sábado, 21 de março de 2020

Homilia: IV Domingo da Quaresma - Ano A

Santo Ambrósio
Carta 80
A carne de nosso barro recebe a luz da vida eterna mediante o sacramento do Batismo

Irmão, você escutou a leitura do Evangelho na qual se narra que, ao passar o Senhor Jesus, viu um cego de nascença. Contudo, se o Senhor o viu é porque não passou longe: portanto, também nós não devemos passar longe do cego que o Senhor julgou não dever evitar, ainda mais se tratando de um cego de nascimento, detalhe este que não foi por acaso que o evangelista destacou.
Porque existe uma cegueira que reduz a capacidade visual e que é ordinariamente provocada por alguma enfermidade; e existe uma cegueira causada por uma transpiração humoral, e que às vezes, extinta a causa, é igualmente curada pela ciência médica. Digo isto para que compreendas que a cura deste cego de nascença não é fruto da habilidade médica, mas do poder divino. Realmente, o Senhor lhe conferiu o dom da saúde, não exerceu a medicina, já que o Senhor Jesus curou aos que nenhum outro conseguiu curar. Corresponde, de fato, ao Criador corrigir as deficiências da natureza, visto que Ele é o seu autor. Por isso acrescentou: Enquanto Eu estou no mundo, sou a luz do mundo. Que é como se dissesse: Todos os cegos poderão recuperar a visão, conquanto que busquem a mim que sou a luz. Contemplai-o também vós, e ficareis radiantes, de modo que possais ver.
Na continuação, uma pergunta: Que sentido tem que alguém que devolvia a vida com soberania, e proporcionava a saúde mediante uma ordem, dizendo ao morto: Vem para fora, e Lázaro saiu do sepulcro; dizendo ao paralítico: Levanta-te, toma tua cama, e o paralítico levantou-se e começou a transportar sua própria cama, na qual era carregado quando tinha todos os seus membros deslocados; que sentido tem, volto a perguntar, que Ele cuspisse e fizesse barro, e untasse o cego nos seus olhos, e lhe dissesse: Vai lavar-te na piscina de Siloé (que significa enviado); e foi, lavou-se e voltou enxergando? Qual é a razão de tudo isso? É uma muito importante, se não engano: pois vê mais aquele a quem Jesus toca.
Considera ao mesmo tempo sua divindade e sua força santificadora. Como luz, Ele tocou e a infundiu; como sacerdote e prefigurando o Batismo, realizou os mistérios da graça espiritual.  Cuspiu, para que percebesse que o interior de Cristo é luz. E realmente vê quem é purificado pelo que procede do interior de Cristo. Sua saliva lava, sua palavra lava, como está escrito: Vós estais limpos pelas palavras que vos tenho dado. Que fizesse barro, e o untasse nos olhos do cego, que outra coisa significa senão compreenderes que é o mesmo o que devolveu ao homem a saúde untando-lhe com barro, e o que do barro modelou ao homem? E que a carne de nosso barro recebe a luz da vida eterna mediante o sacramento do Batismo?
Vai também tu a Siloé, isto é, ao enviado do Pai, segundo o que está dito: Minha doutrina não é minha, mas d’Aquele que me enviou. Que Cristo lave, para que vejas. Acode ao Batismo: é o momento oportuno. Acode pressuroso, para que possas dizer: Eu fui, lavei-me e comecei a ver, para que também tu possas repetir: Era cego, mas agora vejo; para que tu possas dizer com aquele que foi inundado de luz: A noite está avançada, o dia vem chegando.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 65-66. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

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