Depois
de analisar aqui em nosso blog as Exortações Apostólicas para a África e para a América, frutos dos Sínodos continentais em preparação para o Grande Jubileu do
ano 2000, nesta postagem vamos contemplar a Exortação dirigida ao continente
asiático.
A
Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Ásia teve lugar em Roma de 19
de abril a 14 de maio de 1998. Teve como fruto a Exortação Apostólica Ecclesia in Asia, promulgada pelo Papa
João Paulo II em 06 de novembro de 1999, durante uma viagem à Índia.
João
Paulo II
Exortação Apostólica Pós-Sinodal Ecclesia
in Asia
Sobre Jesus Cristo Salvador e a
sua missão de amor e serviço na Ásia: «para que tenham vida e a
tenham em abundância» (Jo 10,10)
Introdução
Como nos documentos anteriores, já na Introdução o
Papa se refere à Liturgia, recordando as celebrações de abertura e de
encerramento do Sínodo. Aqui vai além, destacando o caráter celebrativo de toda
a Assembleia Sinodal, além de salientar os elementos típicos da cultura
asiática nas celebrações:
“O Sínodo foi
uma evocação celebrativa dos
caminhos asiáticos do cristianismo. Os Padres Sinodais recordaram a primeira comunidade
cristã, a primitiva Igreja, pequenino rebanho de Jesus neste continente imenso
(cf. Lc 12,32).
Recordaram o que a Igreja recebeu e ouviu desde o início (cf. Ap 3,3), e, depois de o
recordar, celebraram a «imensa bondade» (Sl 144,7)
de Deus, que nunca falha. (...) Durante o Sínodo, aqueles que estiveram
presentes foram testemunhas dum encontro extraordinariamente frutuoso entre as
antigas e as novas culturas e civilizações da Ásia, um panorama maravilhoso na
sua diversidade e convergência, especialmente quando símbolos, cânticos, danças
e cores apareceram juntos, em harmoniosa combinação, à volta da Mesa do Senhor,
nas Liturgias Eucarísticas de abertura e
encerramento” (n. 04).
Papa Francisco celebra Missa na Terra Santa (2014) |
Capítulo I: O contexto asiático
No capítulo I, ao descrever a realidade do
continente asiático, o Papa recorda a diversidade dos ritos, fazendo referência
às Igrejas Católicas Orientais, que aparecerão reiteradas vezes no Documento:
“Uma análise
das comunidades católicas na Ásia mostra uma variedade magnífica quer pela sua
origem e desenvolvimento histórico, quer por causa das diferentes tradições espirituais e litúrgicas dos
vários ritos. Mas, todas elas estão unidas na proclamação da Boa Nova de Jesus
Cristo através do testemunho cristão e das obras de caridade e de solidariedade
humana” (n. 09).
Com efeito, a maioria dos ritos orientais tem sua
origem na Ásia, particularmente no Oriente Médio: o rito bizantino, originário
de Constantinopla, na fronteira com a Europa (representado na Ásia pela Igreja
Melquita); o rito antioqueno ou sírio-ocidental, da igreja de Antioquia
(celebrado pelas igrejas Maronita e Siríaca); e o rito caldeu ou
sírio-oriental, natural da Mesopotâmia (representado pela igreja caldeia).
Além do Oriente Médio, é originário ainda da Ásia o
rito armênio, celebrado pela igreja de mesmo nome. Merece destaque também a
Índia, com duas igrejas próprias: sírio-malankar (de rito antioqueno) e
sírio-malabar (de rito caldeu).
Capítulo III: O Espírito Santo: Senhor que dá a vida
Depois de recordar no capítulo II a pessoa de Jesus
Cristo e sua missão salvadora, sem referências à Liturgia, o capítulo III é
dedicado à pessoa do Espírito Santo. Aqui se reflete sobre sua atuação no
Batismo:
“Criados à
imagem de Deus, os homens tornam-se morada do Espírito duma forma nova quando são
elevados à dignidade da adoção divina (cf. Gl 4,5). Renascidos pelo Batismo, experimentam a presença e o poder do Espírito, não tanto
como Autor da Vida, mas como Aquele que purifica e salva, produzindo frutos de
«caridade, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão,
temperança» (Gl 5,22-23)”
(n. 15).
Papa Francisco celebra Missa na Coreia do Sul (2014) |
Capítulo IV: Jesus Salvador: O dom a anunciar
No capítulo IV, sobre o anúncio de Jesus Cristo na
Ásia, a Liturgia é compreendida a partir do conceito da inculturação. No n. 21
este tema é introduzido, com a Liturgia definida entre as grandes áreas de
inculturação (junto com a catequese e a espiritualidade). No parágrafo seguinte
este tema será aprofundado:
“A Liturgia é
a fonte e o vértice de toda a vida e missão cristã (cf. Sacrosanctum concilium, 10). É decisivamente um meio de
evangelização, sobretudo na Ásia, onde os seguidores das diferentes religiões
são muito sensíveis ao culto, festas religiosas e devoções populares. Na sua
maior parte, a Liturgia das Igrejas Orientais tem sido inculturada com bom êxito
ao longo de séculos de interação com a cultura circundante, mas as Igrejas de formação
mais recente precisam assegurar que a Liturgia se torne uma fonte ainda maior
de nutrimento para os seus povos, através de um uso claro e efetivo de
elementos tirados das culturas locais. Mas, para a inculturação litúrgica, não
basta fixar a atenção sobre os valores, símbolos e rituais da cultura
tradicional; é preciso atender também às mudanças causadas na consciência e nos
comportamentos pelas culturas secularistas e consumistas emergentes, que estão
a afetar o sentido asiático do culto e da oração. Nem se podem descuidar, numa
inculturação litúrgica genuinamente asiática, as necessidades específicas dos
pobres, migrantes, refugiados, jovens e mulheres” (n. 22).
Neste mesmo parágrafo motiva-se a colaboração entre
as Conferências Episcopais asiáticas e a Congregação para o Culto Divino, a fim
de estudar com seriedade o tema:
“As
Conferências Nacionais e Regionais dos Bispos têm necessidade de trabalhar de
forma mais estreita com a Congregação do Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos
na busca de meios efetivos para fomentar formas de culto apropriadas ao
contexto asiático. Tal cooperação é essencial porque a Liturgia sagrada exprime e celebra a única fé professada por todos
e, sendo herança de toda a Igreja, não pode ser determinada pelas Igrejas
locais isoladamente da Igreja universal” (n. 22).
Ainda neste capítulo aparecem os sacramentos,
sobretudo a Eucaristia, como elemento fundamental da espiritualidade cristã,
sem a qual, por sua vez, não é possível a evangelização:
“Quanto mais
a comunidade cristã estiver arraigada na experiência de Deus que brota duma fé
viva, tanto mais será capaz de anunciar credivelmente aos outros a realização
do Reino de Deus em Cristo. Isso será o resultado da escuta fiel da palavra de
Deus, da oração e contemplação, da celebração
do mistério de Jesus nos sacramentos, sobretudo na Eucaristia, e do exemplo
dado de verdadeira comunhão de vida e integridade de amor” (n. 23).
Capítulo V: Comunhão e diálogo ao serviço da missão
O
capítulo V está centrado no tema do diálogo, tanto ad extra - com as
outras igrejas cristãs e com as outras religiões, muito presentes na Ásia-,
quanto ad intra, isto é, dentro da própria Igreja.
Primeiramente,
já no início do capítulo, recorda-se que o fundamento deste diálogo ad intra
é a comunhão instaurada pelo sacramento do Batismo:
“O mistério
do desígnio amoroso de Deus torna-se presente e ativo na comunidade de homens e
mulheres que, pelo Batismo, foram
sepultados com Cristo na morte, para que, como Cristo ressuscitou dos mortos
pela glória do Pai, assim eles pudessem caminhar numa vida nova (cf. Rom 6, 4). No âmago do mistério
da Igreja, está o vínculo de comunhão que une Cristo Esposo a todos os
batizados” (n. 24).
Na sequência, ao apresentar as instâncias de vivência
desta comunhão, como a paróquia, destaca-se a atuação dos movimentos eclesiais
e sua vivência mais profunda dos sacramentos:
“O Sínodo
reconheceu também o contributo dos movimentos
de renovação para a construção da comunhão, criando oportunidades para
uma experiência mais íntima de Deus, através da fé e dos sacramentos, e fomentando a conversão da vida. É responsabilidade
dos Pastores orientar, acompanhar e estimular estes grupos, de maneira que
estejam bem integrados na vida e missão da paróquia e da diocese” (n. 25).
Papa Francisco celebra Missa na Tailância (2019) |
Os parágrafos seguintes retomam e aprofundam o tema
das Igrejas Católicas Orientais. Enquanto o n. 26 recorda as relações por vezes
difíceis entre as igrejas de diferentes tradições litúrgicas, no n. 27 convida
a reconhecer sua identidade própria:
“A situação
das Igrejas Católicas Orientais,
sobretudo no Oriente Médio e na Índia, merece particular atenção. Desde os
tempos apostólicos, aquelas têm sido guardiães de uma preciosa herança
espiritual, litúrgica e teológica.
As suas tradições e ritos, nascidos de uma profunda inculturação da fé no
território de muitos países asiáticos, merecem o maior respeito. Com os Padres
Sinodais, convido cada um a reconhecer os legítimos costumes e a legítima
liberdade destas Igrejas em matéria disciplinar e litúrgica, como estipulado pelo Código dos Cânones das Igrejas
Orientais” (n. 27).
Capítulo VII: Testemunhas do Evangelho
Por fim, após o capítulo VI, centrado na dimensão
social da Igreja, sem referências à Liturgia, o capítulo VII recorda alguns
sujeitos da ação evangelizadora na Ásia. Primeiramente, antes de falar dos
pastores (Bispos e presbíteros), recorda-se a missão de todos os cristãos,
recebida no Batismo:
“(...) todos
os batizados, pela graça do sacramento do Batismo,
ficam incumbidos de tomar parte na missão salvadora de Cristo, sendo
habilitados para isso mesmo pelo amor de Deus que foi derramado nos seus
corações pelo Espírito Santo que lhes foi concedido (cf. Rm 5,5)” (n. 43).
No mesmo parágrafo aparece a missão de santificar
exercida pelos Bispos e presbíteros através da celebração dos sacramentos:
“Em virtude
da Ordenação Episcopal e da comunhão hierárquica com a Cabeça do Colégio
Episcopal, os Bispos recebem o mandato e a autoridade para ensinar, governar e santificar o Povo de Deus.
Associados
aos Bispos no trabalho de proclamar o Evangelho, os presbíteros são chamados
pela Ordenação a serem pastores do rebanho, pregadores da Boa Nova da salvação
e ministros dos sacramentos” (n. 43).
Depois dos pastores, reitera-se o compromisso dos
cristãos leigos, fundamentado nos sacramentos do Batismo e da Confirmação:
“Como foi
claramente indicado pelo Concílio Vaticano II, a vocação dos leigos situa-os no
mundo, onde realizam as mais diversas tarefas, para aí difundirem o Evangelho
de Jesus Cristo (cf. Lumen gentium,
31). Por graça e missão recebida no Batismo
e na Confirmação, todos os leigos são missionários” (n. 45).
Por fim, a última referência à Liturgia no
Documento diz respeito à família, convidando-a à participação nos sacramentos e
a cultivar uma vida de oração:
“(...) a
família deve tomar parte ativa na vida paroquial, participando nos Sacramentos, especialmente na Eucaristia e
no sacramento da Penitência, e comprometendo-se ao serviço dos outros. Mas
significa também que os pais se devem esforçar por fazer, dos momentos em que a
família está reunida, uma ocasião para rezar, para ler e meditar a Bíblia, para
celebrações especiais presididas por
eles próprios e para uma saudável recreação. Isto ajudará a família cristã a
tornar-se um centro de evangelização, onde cada membro experimenta o amor de
Deus e comunica-o aos outros” (n. 46).
Imagem da Virgem Maria com traços do Extremo Oriente |
Nos próximos meses analisaremos as Exortações para a Oceania e a Europa,
respectivamente no início de setembro e novembro. Acompanhe-nos!
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