São João Cassiano
Conferências, 3
“A fé
é um dom de Deus”
Os Apóstolos
estavam tão intimamente convencidos de que tudo o que se refere à salvação era
neles dom gratuito de Deus, que imploravam d’Ele que lhes concedesse inclusive
a fé: Aumenta-nos – diziam – a fé. A perfeição desta virtude não
derivava de seu livre-arbítrio, mas da generosa doação de Deus. Mas o mesmo
autor de nossa salvação nos ensina quão escorregadia e fraca é a nossa fé, e
quão insuficiente, sobretudo, se não está fortalecida com o seu próprio
auxílio. Por isso disse a Pedro: Simão,
Simão, eis que Satanás quis peneirar-vos como o trigo, porém eu roguei ao meu
Pai para que a tua fé não desfaleça.
Também aquele
pai do qual fala o Evangelho tinha experiência disso. Vendo que ao empurrão das
ondas ia naufragar a sua fé contra os recifes da incredulidade, chamou ao
Senhor em seu auxílio com aquelas palavras: Senhor,
ajuda a minha incredulidade.
Os personagens
evangélicos e os Apóstolos tinham tão arraigada a ideia de que todo bem se
consuma em nós pelo auxílio de Deus, que não confiavam para nada em si mesmos.
Nem sequer apreciavam de poder conservar intacta a sua fé graças ao seu
livre-arbítrio: pediam ao Senhor que lhes concedesse ou aumentasse.
Pois bem: se a
fé de Pedro tinha a necessidade do socorro de Deus para manter-se firme e para
que não sucumbisse, quem será tão presunçoso e cego que se creia com forças
suficientes para guardar a sua sem ser continuamente sustentado pela graça
divina? Ainda mais tendo em conta que o Senhor declara o contrário no
Evangelho: Como o ramo não pode dar fruto
por si mesmo se não permanecer na videira, tampouco vós se não permanecerdes em
mim. E acrescenta imediatamente: Porque
sem mim nada podeis fazer.
Enfim, quão
néscio e ainda sacrílego seria vangloriar-se das boas obras, em lugar de
atribuí-las à graça e proteção divinas, o diz o próprio Senhor ao afirmar que
ninguém pode, sem cooperação e inspiração sua, produzir frutos espirituais: Todo bem e todo dom perfeito brota do Pai
das luzes. O mesmo afirma Zacarias: Se
há algum bem, é d’Ele, e se existe algo maravilhoso, procede d’Ele. Por
isso, o Apóstolo se mantém sempre na mesma tônica, ao dizer: O que tu tens que não tenha recebido? E se o
recebeste, por que te glorias, como se não a tivesse recebido?
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
727-728. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
Confira também uma homilia de São Cirilo de Jerusalém para este domingo clicando aqui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário