terça-feira, 21 de julho de 2020

As mudanças na terceira edição do Missal Romano (3)

Já dedicamos duas postagens aqui em nosso blog a analisar algumas mudanças que serão trazidas pela terceira edição do Missal Romano, cujo processo de tradução pela CETEL (Comissão Episcopal de Textos Litúrgicos) encontra-se em suas etapas finais.  Lembrando que atualmente no Brasil usamos a segunda edição do Missal Romano, publicada em latim em 1975 e traduzida em 1991.

A primeira parte foi dedicada ao Próprio do Tempo, isto é, aos diversos períodos do Ano Litúrgico, e a segunda parte trouxe as Missas dos santos. Nesta terceira e última parte vamos analisar as Missas rituais, para diversas necessidades e votivas.

Missal Romano, tradução da 3ª edição: Material de estudo (CNBB)

3. Missas rituais

As Missas rituais são aquelas utilizadas para alguns sacramentos e sacramentais quando estes são celebrados na Missa, conforme as normas dos respectivos Rituais.

3.1 Iniciação Cristã

Começamos pela Iniciação Cristã de adultos, que antes dos sacramentos possui uma série de ritos preparatórios, durante o período do catecumenato.

O primeiro deles é o Rito da Eleição ou da Inscrição do nome, o qual possui uma Missa própria (cf. Missal Romano, 2ª edição, p. 777). Sobre esta se esclarece no novo Missal que deve ser celebrada quando se realiza o Rito fora do tempo próprio, isto é, o I Domingo da Quaresma (quando então se reza a Missa do dia).

Passamos então aos Escrutínios, que possuem três formulários próprios de orações (pp. 788-791). Na nova edição do Missal se esclarece que nestas Missas sempre se usam os prefácios próprios dos Domingos III, IV e V da Quaresma (pp. 197.204.212), mesmo em outro tempo litúrgico [1].

Há também, atualmente, uma intercessão própria pelos padrinhos dos catecúmenos a ser dita nas três celebrações quando se usa a Oração Eucarística I (Missal, p. 789; Ritual da Iniciação Cristã de Adultos, p. 200). Na terceira edição do Missal, porém, são acrescentadas intercessões pelos padrinhos também nas Orações Eucarísticas II e III.

Para o Batismo a nova edição traz apenas um esclarecimento: nesta Missa omite-se o Ato Penitencial (substituído pelos ritos de acolhida do Batismo) e o Creio (substituído pela renovação das promessas batismais), mas reza-se ou canta-se o Glória.

Praticamente o mesmo é dito para o sacramento da Crisma: omite-se o Creio (substituído pela renovação das promessas batismais), mas reza-se ou canta-se Glória.

Porém, aqui também há uma mudança similar à Missa dos escrutínios: além da intercessão própria pelos crismandos na Oração Eucarística I (Missal, p. 795; Pontifical Romano, p. 45), são acrescentadas intercessões próprias também nas Orações Eucarísticas II e III.

3.2 Demais sacramentos

Passando aos demais sacramentos, começamos pela Unção dos Enfermos, sobre a qual não há menção no atual Missal. Na nova edição, porém, orienta-se que quando se celebra este sacramento na Missa tomam-se as orações do formulário “Pelos doentes” (Missal, pp. 924-925). Além disso, para a Unção o novo Missal traz duas fórmulas de bênção, tomadas do respectivo Ritual (p. 45)

Para o sacramento da Ordem, temos na atual edição do Missal apenas a intercessão pelos ordenados na Oração Eucarística I, remetendo, para as orações, às Missas para diversas necessidades “Pelo Bispo” (pp. 883-885), “Pelo sacerdote” (pp. 887-888) e “Pelos ministros da Igreja” (p. 892).

Esta referência aos formulários para as diversas necessidades trata-se de um erro, pois embora algumas orações dessas Missas sejam iguais aos do ritual das ordenações, presentes no Pontifical Romano, sobretudo as coletas são diferentes (e mesmo algumas orações iguais têm partes próprias no caso das ordenações).

A terceira edição típica do Missal (em latim) traz todas as orações das Missas rituais das ordenações, como estão no Pontifical Romano, além das intercessões pelos ordenandos nas Orações Eucarísticas I, II, III e IV (já presentes no atual Pontifical) e as bênçãos próprias para estas celebrações.

Papa Francisco preside uma Ordenação de presbíteros - 2019
(Na imagem usa-se a edição italiana do Ritual de Ordenações)

Não sabemos como a tradução brasileira tratará esta questão. Seria interessante (e aqui é a opinião do autor deste blog) reproduzir no Missal ao menos as intercessões das Orações Eucarísticas, para evitar uma “troca de livros” durante este momento. Para as demais orações, poderia remeter-se ao Pontifical.

Por fim, na ordem em que estão impressos os sacramentos no Missal, temos o Matrimônio, sobre o qual há três pequenos acréscimos:
A orientação de omitir o Ato Penitencial (substituído pelos ritos iniciais do sacramento), mas rezar ou cantar o Glória;
O acréscimo de intercessões próprias pelos noivos nas Orações Eucarísticas II e III, já presentes no Ritual (p. 118), enquanto que o atual Missal traz apenas a intercessão da Oração Eucarística I (p. 803);
O acréscimo de duas coletas alternativas.

3.3 Sacramentais

Para os sacramentais, o novo Missal também traz alguns pequenos acréscimos e esclarecimentos. Primeiramente, para a Bênção de abade ou abadessa a terceira edição traz intercessões próprias pelo novo abade ou nova abadessa nas Orações Eucarísticas I, II, III e IV e as bênçãos próprias no fim da Missa. Cumpre dizer que, por alguma razão, nenhuma destas orações está presente no Pontifical, nem mesmo a eucologia menor (presente, porém, no Missal, às pp. 815-816) [2].

Na Missa para a Consagração de virgens o novo Missal acrescenta apenas outra opção de bênção, tomada do Pontifical Romano (p. 326).

Em relação à Instituição de leitores e acólitos, sobre a qual o atual Missal se cala, a terceira edição orienta celebrar a Missa “Pelos ministros da Igreja” (pp. 891-892).

Por fim, cumpre dizer que na edição típica as Missas em aniversário de matrimônio e aniversário de profissão religiosa foram deslocadas das Missas rituais para as Missas para diversas necessidades, sobre as quais falaremos a seguir.

4. Missas para diversas necessidades

As Missas para diversas necessidades ou para diversas circunstâncias são formulários de orações por intenções específicas, tanto pela Igreja quanto por situações da vida pública.

Na terceira edição do Missal destaca-se, primeiramente, a mudança na ordem dos formulários, de modo a dar mais destaque a algumas celebrações. Por exemplo, a Missa “Pela família”, atualmente o formulário n. 43, tornou-se o formulário n. 12.

Papa Francisco abençoa com o Evangeliário durante o "Sínodo da Família" (2015)

A maior mudança, porém, é a inserção de um formulário novo: a Missa “Para pedir a castidade” (“Ad postulandam continentiam”), com a eucologia menor completa. Com a inserção deste formulário e das Missas em aniversário de matrimônio e de profissão religiosa, as Missas para diversas necessidades na terceira edição sobem de 46 para 49.

Além do novo formulário, três Missas já existentes na atual edição do Missal recebem alterações:

A Missa “Para promover a concórdia” foi enriquecida de uma nova coleta alternativa e a orientação a usar o prefácio da Missa pela unidade dos cristãos;

À Missa “Pelo perdão dos pecados” foi acrescentado um novo formulário alternativo completo (orações do dia, sobre as oferendas e após a Comunhão);

Também para a Missa “Em qualquer necessidade” foi acrescentado um novo formulário alternativo completo, somando-se aos dois já existentes no atual Missal.

Ainda sobre as Missas para diversas necessidades, temos na terceira edição um esclarecimento sobre quando usar as duas Orações Eucarísticas (OE) sobre a reconciliação (no atual Missal para o Brasil numeradas como VII e VIII).

Sobre as OE para diversas circunstâncias (VI-A, VI-B, VI-C e VI-D) o atual Missal já esclarece (p. 839), porém cala-se sobre as outras duas. Na terceira edição do Missal especifica-se quando usar as OE VII e VIII:
- nas Missas para diversas necessidades “Para promover a concórdia”, “Pela reconciliação”, “Pela conservação da paz e da justiça”, “Pelo perdão dos pecados” e “Para pedir a caridade”;
- nas Missas votivas da Santa Cruz, da Santíssima Eucaristia e do Preciosíssimo Sangue de nosso Senhor Jesus Cristo;
- nas Missas do Tempo da Quaresma, particularmente nos dias de semana.

Papa Francisco preside uma Liturgia Penitencial no Vaticano

Nos dois últimos casos (Missas votivas e da Quaresma), embora as duas OE sobre a reconciliação possuam prefácios próprios, é permitido rezá-las com outros prefácios, especialmente os da Quaresma. Isto as difere das OE VI-A até VI-D, as quais possuem prefácios próprios que não podem ser substituídos, razão pela qual não devem ser usadas nas Missas durante o Ano Litúrgico (no futuro podemos fazer uma postagem indicando quando usar cada OE).

Por fim, ainda sobre o tema das Orações Eucarísticas, na edição típica revisada do Missal Romano (2008), as OE para Missas com crianças (no atual Missal numeradas como IX, X e XI) foram omitidas. Embora seu uso continue permitido, deu-se a entender que, devido a seu uso extraordinário, poderiam ser impressas em um encarte à parte do Missal. Não sabemos, porém, como a CETEL vai proceder neste assunto.

5. Missas votivas

Os últimos textos do Missal sobre os quais analisaremos as mudanças da terceira edição são as Missas votivas, celebrações em honra dos mistérios do Senhor, ou em honra da Virgem Maria ou dos santos que podem ser rezados para favorecer a devoção dos fiéis. Em relação a estas Missas temos pequenos esclarecimentos e acréscimos:

Primeiramente, em relação à Missa votiva à Divina Misericórdia (cf. Missal, p. 941) é reforçado que não pode ser celebrada no II Domingo da Páscoa, também chamada “da Divina Misericórdia”, o qual possui textos próprios.

A Missa votiva de Cristo, sumo e eterno sacerdote (p. 943), que no atual Missal é indicada como formulário B da Missa da Santíssima Eucaristia, recebeu título próprio, destacando assim sua importância, reforçada sobretudo após o Ano Sacerdotal celebrado pelo Papa Bento XVI entre 2009 e 2010.

À Missa votiva do Santíssimo Nome de Maria (p. 954), até então contando apenas com uma oração do dia, foram acrescentadas uma nova coleta alternativa e orações sobre as oferendas e após a Comunhão próprias, as duas ultimas tomadas da Coletânea de Missas de Nossa Senhora (pp. 124-125). As orações da Missa votiva são distintas da Memória do Santíssimo Nome de Maria, no dia 12 de setembro, sobre o qual falamos na segunda parte deste estudo.

Ainda para promover a piedade mariana foi acrescentada na terceira edição a Missa votiva de Maria, Rainha dos Apóstolos, com toda a eucologia menor própria, tomada da Coletânea de Missas de Nossa Senhora (pp. 108-109). A oração do dia desta Missa, porém, já está presente no atual Missal como coleta alternativa para o Comum de Nossa Senhora no Tempo Pascal (p. 738).

Por fim, foi acrescentada a Missa votiva de São João Batista, na qual se tomam as orações da Missa da Vigília da Solenidade da sua Natividade (pp. 599-600). Esta, porém, não é uma novidade total, uma vez que o atual Missal já indica que a citada Missa da Vigília pode também ser celebrada como votiva (p. 600).

Maria, Rainha dos Apóstolos

Concluímos assim nosso percurso pela terceira edição típica do Missal Romano, indicando algumas das mudanças em relação à segunda edição, atualmente usada no Brasil. Aguardemos agora que a CETEL conclua o processo de revisão do texto e o encaminhe para a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos.

Dada a relativa liberdade das Conferências Episcopais na tradução dos textos litúrgicos, sobretudo a partir do Motu proprio Magnum Principium, podemos esperar alguma adaptações, como já existem na tradução da segunda edição.

Até termos em mãos o novo Missal, peçamos ao Senhor: “Concedei, ó Deus, ao povo cristão conhecer a fé que professa e amar a Liturgia que celebra. Por Cristo, nosso Senhor. Amém” (Missal Romano, Oração sobre o povo n. 3, p. 531).

Notas:

[1] Na atual edição do Missal a orientação é usar o prefácio do tempo quando se celebram as Missas dos escrutínios fora dos domingos da Quaresma. É uma escolha bastante acertada da nova edição, uma vez que os referidos prefácios não estão atrelados necessariamente à espiritualidade quaresmal, mas aos Evangelhos proclamados: a samaritana, o cego de nascença e a ressurreição de Lázaro.

[2] Como vimos nas partes anteriores do nosso estudo, as três orações - oração do dia, sobre as oferendas e após a Comunhão - formam a eucologia “menor” em comparação à eucologia “maior”, que é a Oração Eucarística. A palavra “eucologia” significa “conjunto de orações”.

7 comentários:

  1. Salve Maria! Seria muito interessante a postagem indicando quando usar cada OE, inclusive a OE V (do CEN de Manaus), sobre a qual não se tem orientação alguma.

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    1. A Oração Eucarística V realmente é um "problema"...
      Obrigado por seu comentário. Vou preparar o texto em breve.

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  2. As frases de aclamação intercaladas nas orações eucarística praticamente sao repetições de afirmações rezadas pelo presidente da celebração. Dado que as orações eucarística constituem uma prece continua do presidente creio se4 desnecessárias estas aclamações. A participação da assembleia consiste em ouvir a prece com fé e responder depois coletivamente com o Amém do tridagio por Cristo, com Cristo e em Cristo.

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    1. Essas asserções da assembleia são um terror mesmo.
      Fruto de uma mentalidade igualitarista que tenta diminui o sacerdócio ministerial e tratar a todos como "iguais".
      Seria muito oportuno que elas fossem extintas.
      Mas vale lembrar que elas são opcionais, então o Presidente pode optar que elas sejam omitidas, mesmo na atual edição em uso no Brasil.

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  3. A inclusão de intercessões próprias nas OEs II, III e IV, nas diversas missas rituais, me parecem bastante oportunas, porém temo que tenham o efeito de vermos o uso da Oração Eucarística I ser ainda mais restrito, o que é uma pena.

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  4. Concordo com a extinção das aclamados. A oração eucarística eba proclamação de um ato de fé pelo presidente da assembleia.b
    O importante é acreditar e confirmar com o amem no trisagion" por Cristo, comCristo e em Cristo ..."

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