“Jesus vem habitar a nossa
cidade”
Senhor
Presidente,
Caros
representantes das autoridades,
Veneráveis
Irmão no episcopado e no sacerdócio,
Caros irmãos e irmãs, caros fiéis da nossa diocese de
Jerusalém, caros peregrinos vindos do mundo inteiro e todos vós que, no coração
da noite, estais conosco através dos diferentes meios de comunicação: acorremos
todos aqui porque nos sentimos todos convocados por este lugar, Belém, a cidade
na qual nasceu o nosso Salvador que é Cristo Nosso Senhor!
“Jesus nasceu em Belém” (Mt 2,1). Não é apenas uma indicação
histórica e geográfica, mas uma escolha divina. Nascer aqui, neste preciso
lugar, numa cidade desta terra é o que Deus sempre quis porque Ele gosta das
cidades dos homens. Se a Bíblia começa num jardim, em contrapartida termina
numa cidade, Jerusalém Celeste. E mesmo a vida de Cristo que começa aqui será,
desde o seu nascimento até à sua morte, um constante caminhar entre cidades e
aldeias. O deserto não foi para Ele mais do que um parênteses necessário, mas
não definitivo.
Belém, Nazaré, Caná, Cafarnaum, Jerusalém: nomes que nos são
queridos uma vez que foram cidades amadas por Jesus. Depois dele, os Apóstolos
continuarem a percorrer tantas outras: Corinto, Éfeso, Tessalônica, Antioquia,
Roma…é um caminho que continua pelas nossas cidades de hoje. É um caminho
mantido e animado pela sua presença. “E eu estarei convosco todos os dias até
ao fim do mundo” (Mt 28,20)
O nosso Deus é um Deus da cidade. Ele habita as cidades
porque Ele é um Deus que está junto dos homens, Emanuel. A sua palavra não se
esgota numa proposta religiosa privada ou unicamente pessoal. Pelo contrário,
ela procura e deseja uma estrada, uma casa, uma cidade para habitar e
transformar. Aquele que quer fechar o Evangelho ou a presença dos cristãos no
interior de fronteiras privadas ou num contexto intimista não compreendeu o
desejo de Deus. A Encarnação do Filho de Deus é uma levedura, um fermento
destinado a aumentar toda a massa, ou seja, toda a realidade do homem, cosmos e
história, vida e cidade.
O Natal de Jesus Cristo em Belém é um passo de Deus em
direção da nossa terra e das nossas cidades. É um convite feito aos pastores e
aos magos que se repete hoje e nos convida a que nos dirijamos a Belém e, a
partir de lá, até aos confins da terra. O nascimento do Senhor nas nossas
cidades pretende fazer nascer em nós uma forma de “paixão política”, suscitar a
responsabilidade do cuidado da cidade e da terra em que habitamos. Não se trata
de a dominar ou ocupar, mas de a transformar. É preciso transformá-lo de
um simples aglomerado urbano ao serviço de um só, num espaço e um lugar onde a
experiência de comunhão e de paz, de relação e de partilha seja possível.
Permiti-me hoje, a partir deste mesmo lugar, dirigir um
olhar preocupado e atento às nossas cidades e ao nosso o mundo para
verdadeiramente os habitarmos. Na luz do Verbo de Deus, que vem habitar entre
nós, gostaria de me deter com todos vós e contemplar esta “morada de Deus” para
a acolher e converte-la na “morada do homem”.
Cristo morar entre nós foi, antes de mais, um ato de amor.
Ele partilhou a nossa vida em tudo exceto no pecado (cf. Hb 4,15). Por onde Ele passava fazia o bem e curava” (At 10,38)
Entrou nas nossas casas, comeu à nossa mesa, bebeu o nosso vinho, caminhou ao
longo das nossas estradas, brincou com as nossas crianças, alegrou-se com as
nossas festas e chorou pelos nossos mortos. Ele não escolheu a separação e a
distância, ele não gostou do isolamento e do afastamento. Ele escolheu o estilo
da partilha e da comunhão, da participação e da presença. Os seus discípulos –
nós os cristãos – não podemos deixar de seguir os seus traços. Se é verdade que
não temos uma cidade definitiva aqui em baixo, mas que nos encaminhamos para a
cidade futura (cf. Hb 13,14), é
também verdade que nos foi pedido que “continuássemos na cidade” (cf. Lc 24,49) para nela abrir os
caminhos do Reino.
Nesta noite, em que celebramos o nascimento de Cristo em
Belém, proclamamos com os anjos, o amor por esta terra, por estas cidades;
queremos responder à vocação recebida de sermos aqui os artesãos da paz, os
profetas da esperança, as testemunhas convencidas e convincentes da partilha e
do diálogo.
Queremos, com Jesus, habitar esta terra, não a abandonar
para partilharmos as suas dores e angústias, as alegrias e as esperanças e
juntos percorrermos o caminho da salvação. Estamos dispostos a qualquer
esforço, a qualquer compromisso e a qualquer iniciativa que que possam tornar
as nossas cidades abertas e hospitaleiras, lugares em que se possa encontrar
uma casa e um trabalho, uma vida digna e boa. Pedimos ao menino de Belém e aos
seus pais, que vieram aqui à procura de um alojamento, que dos ajudem a
continuarmos nesta cidade. Pedimos ajuda para continuarmos a ser, como eles,
presença de paz nesta terra. Porque as nossas cidades ficariam mais pobres sem
cristãos, e os cristãos arriscariam a perder-se sem as nossas cidades.
Reconhecemos que, nesta cidade, a Sagrada Família ouviu
recusas, viu portas fechadas e a violência cega de Herodes. É sempre possível
que os seus não reconheçam o Salvador que chega e não o acolham (cf. 1,11). Vindo morar entre nós, o
Senhor revela igualmente a contradição (cf.
Lc 2,34) na sua forma, muitas vezes conflituosa, de habitar nestes lugares. A
cidade bem-amada é também a que o faz chorar (cf. 19,41), quando os caminhos triunfais se tornam rapidamente numa
via sacra, numa estrada de dor. As cidades dos homens podem rapidamente
transformar-se em campos de batalha, em lugares de confronto e opressão, de
injustiça e de violência. Então a voz do Senhor e, ainda mais, a sua vida pedem
e oferecem hoje uma possibilidade de transformação que não passa pela via do
protesto estéril ou da oposição violenta, mas propõe-nos e dá-nos testemunho da
via do serviço humilde e concreto. Quereríamos então que nas nossas praças e
nas nossas casas pela nossa palavra e pelo nosso testemunho, o Evangelho possa
continuar a transformar a nossa maneira de vivermos juntos, as nossas relações
e as nossas escolhas. Pedimos que a sua palavra e a nossa oração encontrem
corações que escutem, principalmente os daqueles que detêm autoridade política
e social. Queríamos não ter de chorar mais pela recusa, pela pobreza extrema e
pelos inúmeros sofrimentos que afligem o nosso povo. Gostaríamos que, graças à
boa vontade de todos, Deus possa continuar a habitar nas nossas cidades.
Assim esperamos que as nossas cidades sejam verdadeiramente
santas, não somente e não tanto em razão das preciosas memórias guardadas nas
sua pedras, mas muito mais pela vida que aí se encontra. O Senhor, ao nascer
entre nós, trouxe à terra o começo do seu Reino. E ele prometeu o seu
cumprimento em Jerusalém celeste. A nossa celebração do Natal não é uma simples
comemoração, mas o anúncio que o que germinou com o nascimento de Cristo terá o
seu pleno cumprimento quando Ele voltar.
Enquanto esperamos a sua vinda, construímos as nossas
cidades. Seria infinitamente melhor se elas não fossem a expressão do poder ou
de reivindicações como o foi Babel, mas sim casas de oração e de encontro para
todos os povos (Is 56,7). Queremos então zelar com os nossos pastores para que
a promessa de Salvação chegue até nós e guie os nossos passos nos caminhos do
bem. Como os Magos, queremos olhar para a Estrela de Belém e acolher a graça e
o humilde amor do nosso Deus para voltarmos para as nossas cidades “por um
outro caminho” (Mt 2,12), por uma estrada nova que renove a nossa maneira de
habitar e permanecer. Pedimos esta noite ao Cristo Nosso Senhor nascido em
Belém que Ele nos dê a graça e a força de transformarmos as nossas cidades no
seu Reino. Queremos percorrer com ele a antiga e sempre renovada via da fé, do
amor e da esperança até que chegue do céu a cidade nova onde Deus habitará conosco
e nós com Ele para sempre. Amém!
+ Pierbattista
Pizzaballa
Fonte: Patriarcado Latino de Jerusalém
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