No dia 03 de julho de 2022 o Patriarca de Lisboa, Cardeal Manuel José Macário do Nascimento Clemente, celebrou a Santa Missa na igreja de Santa Maria de Belém, o Mosteiro dos Jerônimos, para a Ordenação Presbiteral de 10 novos sacerdotes.
Foi celebrada a Missa Ritual das Ordenações com as leituras do XIV Domingo do Tempo Comum (Ano C). Eis a homilia do Patriarca na ocasião:
Homilia na Missa de Ordenação de Presbíteros
Caríssimos ordenandos e todos
vós aqui presentes nesta bela celebração - bela porque repleta de verdade
pessoal e eclesial, bela porque manifesta a bondade de Deus, que não abandona o
seu povo e assim vem ao nosso encontro em cada um dos ordenandos de hoje,
tornados sacramento de Cristo sacerdote e pastor no meio de nós.
Acabamos de ouvir no Evangelho
um conjunto de indicações que, podendo aplicar-se a todos os discípulos de
Cristo, têm particular incidência em cada um de vós, os ordenandos.
Como seja o envio: «Naquele tempo, designou o Senhor setenta e dois discípulos
e enviou-os dois a dois à sua frente, a todas as cidades e lugares aonde Ele
havia de ir» (Lc 10,1). Na verdade, o
que acontece convosco não é iniciativa vossa, mas um envio divino.
Não é iniciativa vossa, nem poderia ser. É algo de tão profundo e decisivo que
só de Deus pode provir. Foi há dois mil anos e é agora convosco, a partir da
vontade de Cristo, que se torna vida das pessoas concretas que sois, na
história que vos trouxe aqui e vos impele além.
Também porque vos envia a preparar a sua chegada aonde fordes. Por nós, só por
nós, vamos aonde queremos ou temos de ir, com finalidades que não ultrapassam o
nosso desejo e medida. Mas neste caso - no vosso caso - ides em função de
Cristo que vos envia, para que a vossa vida se transforme em sinal da sua
própria chegada e precisamente aí.
Fostes tomados por Cristo e certamente o sentistes já, como vocação e destino. Tendo como toda a gente propensões naturais e projetos próprios, fostes desapropriados deles para assumirdes de alma e coração o projeto de Deus a vosso respeito e em função de todos.
Daqui a pouco, na prostração que fareis, vivereis o momento de Cristo, naquele horto em que deixou que a vontade do Pai fosse também a sua, ainda que passasse pela cruz para nos salvar a todos com o dom da sua vida. Sim, o vosso destino é inteiramente pascal.
No dia a dia da vossa vida sacerdotal, é este envio que vos determinará, para que a presença salvadora de Cristo possa chegar também a cada pessoa e circunstância que for.
Será essa também a vossa paz. Isso mesmo direis onde chegardes, como a seguir
ouvimos: «Quando entrardes nalguma casa, dizei primeiro: “Paz a esta casa!”» (Lc 10,5). Só o dirá deveras quem a
conhecer já por si mesmo e tanto mais quanto assim for. Aliás, no vosso
percurso pessoal, caros ordenandos, certamente que experimentastes já aquela
harmonia e quietação de espírito que se alcançam apenas em Deus e com Deus. Essa
mesma que levareis a todos.
Assim se alimentava Cristo da
vontade de Deus Pai e assim mesmo serenava as vagas de qualquer mar, exterior
ou interior que fosse. É com esta paz que haveis de sossegar tanta agitação que
encontrareis, exterior ou interior, quando o mar se encapelar nas
circunstâncias várias da Igreja ou do mundo, sorte comum da humanidade que
somos, tão promissora como frágil. Humanidade da qual Deus não desiste e que
Cristo salva. Como bem sabeis e testemunhareis.
Humanidade enferma, como
realmente é. A pandemia que nos chegou tornou mais evidente esta realidade, da
qual talvez nos julgássemos a salvo, ao menos na dimensão que teve. Aliás,
tanto a crise ecológica como a globalização viral alertam-nos para um futuro
incerto e requerem-nos outra atuação solidária. Mas a enfermidade humana, ou
seja, a natureza pouco firme e tão precária de cada um de nós, tem outros contornos
de espírito, que requer socorros além dos físicos.
Por isso os milagres de Jesus
foram sempre integrais, como a ecologia agora requer e chegando ao lugar mais
íntimo em que a vida de cada um se resolve e salva. É essa a dimensão do “reino
de Deus”, não deixando de fora nada nem ninguém, na totalidade do que somos em
nós e com os outros.
Assim o ouvimos igualmente:
«Quando entrardes nalguma cidade e vos receberem, comei do que vos servirem,
curai os enfermos que nela houver e dizei-lhes: “Está perto de vós o Reino de
Deus”» (Lc 10,8-9). Tudo se conjuga:
o envio, a chegada, a partilha, a cura e com tudo isto a proximidade do Reino.
O melhor que vos acontecerá,
caros ordenandos, é ativar e verificar tudo isto onde chegardes. Porque o Reino
não é uma “utopia” a imaginar, mas uma realidade a acontecer. Se não a
tivésseis experimentado já, não estaríeis aqui agora - nem nós convosco e como
estamos, em jubilosa ação de graças pela vossa ordenação.
O júbilo, vosso e nosso, é o que sentiram os discípulos que o Evangelho refere: «Os
setenta e dois discípulos voltaram cheios de alegria, dizendo: “Senhor, até os
demónios nos obedeciam em teu nome!» (Lc
10,17). É de uma alegria profunda que se trata, bem maior do que as
superficiais, tão fugazes que são. Alcança-se unicamente pelo nome e o poder de
Cristo, que vence o mal na sua raiz, por mais entranhada e nociva que seja.
Mantende-vos em Cristo e sentireis o mesmo que os discípulos daquela altura.
Rezareis e ensinareis a rezar o Pai-nosso até à exclamação final: «Mas
livra-nos do mal!», franqueando aí mesmo as portas da alegria. Como o nosso
mundo e até a nossa Igreja precisam alcançá-la agora e como acontecerá também
através de vós, caros ordenandos!
Finalmente, como tudo começou
em Deus, que vos escolheu e envia, também é em Deus que tudo culminará
plenamente, no arco total da vossa existência pessoal e do vosso serviço
eclesial. Assim lhes disse Cristo: «Alegrai-vos antes porque os vossos nomes
estão escritos nos Céus!» (Lc 10,20).
E assim nos alegraremos todos, na celebração eterna a que nos destinamos
convosco.
Este alegre anúncio terá
ocasião por excelência na Jornada Mundial da Juventude, que daqui a um ano ofereceremos
a uma multidão de gente nova, provinda de todos os continentes. Será para vós,
ordenandos de hoje, um marco inicial do vosso ministério, caracterizando-o
especialmente como serviço da verdadeira alegria, que só em Cristo se consegue
e com Cristo se partilha. Assim a levou a Virgem Mãe, partindo apressadamente
ao encontro de Isabel. Assim ireis vós, ao encontro de tantos que vos esperam!
Lisboa, Santa Maria de Belém, 03
de julho de 2022.
Manuel, Cardeal-Patriarca
Fonte: Patriarcado de Lisboa.
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