com o Pai e o Filho. São numerosos os
textos, especialmente no Evangelho de São
João, que evidenciam este fato: de modo especial as passagens do discurso
de despedida de Cristo Senhor, na quinta-feira antes da Páscoa, durante a
última Ceia.
Na perspectiva da despedida dos
Apóstolos, Jesus lhes anuncia a vinda de “outro Consolador”
[Paráclito]. Diz assim: “Eu pedirei ao Pai, e Ele vos dará outro Consolador, para
que permaneça sempre convosco: o Espírito da Verdade...” (Jo 14,16).
“O Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, Ele
vos ensinará tudo...” (v. 26). O envio do Espírito Santo, que Jesus chama aqui
“Consolador”, será enviado pelo Pai em nome do Filho. Este envio é explicado amplamente
pouco depois pelo próprio Jesus: “Quando vier o Consolador, que Eu vos
enviarei da parte do Pai, o Espírito da Verdade que procede do Pai, Ele
dará testemunho de mim” (Jo 15,26).
O Espírito Santo, pois, que
procede do Pai, será enviado aos Apóstolos e à Igreja seja pelo Pai em nome do Filho,
seja pelo Filho uma vez que tenha retornado ao Pai.
Pouco adiante diz ainda Jesus: “Ele
(o Espírito da Verdade) me glorificará, porque receberá do que é meu para
vos anunciar. Tudo quanto o Pai tem, é meu. Por isso, Eu vos disse que o Espírito
receberá do que é meu e vos anunciará” (Jo 16,14-15).
5. Todas estas palavras, como
também os outros textos que encontramos no Novo Testamento, são extremamente
importantes para a compreensão da economia da salvação. Eles nos
dizem quem é o Espírito Santo em relação ao Pai e ao Filho:
possuem, portanto, um significado trinitário: dizem não só que o Espírito Santo
é “enviado” pelo Pai e pelo Filho, mas também que Ele “procede” do Pai.
Tocamos aqui questões que têm uma importância
chave no ensinamento da Igreja sobre a Santíssima Trindade. O Espírito
Santo é enviado pelo Pai e pelo Filho depois que o Filho, tendo cumprido sua
missão redentora, entrou na sua glória (cf. Jo 7,39;
16,7), e estes envios ou “missões” (missiones) definem toda a economia
da salvação na história da humanidade.
Estes “envios” ou “missões”
comportam e revelam as “processões” que há no próprio Deus. O Filho procede
eternamente do Pai, enquanto gerado por Ele, e assumiu no tempo uma natureza
humana para nossa salvação. O Espírito Santo, que procede do Pai e do Filho,
manifestou-se primeiramente no Batismo e na Transfiguração de Jesus, e em
seguida no dia de Pentecostes sobre seus discípulos; Ele habita nos corações
dos fiéis com o dom da caridade.
Ouçamos, portanto, a advertência
do Apóstolo Paulo: “Não entristeçais o Espírito Santo de Deus, com o qual fostes
marcados para o dia da redenção” (Ef 4,30). Deixemo-nos guiar por Ele. Ele
nos guia pelo “caminho” que é Cristo para o encontro beatificante com o Pai.
19.
O Espírito Santo procede do Pai e do Filho
João Paulo II - 20 de novembro
de 1985
1. Na última Catequese centramos nossa
atenção sobre o Espírito Santo, refletindo sobre as palavras do Símbolo
Niceno-Costantinopolitano, segundo a forma em uso na Liturgia latina: “Creio
no Espírito Santo, Senhor que dá a vida, e procede do Pai e do Filho; e com o
Pai e o Filho é adorado e glorificado: Ele que falou pelos profetas”.
O Espírito Santo é “enviado” pelo
Pai e pelo Filho, assim como também deles “procede”. Por isto é chamado “o Espírito
do Pai” (cf. Mt 10,20; 1Cor 2,11;
Jo 15,26), mas também “o Espírito do Filho” (Gl 4,6), ou
“o Espírito de Jesus” (At 16,7), porque é o próprio Jesus a enviá-lo (cf. Jo 15,26). Por isto
a Igreja latina confessa que o Espírito Santo procede do Pai e do Filho (“qui a Patre Filioque procedit”),
enquanto as Igrejas Ortodoxas proclamam que o Espírito Santo procede do Pai por
meio do Filho. E procede “por via da vontade”, “no modo do amor” (“per modum
amoris”), o que é “sententia certa”, isto é, doutrina teológica
comumente aceita no ensinamento da Igreja e, portanto, segura e vinculante.
2. Esta convicção encontra
confirmação na etimologia do nome “Espírito Santo”, à qual aludi na Catequese anterior: Espírito,
“spiritus”, “pneuma”,
“ruah”. Partindo de tal etimologia se descreve a “processão” do
Espírito do Pai e do Filho como “expiração”:
“spiramen”, sopro de Amor.
Esta expiração não é
geração. Só o Verbo, o Filho, “procede” do Pai por geração eterna. Deus,
que eternamente conhece a Si mesmo e tudo em Si mesmo, gera o Verbo. Nesta geração
eterna, que acontece por via intelectual (“per modum intelligibilis actionis”), Deus, na absoluta unidade da sua
natureza, isto é, da sua divindade, é Pai e Filho. “É”, não “se torna”; “é”
eternamente; “é” desde o princípio e sem princípio. Sob este aspecto a palavra “processão”
deve ser entendida corretamente: sem nenhuma conotação própria de um “devir”
temporal. O mesmo vale para a “processão” do Espírito Santo.
3. Deus, pois, mediante a geração,
na absoluta unidade da divindade, é eternamente Pai e Filho. O Pai que gera ama o
Filho gerado, e o Filho ama o Pai com um amor que se identifica com aquele do
Pai. Na unidade da Divindade o amor é, por um lado, paterno e, por outro,
filial. Ao mesmo tempo, o Pai e o Filho não só estão unidos por esse recíproco amor como duas
Pessoas infinitamente perfeitas, mas a sua mútua complacência, seu Amor
recíproco procede neles e deles como Pessoa: o Pai e o Filho “expiram” o
Espírito de Amor, consubstancial a eles. Deste modo Deus, na absoluta unidade
da sua Divindade, é desde toda a eternidade Pai e Filho e Espírito
Santo.
O Símbolo Atanasiano ou “Quicumque” proclama: “O Espírito Santo
não foi feito, nem criado, nem gerado, mas procede do Pai e do Filho”. E a “processão”
é per modum amoris, como dissemos. Por isto, os Padres da Igreja
chamam o Espírito Santo: “Amor, Caridade, Dileção, Vínculo de Amor, Beijo de
Amor”. Todas estas expressões testemunham o modo de “proceder” do Espírito
Santo do Pai e do Filho.
4. Pode-se dizer que Deus,
na sua vida íntima, “é amor” que se personaliza no Espírito Santo,
Espírito do Pai e do Filho. Assim, o Espírito é chamado também Dom.
Com efeito, no Espírito, que é o
Amor, se encontra a fonte de todo dom, que tem em Deus seu princípio, em relação
às criaturas: o dom da existência por meio da criação, o dom da graça por meio
de toda a economia da salvação.
À luz desta teologia do Dom trinitário
compreendemos melhor as palavras dos Atos
dos Apóstolos: “Recebereis o dom do Espírito Santo” (At 2,38).
São as palavras com as quais Cristo se despede definitivamente de seus amigos,
retornando ao Pai. Sob esta luz compreendemos também as palavras do Apóstolo: “O
amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo
que nos foi dado” (Rm 5,5).
Concluamos, pois, a nossa reflexão
invocando com a Liturgia: “Veni, Sancte
Spiritus” [1]. “Vinde, Espírito Santo, enche os corações dos teus fiéis e acende
neles o fogo do teu amor”.
O Espírito que procede do Pai (e do Filho) (Raúl Berzosa Fernández) |
Nota:
[1] “Veni, Sancte Spiritus”
é a sequência da Solenidade de Pentecostes, cujas primeiras palavras são
traduzidas em português como: “Espírito de Deus, enviai dos céus um raio de luz!”. Para acessar nossa postagem sobre essa sequência, clique aqui.
Tradução nossa a partir do texto italiano divulgado no site da Santa Sé (13 de novembro e 20 de novembro de 1985).
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