Santo Atanásio
Sobre a Encarnação do Verbo
“Suas
chagas nos curaram”
Nos conta São
João que Jesus tinha dito: Destruí este
templo e em três dias o erguerei. Mas
ele - observa o evangelista - falava
do templo do seu corpo. E se é verdade que o Pai fez tudo por sua Palavra,
por seu Filho, não é menos evidente que a ressurreição de sua carne a consumou
por seu próprio Filho. Portanto, por meio dele o ressuscita e por meio dele lhe
dá a vida. Enquanto homem é ressuscitado segundo a carne, e enquanto homem
recebe a vida, quem agiu como um homem qualquer.
Mas ele é ainda
quem, em sua qualidade de Deus, levanta o próprio templo e comunica a vida à
sua própria carne. Enquanto por um lado nos diz: Por eles me consagro para que também eles se consagrem na verdade.
E quando nos diz: Deus meu, Deus meu, por
que me abandonastes?, fala como nosso representante, já que assumiu a condição de escravo, fazendo-se
semelhante aos homens. E assim, encontrado
com aspecto humano, se humilhou fazendo-se obediente até a morte, e morte de
cruz. E como disse Isaías: Ele
suportou nossos sofrimentos e padeceu nossas dores.
Sendo assim, não
foi vexado de dores por sua causa, mas pela nossa; nem foi abandonado por Deus,
mas nós; e por nós, os abandonados, ele veio ao mundo. E quando diz: Por isso Deus o exaltou acima de tudo e lhe
deu o nome que está acima de todo nome, fala do templo do seu corpo.
Realmente, não é
o Altíssimo quem é exaltado, mas a carne do Altíssimo; e é para a carne do
Altíssimo que se concedeu o nome que está
acima de todo nome. E quando disse: o
Espírito ainda não tinha sido dado, porque Jesus não havia sido glorificado,
fala da carne de Cristo que ainda não estava glorificada. Pois não é o Senhor
da glória que é glorificado, mas carne do Senhor da glória; esta recebeu a
glória junto com ele quando subiu ao céu. Por isso, o espírito de adoção ainda
não fora dado aos homens, porque as primícias que o Verbo tinha assumido da
natureza humana ainda não haviam subido ao céu.
Portanto, quando
a Escritura utiliza expressões tais como: o
Filho recebeu, ou o Filho foi
glorificado, referem-se à sua humanidade, não à sua divindade. Assim,
enquanto alguns textos dizem: Aquele que
não poupou ao seu próprio Filho, mas que o entregou à morte por nós, outros
afirmam: Como Cristo amou a sua igreja e
se entregou por ela.
Deus, que é
imortal, não veio para salvar-se a si mesmo, mas para libertar-nos a nós que
estávamos mortos; nem padeceu por si mesmo, mas por nós, e de tal forma ele
assumiu nossa miséria e nossa pobreza, que foi com a finalidade de
enriquecer-nos com a sua riqueza. Pois sua paixão é nossa alegria; sua
sepultura, nossa ressurreição; e seu batismo, nossa santificação. De fato, ele
afirma: Por eles me consagro, para que
também eles se consagrem na verdade.
E seus sofrimentos são nossa salvação, porque suas chagas nos curaram. O castigo suportado por ele é a nossa paz,
já que nosso salutar castigo recaiu sobre
ele, isto é, foi castigado para merecermos a paz.
E quando na cruz
exclama: Pai, em tuas mãos entrego o meu
espírito, encomenda ao Pai, nele mesmo, todos os homens que nele são
vivificados. Somos realmente seus membros, e ainda que sejam muitos os membros,
formamos um só corpo, que é a Igreja. É o que diz São Paulo escrevendo aos
gálatas: Porque todos vós sois um só em
Cristo Jesus. Desta forma, nele, nos encomenda a todos.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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