São Cirilo de Alexandria
Comentário sobre o Evangelho de São João
Cristo
entregou a sua alma nas mãos do Pai, abrindo-nos a novas luminosas esperanças
Jesus, quando tomou o vinagre, disse: “Está
consumado”. E inclinando a cabeça, entregou o espírito. Disse com razão:
“Está consumado”. Já tem ressoado a hora de levar a mensagem de salvação aos
espíritos que se encontram nos abismos. Ele veio realmente para estabelecer sua
soberania sobre os vivos e os mortos. Por nós suportou a mesma morte na carne
assunta, totalmente igual a nossa, ele que por natureza, Deus como é, é a
própria vida. Tudo isto ele quis expressamente para destronar aos poderes
abismais, e preparar deste modo o retorno da natureza humana à vida verdadeira,
ele, primícias dos mortos e primogênito de toda criatura.
Inclinando a cabeça: é o gesto
característico de quem acaba de morrer, quando, ao faltar o espírito que mantém
unido a todo o corpo, os músculos e os nervos se relaxam. Por isso, a expressão
do evangelista não é totalmente apropriada, apesar de introduzir imediatamente
outra frase comumente utilizada, também ela, para indicar que alguém morrer: entregou o espírito.
Parece como se,
impulsionado por uma particular inspiração, o evangelista não tenha dito
simplesmente morreu, mas entregou o espírito. Ou seja, entregou
seu espírito nas mãos do Pai, conforme o que ele mesmo tinha dito, embora
através da profética voz do salmista: Pai,
em tuas mãos encomendo o meu espírito. Entretanto, a força e o sentido
destas palavras constituíam para nós o começo e o fundamento de uma ditosa
esperança.
Devemos
realmente crer que as almas dos santos, ao sair do corpo, não somente se
confiam às mãos do Pai amadíssimo, Deus de bondade e de misericórdia, mas na
maioria dos casos se apressam ao encontro do Pai comum e de nosso Salvador
Jesus Cristo, que nos desatou o caminho. Nem é correto pensar - como fazem os
pagãos - que estas almas estejam esvoaçando em torno aos seus túmulos, à espera
dos sacrifícios oferecidos pelos mortos, ou que sejam precipitadas, como as
almas dos pecadores, no lugar de imenso suplício, isto é, no inferno.
Cristo entregou
sua alma nas mãos do Pai, para que nela e por ela nós alcancemos o começo da
luminosa esperança, sentindo e crendo firmemente que, depois de ter suportado a
morte na carne, estaremos nas mãos de Deus, em um estado de vida infinitamente
melhor que aquele que tínhamos enquanto vivíamos na carne. Por isso, o Doutor
dos Gentios escreve que é muito melhor partir deste corpo para estar com
Cristo.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 331-332. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
Para ler uma homilia de São Romanos, o Melode para esta celebração, clique aqui.
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