A tradução da terceira edição típica do Missal Romano
encontra-se em suas etapas finais. A CETEL (Comissão Episcopal de Textos
Litúrgicos) está em processo de revisão do material antes de enviá-lo à Congregação
para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos para sua aprovação.
Vale lembrar que usamos no Brasil a segunda edição do Missal
Romano, publicada em sua forma típica (em latim) em 1975 e traduzida para o
português do Brasil em 1991. A terceira edição foi publicada em latim em 2002 e
revisada em 2008, sendo esta a tradução que aguardamos.
À luz deste processo, gostaríamos de apresentar algumas das
mudanças que serão trazidas por esta terceira edição. Não vamos entrar aqui em
questões de tradução, nos limitando a apresentar as mudanças que dizem respeito
a toda a Igreja.
Missal Romano, tradução da 3ª edição: Material de estudo (CNBB) |
Nesta postagem analisaremos o chamado “Próprio do Tempo”,
isto é, as celebrações dos diversos períodos do Ano Litúrgico, enquanto que dedicaremos
outras duas postagens às Missas dos santos, rituais, para diversas necessidades
e votivas.
1. Próprio do Tempo (Ano Litúrgico)
1.1 Solenidades da Epifania e da Ascensão: Missa da Vigília
O Calendário Romano Geral possui dez solenidades do Senhor.
Cinco delas, porém, são particularmente importantes, elencadas nos números 1 e
2 da Tabela de precedência dos dias litúrgicos: Páscoa, Natal, Epifania,
Ascensão e Pentecostes.
Três destas celebrações já possuem vigílias: em primeiro
lugar, naturalmente, a Vigília Pascal, “mãe de todas as vigílias” e coração do
Ano Litúrgico; depois a Vigília de Pentecostes, que pode ser celebrada de forma
simples ou de forma solene (com várias leituras); e por fim a Vigília do Natal,
que raramente é celebrada, sendo “obscurecida” pela Missa da Noite.
Com a inserção das Missas da Vigília da Epifania e da
Vigília da Ascensão, as cinco grandes solenidades do Senhor passam a contar com
formulários próprios de orações a serem rezadas na tarde do dia anterior [1].
As duas novas vigílias são compostas de oração do dia (também chamada de “coleta”),
oração sobre as oferendas e oração após a Comunhão próprias (a chamada
“eucologia menor”) [2].
A coleta da nova Vigília da Epifania é a atual oração da
segunda-feira após a Epifania (Missal Romano, 2ª edição, p. 168). Portanto, foi
proposta uma nova oração para este dia. Para a Solenidade da Ascensão, por sua
vez, foi acrescentada também uma nova coleta alternativa para a Missa do dia.
1.2 Quaresma
a) As estações
quaresmais
Antes de entrar no Tempo da Quaresma, a terceira edição do
Missal aprofunda o tema das “estações quaresmais”, que são mencionadas vagamente
na atual versão (p. 174). Recolhendo a contribuição do Cerimonial dos Bispos,
se especifica como celebrar as estações.
b) As flores e instrumentos
musicais na Quaresma
Na mesma página é especificado que durante a Quaresma proíbe-se
ornar o altar com flores e os instrumentos musicais devem apenas sustentar o
canto - exceto no IV Domingo (Laetare),
nas solenidades e festas. Estas informações estão ausentes na atual edição do
Missal, embora sejam descritas no Diretório Litúrgico.
c) Orações sobre o
povo para todos os dias da Quaresma
Seguindo uma antiga tradição, que remete mais uma vez às
antigas “estações quaresmais romanas”, a terceira edição do Missal traz uma
oração sobre o povo para cada dia da Quaresma, desde a Quarta-feira de Cinzas
até a quarta-feira da Semana Santa, as quais podem ser proferidas à escolha (ad libitum).
A oração sobre o povo é uma breve oração recitada antes da bênção
final da Missa, logo após a invocação “O Senhor esteja convosco”. Atualmente é
prevista uma oração sobre o povo para a Celebração da Paixão do Senhor na
Sexta-feira Santa (sem a bênção em seguida), bem como uma série de 26 orações
sobre o povo que podem ser usadas de maneira facultativa em qualquer Missa (pp.
531-534).
Inclusive algumas das orações próprias para os dias da
Quaresma na terceira edição são tomadas desta série do atual Missal, a qual
permanecerá na nova edição, sendo enriquecida de alguns formulários,
substituindo os que foram transladados à Quaresma.
Apesar da inserção da série de orações sobre o povo para a
Quaresma, esperamos (e aqui é a opinião
do autor deste blog) que a tradução do novo Missal conserve a bênção solene
própria para este tempo (cf. Missal
Romano, 2ª edição, p. 521), dada a riqueza do seu texto.
Papa Francisco abençoa na Missa da Quarta-feira de Cinzas (2020) |
d) Coleta alternativa
para a sexta-feira da V semana da Quaresma
Para a sexta-feira da V semana da Quaresma, a última
sexta-feira deste tempo, é proposta uma segunda opção de oração do dia ou
“coleta”, que pode ser proferida à escolha, a qual recorda a participação da
Virgem Maria no Mistério Pascal do seu Filho.
Na edição de 1962 do Missale Romanum já havia neste dia uma Missa votiva às “Sete Dores de Nossa Senhora” (“Septem Dolorum Beatae Mariae Virginis”). Tal tradição é conservada na Terra Santa, onde se celebra a Missa na última sexta-feira da Quaresma no pequeno altar de Nossa Senhora das Dores junto ao Calvário na Basílica do Santo Sepulcro.
1.3 Semana Santa
a) O sinal da cruz no
Domingo de Ramos, na Vigília Pascal [e na Festa da Apresentação do Senhor]
Embora seja uma questão menor, esta ainda gera dúvidas,
sobretudo em relação aos dois primeiros casos a seguir. Na atual edição do
Missal Romano, no início da Missa do Domingo de Ramos, da Vigília Pascal e da
Festa da Apresentação do Senhor é dito somente: “o sacerdote saúda o povo como
de costume” (pp. 220.271.547).
No novo Missal é esclarecido que nessas três celebrações, antes
da saudação inicial, faz-se o sinal da cruz normalmente, como o Cerimonial dos
Bispos já havia indicado.
b) A Missa Crismal
Esta também é uma questão menor, mas a apresentamos aqui
como curiosidade. Provavelmente na nova edição do Missal não serão mais
impressas as orações para a Bênção dos Óleos dos Enfermos e dos Catecúmenos e
para a Consagração do Crisma na Missa Crismal, celebrada na manhã da quinta-feira
da Semana Santa (atualmente estas orações encontram-se às pp. 237-244).
A escolha segue um critério prático: de um lado economiza-se
espaço (pois, como veremos na próxima postagem, o novo Missal será enriquecido
por várias celebrações dos santos) e evita-se uma duplicação dos textos, uma
vez que estes já se encontram no Pontifical Romano (pp. 525-533)
1.4 Tríduo Pascal
Nas celebrações do Tríduo Pascal, as mais importantes do Ano
Litúrgico, não há grandes novidades. Apenas alguns esclarecimentos sobre
questões obscuras na segunda edição do Missal, que depois foram resolvidas pelo
Cerimonial dos Bispos e pela Carta Circular Paschalis Sollemnitatis.
a) Missa da Ceia do
Senhor:
Recorda-se que o altar deve ser ornado com flores
“moderadamente” (de modo a não antecipar o júbilo da Vigília Pascal).
Sobre o Lava-pés, embora a terceira edição do Missal
determine que dela participem apenas homens (“viri selecti”), a partir do Decreto de janeiro de 2016 é permitida
também a participação de mulheres, mudando-se o texto para “Qui selecti sunt ex populo Dei” (“Aqueles
que são escolhidos entre o povo de Deus”).
b) Celebração da
Paixão do Senhor:
Antes das orientações da celebração propriamente dita, à
frase “Hoje e amanhã, segundo antiquíssima tradição, a Igreja não celebra os
sacramentos” (p. 254), o novo Missal acrescenta, esclarecendo: “exceto a
Penitência e a Unção dos Enfermos”.
Sobre a Oração Universal a nova edição esclarece que, na
ausência de diácono, as intenções são proferidas por um ministro leigo, do
ambão. Embora na prática isto já venha sendo feito, a informação está ausente
no atual Missal.
Na segunda forma da adoração da cruz, na qual se entoa a
aclamação “Eis o lenho da cruz...” junto à porta, no meio da igreja e junto ao
altar [3], permite-se que a cruz seja conduzida, na ausência do diácono, por um
ministro leigo. Na atual versão do Missal apenas o sacerdote ou o diácono são
autorizados a conduzir a cruz nesta segunda forma.
Papa Francisco venera a cruz apresentada pelo diácono (2019) |
c) Vigília Pascal:
Sobre o sinal da cruz no início da Vigília já nos referimos
acima. Além disso, o novo Missal reforça que na procissão com o círio não se
levam nem a cruz nem os castiçais processionais, apenas o turíbulo com naveta
do incenso que precedem o círio pascal.
Ainda sobre a procissão, na nova edição do Missal está claro
que o círio pascal, na ausência do diácono, é conduzido por um ministro leigo e
não pelo sacerdote, que caminha atrás com a sua vela.
Sobre a Liturgia da Palavra, ao recordar a possibilidade de
omitir algumas leituras, é dito que devem ser proferidas ao menos três, tiradas
“da Lei e dos Profetas”. Daqui pode se deduzir que deve ser escolhida ao menos
uma leitura dentre as três primeiras, do Pentateuco (sendo que a leitura do
Êxodo nunca pode ser omitida), e ao menos uma dentre as quatro últimas, dos
Profetas.
1.5 Tempo Pascal
a) Novas orações
O Tempo Pascal é enriquecido por várias novas orações na
terceira edição do Missal Romano, uma vez que muitas das orações deste tempo,
particularmente as coletas (oração do dia), são repetidas em outras ocasiões.
Por exemplo, a oração do dia do V Domingo da Páscoa (p. 308)
é a mesma do XXIII Domingo do Tempo Comum (p. 367). Assim, mantendo a oração no
Tempo Comum, é proposto um novo texto para a Páscoa.
Os outros dias que recebem novos textos são:
Segunda-feira da II semana da Páscoa (p. 321): mesma oração
do XIX Domingo do Tempo Comum (p. 363);
Quinta-feira da II semana da Páscoa (p. 325): mesma oração
da segunda-feira da VI semana da Páscoa (p. 321);
Sexta-feira da II semana (p. 327): praticamente a mesma
oração da quarta-feira da Semana Santa (p. 234), apenas invertida a ordem das
frases;
Sábado da II semana (p. 328): praticamente a mesma oração do
V Domingo da Páscoa, sobre a qual já falamos acima. Para este dia o novo Missal
apresenta duas opções de oração do dia;
Segunda-feira da III semana (p. 331): mesma oração do XV
Domingo do Tempo Comum (p. 359);
Segunda-feira da IV semana (p. 321): mesma oração do XIV
Domingo do Tempo Comum (p. 358);
Sábado da IV semana (p. 329): a coleta deste dia se torna a
nova oração do V Domingo da Páscoa. Portanto, é proposta outra oração para este
sábado;
Segunda-feira da V semana (p. 331): mesma oração do XXI
Domingo do Tempo Comum (p. 365);
Terça-feira da VI semana (p. 323): praticamente a mesma
oração do III Domingo da Páscoa (p. 305).
b) Memória de “Maria,
Mãe da Igreja” na segunda-feira depois de Pentecostes
Por fim, esta última mudança não se encontra na terceira
edição do Missal, uma vez que foi realizada após sua impressão. Trata-se da
inserção da memória de “Maria, Mãe da Igreja” na segunda-feira após o
Pentecostes pelo Decreto divulgado em março de 2018, como um “eco” do Tempo Pascal.
As orações desta celebração, porém, já se encontram no
Missal, como Missa votiva (p. 952), assim como na Coletânea de Missas de Nossa Senhora (p. 139).
Maria, Mãe da Igreja |
Concluímos assim a primeira parte da nossa análise de
algumas mudanças na terceira edição do Missal Romano. Na segunda parte traremos
as Missas dos santos, enquanto que na terceira e última parte desta série analisaremos as
Missas rituais, para diversas necessidades e votivas.
Notas:
[1] Também possuem uma Missa da Vigília as solenidades da
Assunção de Maria (15 de agosto), da Natividade de São João Batista (24 de
junho) e de São Pedro e São Paulo, Apóstolos (29 de junho).
[2] As três orações - oração do dia, sobre as oferendas e
após a Comunhão - formam a eucologia “menor” em comparação à eucologia “maior”,
que é a Oração Eucarística. A palavra “eucologia” significa “conjunto de
orações”.
[3] Na primeira forma as três invocações são feitas junto ao
altar pelo sacerdote.
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